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1. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA E REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

1.3 VISUALIZAÇÃO EM GEOMETRIA: PESQUISAS E CONCEITOS

1.3.4 Aproximações entre as concepções de Duval e Gutiérrez

Para Duval (2015), é necessário que haja um “treinamento” para desenvolver o raciocínio para a visualização em Geometria. Do mesmo modo, Gutiérrez (1996a) diz que é necessário adquirir e desenvolver as habilidades para realizar os processos necessários para a visualização geométrica.

Pode-se notar que, de acordo com Duval (2105), a visualização centra-se em três operações cognitivas sobre as figuras geométricas, sendo essas operações relacionadas a registros semióticos distintos (discursivos e não-discursivos (figural ou gráficos)). A visualização geométrica na perspectiva desse autor envolve a coordenação entre as funções heurísticas, de suporte e discursiva, sendo executados tratamentos dentro dos registros na aplicação de cada função, que culminam (com a coordenação das funções) na conversão entre registro de representação semióticos, proporcionando assim a compreensão do conteúdo estudo.

Embora não utilize diretamente o termo ‘atividade cognitiva’, Gutiérrez (1996a) entende a visualização como uma atividade do raciocínio capaz de integrar as imagens mentais, as

representações externas, as duas ações de interpretação de informações e as habilidades para a visualização, o que na prática implica em um processo cognitivo.

Gutiérrez (1996a), mesmo não se aprofundando tanto nas figuras geométricas como Duval (2015), faz uso, mesmo que indireto, de representações semióticas. Em alguns casos as imagens mentais podem ser representações semióticas, como, por exemplo, figuras geométricas (lembrando que nem toda imagem mental é uma representação semiótica, como dito nas seções 2.2.1 e 2.3.3). Do mesmo modo, pelo conceito de representações externas adotado por Gutiérrez (1996a), em alguns casos essas podem ser representações semióticas.

É importante salientar que a concepção de representação se apresenta em três situações distintas: a representação mental, representação computacional e representação semiótica, sendo que a diferença entre elas está centrada na função (Duval, 2012b). A representação mental caracteriza-se pela evocação dos objetos ausentes e incluem, além de imagens, crenças, concepções, ideias, noções, fantasias, etc. A representação computacional está associada à codificação da informação, tem a função de tratamento automático ou quase automático. E as representações semióticas, segundo (Duval, 2012b, p. 269) “são produções constituídas pelo emprego de signos15 pertencentes a um sistema de representações que tem inconvenientes próprios de significação e de funcionamento”, realizando assim uma função de objetivação, uma função de expressão e função de tratamento intencional.

A mobilização das habilidades para a visualização elencadas por Gutiérrez (1996a) compõem um processo cognitivo na visualização. Pode-se observar, pelo exposto nas seções anteriores que versam sobre as perspectivas desses autores sobre a visualização em Geometria, que essas habilidades compõe ou fazem parte da exploração heurística das figuras (sendo algumas delas tratamentos, no sentido de Duval (2012b), dentro do registro figural), como, por exemplo, a percepção figura-fundo tem relação com a desconstrução dimensional; a rotação mental tem relação com a reconfiguração de uma composição etc.

As ações de interpretação para formação de uma imagem e interpretação de informação a partir da figura que compõem a visualização segundo Gutiérrez (1996a) e que, de acordo com ele “são processos inversos” (GUTIÉRREZ, 1992, p 45) se assemelham à passagem entre as funções heurística e discursiva, elencadas por Duval (2015), e consistem em conversões, segundo Duval (2012b). Faz parte da interpretação visual criar a imagem a partir das informações, ou seja, das representações discursivas (processo de transição (conversão) do

15 “Um signo é um sinal mobilizado por alguém (sujeito) capaz de permitir-lhe identificar um sistema ou registro de representação semiótico”. (Henriques & Almouloud, 2016, p. 468).

discursivo para o figural). Enquanto o processo de interpretação de informação a partir da figura contempla “ver” as propriedades matemáticas que estão resumidas na figura (processo de transição da função heurística para a discursiva, ou seja, conversão do registro figural para a língua natural).

Pode-se considerar que a visualização, tanto no sentido de Duval, quanto de Gutiérrez, consiste em uma atividade de raciocínio que depende de uma elaboração cognitiva que reconheça as figuras e as relacione como os elementos visuais ou espaciais, sejam mentais ou físicos, que passam por representações semióticas (podendo ser registros em língua natural, registros figurais etc.). Pela ideia apresentada por Duval (1999) “a visualização é baseada na produção de uma representação semiótica” (Duval, 1999, p. 12), dessa forma, a visualização é realizada pela atividade de representação, precisando dela para que a visualização se concretize. Uma das principais diferenças entre as perspectivas dos dois autores estaria no fato de que, para Duval (2015), o reconhecimento das formas 1D e 2D são de suma importância para realizar a relação com a função matemática, o que possibilitaria o melhor desempenho na aprendizagem dos conceitos de Geometria e na necessidade de se compreender melhor o funcionamento dos registros de representação semióticos utilizados em Geometria, bem como os tratamentos internos a eles e a conversão entre pelo menos dois registros relacionados à um mesmo objeto geométrico.

Nesta pesquisa entende-se que as perspectivas de ambos autores se complementam e fornecem uma concepção de visualização geométrica mais densa. Por esse fato e por todo exposto nesta seção, optamos por adotar metodologicamente a visualização como uma atividade cognitiva intrinsecamente semiótica, na qual são articuladas imagens mentais, representações externas, ações de interpretação para a visualização e as habilidades para a visualização, de modo que proporcione a integração entre as funções heurística e discursiva. A Figura 11 ilustra esse entendimento:

Figura 11 – Concepção adotada de Visualização Geométrica Fonte: A autora, 2020.

Entende-se que as habilidades para visualização proporcionam tratamentos dentro do registro figural compondo a função heurística. As representações externas, por implicarem na utilização de imagens dadas e/ou produzidas na resolução escrita e na explicação oral, fazem parte das operações heurísticas, de suporte e discursiva. As imagens mentais, como parte cognitiva do raciocínio, também permeiam as três operações, e pode-se observar que as ações de interpretação envolvem conversões entre os registros figural e língua natural, importantes para a consolidação da ação de visualização.

Na busca por mais subsídios para este trabalho e para compreender o que vem sendo estudado sobre visualização em Geometria na última década, na seção 1.4 será apresentado um breve levantamento envolvendo pesquisas nacionais e internacionais sobre visualização em Geometria.

1.4 VISUALIZAÇÃO EM GEOMETRIA: UM LEVANTAMENTO DE PESQUISAS