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Tenciona-se, neste capítulo, apresentar questões pertinentes às vivências sociais, históricas e culturais das 22 localidades investigadas nesta tese. Tem-se como objetivo aclarar esses aspectos com vistas à interpretação dos resultados encontrados, uma vez que a análise que se busca desenvolver, aqui, parte da premissa de que a relação entre língua, cultura e sociedade é intrínseca.

Assim, de modo a melhor circunstanciar a situação das áreas investigadas, parte-se das propostas de delimitação de espaços no Estado da Bahia, situando as localidades da rede de pontos do Projeto ALiB, na área baiana. Levam-se em consideração, ainda, aspectos que nortearam a escolha de tais cidades pelo Projeto, no intuito de uma melhor compreensão da realidade dialetal do Estado e da situação dessas cidades, vistas particularmente e também em conjunto.

3.1 DIVISÃO TERRITORIAL DO ESTADO DA BAHIA E A REDE DE PONTOS DO ALiB Como se disse na Introdução desta tese, o Estado da Bahia é o quinto em extensão no país. Ao longo de seu território, situam-se 417 municípios21. Assim sendo, geri-lo é tarefa que

requer políticas públicas que agreguem cada um dos cantos de tal território e contemple toda a diversidade social e cultural decorrentes de seu histórico.

Essas políticas se desenvolvem desde a década de 1930 e são responsáveis pelo seu destaque nacional, no que tange ao planejamento.

Apresentam-se, aqui, de modo breve, algumas dessas propostas de divisão territorial, a fim de melhor avaliar a situação das cidades contempladas pela rede de pontos do ALiB, no contexto baiano. Interessa situá-las de modo coerente, para que se façam análises mais precisas acerca de sua realidade dialetal.

No âmbito estadual, destacam-se, inicialmente, tentativas de organização do território entre os anos de 1955 a 1959, durante o governo de Antônio Balbino. Tais iniciativas se referem ao período de secas pelo qual o Estado passava, à crise econômica e às grandes levas de migrantes idos para a Região Sudeste do país. É de 1966, porém, a primeira regionalização do Estado.

Naquele momento, foram estabelecidas, pelo então governador Lomanto Júnior, 21 Regiões Administrativas22 para a Bahia. Essa proposta foi ineficaz, todavia, uma vez que não

21 Informações disponibilizadas pelo IBGE, segundo estimativas para o ano de 2017.

22 As sedes dessas Regiões Administrativas eram: Salvador, Feira de Santana, Ilhéus, Itabuna, Vitória da Conquista, Jequié, Alagoinhas, Juazeiro, Valença, Serrinha, Brumado, Senhor do Bonfim, Xique-Xique, Itaberaba,

havia integração entre as sedes e os municípios, bem como entre as regiões. Ademais, não eram claros os parâmetros metodológicos tomados para tal delimitação e não se explicitava qual a funcionalidade de tal proposta: “Prova de tal ineficiência é que já no ano de 1968 a CPE dividiu o estado da Bahia em 16 micro-regiões programas [...]”. (SOUZA, 2008, p.69).

Data de 1973, do primeiro governo de Antônio Carlos Magalhães, uma nova proposta de divisão territorial do Estado da Bahia. Para tanto, tomou-se por base um estudo de Milton Santos, de 1958, que, dentre outras questões, propunha a necessidade de uma regionalização que considerasse os fluxos e correlações da área baiana com outros Estados em razão da malha rodoviária local, que se expandia, bem como alterações sofridas na zona de influência exercida pela Bahia, no panorama comercial.

Novos estudos foram realizados e, com base em parâmetros naturais (relevo e hidrografia), na posição das cidades quanto a outros Estados e demais cidades da Bahia, dentre outros, foram indicadas 17 Regiões Administrativas. Foram determinados 17 centros23 e 25 subcentros24 regionais na Bahia. Além dessas, foram estabelecidas nove capitais regionais25, correlacionadas à organização econômica.

