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As Áreas verdes ou o Espaço mata identificados e sua porcentagem de

No documento Dissertação Rodrigo MN 2013 (páginas 106-114)

4. ESPAÇOS EDIFICADOS, PROFANOS E RITUAIS, EM TERREIROS DE

4.2. Análise dos espaços edificados, profanos e rituais, em terreiros de candomblé

4.2.6. As Áreas verdes ou o Espaço mata identificados e sua porcentagem de

Conforme o gráfico 6, as áreas verdes estão presentes nos terreiros, mesmo que de forma simplificada, como em jardins ou canteiros, ou apenas em árvores sagradas. Elas se constituem como espaços obrigatórios para os diversos ritos, mas pelos resultados obtidos podemos perceber adaptações às realidades das casas.

A amostragem permitiu observar 29 espaços indicados como pertencentes à classe que analisamos. Nele temos 25% das áreas dedicadas a jardins e canteiros de ervas com plantas sagradas. 18% referentes ao Iroko/Iroco (Ficus doliaria M.). 17,2%

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Identificamos diferentes formas de escrita para o termo Yamim Oxorongá, especificamente na obra utilizada. Contudo, preferimos manter a grafia informada na pesquisa do INRC por se tratarem de meios de auto-identificação dos informantes da pesquisa.

para o dendezeiro (Elaeis guineensis Jacq.). Respectivamente, 7,1% para o cultivo da aroeira (Schinus therenthifolius Radd.), acocô (Newbouldia laevis Seem.), bambu (Oxytenanthera abyssinica (A. Rich.) Munro) e Jamelão (Syzygium cumin). Encontramos ainda o valor de 3,8% para a jaqueira (Artocarpus integrifolia L. f.), a bananeira (Musa sapientum L.) e o cajá (Spondias lutea L.), respectivamente.

A relação entre as áreas verdes declaradas (29 no total) e a amostra de 32 casas poderia ser indicativa da diminuição desse espaço. Para tanto, a oferta de plantas em lojas especializadas pode ser a resposta para essa diminuição, pois a compra torna desnecessário o cultivo e pode indicar uma mudança na orientação dos terreiros, que preferem adquirir as espécies vegetais ao invés de conservá-las nos terreiros ou mesmo colhê-las em áreas de mata.

Reforçamos a constatação de que um vaso com uma ou duas plantas, por exemplo, é um espaço mata e isso pode ter passado desapercebido durante a coleta de dados da pesquisa na qual nos baseamos aqui. Assim, fica clara a indicação da presença de poucas áreas verdes, mas, ao mesmo tempo, elas têm se reduzido devido a questões de falta de espaço ou mesmo indisponibilidade do dirigente em cultivar certa quantidade de vegetais nos terreiros. Frente à oferta existente no mercado, essa diminuição pode indicar mudanças, do cultivo interno para a aquisição externa.

Os terreiros com um espaço mata declarado, seja ele um canteiro ou um jardim, são: Terreiro Ilê Asé Yatopé, Terreiro Ilê Nidê, Abassá do Ogum, Ilê Asé Obaluayê Azauany, Rumpaimi Hevioso Zoonocaum Mean, Ilê Asé Opô Afonjá e Ilê Asé Baba Nile Ké.

O Iroko/Iroco (Ficus doliaria M.) é um orixá fitomorfo presente em todas as nações do candomblé, sendo identificado como o Tempo ou Katendê em casas de raiz angolana; e, como Loko, na nação Jêje. Possui três simbolismos associados à sua imagem: o primeiro, o associa ao tempo climático, o segundo, ao fato de ter sido ele a árvore pela qual os demais orixás desceram à Terra pela primeira vez; e, por fim, à ancestralidade, pois a árvore seria uma ligação entre o Orúm o Aiyé. Ele se encontra cultivado nas seguintes casas: Terreiro Ilê Ogun Anaeji Igbele Ni Oman, Terreiro Ilê Omi Ojuarô, Terreiro Ilê Asé Oju Oba Ogo Odo, Ilê Obá Nilá, Terreiro Rwe Sinfá (Casa das Águas de Ifá) e no Ilê Ajagunã Ajagunã Asé Oyá Messan.

