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Aproximação com um método adequado para a investigação

No esforço de compreender e explicar a realidade, estamos sempre fazendo novas reflexões sobre o processo de construção do conhecimento, procurando aprofundar problemas de ordem conceitual assim como também com relação aos procedimentos de investigação. Constitui-se nossa intenção neste presente trabalho concentrar nossa atenção sobre o momento da produção das Ciências Sociais em que se começou a valorizar a pesquisa de campo, relevando-se a preferência pelo micro-estudo de caso ao invés das grandes fórmulas baseadas em explicações estruturais33.

A ciência, mesmo comprometida com ideais de objetividade e neutralidade, tem se colocado em funcionamento como um instrumento de poder muitas vezes opressor daqueles que não a produzem, mas apenas sofrem seus efeitos. Para melhor compreensão do processo de produção do conhecimento, faremos uma breve alusão ao pensamento elaborado por alguns teóricos, apenas numa tentativa de justificar a opção metodológica que fizemos para desenvolver nossa investigação, que ao longo do texto passaremos a descrever.

Haguette (1987) inicia seu raciocínio sobre a produção do conhecimento trazendo a compreensão de que durante muito tempo acreditou-se que a mente humana era uma tábula

33 Haguette (1987) faz um sucinto, mas rico apanhado sobre o início das visões qualitativas de ciência na

modernidade, abordando o pensamento de Bacon, Locke, Kant, Hegel e Marx como introdução ao seu estudo sobre as metodologias qualitativas. Fizemos uma breve menção ao empirismo, racionalismo, positivismo e à dialética sem, no entanto, nos aprofundarmos, mas apenas para servir de ponto de partida para a sequência de nossa reflexão.

rasa na qual eram impressos os conhecimentos segundo uma visão convencional chamada “empirismo” fundamentada por Bacon. Locke deu novas argumentações ao método empirista baconiano e Descartes o contestou colocando o papel da razão e da reflexão em posição de relevância sobre os dados empíricos, explicando que os sentidos não eram suficientes para desvendar o real.

O “racionalismo”34, ou visão cartesiana de produção do conhecimento elaborado por Descartes, coloca em evidência uma verdadeira disputa entre a razão e os sentidos como instrumentos de aproximação com o real. De acordo com Haguette (1987) é somente no século XIX que se instauram as questões políticas dentro das metodologias, pois até então as discussões metodológicas se situavam em um campo supostamente neutro, que visava a objetividade do conhecimento. A diferença marcante entre a “dialética” hegeliana e a marxista, e o “positivismo” de Comte, constituíram-se então a grande contradição do momento. Hegel enfatizava a teoria – ou contemplação do mundo – enquanto Marx preocupava-se com a práxis, ou seja, com as ideias aplicadas ao processo de desenvolvimento social: o “materialismo” histórico e o dialético.

Muitas controvérsias epistemológicas passaram a existir na era moderna com a expansão do capitalismo, com as ideias marxistas, especialmente a exigência de que a ciência se colocasse a favor das causas humanas e que tivesse uso na prática social. Dentro dessa reflexão do compromisso da ciência com o extermínio das desigualdades e com o benefício da humanidade se instaura também na modernidade as reflexões em torno da importância do indivíduo e dos pequenos grupos como objeto de análise (HAGUETTE, 1987).

Entende-se que os diferentes indivíduos e grupos que constituem cada sociedade, constroem na dinâmica social cotidiana, visões variadas de mundo, que servem de substrato para a elaboração das questões epistemológicas e metodológicas de todos aqueles que investigam e produzem ciência.

Nesse exercício de aproximação com o real, é que se percebe a impossibilidade de se produzir conhecimento sobre os fenômenos sociais na sua totalidade. Todo conhecimento é limitado e passível de críticas, de complementos, de dúvidas.

A opção pela pesquisa qualitativa está relacionada diretamente à nossa forma de perceber o mundo, e ao conhecimento que construímos ao longo de nossas vivências.

34 A esse respeito, Weller et al (2002) traz uma discussão sobre a disputa estabelecida na modernidade entre o

Deixamos claro, portanto, que a nossa opção pelos estudos qualitativos não está ligada a uma reação contra o paradigma estrutural, nem aos modelos quantitativos de análise, trata-se apenas de procurar refletir sobre a melhor adequação metodológica ao nosso objeto de estudo. Tomando como base o que declara Pineau, (2006, p.336) cremos que nossa opção metodológica se firma no momento da “[...] difícil passagem do paradigma da ciência aplicada ao do ator reflexivo.” Para este autor, os teóricos que fazem a corrente de pesquisa- ação-formação, utilizando os estudos do método biográfico, constituem a gênese de um movimento que há mais de 20 anos vem desenvolvendo estudos sobre histórias de vida e formação, revalorizando o método biográfico, e dando voz não apenas aos sujeitos “notáveis” da história, mas também, e sobretudo, àqueles ausentes e invisíveis. Sendo assim, “Sua aposta bio-política é a da reapropriação, pelos sujeitos sociais, da legitimidade de seu poder de refletir sobre a construção de sua vida. Essa vida não é completamente pré-construída. E ela é muito complexa para ser construída unicamente pelos outros.” (PINEAU, 2006, p. 336).

O método biográfico se situa, como diz Ferraroti (1982, p. 20), “[...] numa encruzilhada da investigação teórica e metodológica das ciências do Homem.” Cremos que este método tem mais condições de responder hoje às exigências de compreensão da vida quotidiana, constituindo-se, segundo este autor, como uma “[...] ciência das mediações que traduz as estruturas sociais em comportamentos individuais ou microssociais.” (p. 20).

1.4 A Escola de Chicago: inovação na pesquisa qualitativa e importante