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1 ESCÂNDALOS POLÍTICOS, DO GERAL AO ESPECÍFICO: O PROCESSO DE

1.3 SOBRE COMO ABORDAR AS NARRATIVAS DITAS ESCANDALOSAS

1.3.3 Esquematização dos dados e a identificação das polarizações

1.3.3.1 Corpus de análise

Feita essa exposição dos principais conceitos que norteiam a nossa discussão, detalhamos os procedimentos práticos de análise. Embora já tenhamos exposto alguns deles, nos concentramos mais, até aqui, em justificar as nossas escolhas, recriando parte da dinâmica que desenvolvemos ao reestruturar nossos objetos e objetivos de pesquisa. Agora, então, buscaremos focar na apresentação direta dos materiais que compõem o nosso corpus: os jornais, os recortes temporais e os elementos que vão ser levados em consideração para a identificação das formas narrativas que constituem a mentalidade escândalo.

Destaca-se, também, as razões de se abordar esse tema através dos escândalos políticos midiáticos, tanto no que se refere a sua importância pelo apelo sempre atual que

emanam nas análises de comunicação, em especial de jornalismo, quanto pelas possibilidades que oferecem sendo um objeto complexo e multifacetado. Isso, sem esquecer que inúmeras maneiras de abordá-lo são possíveis, e as que são apresentadas aqui pretendem dar conta de apenas uma parte da longa lista de problematizações suscitadas pelos escândalos. Esgotá-lo não era uma opção – nem pretensão – e, sim, torná- lo compreensível.

É importante que se ressalte, ainda, que, embora aqui estejam descritas grande parte da abordagem metodológica que nos guiou, outras informações que julgamentos pertinentes nesse sentido também estão diluídas ao longo dos capítulos, na medida em que aprofundamos os conceitos que nos auxiliam na compreensão do problema de pesquisa.

Finalmente, em termos de corpus, é preciso vislumbrar o grande panorama de análise que se coloca diante deste trabalho, o que inclui compreender as escolhas que foram feitas ao longo do caminho, assim como as recusas. Pode-se admitir que há um corpus nuclear, de onde a discussão parte e que, para fortalecê-la, cria a necessidade de se apoiar em outro corpus, que são colocados aqui como complementares. Sinalizamos isso no final da seção anterior e, por isso, começaremos explicando estes últimos.

Como corpus complementares, então, temos os materiais colhidos da década de 1950. Como já mencionado, este é o período em que a expressão “mar de lama” ganha seu sentido mais conhecido e que nos guia pelos escândalos políticos; nela está a ideia de que a corrupção ganha grandes proporções e parece “engolir” um determinado governo e/ou personagens específicos da política. Esse também é o período que coincide com o que se convencionou chamar de “modernização” do jornalismo brasileiro, cujas transformações passaram a indicar um alinhamento entre o jornalismo nacional e o modelo estadunidense, guiado pelos ideais que hoje fazem parte da mítica profissional jornalística.

Essas duas características fazem com que a década citada seja particularmente interessante para fazermos as primeiras observações das questões que guiam este trabalho. Por isso, para tal, nos debruçamos sobre dois materiais específicos: 1) a cobertura do escândalo da CPI da Última Hora, ocorrido em 1953, a partir da perspectiva dos jornais Tribuna da Imprensa e Última Hora; 2) o “Livro Negro da Corrupção”, edição especial do jornal O Globo sobre os malfeitos do governo Vargas, lançado em setembro de 1954.

Essa edição especial citada, apesar de ser posterior ao trágico fim do governo de Getúlio Vargas, foi responsável por guiar nosso olhar sobre qual escândalo desse período deveríamos nos debruçar. Nela, é feita uma retrospectiva das situações corruptivas que envolveram os três anos de presidência de Vargas. Em especial, dois escândalos são citados, a CPI da Última Hora e o atentado da Rua Tonelero. Privilegiamos o primeiro, então, por ser considerado o menos alterado por eventos externos, já que as investigações do atentado foram marcadas pelo suicídio do ex-presidente, em agosto de 1954.

