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As primeiras normas reguladoras das profissões liberais no Brasil

2 A ORIGEM DO ARQUITETO MODERNO

3.3 DA ORGANIZAÇÃO DAS CLASSES PROFISSIONAIS ÀS INICIATIVAS CONDUCENTES AO CONTROLE ESTATAL DO EXERCÍCIO DAS

3.3.3 As primeiras normas reguladoras das profissões liberais no Brasil

No início do século XX vários países da Europa e também do continente americano, objetivando estabelecer mecanismos de controle das profissões em relações às quais havia certo consenso social sobre a necessidade de habilitação acadêmica para o seu exercício – como é o caso das profissões tecnológicas em geral, e da arquitetura em particular – iniciaram um processo de regulamentação dessas profissões, através da criação de leis reguladoras e de órgãos voltados para a fiscalização das mesmas.63

Num contexto internacional de crescente integração nas diversas áreas da atividade humana, também no Brasil os movimentos em prol de uma regulamentação para o exercício das profissões tecnológicas, que já haviam iniciado desde meados do Oitocentos, adquiriram um ritmo muito mais vigoroso nas últimas décadas desse século e no primeiro quartel do seguinte, ao mesmo tempo como causa e consequência da consolidação do ensino acadêmico e da organização das associações de classe nesse período.

Importa reafirmar que formas embrionárias de controle das profissões existiram no país desde o primeiro século de vida colonial. Já então, os Regimentos de Oficiais Mecânicos, que regulamentavam as Corporações de Ofício em Portugal e suas colônias, estabeleciam as condições de capacidade para o exercício das profissões a elas relacionadas, o que deveria ser comprovado através de exames minuciosamente descritos nos referidos regimentos. (TELLES, 1994). Assim, no âmbito dos citados ofícios mecânicos – pedreiros, carpinteiros, canteiros etc. –, os profissionais legalmente habilitados para projetar e construir em território nacional se submetiam a essa forma de controle, que vigorou por mais de 250 anos, até 1824,

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Entre esses países europeus podem ser citados: Inglaterra, em 1931, com o Royal Institute of

British Architects; Espanha, em 1931, com o Colegio Oficial de Arquitectos; Portugal, em 1931, com o Sindicato Nacional dos Arquitectos, depois substituído pela Ordem dos Arquitetos; e França, em

1933, com a Ordre des Architectes. Os Estados Unidos, que representam um modelo bastante particular de regulamentação, em razão da natureza federativa de sua organização político- administrativa, instituiu semelhante processo de controle do exercício profissional no período que vai da última década do século XIX até 1940, tendo à frente o American Institute of Architects e, posteriormente, o National Council of Architectural Registration Boards. Entre os países do sul do continente americano podem ser relacionados: Uruguai, em 1931, com a Sociedad de Arquitectos del

Uruguay; Chile, em 1942, com o Colegio de Arquitectos de Chile; e Argentina, em 1944, com o Consejo Profesional de Arquitectura. Este tema será mais bem tratado Seção 5 desta tese.

quando foi revogada pela Constituição Imperial que extinguiu essas corporações de origem medieval.

Tal constituição foi construída poucas décadas após a Revolução Francesa, quando os ventos libertários que desta emanaram influenciavam o pensamento e a prática social e política ao redor do mundo. Assim, essa lei64

ainda que outorgada pelo imperador num ambiente de contencioso entre os liberais republicanos e os conservadores monarquistas, além de caracterizada por forte concentração de poder na figura do monarca, a quem era atribuído o Poder Moderador que se sobrepunha aos demais poderes – trazia um forte compromisso com a ideia dos direitos individuais e do livre exercício profissional, conforme revela o dispositivo abaixo:

Art. 179. A inviolabilidade dos Direitos Civis, e Politicos dos Cidadãos Brazileiros, que tem por base a liberdade, a segurança individual, e a propriedade, é garantida pela Constituição do Imperio, pela maneira seguinte:

