• Nenhum resultado encontrado

SOCIOLINGUÍSTICA

9.1 O QFF, OS VOCÁBULOS CONTROLADOS E A DITONGAÇÃO DIANTE DE <S>

9.3.1 Questões gerais e a análise dos itens do QFF

9.3.2 Variáveis extralinguísticas 333

9.3.3 Variáveis linguísticas 344

10 PROCEDIMENTOS ADOTADOS PARA A OBSERVAÇÃO

ACÚSTICA 348 10.1 A ORGANIZAÇÃO DO CORPUS 348 10.1.1 Os inquéritos do ALiB 350 10.1.2 O inquérito experimental 352 10.2 PROCEDIMENTOS DE ANÁLISE 353 11 OBSERVAÇÕES ACÚSTICAS 356 11.1 O INQUÉRITO EXPERIMENTAL 356 11.2 SALVADOR 360 11.3 CARAVELAS 367 11.4 EUCLIDES DA CUNHA 374 11.5 VITÓRIA DA CONQUISTA 381 11.6 BARRA 388 11.7 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES 394 12 CONSIDERAÇÕES FINAIS 394 REFERÊNCIAS 405 APÊNDICES 426

APÊNDICE A 427 APÊNDICE B 430 APÊNDICE C 444 APÊNDICE D 446 APÊNDICE E 452 ANEXOS 460 ANEXO A 461 ANEXO B 462

1 INTRODUÇÃO

O Estado da Bahia ocupa uma área de 564 733,177 Km², sendo a maior unidade federativa do Nordeste brasileiro e a quinta do Brasil. Sua população, segundo o último Censo, realizado em 2010, era composta de 14 016 906 indivíduos. Sua história, de modo geral, remonta ao ano de 1500, quando da chegada das primeiras esquadras portuguesas ao seu litoral sul e, à volta de 1530, com a instalação dos portugueses em Salvador e definição do primeiro governo geral brasileiro.

Diante de séculos de história, quilômetros de extensão – para onde a língua portuguesa foi transplantada em momentos diversos – e milhares de habitantes, dotados de vivências sociais e culturais múltiplas, é inegável a necessidade de compreender o quão diverso é o português falado em áreas baianas. E, mais ainda, é importante explorar as feições dessa diversidade. Esse trabalho é feito, desde a década de 1950, com os primeiros estudos da equipe de Dialetologia, da Universidade Federal da Bahia (UFBA), sob a liderança do Professor Nelson Rossi.

Esta tese, assim, vincula-se a tais necessidades e interessa-se por contribuir para a ampliação dos estudos sobre a realidade dialetal baiana. Parte, então, do pressuposto de que a língua se manifesta no uso concreto e é apreendida através da fala de seus usuários. É, portanto, heterogênea por essência, ainda que sistemática.

A diversidade, aqui, é tratada como fenômeno inerente a toda e qualquer língua natural. A variação no Português Brasileiro (PB) é, dessa maneira, compreendida como fruto das distintas escolhas efetivadas por indivíduos e grupos. A heterogeneidade linguística congrega tanto informações de cunho interno à estrutura linguística, como aquelas referentes aos contextos sociais, culturais e históricos em que estão inseridos os sujeitos da língua, seus falantes.

Este estudo, assim, busca apresentar informações no sentido de compreender o uso variável de ditongos diante de <S>, em áreas do Estado da Bahia, contempladas pelo Projeto Atlas Linguístico do Brasil (ALiB). Parte-se, então, da fala de indivíduos nativos de 22 cidades baianas. São elas, citadas, aqui, segundo os critérios estabelecidos para apresentação da rede de pontos do ALiB1: Juazeiro, Jeremoabo, Euclides da Cunha, Barra, Irecê, Jacobina, Barreiras, Alagoinhas, Seabra, Itaberaba, Santo Amaro, Santana, Salvador (capital do Estado), Valença, Jequié, Caetité, Carinhanha, Vitória da Conquista, Ilhéus, Itapetinga, Santa Cruz Cabrália e Caravelas.

1 A numeração das localidades da rede de pontos do ALiB foi feita adotando a distribuição espacial dos pontos de norte a sul e de leste a oeste (CARDOSO et al, 2014a). Assim, a rede de pontos do Estado da Bahia é numerada de 81 (Juazeiro) a 102 (Caravelas). Segue-se essa ordem de apresentação ao longo desta tese.

A ditongação diante de <S> é um fenômeno em variação no Português do Brasil, o qual é possível evidenciar em três exemplos, obtidos a partir da fala da informante de segunda faixa etária, de Salvador:

(i) INQ. – O que vem depois do nove? INF. – Depois deiz [»dEjs].

(ii) INQ. – Uma pessoa que canta bem, se diz que ela tem uma boa...? INF. – Bom cantô. É boa voiz [»vçjs].

(iii) INQ. – Se a pessoa não quer ser incomodada, a pessoa diz: “Me deixe em...”? INF. – Em paiz [»pajs].