Os problemas dessa proposta dizem respeito ao fato de ela se voltar quase que exclusivamente à administração e pouco ter repercussões em questões sociais. Tampouco eram consideradas questões pertinentes às desigualdades regionais ou às particularidades socioculturais das áreas em questão.

Durante a década de 1990, houve uma revisão dessa última tentativa. Optou-se, entretanto, por se considerar Regiões Econômicas. Levavam-se em conta questões naturais e a localização das cidades. Determinaram-se 15 regiões26, cuja funcionalidade se voltava ao

mercado, à exploração do capital e, principalmente, à iniciativa privada. No Plano Plurianual (PPA) do Estado da Bahia, referente aos anos 2000 a 2003, substituíram-se tais regiões por Eixos Estaduais de Desenvolvimento. Visava-se à necessidade de articulação do Estado com o

Santo Antônio de Jesus, Santa Maria da Vitória, Barreiras, Caetité, Medeiros Neto, Seabra e Ribeira do Pombal (SOUZA, 2008, p.69).

23 Barreiras, Santa Maria da Vitória, Irecê, Caetité, Juazeiro, Jacobina, Itaberaba, Vitória da Conquista, Paulo Afonso, Serrinha, Feira de Santana, Jequié, Itapetinga, Alagoinhas, Salvador, Itabuna/Ilhéus e Itamaraju. 24 Bom Jesus da Lapa; Barra e Xique-Xique; Guanambi e Caculé; Senhor do Bonfim e Remanso; Miguel Calmon; Ibotirama e Seabra; Brumado, Poções e Cândido Sales; Jeremoabo; Euclides da Cunha; Ipiaú e Jaguaquara; Esplanada e Cícero Dantas; Valença e Santo Antônio de Jesus; Canavieiras e Camacan; Medeiros Neto e Itanhém. 25 Vitória da Conquista, Itaberaba, Feira de Santana, Barreiras, Juazeiro, Jacobina, Alagoinhas, Salvador,

Itabuna/Ilhéus.

26 Região Metropolitana de Salvador, Litoral Norte, Recôncavo Sul, Litoral Sul, Extremo Sul, Nordeste, Paraguaçu, Sudoeste, Baixo Médio São Francisco, Piemonte da Diamantina, Irecê, Chapada Diamantina, Serra Geral, Médio São Francisco e Oeste.

mundo, em consideração à economia global. Delimitaram-se nove eixos que, mais uma vez, não atendiam às demandas locais, no sentido de sociedade e cultura.

Assim sendo, entende-se que nenhuma das propostas apresentadas até então sejam relevantes para se situar as localidades baianas, agregadamente, tendo em mente estudos acerca da língua falada e, por conseguinte, de aspectos que envolvem as suas organizações sociais, suas histórias e suas culturas.

Para os anos entre 2008 e 2011, o PPA baiano propunha uma divisão territorial em Territórios de Identidade. Essa proposta é válida até a atualidade. De acordo com Secretaria do Planejamento do Estado da Bahia (SEPLAN), os territórios de identidade surgem com vistas à delimitação de prioridades por parte do governo, com base nas realidades locais, de modo a que se possibilite o desenvolvimento sustentável entre as regiões estaduais. Define-se, então, Território de Identidade como:

[...] um espaço físico, geograficamente definido, geralmente contínuo, caracterizado por critérios multidimensionais, tais como o ambiente, a economia, a sociedade, a cultura, a política e as instituições, e uma população com grupos sociais relativamente distintos, que se relacionam interna e externamente por meio de processos específicos, onde se pode distinguir um ou mais elementos que indicam identidade, coesão sociais, cultural e territorial. (SEPLAN, 2018, p.1).

Essa visão é reiterada pelo Decreto 12 354/2010, que institui os Territórios de Identidade do Estado da Bahia:

Considera-se Território de Identidade o agrupamento identitário municipal formado de acordo com os critérios sociais, culturais, econômicos e geográfico, e reconhecido pela sua população como espaço historicamente construído ao qual pertence, com identidade que amplia as possibilidades de coesão social e territorial. (BAHIA, 2010, p.1).

