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3. O modelo reflexivo da formação de professores

3.2. Estratégias supervisivas

Dentro do paradigma de formação reflexivo que temos vindo a abordar, existe um conjunto de estratégias que pretendem dar aos profissionais a possibilidade de se “tornarem autores das suas práticas e não apenas aplicadores e reprodutores de soluções que alguém possa pensar na sua vez” (Sá-Chaves, 2005, p. 7).

Tal como dissemos a respeito dos estilos supervisivos, também as estratégias não se excluem, complementam-se (Amaral, Moreira & Ribeiro, 1996). Mediante os contextos e formandos, os supervisores podem recorrer a várias estratégias no processo supervisivo, pois a aplicação de uma estratégia poderá implicar o recurso a outra(s) e diferentes formandos em diferentes estádios de desenvolvimento podem requerer estratégias supervisivas diferentes.

Uma das estratégias relevantes na formação de professores reflexivos é a realização de perguntas pedagógicas. Esta estratégia baseia-se no questionamento com intenção formativa, onde o supervisor assume o papel de questionar para promover a reflexão e o professor em formação o papel de responder e autoquestionar-se.

Smyth (1987, citado em Alarcão & Tavares, 2003) refere a importância das perguntas pedagógicas no desenvolvimento e emancipação dos professores. Segundo o autor, estas perguntas podem ser de quatro tipos: i) descrição (o primeiro passo a ser dado para levar o professor a iniciar uma tarefa passa pela resposta à pergunta o que

55 modo a descobrir o significado das acções); iii) confronto (através de perguntas deste carácter, questionam-se as teorias seguidas, ponderam-se opções teóricas alternativas); iv) reconstrução (este tipo de questionamento dá a possibilidade ao professor de alterar as suas práticas). É neste sentido que Amaral, Moreira e Ribeiro (1996) afirmam: “as perguntas pedagógicas surgem então como estímulos [à] reflexão na acção, sobre a acção e sobre a reflexão na acção” (p. 105).

Com a preocupação de compreender as finalidades e os contextos educativos, os professores relatam e registam muitos acontecimentos da sua prática pedagógica, resultando este registo numa estratégia supervisiva conhecida por narrativa. O diário de bordo, o diário íntimo e o registo quotidiano (Holly, 1991, citado em Amaral, Moreira & Ribeiro, 1996) são tipos de narrativas que permitem guardar experiências vividas e através delas analisar a acção do professor e tirar conclusões.

O diário de bordo é um registo de características mais objectivas, na medida em que compreende o registo de factos. O diário íntimo permite um maior distanciamento dos factos, levando os professores a reflectir sobre os mesmos. Por fim, o registo quotidiano compreende características das duas narrativas anteriores, englobando não apenas o registo de factos, mas também de reflexões pessoais e expressão de sentimentos, apresentando-se como a narrativa com conteúdo mais abrangente.

A análise de casos é outra estratégia supervisiva de natureza reflexiva. Não deixa de ser uma narrativa, um registo de acontecimentos e situações reais, mas com um nível maior de profundidade, pois as descrições revelam tanto conhecimentos teóricos dos formandos, como as suas crenças: “os casos são narrativas elaboradas (ou trabalhadas) com [o] objectivo [de] darem visibilidade ao conhecimento que deles brota” (Alarcão & Tavares, 2003, p. 102-103). A particularidade e o valor formativo dos casos prendem-se com o carácter analítico dos mesmos. Estes são registados para serem, posteriormente, analisados, à luz nos pressupostos teóricos que lhes estiveram subjacentes e dos quais, no momento da acção, os professores não tiveram consciência (Shulman, 1986, citado em Amaral, Moreira & Ribeiro, 1996).

Na senda do desenvolvimento do professor reflexivo, o trabalho de projecto surge como uma estratégia de formação que poderá dar contributos relevantes, por ser uma metodologia cujo foco se centra no estudo de problemas com interesse para um grupo, todo ele implicado no trabalho de pesquisa, de reflexão sobre a acção, de

56 consultas bibliográficas e troca de impressões (Amaral, Moreira & Ribeiro, 1996). Aqui o papel do supervisor é fundamental ao criar momentos de reflexão avaliativa sobre o percurso-organização dos saberes dos professores em formação.

Amaral, Moreira e Ribeiro (1996) apresentam ainda a investigação-acção como outra estratégia relevante no quadro da formação de professores reflexivos. Trata-se de uma estratégia que pode ser levada a cabo pelo próprio professor, numa perspectiva de autoformação. Esta estratégia favorece a compreensão das situações educativas e uma intervenção sobre as identificadas como problemáticas, através de ciclos sucessivos de investigação-acção. Os autores identificam quatro fases nesse processo: i) planear um esquema de acção para melhorar uma dada situação; ii) agir através da implementação desse plano; iii) observar os efeitos da acção; iv) e reflectir sobre os efeitos observados, dando início a um novo ciclo de investigação-acção. É uma estratégia supervisiva que implica um questionamento e reflexão contínuos sobre a prática, permitindo a reconstrução de saberes.