Compreende-se, inicialmente, que esse tipo de ditongação é uma inovação da variedade brasileira, como atestam autores que trataram do fenômeno, e se presta a caracterizar áreas dialetais no Brasil, ainda não suficientemente delimitadas. Ademais, trata-se de um fenômeno que se manifesta na escrita de brasileiros, escolarizados ou não, e é responsável por gerar homofonias, como nos casos de mais (intensificador) e mas (conjunção adversativa, cuja vogal passa comumente por ditongação), pois (conjunção explicativa) e pôs (terceira pessoa singular, presente do indicativo do verbo por).

Buscou-se, com o desenvolvimento da pesquisa referente ao assunto, dar continuidade aos estudos acerca desse fenômeno, desenvolvidos pela autora, desde o período de Iniciação Científica (2008-2011) e melhores consolidados em sua dissertação de Mestrado (SILVA, 2014), quando apresentou dados acerca desse aspecto nas capitais brasileiras constituintes da rede de pontos do Projeto ALiB.

Diante dos resultados e hipóteses traçados naquele momento, visa-se, agora, a compreender quais as possíveis relações entre a distribuição diatópica da ditongação diante de <S> no Estado da Bahia com características acústico-articulatórias das vogais que se ditongam. Parte-se, portanto, do seguinte problema: quais as possíveis relações entre a distribuição diatópica desse tipo de ditongação em áreas do Estado da Bahia, com as características acústico- articulatórias das vogais encontradas nessas normas, bem como com as peculiaridades sociais dessas áreas?

Algumas questões foram postas, no sentido de buscar aclarar tal problema:

(i) de que modo o fenômeno se encontra distribuído entre as comunidades e quais delas seriam mais proeminentes no uso das variantes ditongadas?

(ii) De que maneira, as características acústicas das vogais diante de <S> interferem na ocorrência da ditongação? É possível estabelecer distinções entre as qualidades vocálicas em eixo diatópico?

(iii) Em que grau e de que forma aspectos suprassegmentais, como a tonicidade da sílaba em observação, incidem sob a ditongação das vogais?

(iv) De que forma se manifestam as possíveis interferências de ordem lexical na ocorrência da ditongação?

(v) De que modo as diferentes realizações fonéticas da consoante em coda silábica agem sobre a ditongação e, em que medida, esse aspecto pode ser considerado, do ponto de vista fonético-fonológico, para a compreensão do processo?

Tem-se como norte a ideia de que os sons se organizam nas sílabas em função de suas relações de força, as quais se ligam, diretamente, ao seu grau de sonoridade e abertura. Dessa forma, quanto mais longas e abertas as vogais, maiores as chances de ditongação diante de <S>. Em face das divergências acústico-articulatórias entre as vogais com tais características e as consoantes em coda, mais fechadas, transientes e fracas, a semivogal surgiria como uma compensação entre núcleo e coda silábica. Diante disso, ergue-se a necessidade da investigação acústica que ora se propõe.

Intentou-se, desse ponto de vista, agregar os saberes da Dialetologia, da Sociolinguística, da Fonética Acústica e da Fonologia, de modo a se obter tais respostas. Tencionou-se testar a hipótese estabelecida quanto à abertura das vogais. Áreas caracterizadas por vogais com essas características (mais longas e mais abertas) tenderiam a apresentar maiores índices de vogais ditongadas. Questões de ordem sócio-histórica e cultural, aspectos referentes aos contatos linguísticos pré-existentes, bem como a compreensão do panorama atual das cidades investigadas, permitirão que se averiguem possíveis motivações para tais aspectos linguísticos.

Definiram-se, assim, os seguintes objetivos:

(i) verificar, com base na metodologia variacionista, aspectos fonético-fonológicos, que interfiram na existência das realizações ditongadas, interpretando esses resultados a partir de pressupostos de teorias fonológicas.

(ii) Analisar parâmetros acústicos de vogais tônicas diante de <S>, estabelecendo correlações entre esses e aspectos articulatórios, bem como com o processo de ditongação diante de <S>.

(iii) Estabelecer possíveis zonas dialetais no Estado da Bahia, quanto ao fenômeno em estudo.

(iv) Identificar possíveis estratificações quanto ao sexo e à idade dos informantes, elementos sistematicamente controlados pelo Projeto ALiB.

Nos capítulos apresentados após esta Introdução, visa-se, assim, a se delinearem caminhos no sentido de cumprir as metas estabelecidas e ora apresentadas.

O primeiro deles, O português no domínio do Brasil: breve revisão sociohistórica, versa sobre as questões referentes à disseminação da língua portuguesa no Brasil. Enfatizam-se aspectos pertinentes aos contatos entre povos e línguas, ressaltando o contexto baiano. Não obstante, expõem-se dados acerca de línguas africanas majoritárias no período colonial, partindo da premissa de que foi por meio da ação de escravos e seus descendentes, mestiços ou não, que a língua portuguesa foi, paulatinamente, ocupando as áreas interioranas do país.

O Capítulo 3, intitulado As localidades investigadas: visão panorâmica, debruça-se, primeiramente, sobre a divisão territorial do Estado da Bahia e suas relações com a rede de pontos do Projeto ALiB no Estado. Depois, trata de elementos relativos à história social das 22 cidades cuja realidade linguística se investiga, destacando seu passado e seu presente, no sentido de melhor compreender os dados em análise.