Diante disso, observa-se que se trata de uma proposta pautada em questões humanísticas e que priorizam aspectos como as diferentes identidades apresentadas pelos indivíduos dessas comunidades, aferidas a partir de sua sensação de pertencimento27. Essas questões foram avaliadas em 17 reuniões plenárias, realizadas entre maio e junho de 2007, no interior do Estado (FLORES, 2014, p.24).

Dessa maneira, vê-se que, para além dos interesses administrativos e econômicos, a proposta de divisão do Estado da Bahia em Territórios de Identidade considera aspectos sociais, partindo de visões das próprias comunidades envolvidas. Isso posto, julga-se que seja uma proposta relevante para que se tome como norte, no sentido de analisar aspectos linguísticos e culturais das comunidades aqui observadas, em grupo.

27 De acordo com Flores (2014, p.23) as consultas públicas já se desenvolviam desde o PPA anterior (2004-2007). Porém, naquele primeiro momento, as reuniões foram efetuadas apenas em Salvador e as pessoas foram convidadas pelas secretarias governamentais envolvidas, sendo técnicos e servidores com interesses na situação.

Foram definidos 27 Territórios de Identidade para o Estado da Bahia28. Adiante, em

quadro explicativo, apresentar-se-ão as localidades constituintes da rede de pontos do Projeto ALiB no Estado da Bahia e os Territórios de Identidade a que pertencem.

Em nível nacional, destaca-se, aqui, a proposta do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). No ano de 1990, o IBGE propõe a divisão das Unidades Federativas em mesorregiões e microrregiões. O órgão considera, além dos limites político-administrativos os desenvolvimentos locais e regionais no contexto do capitalismo. Definem-se, assim, meso e microrregiões:

Entende-se por mesorregião uma área individualizada em uma unidade da Federação que apresenta formas de organização do espaço geográfico definidas pelas seguintes dimensões: o processo social como determinante, o quadro natural como condicionante e a rede de comunicação e de lugares como elemento de articulação espacial. Estas três dimensões possibilitam que o espaço delimitado como mesorregião tenha uma identidade regional. Esta identidade é uma realidade construída ao longo do tempo pela sociedade que aí se formou.

[...]

As microrregiões foram definidas como partes das mesorregiões que apresentam especificidades quanto à organização do espaço. Essas especificidades não significam uniformidade de atributos nem conferem às microrregiões auto-suficiência e tampouco o caráter de serem unicas devido a sua (sic) articulação a espaços maiores quer à mesorregião à Unidade da Federação quer à totalidade nacional. (IBGE, 1990, p.8).

Dessa forma, observa-se que essa é uma possibilidade que também abarca aspectos humanos, sociais e identitários. Por essa razão e por se considerar que essa é uma proposta difundida em eixo nacional e já solidificada, também se levará a mesma em conta, no que tange à análise das particularidades locais.

No Quadro 6, adiante, apresentam-se as localidades investigadas nesta tese, os Territórios de Identidade a que pertencem, bem como suas mesorregiões e microrregiões.

28 São eles: Irecê, Velho Chico, Chapada Diamantina, Sisal, Litoral Sul, Baixo Sul, Extremo Sul, Médio Sudoeste da Bahia, Vale do Jiquiriçá, Sertão do São Francisco, Bacia do Rio Grande, Bacia do Paramirim, Sertão Produtivo, Piemonte do Paraguaçu, Bacia do Jacuípe, Piemonte da Diamantina, Semiárido do Nordeste II, Litoral Norte e Agreste Baiano, Portal do Sertão, Sudoeste Baiano, Recôncavo, Médio Rio de Contas, Bacia do Rio Corrente, Itaparica, Piemonte Norte do Itapicuru, Metropolitano de Salvador e Costa do Descobrimento.

LOCALIDADES

IDENTIFICAÇÃO