Como forma de identificar a presença do orixá na árvore, um ojá branco é amarrado em sua copa e as oferendas a ele realizadas são colocadas em suas raízes. Na

pesquisa do INRC foi possível fotografar o Iroko/Iroco existente no Terreiro Ilê Ogun Anaeji Igbele Ni Oman (observar a figura 14 abaixo) enfeitado com tais panos.

Cacciatore (1988) informa que, na África, o Iroko/Iroco é identificado na espécie Clorophora excelsa, mas no Brasil, pela indisponibilidade de tal árvore, passou a ser utilizada a Ficus doliaria M., fato confirmado por Tabuti et alii 2003, que informam a perpetuação da adoração da Clorophora excelsa em comunidades da Uganda ainda no século XXI.

O dendezeiro (Elaeis guineensis Jacq.), também chamado de Dendém, Avoira ou Palmeira de Azeite, está ligado ao culto de Ogum, sendo a árvore totêmica deste orixá. Do seu fruto é extraído o azeite de dendê utilizado na culinária dos terreiros e na preparação de alimentos para os orixás. O uso dessa planta remonta à escravidão, pois é entendido que essa espécie foi introduzida pelos africanos no Brasil, como forma de continuidade de sua cultura e tradições após a diáspora.

Figura 14. Iroko do Terreiro Ilê Ogun Anaeji Igbele Ni Oman enfeitado com Ojás. Fonte: Pereira et alii, 2012.

Gráfico 6. Áreas e Espaços Verdes identificados e seu percentual de ocorrência.

Fonte: Pereira et alii, 2012

Área Verde declarada (Jardins e Canteiro de Ervas e Plantas Sagradas)

Iroko Dendezeiro Acocô Aroeira Bambuzal Jamelão Bananeira Cajá Jaqueira

7 6 5 2 2 2 2 1 1 1 25,0% 18,0% 17,2% 7,1% 7,1% 7,1% 7,1% 3,8% 3,8% 3,8%

Áreas e Espaços Verdes identificados e sua porcentagem de ocorrência

Nº de áreas

Pélissier (1997), ao descrever as campanhas empreendidas por Portugal para o domínio de Angola e do Congo no século XIX, indica a existência do comércio do óleo de palma, outro nome para o azeite de dendê, entre várias regiões do Império Português. Ao mesmo tempo, o autor indica que o produto poderia, potencialmente, vir a se configurar como gênero de exportação africana nos domínios lusitanos.

Existe um amplo espectro de uso do dendê. O primeiro se relaciona à confecção do mariwó, as folhas desfiadas da árvore que indicam cômodos sagrados nos terreiros de candomblé e são utilizadas na confecção das roupas de Ogum e Ossaim. Um segundo uso está na produção de fitas, a partir da fibra verde das folhas, para a proteção contra éguns em ritos mortuários (PEREIRA, 2013).

Da palha seca da folha é produzida a palha da Costa, ou ikó, fibras que vestem e protegem Omolu, caracterizando um terceiro tipo de utilização do dendê. Também desta parte são produzidos os instrumentos de Nanã e Omolu, respectivamente o Ibiri e o Xaxará, o que denota a quarta forma de uso. Das amêndoas do dendezeiro processadas temos o quinto uso: a extração de um óleo, o adí, utilizado em ritos de Oxalá por ser translúcido.

Ainda do dendezeiro se extraí um tipo de vinho, chamado de emu ou vinho de palma, apresentando o sexto uso da árvore. Por fim, Cacciatori (1988) indica um sétimo uso da planta: os frutos secos da espécie Elaeis guineensis Jacq. var. Idolatrica são utilizadas na confecção de um ifá, constituído de cinco ou seis sementes.