A pretensão, ao observar esse material, era reunir alguns indícios sobre as narrativas de escândalos políticos. É importante que se destaque, no entanto, que não há qualquer intenção comparativa nesse exercício. O que se buscou fazer foi organizar algumas categorias preliminares que nos ajudariam a pensar as categorias finais, utilizadas para analisar os escândalos da Era PT, em seu próprio mar de lama. A ideia, então, era que os escândalos do “mar de lama de Vargas” nos oferecesse algumas pistas sobre permanências e transformações nas formas narrativas dos escândalos que vimos desdobrar nos trezes anos dos governos petistas.

Influenciados pelas transformações do fazer jornalístico, que mexiam também com a sua concepção profissional, os jornais da década de 1950 estavam se colocando como atores políticos, enaltecendo e consolidando sua narrativa em torno da defesa da ordem democrática. Por tudo isso, esse parecia um contexto promissor de observação inicial.

As polarizações que encontraríamos depois, no “mar de lama de Lula e do PT” carregavam muitos dos indícios que visualizamos primeiro na década de 1950, o que nos diz bastante sobre o tipo de jornalismo que foi sendo moldado aqui no Brasil “pós- modernização”. Com todas as problematizações que esse termo é capaz de suscitar, como pontuaremos adiante, esse período ainda resguarda bons materiais de análise.

Já como corpus principal, ou nuclear, têm-se os escândalos da Era PT34, apresentados pelo jornal o Globo. Sobre eles, cabe dizer que partimos de uma lista 13 escândalos, que abarcam desde o período em que a presidência estava ocupada por Luiz Inácio Lula da Silva, até os dias de Dilma Rousseff, e de um relato veiculado no site do jornal, também sobre o que o veículo considerou como sendo os escândalos mais importantes dessa época.

34 Optou-se por usar essa nomenclatura em consonância com a maneira como os veículos de comunicação

passaram a se referir ao período em que políticos do Partido dos Trabalhadores ocuparam a presidência da república.

Em relação ao jornal que foi escolhido como ponto de partida, ancoramos nossas considerações no O Globo por três razões principais: 1) pela penetração que usufrui no mercado jornalístico brasileiro, ocupando nos últimos 20 anos o ranking de cinco periódicos mais vendidos; 2) pela posição que esse veículo se auto impõe, como representante do jornalismo de referência brasileiro; 3) pelo levantamento que ele realizou, à época do impeachment de Dilma Rousseff, com os escândalos que marcaram os governos do PT.

Nesse sentido, esclarecemos que nossa pretensão foi de trabalhar com o que é caracterizado escândalo pela própria imprensa, ou seja, pelo que o próprio jornal classifica como tal. Buscamos, assim, fazer o movimento inverso: ao invés de estabelecer uma noção de escândalo – midiático – e tentar enquadrar as situações nesse caminho pré- concebido, utilizamos os enquadramentos já providos pela imprensa e, a partir deles, problematizamos o conceito de escândalo midiático.

Ainda sobre a lista de 13 escândalos veiculada e mantida nos acervos do jornal O Globo, esclarecemos que essa “curadoria de escândalos” do PT, estruturado através de uma galeria de eventos, apresenta uma cronologia do que foi a administração petista ao longo dos treze anos. Seguindo nossa argumentação de privilegiar o entendimento de escândalo do veículo jornalístico, esses eventos foram usados como ponto central para nossa discussão.

Em relação à lista em si, é preciso também fazer algumas considerações. Ela está disponibilizada no site do periódico, tendo sido veiculada após a confirmação de que o mandato de Dilma Rousseff seria, de fato, impedido, em agosto de 2016. Mas, diante dessa lista online, como se poderia agrupar uma série de matérias nos jornais impressos para serem analisadas? Ou seja, como transportar essas informações online para o meio impresso, adaptando-se aos propósitos deste trabalho?

