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1. Práticas de supervisão: um espaço de desenvolvimento profissional

1.1. Aproximação ao conceito de desenvolvimento profissional docente

Termos como “formação contínua”, “aperfeiçoamento” ou “formação em serviço” tendem a ser usados como sinónimos de desenvolvimento profissional. No entanto, a formação em serviço tem um carácter profissionalizante e a formação contínua pretende melhorar as competências profissionais, sendo por nós considerada como uma importante dimensão, mas não única de desenvolvimento profissional.

García (2009) define o desenvolvimento profissional como “um processo que se vai construindo à medida que os docentes ganham experiência, sabedoria e consciência profissional” (p. 11). A noção de desenvolvimento profissional pressupõe, por isso, aperfeiçoamento por via ou não de formação, mas é essencialmente um processo abrangente, contínuo e evolutivo. Trata-se, portanto, de uma visão holística do desenvolvimento profissional contínuo dos professores, que abrange “quer a aprendizagem eminentemente pessoal, sem qualquer tipo de orientação, a partir da experiência (...), quer as oportunidades informais de desenvolvimento profissional vividas na escola, quer ainda as mais formais oportunidades de aprendizagem

acelarada” (Day, 2001, p. 18).

Morais (2002), defende que o desenvolvimento profissional “ocorre pela interacção dinâmica entre a mudança individual e a mudança colectiva” (p. 14), relevando a importância dos contextos. O conceito de desenvolvimento profissional enquadra-se, então, num contexto complexo, as escolas, onde os docentes se inserem e mobilizam e produzem saberes.

Na mesma linha de entendimento, García (2009) afirma que o desenvolvimento profissional docente é um “processo individual e colectivo que se deve concretizar no

61 local de trabalho do docente: a escola; e que contribui para o desenvolvimento das suas competências profissionais através de experiências de índole diferente, tanto formais, como informais” (p. 7). Ao afirmar o desenvolvimento profissional como um processo que começa na formação inicial e se estende ao longo de toda a vida profissional do professor, o autor pretende acabar com a dualidade formação inicial e formação contínua, defendendo a valorização dos aspectos contextuais e organizacionais e a orientação para a mudança.

Todo o desenvolvimento profissional envolve aprendizagem, potenciando a mudança. Assim, desenvolvimento e mudança aparecem associados. No entanto, essa mudança, se se quer qualitativa, depende da vontade do professor em querer mudar. Como regista Day (2001), “os professores não podem ser formados (passivamente). Eles formam-se (activamente)” (p. 17). É essencial que os profissionais do ensino participem activamente na tomada de decisões sobre a sua aprendizagem, bem como demonstrem o seu compromisso e interesse pela aprendizagem permanente.

Day (2001) defende ainda que planificar e apoiar o desenvolvimento profissional é uma responsabilidade conjunta dos professores, das escolas e do Governo, pois que, como refere, “o êxito do desenvolvimento da escola depende do êxito do professor” (p. 17). A promoção desse desenvolvimento permite a todos os professores acompanhar a mudança, rever e renovar os seus conhecimentos, destrezas e perspectivas sobre o bom ensino. Só assim se poderá alcançar um ensino eficaz. No entanto, não nos podemos esquecer que os professores também aprendem de forma natural ao longo da sua carreira e que o modo como pensam e agem resulta da intersecção das suas histórias de vida, contextos e desenvolvimento profissional.

Morais e Medeiros (2007) identificaram sete fontes relevantes para a investigação do desenvolvimento profissional: i) o discurso dos docentes sobre as suas próprias vidas; ii) as experiências de vida e o ambiente socio cultural que dão sentido ao

eu; iii) o estilo de vida do professor dentro e fora da escola; iv) a compreensão do seu

ciclo de vida; v) os estádios referentes à carreira; vi) os incidentes críticos que ocorrem na sua vida; vii) e a compreensão do indivíduo na intersecção da sua história de vida com a história da sociedade.

Apesar de o conceito de desenvolvimento profissional ter vindo a modificar-se, devido à crescente preocupação em compreender os processos de aprendizagem do

62 professor, as definições apresentadas apontam-no como um processo que implica uma mudança qualitativa do ensino e está sujeito a influências de diversos factores. De entre estes, García (1999) destaca i) a política educativa, ii) a cultura organizacional, iii) as forças sociais, iv) a individualidade e colectividade do professorado, v) o modelo curricular, vi) os materiais curriculares, e vii) as instituições públicas de formação.