Em seguida, em Bases teóricas para a investigação, explicitam-se os pressupostos teóricos que nortearam a pesquisa que se apresenta agora. Nele são expostos elementos da Dialetologia e da Sociolinguística Variacionista. Procura-se delimitar as disciplinas, trazendo dados sobre os seus históricos, objetivos e principais aspectos teórico-metodológicos. Objetiva- se, também, situar o estudo apresentado entre essas duas vertentes dos estudos sobre a diversidade linguística.

O quinto capítulo, Os sons da fala: alguns tópicos sobre o seu estudo, retoma itens relevantes para o estudo do panorama sonoro do português e, em específico, para a observação de vogais e ditongos sob a perspectiva da Fonética Acústica e da Fonologia.

Delimitam-se, desse modo, as áreas que sustentam a investigação proposta nesta tese. Em seguida, explicitam-se noções concernentes ao estudo do sinal acústico, compreendendo que a sua investigação possibilita a averiguação de elementos articulatórios e auditivos, bem como solidifica análises variacionistas. Além disso, abordam-se assuntos tratados por teorias fonológicas, que auxiliam na compreensão da natureza dos ditongos, dos processos de ditongação e da ditongação diante de <S>.

No Capítulo 6, A ditongação diante de <S> no PB: visões prévias, faz-se uma retrospectiva aos diferentes estudos que tratam do fenômeno.

Primeiramente, recorre-se aos testemunhos de filólogos, gramáticos e linguistas historicistas, que apontam a existência desse tipo de ditongação na variedade brasileira, sua inexistência no Português Europeu (PE) e fornecem indícios acerca dos seus primeiros registros na escrita e sua depreensão nas rimas de poetas oitocentistas. Faz-se uma visita às monografias

dialetais, importantes testemunhos acerca do português falado em áreas brasileiras, no começo do século XX, e, também, ao Atlas Prévio dos Falares Baianos (APFB) (ROSSI, 1963). Expõem-se, ainda, resultados encontrados por estudos sociolinguísticos e os aspectos mais relevantes acerca do trabalho com as capitais brasileiras, que originou esta tese.

O Capítulo 7, Aspectos metodológicos gerais, explora particularidades metodológicas comuns à análise de base variacionista e à observação de caráter acústico, que se apresentam. Assim, aborda aspectos atinentes ao corpus, apresentando o Projeto ALiB, os critérios para a escolha das localidades pesquisadas, os instrumentos de coleta, destacando aqueles que servirão de base ao estudo em desenvolvimento, e os informantes e suas características.

Posteriormente, em Procedimentos adotados para a análise sociolinguística, expõem- se informações sobre o levantamento dos dados coletados, as definições estabelecidas para a observação quantitativa e questões pertinentes ao programa utilizado para esse fim.

Expõem-se as Análises dialetológica e sociolinguística no nono capítulo, que apresenta, primeiramente, a distribuição espacial da ditongação diante de <S> na Bahia, com base nas realizações de seis vocábulos sistematicamente controlados através da aplicação do Questionário Fonético-Fonológico (QFF) do Projeto ALiB (COMITÊ NACIONAL DO PROJETO ALiB, 2001). Demonstra-se essa realidade em cartogramas.

Ademais, o capítulo aborda os valores obtidos através da ferramenta estatística, para os dados das 22 cidades baianas quanto à ditongação diante de <S>. Comenta-se a distribuição diatópica encontrada, as questões sociais aparentemente implicadas no processo e os condicionamentos linguísticos para a aplicação da regra. Ademais, estabelecem-se algumas interpretações preliminares, que serviram de norte para a observação acústica e demonstram a realidade baiana quanto ao fenômeno.

O décimo capítulo, Procedimentos adotados para a observação acústica, volta-se à exposição da metodologia empregada na observação acústica das vogais diante de <S>.

Registram-se, a esse respeito, informações acerca da manipulação dos áudios selecionados para a tarefa, bem como os critérios que validaram a escolha dos inquéritos, os quais se pautaram, sobretudo, nos resultados encontrados na análise de caráter variacionista. Expõem-se os vocábulos investigados e dados sobre o programa usado para tal análise. Além disso, pontuam-se aspectos referentes a inquéritos experimentais, realizados com informantes de Salvador, para que se tivessem informações obtidas em ambiente controlado acusticamente, e se pudessem tecer considerações com maior clareza.

O último capítulo, Observações acústicas, revela informações acerca dos valores pertinentes à duração e ao primeiro e segundo formantes vocálicos de vogais tônicas diante de

<S>. Comentam-se, outrossim, os resultados encontrados, com vistas as considerações finais, apresentadas no capítulo subsequente.

Por fim, segue-se às considerações finais, a lista das referências citadas. Expõem-se, ainda, os apêndices – que trazem informações acerca das entrevistas que constituem o corpus, das características sociais dos informantes e de outros aspectos metodológicos, como os instrumentos utilizados para os inquéritos experimentais – e os anexos.

2 SOBRE O PORTUGUÊS BRASILEIRO: BREVE REVISÃO SOCIOHISTÓRICA