Devido à maneira como são expostos os escândalos na compilação que foi feita pelo O Globo (figura 1), tivemos alguns cuidados. Com o título “13 escândalos do PT no poder”, o jornal promove um passeio virtual pelo que chama de principais escândalos que marcaram os governos do PT na presidência, disponibilizando um resumo a respeito deles. Apesar da indicação numérica, cabe destacar que alguns dos episódios incluídos na lista do periódico são desdobramentos de um escândalo e não necessariamente um novo evento. Isso foi levado em consideração no momento da análise, mas, para a composição do corpus, todos foram levados em consideração com igual peso.

Além disso, o O Globo não faz qualquer conexão entre esses episódios e suas próprias matérias escritas sobre o assunto. Não há qualquer link que junte essas indicações de escândalos e as edições passadas do jornal – o que seria de grande ajuda para nos guiar nas análises das narrativas. Por isso, utilizou-se como guia extra um relato que também foi veiculado no site do periódico, em que os escândalos da Era PT são descritos e, nessa versão, é possível encontrar links para matérias.

Diante desse material, procedeu-se da seguinte forma: buscou-se informações sobre o início e o fim desses episódios descritos como escandalosos, partindo de pesquisas no próprio site do jornal. Foi com base nos resultados dessas pesquisas que organizamos uma linha temporal que nos auxiliou nas buscas das matérias nas edições do acervo que são iguais às impressas.

Figura 1 - Print screen da tela de abertura da galeria do O Globo.

Fonte: www.oglobo.globo.com

Em termos de aproximação com o material, explicamos ainda que a observação inicial desses recortes foi feita com base no conteúdo apresentado nas capas dos jornais. Ou seja, observamos primeiramente as capas dos jornais ao longo desses episódios que identificamos como escândalos, em busca de indícios sobre as polarizações que queríamos explicitar. Quando menções ao escândalo eram feitas na capa, seguiu-se para as matérias relacionadas dentro do jornal. Essa opção foi feita levando em consideração que a visibilidade desses escândalos deu-se, principalmente, a partir das manchetes.

A partir do momento em que as chamadas na capa não estavam – ainda ou não mais – sendo feitas, pode-se perceber que o próprio escândalo também não existia no sentido em que comumente lhe é associado. Essa escolha de se basear na capa não é vista

como prejudicial porque, até em sua fase prévia, prevista por Thompson (2002) como sendo um prelúdio do escândalo, sem necessariamente ser classificado como tal, as narrativas com potencialidade para serem vistas como escândalo recebem algum tipo de visibilidade nas capas dos jornais.

Além disso, vale ressaltar que cada um desses casos, tanto do corpus complementar quanto do principal, tem em comum o fato de serem aqui compreendidos como um escândalo político de poder, nomenclatura que adotamos desde o início e, agora, cabe um esclarecimento a mais. Nos termos previstos por Markovits e Silverstein (1988), escândalos políticos, para serem reconhecidos como tal, têm que envolver abuso de poder em relação a processos e procedimentos. Já Thompson (2002), em sua sistematização, distingue os escândalos políticos em “escândalos sexuais”, “escândalos financeiros” e “escândalos de poder”.

Em linhas gerais, o autor pontua que os primeiros dizem respeito às situações em que há transgressões de códigos sexuais, tendo políticos como um dos personagens principais, enquanto os segundos envolvem o mau uso de recursos econômicos públicos, e os últimos se referem aos abusos de poder político.

Dos casos apresentados aqui, a CPI da Última Hora e grande parte dos escândalos da Era PT poderiam ser enquadrados como escândalo político-financeiros, tomando como base os escândalos do Mensalão35 e da Lava-Jato36. No entanto, parece mais promissor concebê-los a partir da noção de escândalos de poder, alinhando-se, inclusive, ao entendimento de narrativas patrimonialistas.

De acordo com Thompson (2002, p.239), está previsto que escândalos político- financeiros envolvam também transações financeiras ilícitas, mas essas transações não constituem a fonte do escândalo, elas são secundárias, porque as atividades realmente centrais ao escândalo são “transgressões de regras e leis que regulamentam o exercício do poder político” (THOMPSON, 2002, p.239). É o uso ilícito do próprio poder político, nos termos descritos pelo autor e com o qual se converge.