Por fim, Alarcão e Tavares (2003) e Sá-Chaves (2005) identificam os portfólios reflexivos como outra metodologia promotora de uma formação reflexiva dos professores.

Segundo Sá-Chaves (2005), o portfólio reflexivo consiste numa estratégia “que procura evidenciar o fluir dos processos subjacentes ao modo pessoal como cada qual se apropria singularmente da informação, reconstruindo o seu conhecimento pessoal prévio” (p. 9) e que permite ao formador compreender e intervir nesses mesmos processos. Por outras palavras, a autora entende-o como uma narrativa, de natureza biográfica, que permite aceder aos significados que os sujeitos atribuem aos conhecimentos e ao modo como estes significados se constroem.

Alarcão e Tavares (2003), por sua vez, entendem o portfólio como “um conjunto coerente de documentação reflectidamente seleccionada, significativamente comentada e sistematicamente organizada e contextualizada no tempo, reveladora do percurso profissional” (p. 105). O portfólio reflexivo implica, assim, da parte do sujeito uma reflexão consciente e autónoma acerca das suas experiências, ao registar e estruturar o significado das mesmas, bem como capacidades de decisão e sistematização. Segundo os autores, o portfólio reflexivo compreende cinco fases: i) diagnóstico dos sucessos e dificuldades; ii) definição de uma área de intervenção específica nas aulas de cada

57 professor; iii) constituição de um grupo voluntário para reflectir sobre cada área; iv) apresentação das primeiras versões dos portfólios; v) e novo ciclo de portfólio.

Qualquer uma dessas estratégias serve a formação inicial de professores, como a sua formação contínua, numa perspectiva de desenvolvimento ao longo do percurso profissional. Nesta medida, cada uma cumpre um papel fundamental na formação do professor supervisionado, como do seu próprio professor supervisor, num quadro formativo que se pretende cada vez mais reflexivo, colaborativo e investigativo.

Síntese

Ao longo deste capítulo, procurámos dar a conhecer o desenvolvimento do conceito de supervisão, reflectindo a preocupação crescente das instituições de formação sobre o modo como os professores aprendem a ensinar.

No decorrer deste processo, reconhecemos a importância da figura do supervisor, daí a ênfase nas competências e funções a desenvolver por este. Foi igualmente nosso intuito explanar os diferentes modelos e estilos de supervisão, reflectindo acerca do impacto que a adopção de um determinado modelo e estilo pode ter na qualidade e eficácia do processo de supervisão, bem como no desenvolvimento profissional e pessoal do professor e do supervisor. Valorizámos, neste seguimento, a adopção de uma postura reflexiva e investigativa, quer por parte do professor em formação, quer por parte do supervisor, durante o ciclo supervisivo, através de estratégias que realçamos nesta parte do trabalho.

Assim sendo, neste capítulo, explorámos contextos teóricos pertinentes para a compreensão da problemática em estudo, nomeadamente no que concerne ao objectivo da supervisão que se relaciona, como aprofundaremos no próximo capítulo, com o desenvolvimento profissional, não apenas do professor em formação, mas também do supervisor.

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CAPÍTULO

III

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Introdução

Como procurámos já relevar no capítulo anterior, supervisão pedagógica acolhe cada vez mais desafios e responsabilidades relacionados quer com a formação inicial quer com o desenvolvimento pessoal e profissional dos professores, que visam o aumento da qualidade do ensino e uma maior influência da escola na sociedade.

Neste capítulo pretendemos reflecitr acerca da relação entre a supervisão pedagógica e o desenvolvimento profissional, assumindo aquela como uma das várias experiências que ocorrem na vida profissional de um docente e que constitui uma aprendizagem, logo permitindo uma melhoria qualitativa no seu desempenho e um contributo para o seu crescimento enquanto pessoa e profissional.

Inserido neste enquadramento, este capítulo inclui três pontos estruturantes, que permitem compreender e aprofundar esta relação. Assim sendo, abordamos o conceito de desenvolvimento profissional, clarificando-o e apresentando diferentes perspectivas de abordagem, que nos ajuda a justificar a supervisão como um dos factores de desenvolvimetno profissional docente. Ainda faz parte integrante do capítulo uma consideração sobre o que alguns autores perspectivam acerca das etapas de desenvolvimento profissional docente, fundamentais à compreensão do modo como esse desenvolvimento ocorre e dos traços de que se reveste e das potenciais implicações disso ao nível do desempenho profissional do professor.