A partir de tal espectro amplo de uso podemos entender porque a existência do dendezeiro se apresenta tão relevante para os terreiros: as possibilidades de uso são inúmeras. Contudo, apenas quatro casas apresentaram essa árvore, um fato que pode ser indicativo de que os produtos acima mencionados, vindos do processamento do dendezeiro, estejam sendo adquiridos no mercado, ao invés de serem produzidos no terreiro. A figura 15 apresenta o dendezeiro ainda existente no local onde havia o Terreiro da Gomeia, Duque de Caxias (RJ).

O dendezeiro (Elaeis guineensis Jacq.) foi identificado nos seguintes terreiros: Terreiro Ilê Omi Ojuarô, Terreiro Rwe Sinfá(Casa das Águas de Ifá), Ilê Ti Oxum Omi Ia Ilá Oba Ti Odou Ti Ogum Alé, Ilê Ajagunã Ajagunã Asé Oyá Messan e no Terreiro Ilê Ogun Anaeji Igbele Ni Oman.

A aroeira (Schinus therenthifolius Radd.) é relacionada ao culto de Ogum, mas também é utilizada nos ritos para Exu, em especial em sacudimentos. Ela possui grande importância na "nação" Kêtu, sendo utilizada nas obrigações de cabeça, nos banhos de

descarrego e nas purificações de pedras (otás) para uso em assentamentos. Apesar de tão importante, na amostra analisada ela está presente em apenas duas casas e pode expressar o gosto pessoal do dirigente pela árvore. Ela foi identificada no Terreiro Ilê Asé Oju Oba Ogo Odo e no Ilê Ajagunã Ajagunã Asé Oyá Messan.

Figura 15. Dendezeiro presente no espaço do extinto Terreiro da Gomeia. Fonte: Pereira et alii, 2012.

O acocô (Newbouldia laevis Seem.), denominado de Arrorô na "nação" Efón, está relacionado ao culto de Ossaim, Xangô e Ogum. Sua utilização é feita em ritos de iniciação, em banhos e como defumadora de terreiros. Tal como a aroeira, sua presença é pouco expressiva na amostra, compondo o espaço mata de apenas dois terreiros: o Ilê Asé Omo Karê e no Ilê Ti Oxum Omi Ia Ilá Oba Ti Odou Ti Ogum Alé.

A jaqueira (Artocarpus integrifolia L. f.), também chamada de Apaocá, é tida como outro orixá fitomorfo, pois é a mãe de Oxossi em alguns mitos. Seu uso está relacionado aos cultos de Exu e Xangô, sendo interdito o seu consumo para os filhos do orixá dos raios. A sua frequência é muito pequena nas casas analisadas, apenas uma no Terreiro Ilê Asé Oju Oba Ogo Odo, o que novamente pode indicar um gosto pessoal do dirigente em cultivar tal planta e não uma obrigatoriedade do candomblé.

O bambu (Oxytenanthera abyssinica (A. Rich.) Munro) é consagrado ao culto aos éguns na Bahia, ao mesmo tempo em que sua variedade Villata, o bambu amarelo, é considerada a morada de Oyá/Iansã e do Caboclo Flecheiro Gentil de Aruanda. As folhas desta planta são utilizadas em banhos e nos defumadores, pois têm poder de afastar os espíritos obsessores (CACCIATORI, 1988). Tal planta foi identificada no Ilê Ajagunã Ajagunã Asé Oyá Messan e no Terreiro Ilê Ogun Anaeji Igbele Ni Oman. A bananeira (Musa sapientum L.) se relaciona ao culto de Exu, mas também na preparação e acondicionamento de determinados alimentos rituais: o abará, o abalá, abadô, o acaçá e o ekuru (VERGER, 1995b). A bananeira está presente no Ilê Ajagunã Ajagunã Asé Oyá Messan.