Isso porque é preciso refletir que, ao levar isso em consideração, os escândalos que poderiam ser vistos como político-financeiros ganham uma nova dimensão. Todos

35 Esquema de propinas a parlamentares, pagas com dinheiro público desviado com a contrapartida que

votassem a favor das propostas do governo, eclodido em 2004 e amplamente explorado nos anos seguintes, em meio a novas revelações - em especial de Roberto Jefferson, em 2005 - e desdobramentos.

36 Investigação da Polícia Federal a respeito de lavagem de dinheiro, sonegação fiscal, corrupção e outros

crimes, que acabou implicando o então diretor da Petrobrás, Paulo Roberto Costa, em 2014. Ele, juntamente com o doleiro Alberto Yousseff fizeram o acordo para delação premiada e implicaram nomes do Partido dos Trabalhadores como beneficiários em diversos esquemas de corrupção através da estatal.

eles, em seus momentos de eclosão e desenvolvimento, colocaram em destaque no debate político nacional – acadêmico ou não – a natureza do exercício político e as próprias bases do sistema de governo em vigor no país. Em todos os casos analisados neste trabalho, também, o fio condutor da narrativa é o uso do poder proporcionando um completo descontrole em termos de usufruto do dinheiro público, não o contrário.

Já de volta ao ano de 1953, o fio condutor pode ser pensado em termos de tentativa de controle do jogo político da época, implementada por Vargas com o financiamento do jornal Última Hora, que confere à CPI o status de escândalo. A indignação de Lacerda dá extensa visibilidade ao montante desviado para este fim, mas, em último grau, é o esforço em se construir um sistema midiático para além das críticas ao governo que estimula o questionamento. A normatização em torno disso se torna mais clara quando, em diversos momentos da campanha lacerdista durante a CPI, o jornal Tribuna da Imprensa expõe os valores repassados ao jornal de Wainer, o Última Hora. Esses números não dizem apenas “é um absurdo que se gaste tanto em jornal para falar bem do governo”, mas eles dizem também “é um absurdo que se gaste tanto para poder governar”.

Os escândalos da Era PT seguiram uma lógica parecida, acreditamos. Tanto que, à época, muito se questionou a respeito do preço da governabilidade no país. É, portanto, coerente que se agregue esses escândalos sob uma perspectiva comum. Isso, no entanto, não significa que suas particularidades não serão pontuadas, mas apenas que há um cuidado na seleção desses casos para a composição do corpus de análise.

Além disso, ao longo do trabalho, trazemos alguns exemplos mais atuais, de casos que ajudam a ilustrar as discussões que seguem. Esses casos não necessariamente se enquadram como escândalos políticos, mas servem para pensar o papel e o lugar dessas narrativas, na correlação entre jornalismo e política na atualidade.

Isso posto, tendo apresentado os principais conceitos que pretendemos trabalhar para alcançar nosso objetivo de demonstrar como a mentalidade escândalo tem funcionado nas narrativas jornalísticas, passamos a abordá-los já no contexto de discussões específicas.

Até chegarmos à análise principal, julgamos necessário rever algumas questões que são caras ao entendimento de jornalismo no contemporâneo, especialmente no que diz respeito a essas narrativas tão postas em destaque – e cuja própria existência pressupõe esse tratamento especial – como as que são compreendidas como sendo escândalos políticos. Como primeiro passo, então, daremos atenção à aproximação entre jornalismo e narrativa, para introduzir algumas considerações sobre as especificidades do que se

apreende, hoje, por escândalos políticos, assim como os pormenores iniciais do que entendemos como polarizações.