Em síntese, poder-se-á dizer que o desenvolvimento profissional se inspira nos princípios do construtivismo, é um processo a longo prazo, situado em contextos concretos, relacionado com os processos de reforma da escola, em que o professor é encarado como prático reflexivo; é um processo colaborativo, que pode assumir diferentes formas em diferentes contextos (García, 2009); e, em última análise, contribui para a melhoria da qualidade da educação, através de processos de renovação e aquisição de competências, fundamentais a uma reflexão, planificação e prática eficazes (Day, 2001).

A nosso ver, a prática de funções supervisivas enquadra-se nestes princípios, ao potenciar aprendizagem e daí poder conduzir a mudanças. A partilha de experiências em contexto de trabalho estimula os professores a analisar as suas práticas através de processos de descoberta e reflexão baseados na colaboração e entreajuda, levando-os à resolução de problemas. É também através das interacções que acontecem na escola, pois, como vimos, este é o contexto onde se deve enquadrar o processo de crescimento profissional docente (Morais, 2002; Garcia, 2009), da discussão e da reflexão sobre as práticas pedagógicas, que os profissionais, professores e supervisores, aprendem uns com os outros e se desenvolvem pessoal e profissionalmente. Relembramos, no entanto, a importância da natureza de que se reveste o processo supervisivo e da forma como actua o supervisor. Como registam Santos e Brandão (2008), “o contexto de trabalho funciona, assim, como palco de aprendizagens e formação não só para os alunos- estagiários, mas também para os profissionais em exercício” (p. 91).

Destacamos o supervisor como investigador e profissional da prática, que, na constante busca de respostas para os problemas reais, na procura da melhor forma de ensinar e na partilha e reflexão com o professor em formação, outros supervisores e demais professores, ensina e aprende. Deste modo, a supervisão apresenta-se como uma “forma questionadora e sustentada de olhar a prática, [permitindo] ensinar e aprender de forma eficaz e melhorar a qualidade da intervenção” (Santos & Brandão, 2008, p. 90).

63 A propósito, Alarcão (2001) defende que a procura da qualidade da educação não se faz sem desenvolvimento profissional e institucional, que, por seu turno, também não são possíveis sem investigação. A qualidade da educação está, assim, relacionada com a melhoria das práticas profissionais dos docentes e nível de desenvolvimento das instituições de ensino. Daí a importância e relação do desenvolvimento profissional com a supervisão.

Num estudo acerca do desenvolvimento profissional dos professores, Morais (20024) revela alguns factores que os professores percepcionam como contributos para o seu desenvolvimento. Os docentes que participaram no estudo explicitaram que a própria experiência profissional, as situações e desafios do dia-a-dia, as acções de formação contínua e a reflexão individual e partilhada foram relevantes para o seu desenvolvimento profissional. Enunciaram, ainda, as razões pelas quais estas experiências foram significativas, mencionando o contributo que deram para a (des)construção e questionamento de conceitos/ conhecimentos científicos, a exigência de adaptações nas práticas educativas e de momentos de reflexão, flexibilização e articulação da própria acção com os estudantes, bem como o facto de terem contribuido para a dinamização das suas competências pessoais.

Morais (2002) demonstrou igualmente a relação entre o exercício de cargos nas escolas e a dimensão da auto-eficácia, enquanto variável do desenvolvimento profissional, entre os quais o desempenho de cargos de supervisão pedagógica, como orientador de estágios e delegado à profissionalização em serviço ou formador. Os professores participantes no estudo referiram que, no exercício de cargos de supervisão, tinham tido de “partilhar experiências”, de consciencializar-se “de alguns problemas que poder[iam] surgir no dia-a-dia nas aulas e a forma de ultrapassá-los”, tinham tomado “contacto com estratégias novas” e desenvolvido “o espírito de entreajuda com partilha de experiências e materiais”. Reconheceram, portanto, a importância que teve o facto de terem desempenhado cargos de supervisão pedagógica para o seu desenvolvimento profissional.

A autora concluiu que o desempenho desses cargos tinha impacto ao nível do conhecimento profissional dos professores, nas dimensões de conhecimento do

4 O estudo de Morais (2002), desenvolvido na Região Autónoma dos Açores, centrou-se no desenvolvimento profissional dos professores do 2.º Ciclo, na variável auto-eficácia e sua relação com os factores de contexto promotores desse desenvolvimento.

64 conteúdo, conhecimento pedagógico geral, conhecimento pedagógico de conteúdo, conhecimento dos contextos, conhecimento de si próprio e conhecimento da dimensão interpessoal. No presente estudo, analisaremos, de igual modo, a que níveis do domínio do conhecimento profissional o exercício da supervisão poderá ter impacto, assumindo a importância de o professor dominar determinados conhecimentos, para exercer a sua profissão com qualidade e para se poder desenvolver profissionalmente.