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4 OS INSTITUTOS DE CONTRATUALIZAÇÃO DO PROCESSO

4.1 O PROCEDIMENTO DE MISE EN ÉTAT

4.1.6 As decisões da instrução e os recursos cabíveis

Genericamente consideradas, as decisões preparatórias com a finalidade de formar a instrução – seja para determinar uma medida preparatória, seja por se tratar de uma decisão de questão provisória – não podem sofrer recurso, salvo nas hipóteses expressas de lei340.

O artigo 773 do código francês de processo civil341 prevê um princípio de que as decisões tomadas pelo juiz de mise en état serão objeto de simples menção ou registro nos autos, devendo ser notificados os advogados destas decisões. Ou seja: em princípio, as medidas tomadas pelo juiz de mise en état não são motivadas porque elas são objeto de um simples despacho nos cadernos processuais (dossier), sendo os advogados notificados, sem sanções impostas342. A regra, portanto, é de irrecorribilidade destas decisões – e, tratando-se de uma regra, há decisões das quais caberão recursos, como se verá a seguir.

As decisões do magistrado encarregado da instrução são preparatórias ao julgamento do mérito e, exatamente por isso, em regra não fazem coisa julgada – tema tratado no item precedente, quando ficou explicitado que a coisa julgada refere-se apenas a incidentes processuais e incidentes que põem fim à instância. Sendo assim, não podem ser passíveis de recurso, senão após prolatada a decisão final de mérito.

Isso não afasta o fato de que o juiz de instrução, no cumprimento de sua missão preparatória, em decisão fundamentada, julgue os incidentes processuais a ela referentes. Ou seja: em que pese nem todas as suas decisões sejam acobertadas pelo manto da coisa julgada, é certo que, em regra, elas não estarão disponíveis aos recursos das partes. Essa compreensão

339

A regra encontra-se prevista no artigo 771, 1o, do código de processo civil francês, já analisado no item oportuno.

340

A previsão encontra-se no art. 545 do código de processo, cuja previsão expressa dá-se nos seguintes termos: “Les autres jugements ne peuvent être frappés d’appel indépendamment des jugements sur le fond, que dans les cas spécifiés par la loi”. “Os outros julgamentos não poderão ser objeto de recurso, independentemente das sentenças de mérito, senão nos casos previstos em lei” (tradução livre da autora).

341

A redação do artigo, em tradução livre da autora segue transcrita: Art. 773. As medidas tomadas pelo juiz de instrução são objeto de simples menção no processo, devendo ser notificados os advogados.

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implica concluir que, nem por um motivo, nem por outro, o magistrado não se furtará a proferir a sua decisão, quando necessário.

Por isso, foi criado um regime derrogatório343 para as decisões do magistrado de

mise en état, mas apenas para aquelas que encontram-se passíveis de fazer coisa julgada. O

decreto de 28 de dezembro de 2005 conferiu às decisões que versam sobre exceções procedimentais ou incidentes processuais a autoridade de coisa julgada. Ao assim proceder, foi necessário, igualmente, modificar as modalidades de recursos possíveis contra estas decisões. A reforma tinha que guardar coerência e, assim, ao conferir os efeitos da coisa julgada, permitiu, na outra mão, a apresentação de recurso de pela parte.

A previsão adveio com a reforma do artigo 776 do código344. Inicialmente, não era admitido qualquer recurso imediatamente – como já referenciado, o recurso seria manejado quando apresentado contra a decisão de mérito. Este conceito permite concluir que, em verdade, a previsão não é de ausência de recurso, e sim de recorribilidade mediata. Conclusão disso é que, em regra, as decisões do magistrado de instrução não podem sofrer recurso de apelação ou de cassação, senão após o julgamento do mérito. Assim, para poder valer-se da via recursal para impugnar as decisões proferidas durante a instrução, a parte deve aguardar a decisão de mérito.

Isso implica que não são passíveis de oposição, contradição e serão afrontadas por recurso apenas ao final345.

Destarte, de acordo com este dispositivo, as decisões, em regra, são irrecorríveis de imediato. Assim, o recurso será possível imediatamente, de forma excepcional, nas hipóteses previstas em lei, assim como naquelas elencadas no próprio dispositivo mencionado.

343

O termo é citado em DOUCHY-OUDOT, Mélina. La scission des phases de l'instance: la mise en état. Ob. Cit. p. 242.

344

A redação original do artigo citado indiretamente é a seguinte: “Art. 776. Les ordonnances du juge de la mise en état ne sont pas susceptibles d'opposition.

Elles ne peuvent être frappées d'appel ou de pourvoi en cassation qu'avec le jugement statuant sur le fond. Toutefois, elles sont susceptibles d'appel dans les cas et conditions prévus en matière d'expertise ou de sursis à statuer.

Elles le sont également, dans les quinze jours à compter de leur signification, lorsque :

1° Elles statuent sur un incident mettant fin à l'instance, elles ont pour effet de mettre fin à celle-ci ou elles en constatent l'extinction ;

2° Elles statuent sur une exception de procédure ;

3° Elles ont trait aux mesures provisoires ordonnées en matière de divorce ou de séparation de corps ;

4° Dans le cas où le montant de la demande est supérieur au taux de compétence en dernier ressort, elles ont trait aux provisions qui peuvent être accordées au créancier au cas où l'existence de l'obligation n'est pas sérieusement contestable. ”

345

A primeira hipótese consiste na decisão sobre incidente que põe fim à instância, seja porque o seu efeito é de finalizar a instância, seja porque apenas declaram a extinção desta. Em segundo plano, podem decidir uma exceção processual. A terceira espécie de decisão refere-se às medidas provisórias deferidas em matéria de divórcio ou separação de corpos. Por fim, decisões que versam sobre a fixação de provisionamento pelo credor, quando a demanda supera a taxa de competência, em casos em que a existência da obrigação não é seriamente contestada346.

Em resumo, imediatamente, caberá recurso nas seguintes hipóteses: i) das decisões que solucionam um incidente pondo fim à instância, a exemplo da decisão que reconhece a perempção, e daquelas que têm por efeito por fim à instância, a exemplo do que ocorre com a morte de uma parte em ações instransmissíveis, ou as decisões que constatam a extinção da instância, como a constatação da conciliação entre as partes; ii) das decisões que se relacionam sobre exceções de procedimento; iii) das decisões que se relacionam com as medidas provisórias em matérias de divórcio ou separação de corpos; iv) por fim, das decisões que acordam a um credor uma provisão sobre uma obrigação não seriamente contestável, num montante superior à taxa da competência347.

O recurso, nesses casos, deverá ser manejado nos quinze dias que sucedem a notificação das partes.

O recurso não se iniciou em texto tão amplo. A previsão inicial, contida no decreto de 28 de dezembro de 1998 exemplificava as hipóteses em que o recurso seria admitido, abarcando tão-somente três situações: exceções de incompetência, litispendência ou conexão.

Há, ainda, que se considerar, conforme exposto no item anterior, que a decisão de inadmissibilidade do recurso do conselheiro de mise en état está passível de produzir coisa julgada – mas especificamente quando a decisão não conhece do recurso. Sendo assim, esta decisão poderá ser objeto de recurso imediato348.