2 SOBRE A NARRATIVA E SUA RELAÇÃO COM O JORNALISMO

Já sinalizamos que este trabalho é constituído a partir de um olhar sobre o jornalismo que compreende as notícias como narrativas. Nesse sentido, e para fins de localização desse debate, é relevante destacar as ideias de Bird e Dardenne (1993), que afirmam que as notícias devem ser vistas como mitos. Essa compreensão se insere em uma perspectiva narrativa das notícias, como é proposta também por Motta (1997) e problematizada por Albuquerque (2000a) – e para a qual também convergimos, com algumas considerações.

Ainda segundo Bird e Dardenne (1993), enxergar as notícias como narrativas é focar no modo como as notícias são narradas, considerando como parâmetro o afastamento ou a proximidade do registro de dados. Isso significa que, ao se afastar, gradativamente, de um registro, que é meramente processual, a notícia estaria se aproximando de uma forma mais narrativa. Nesse sentido, quanto mais narrativa, ou seja, mais próxima da maneira de contar (es-)histórias que conhecemos, mais compreensível aos leitores.

De acordo com a proposta de Motta (1997) de aplicação dos estudos narrativos na análise jornalística, enxergar o jornalismo como narrativa é útil para entender a constituição dos chamados fait divers. Por outro lado, em outra argumentação, Albuquerque (2000a) propõe a ampliação desse espectro de consideração e afirma que pensar o caráter narrativo é relevante tanto para as fait divers quanto as hard news, e que essa proposta visa pensar a cultura profissional jornalística. Isso porque, de acordo com o autor, as hard news são notícias que precisam muito mais de explicações do que as notícias enquadradas como fait divers. No entanto, a própria consideração da existência dessa dicotomia nos é problemática, embora recorrente.

Bird e Dardenne trabalham com as noções de “registro” e “narrativa”, já Motta (1997, p.318) apresenta a dicotomia em termos de “hard news” e “soft news”, em que nesta última “a narrativa se revela com toda a sua liberdade de criação.” Albuquerque (2000), por sua vez, apresenta uma proposta que nos permite enxergar um entrelaçamento entre essas duas noções, quando fala em “hard news com tratamento narrativo”, sendo esse tratamento narrativo uma tentativa de dar às notícias um formato mais relacionado a contar (es-)histórias.

Entretanto, em todos esses exemplos ainda há o reconhecimento de uma dualidade. Isso, diante do que é argumentado, insiste em uma oposição que tende a não

contemplar as particularidades da narrativa jornalística e as suas transformações, principalmente no que diz respeito à cobertura política. A partir dessas inquietações, apoiamo-nos nas considerações feitas por esses autores, mas também tentando sinalizar uma nova leitura a respeito das análises das narrativas jornalísticas, mais alinhada com a dissolução dessas fronteiras. Por ora, utilizamos a ideia mais geral e abrangente possível, de que as notícias servem para descortinar questões políticas e culturais de uma época, levando em consideração que elas podem levantar hipóteses acerca do mundo político (SCHUDSON, 1982).

Deixamos de lado, assim, ao menos temporariamente, o que parece ser um dos grandes terrenos de disputa das narrativas jornalísticas, que é o seu discurso que se pauta pela pretensão de verdade, afeito à apresentação de fatos verificados, em uma demonstração de sua herança com certos pressupostos positivistas (RESENDE, 2004). Retomaremos essa questão adiante, quando tratarmos especificamente das narrativas reconhecidas como escândalos políticos, assim como da construção de um ideal jornalístico comprometido com a defesa democrática.

Neste momento, o primeiro ponto que propomos pensar é: o que distingue uma narrativa jornalística de uma narrativa não jornalística? Frus (1994), em sua investigação sobre o que delimita a ficção da não-ficção, chega a uma conclusão interessante: essa fronteira não é estética, é cultural. O que faz com que identifiquemos um texto como ficcional ou não estaria, assim, mais ligado a uma construção cultural do que a aspectos estéticos e discursivos impressos no texto. Isso explicaria, por exemplo, a confusão causada em um leitor que se depara com uma narrativa jornalística que é construída com elementos literários, ou uma narrativa que se propõe literária, e que se utiliza dos artifícios da construção da notícia para se constituir. Algo parece ter sido colocado fora da ordem.