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CAPÍTULO II FUNDAMENTOS TEÓRICOS: FACILIDADES E DIFICULDADES

2.3 AS PERMANÊNCIAS NAS DIVERSIDADES: MODELOS DE PRÁTICAS DE

da invenção da própria escrita – quando correlacionados aos estudos científicos propostos para o estudo das línguas humanas de caráter estrutural, desenvolvidos ao longo do século XX, mais especificamente até as décadas de 1960 a 1970, não se distanciam daqueles que foram cultivados ao longo do tempo de implantação da própria civilização da escrita. Segundo Bloomfield. (op.cit. p. 264; in: Harris, T.L. e Hodges R.E, 1983), a leitura implica apenas a “correlação de uma imagem sonora com a correspondente imagem visual”; razão pela qual se mantém, ainda no século XX, a velha concepção de que o saber ler é saber decifrar ou codificar-descoficar informações. Excluído o homem desse campo de investigações e com ele a própria história da leitura, essa perspectiva faz prevalecer o valor e o papel social da língua sistema, dissociado da função social das atividades da fala e, consequentemente, das funções exercidas pela leitura nas esferas sócio individuais do desenvolvimento humano. Assim, no campo do ensino-aprendizagem, as práticas de docência se mantinham dissociadas dos processos de compreensão e de interpretação dos textos propostos para a leitura, cabendo ao aprendente se limitar a pronunciar corretamente as palavras imprensas mesmo que não compreendessem seus significados e, consequentemente, fossem incapazes de atribuírem a elas sentidos postos ou pressupostos pelos referidos textos. Trata-se de uma posição ou postura didática em que as aquisições de significados a serem transmudados em sentidos, pelos produtores-leitores, não eram perspectivizados como meios para a formação geral das pessoas ou indivíduos.

A partir das décadas de 1960-1970, os modelos estruturalistas passam a ser questionados face à insuficiência de eles serem incapazes de darem conta das variadas e diferentes funções das atividades da fala, ordenadas e organizadas pelas formas linguísticas de que resultam os textos: unidades de sentidos que se explicam pela dupla lateralidade dos significados que, tecidos e entretecidos entre si, respondem pela sua textura. Retoma-se a concepção de texto que,

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numa perspectiva etimológica, deriva da palavra latina textum, cujo sentido aponta para uma estrutura coesa e autônoma, construída pacientemente por meio de elementos entrelaçados e encadeados de que resulta um produto final que se pode apreciar e manipular. Neves e Oliveira (2001) ocupam-se em analisar um conjunto de definições propostas, desde os primeiros anos da década de 1960 por diferentes autores, e colocam em relevo o fato de elas postularem ser a função comunicativa e social aquela revestida de maior importância. Concebido como produto de atividades verbais em contexto, o texto assume o seu caráter de unidade e totalidade semânticas coesas e coerentes e, nessa acepção, não pode ser focalizado apenas como justaposição de frases, ainda que inter-relacionadas entre si, mas como discurso, ou ato de enunciação oral ou escrita e, nessa condição, afirmam ser o texto a unidade fundadora das práticas discursivas.

Ao longo desse desenvolvimento de fundamentos teóricos sobre a concepção de texto como produto de práticas discursivas, muitos autores como Viana e Teixeira (2002) ponderam não se poder negligenciar que a descodificação é uma condição fundamental que, quando não satisfeita, impedirá o desenvolvimento da leitura; contudo, reduzir a leitura a técnicas de descodificação sempre foi uma posição limitada que impede o acesso à produção de conhecimentos e, necessariamente, não faculta o desenvolvimento sócio-cognitivo-interativo humano. Compreendendo ser a leitura a interação entre os conhecimentos prévios do leitor e novas experiências por ele vivenciadas, extensivas a informações léxico-gramaticais, associadas a signos gráficos implicadas nos processos de descodificação de informações não linguísticas, autores como Smith (1978.), Charmeaux (1975) e Goodman (1995) privilegiam a dimensão psicolinguística da leitura na sua relação entre pensamento e linguagem.

No fluxo desse processo de revisões sobre o ato da leitura, por meio do qual ela é focalizada não apenas como atividade que faculta ascender aos processos de produção de sentidos do texto escrito, mas também assegurar o acesso ao pensamento e julgamento pessoal do próprio leitor. Esse esforço para entender a concepção de leitura, em busca uma abordagem capaz de

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abarcar a relação entre linguagem e pensamento possibilitam que ela também seja considerada como ato de socialização que se explica como um processo multifacetado e multidimensional, implicado desde o reconhecimento da palavra até a intervenção de processos mentais superiores. Ela envolve tanto o reconhecimento dos signos impressos por meio dos quais se faz a evocação dos significados das palavras construídos por experiências do passado e a reconstrução de novos-outros significados pela manipulação de conceitos já conhecidos pelo leitor. Esses são organizados por processos desencadeados por outros-novos pensamentos que conduzem, orientam ou desencadeiam novos comportamentos que se integram, favorecendo tanto o desenvolvimento da pessoal e social do leitor.