O cajá (Spondias lutea L.) está relacionado a Ogum, sendo utilizado em àgbo ìgbèrè (banhos de iniciação) dos filhos do orixá da metalurgia (BENISTE, 1999). Também é considerada como árvore onde essa deidade pode morar. Na "nação" Jêje recebe o nome de akikon’tin, sendo morada de alguns voduns, como o Gun, Fá e Bessén. Apenas o Ilê Ajagunã Ajagunã Asé Oyá Messan apresentou essa planta descrita em seu terreiro. Já o jamelão (Syzygium cumin) é uma planta ligada a Omolu e seus ritos, mas tem valor fitoterápico para à circulação sanguínea, sendo indicado o chá da folha para tal fim. Esta espécie vegetal foi identificada no Ilê Ajagunã Ajagunã Asé Oyá Messan.

Uma relação foi percebida durante a tabulação dos dados, entre a menção ao espaço mata e a "nação" que o cultiva de forma declarada. Ao observamos o gráfico 7 podemos perceber, para as áreas identificadas, que a "nação" Kêtu possui exemplares de todas as espécies e locais identificados. Vê-se o Iroko/Iroco (Ficus doliaria M.) com 5 exemplares, 5 áreas verdes declaradas, 3 dendezeiros (Ealis guineensis Jacq.), 2 aroeiras (Schinus therenthifolius Radd.), 1 acocô (Newbouldia laevis Seem.), 1 bambuzal (Oxytenanthera abyssinica (A. Rich.) Munro), 1 jaqueira (Artocarpus integrifolia L. f.), 1 pé de jamelão (Syzygium cumin), 1 bananeira (Musa sapientum L.) e 1 cajazeiro (Spondias lutea L.).

As outras relações percebidas são: 2 áreas verdes estão em terreiros da "nação" Angola e Jêje-Mahin, respectivamente; 1 acocô (Newbouldia laevis Seem.) na nação Ijexá; 1 bambuzal (Oxytenanthera abyssinica (A. Rich.) Munro) na "nação" Efón; 2 dendezeiros (Elaeis guineensis Jacq.) em terreiros Efón e Ijexá, respectivamente, e 1 Iroko/Iroco (Ficus doliaria M.) na "nação" Efón.

Gráfico 7. Áreas verdes identificadas em relação à nação do terreiro.

Fonte: Pereira et alii, 2012.

Área Verde declarada (Jardins e Canteiro de Ervas e Plantas Sagradas)

Iroko Dendezeiro Aroeira Acocô Bambuzal Bananeira Cajá Jamelão Jaqueira

5 5 3 2 1 1 1 1 1 1 1 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1 1 0 0 1 0 0 0 0 0 0 1 0 1 0 0 0 0 0

Áreas verdes identificadas em relação à nação do terreiro

nação Kêtu nação Angola nação Jêje nação Jêje-Mahin nação Efón nação Ijexá

O que fica claro é a maior quantidade de áreas verdes declaradas em terreiros da "nação" Kêtu, o que pode ser relacionado à importância que as plantas têm para essa nação (Verger, 1995b). Se refletirmos que houve uma efetiva criação de um "Mito de pureza nagô" (BASTIDE, 2001), sendo ele identificável e instrumentalizado pelos dirigentes, é possível pensar que, para além do uso ritualístico e fitoterápico, as casas Nagôs primam pelo destaque a essas áreas como forma de acessar esse capital cultural ligado às plantas e difundido pelos estudos do antropólogo Pierre Verger e Roger Bastide.

De forma conclusiva, para os valores encontrados podemos afirmar que: 1) há uma escolha intencional por determinadas plantas, tendo em vista seu alto percentual de ocorrência e 2) o espaço necessário para a implantação de um extenso conjunto de plantas pode não existir, o que leva os/as dirigentes a adotarem o cultivo de árvores específicas apenas. Atrelado a isso, há o fato de que a colheita de plantas pode ser feita fora do terreiro, bem como sua aquisição pode ser feita no comércio, em locais de venda como o Mercadão de Madureira.

No documento Dissertação Rodrigo MN 2013 (páginas 106-114)