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1 ESCÂNDALOS POLÍTICOS, DO GERAL AO ESPECÍFICO: O PROCESSO DE

3.3 O JORNALISMO E O MONOPÓLIO DO ESCÂNDALO POLÍTICO

3.3.1 O conceito em Max Weber

3.3.1.1 Aproximações com o objeto: os escândalos políticos sob o monopólio do

cidadãos perseguem – e não sabem exatamente o porquê –, que provê essa segurança.

Juntos, a imprensa com seus diversos mecanismos narrativos de autopreservação e cidadãos que temem os sentidos que podem estar contidos no vazio narrativo da expressão “atentado à democracia”, esses dois elementos são responsáveis por garantir que a segurança do monopólio do escândalo permaneça no jornalismo. Especificamente em relação aos escândalos, um dos resultados diretos disso se deposita nas narrativas jornalísticas que relacionam a exposição de escândalos com a própria manutenção democrática e qualquer prejuízo que a cobertura de escândalos possa ter é tratada também como um prejuízo para a ordem pública e democrática.

Já em relação ao último ponto que listamos, os regulamentos que, na ideia weberiana, permite ao Estado monopolista intervir em todos os domínios, também é possível traçar um paralelo com o monopólio jornalístico. No contexto do jornalismo e dos escândalos, os regulamentos parecem ser exatamente as negociações narrativas que estão impressas nos discursos. Afinal, é através de uma estrutura narrativa prévia que é possível guiar a experiência pela mentalidade escândalo, induzindo um entendimento de que tudo que está sendo narrado serve a um propósito maior. Nessa estrutura, também, se aglutinam os imperativos que normalizam a exposição feita pelo jornalismo de toda a administração pública – e não apenas normaliza, mas pressupõe que essa é a única maneira de se operar, única atuação possível e desejável – e fazem com que os escândalos sejam vistos como peças inerentes às narrativas jornalísticas.

3.3.1.1 Aproximações com o objeto: os escândalos políticos sob o monopólio do jornalismo

Retomando uma questão, que julgamos fundamental para compreender esse monopólio do escândalo que tentamos delimitar, perguntamos: a que se refere esse monopólio do escândalo detido pelo jornalismo? Existe escândalo político midiático –

nascido, conduzido e que depende das formas midiáticas para existir – fora das narrativas jornalísticas? Quando falamos em narrativas jornalísticas, não queremos dizer que os escândalos políticos só existem nas páginas dos jornais, nas matérias de televisão, nos pronunciamentos de rádio e, atualmente, nos portais de notícias. A mediação midiática é essencial, como já apontou Thompson. Esse tipo de escândalo, ao qual nos referimos, depende dos atravessamentos midiáticos não só para se propagar, mas para existir como tal. A questão, no entanto é outra.

Viemos apontando, no entanto, que o monopólio diz respeito a deter as formas narrativas nas quais os escândalos políticos midiáticos são reconhecidos, valorizados, legitimados. E, ainda, ao prover essas formas, o jornalismo também busca resguardar seu lugar como instituição essencial. Nesse caso específico, essencial para a manutenção da democracia.

Como premissa para compreender esse monopólio, então, tem-se a ideia de forma, sendo complexificada pela noção de narrativa e atravessada pelos escândalos políticos. Não sem razão, o esforço principal que precisa ser feito é clarificar o que é essa forma, que, como vimos, tem sido aqui tratada como uma estrutura mutável, constituída de três dimensões – estrutural, simbólica e temporal. Ainda sobre elas, as formas narrativas são anteriores às notícias, no sentido que constituem um guia para a compreensão destas. As formas não são os conteúdos das notícias, mas se relacionam com eles e podem ser determinadas e compreendidas a partir deles.

Nesse contexto, é válido pensar na estrutura do lead na qualidade de forma basilar do jornalismo “moderno”. Um lead é uma forma não apenas porque corresponde à uma dada estrutura em que informações específicas são colocadas. No sentido como se concebe aqui, ele é uma forma porque comunica uma série de outras informações além das que dispõe explicitamente. Um lead faz parte de um instrumental jornalístico recente, ele é culturalmente localizado, permeado por ideais de uma cultura profissional consolidada.

Como estudante de jornalismo, aprendi o lead ainda na universidade, sem qualquer perspectiva de ensaiá-lo em alguma redação. Tempos depois, já trabalhando na profissão, o internalizei de tal modo que não havia outra maneira de começar um esboço de matéria. Ele, como forma, é anterior às notícias que atravessa. É nesse sentido que vemos a busca pelas formas narrativas que constituem os escândalos políticos midiáticos no jornalismo brasileiro, tanto porque dá a ver traços da cultura profissional jornalística

que se instalou no Brasil, quanto porque se relacionam com o compromisso democrático que deriva desta cultura.

Assim como o lead, outras formas pairam nas narrativas jornalísticas. Outras formas indicam para onde olhar, quem procurar e quando se preocupar. Outras formas que, se identificadas e organizadas, podem nos dar pistas sobre o que faz uma narrativa ser percebida como um escândalo e como os elementos que lhe dão esse sentido fundam a mentalidade escândalo. Consequentemente, pode nos dar pistas também sobre como o jornalismo explora essa mentalidade em prol de sua autopromoção.

Afinal, esse monopólio que apontamos, nesse contexto, nada mais é do que o jornalismo administrando as formas narrativas que compõem o que ele vai chamar de escândalo político, e o faz para fortalecer sua imagem – principalmente de protetor da democracia. É a mentalidade escândalo com seu fim último exposto.

Mas, para tentar ilustrar isso, sabemos, é necessário mergulhar fundo nas narrativas reconhecidas como escândalos políticos. Não apenas utilizando-as como corpus de análise, mas tornando-as o próprio objeto de pesquisa. É preciso partir da premissa de que essas narrativas resguardam especificidades que podem ser usadas pelo jornalismo em sua autoproclamação de pilar democrático. Mas não só, pois não parece ser apenas o jornalismo que detém as formas dos escândalos políticos e as monopoliza em benefício próprio; os escândalos também parecem escravizar o jornalismo, na medida em que, sem eles, este jornalismo perde em credibilidade – pois, se o escândalo é possível de ser exposto em outras formas narrativas por outros meios, por quê confiar tanto no jornalismo? – e utilidade.

Mas, em se tratando dos escândalos, quais são essas formas narrativas que o jornalismo ainda detém e que monopoliza essas narrativas escandalosas? Quais são essas formas que, ao ganharem cada vez mais espaço nas narrativas jornalísticas, parecem acionar uma maneira específica de julgar os acontecimentos, e reorganiza nosso olhar, fazendo com que reconheçamos aquela série de eventos como escândalos políticos? Olhemos para os escândalos, então, a fim que nos olhem de volta com algumas possíveis respostas.

4 DIÁLOGOS COM O INVISÍVEL: A MENTALIDADE ESCÂNDALO ONTEM