Todos esses modelos partem do pressuposto que uma vez descodificada as formas vocabulares e/ou as frases enunciadas pelo escritor-leitor de um texto, por se atribuir a elas significados, convertendo-as em palavras, o processo de compreensão das primeiras e os sentidos dos enunciados frasais serão naturalmente compreendidos.

O quadro acima é complementado, reelaborado por estudos de Rumelhart (1994) que busca reconciliar posições extremas e incapazes de representar adequadamente conhecimentos que, produzidos pelo leitor em situações de interações, tipificam-se por serem diferenciados e variáveis ou de diferentes fontes ou dimensões. A leitura, para esse autor, abarca o processamento do texto, o uso de experiências e de expectativas que, no fluxo dos processos interativos, asseguram o processamento dessas variadas e diferentes informações, asseguradas pela compreensão do leitor sempre gerada e controlada pelos estímulos impressos. Há, portanto, tantas modalidades, modos de processar as informações produzidas pelas práticas de leituras quantas são as pessoas que leem os tipos de textos ou gêneros a serem lidos – sejam esses modelos ascendentes ou descendentes – que exigem o domínio de esquemas ou modelos complexos de leituras. A riqueza e/ou complexidade do processamento de informações pelo produtor-leitor, bem como falhas na apreensão de informações que, para seus estudiosos se torna impossível postular um único modo de ler.

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Os estudos de Rumelhart (op.cit.) permitem considerar não haver um modelo único para o processamento de informações, por conseguinte aqueles usados por um leitor maduro ou proficiente e por leitores iniciantes não são equivalentes. Os primeiros fazem usos de estratégias flexíveis em função do tipo de texto que leem, dos objetivos a que se propõem a alcanças por meio de suas leituras, os arquivos de seus conhecimentos prévios ou grau de desenvolvimento de seus modelos cognitivos ou estilos de leituras. Assim, o leitor maduro ou fluente domina os processos que a ele facultam identificar novas informações, faz uso flexível e estratégico dos mesmos para ascender aos significados dos textos escritos que lê, identifica ou produz inferências autorizadas em relação a seus objetivos e/ou intenções, além de articular um conjunto de operações mentais e atitudes que são facilitadoras de outras aprendizagens. Portanto, não basta descobrir quais são as estratégias que guiam ou orientam os procedimentos de um leitor maduro, envolvidas no ato de ler, sem que se tenha como referência as razões ou objetivos por meio dos quais as pessoas leem, ou quais são os propósitos que desencadeiam ou motivam a leitura de um texto “x” ou “y”, “z”, etc.

Uma síntese dos estudos, acima registrados, aponta que a leitura: a) tem papel fundamental nas atividades que facultam o desenvolvimento psicossocial de seus aprendentes, por isso ela não se reduz a mecanismos de justaposições; b) qualifica-se como atividade criativa e formativa que favorece o desenvolvimento integral da criança ou do jovem, e ainda ao: c) desenvolver os processos mentais próprios da aprendizagem, os seus aprendentes ao: c.1) ampliar o domínio e o uso flexível de usos de regras de caráter linguístico que qualificam os modelos de codificação- descodificação de caráter lógico, ou seja, esse domínio favorece experiências de manipulação de regras e de suas relações, que: c.2) diferenciar e classificam os conhecimentos linguísticos pelos não linguísticos, ou vice-versa; logo, a leitura amplia os modelos ou esquemas classificatórios de conhecimentos de mundos; logo, c.3) favorecer a diferenciação conceptual pela diferenciação de novas relações entre os conceitos. Enfim, com ou por meio dela, também se aprende a pensar; razão por que elas responde pela aprendizagem de novas palavras, de outras

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modalidades de conceber novos-outros conhecimentos, desde que a leitura mobilize o desenvolvimento de atitudes de pesquisas e descobertas de modos de agir criativos, visto ser ela o elemento capaz de desencadear movimentos que mobilizam a força produtora da linguagem ativada pelo pensamento crítico e/ou reflexivo. Nessa acepção, ela responde pelos processos do desenvolvimento da linguagem que ativa e é ativada pelo próprio pensamento que se desenvolve e, ao mesmo tempo, é desenvolvido pela própria linguagem e, nessa acepção, a leitura envolve operações mentais e atitudes referentes a modos de ser e de agir no/sobre os mundos.