 XXIV. Nenhum genero de trabalho, de cultura, indústria, ou commercio póde ser prohibido, uma vez que não se opponha aos costumes publicos, á segurança, e saude dos cidadãos;

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Foi a primeira constituição da história do Brasil e a única do período imperial. Inicialmente foi convocada uma Assembléia Constituinte, instalada em 03 de maio de 1823 e formada por deputados eleitos, a quem caberia elaborar o texto constitucional. Duas correntes opostas se formaram: a dos liberais republicanos – que defendiam uma monarquia mais comprometida com a divisão de poderes e com os direitos individuais – e a dos conservadores – que pretendiam uma maior concentração de poderes nas mãos do Imperador. Como desfecho da contenda, em 12 de novembro daquele mesmo ano, por ordem do monarca, o exército invadiu o plenário, prendeu deputados e dissolveu a Assembléia. Feito isso, o Imperador nomeou uma comissão formada por dez membros de sua confiança que, em quarenta dias, redigiu um anteprojeto do texto constitucional, o qual foi assinado por ele em 25 de março de 1824. Trazia clara influência dos ideais liberais então vigentes na Europa a partir da Revolução Francesa e definia como forma de governo uma monarquia hereditária e constitucional, mas introduzia dois elementos que conferiam forte concentração de poder ao Imperador: o Estado Unitário, sem qualquer autonomia para as províncias, cujos presidentes eram nomeados pelo monarca; e a inclusão de um “Poder Moderador”, privativo de Sua Majestade que, através dele, controlava toda a organização política do Império. (CONSTITUIÇÃO DE 1824, Título 3º, art. 10 e 11). Sobrepunha-se aos demais poderes – o Executivo, formado pelo Conselho de Estado e pelos ministros, todos nomeados pelo Imperador que era também o Chefe do Poder (art. 102 a 104); o Legislativo, formado por um Senado Vitalício cujos membros eram nomeados pelo monarca e uma Câmara de Deputados temporária, constituída de membros eleitos para mandatos de quatro anos pelo voto indireto de um Corpo Eleitoral (art. 14, art. 35 a 39 e art. 40 a 51); e o Judiciário, formado por juízes também nomeados e destituídos pelo Imperador. (art. 151 a 164). É interessante notar, por outro lado, que apesar de se caracterizar pela grande concentração de poder na figura do monarca, essa Carta inseria alguns princípios bastante característicos dos ideais libertários da época, principalmente no que se refere aos direitos individuais, à igualdade perante a lei e à liberdade de religião, pensamento e manifestação (artigo 179, incisos IV, V, VII e XIII) e à liberdade de trabalho (artigo 179, inciso XXIV e XXV).

 XXV. Ficam abolidas as Corporações de Officio, seus Juizes, Escrivães, e Mestres. (CONSTITUIÇÃO POLITICA DO IMPERIO DO BRAZIL, 1824).

Extintas tais corporações por determinação constitucional, foi declarada livre toda e qualquer forma de exercício profissional, não mais se reconhecendo leis ou instituições que pudessem estabelecer condições sobre o mesmo. Assim,

[...] todas as pessoas, diplomadas ou não, podiam exercer livremente todas as profissões. Os advogados, os engenheiros e os médicos, por exemplo, formados em escolas superiores, tinham que concorrer em igualdade de condições, ou até com desvantagens, com os profissionais práticos, respectivamente alcunhados de rábulas, de engenheiros práticos e de charlatães. (CASTRO, 1995, p. 26).

Desse dispositivo65 resultou que o exercício da engenharia, da arquitetura e das demais profissões tecnológicas foi completamente livre nas décadas seguintes. Foi um duro revés para o incipiente processo de organização dessas profissões que até então vinha se constituindo a partir da formação de um sistema de ensino acadêmico.66 Estabelecido um vácuo regulatório no imediato período pós-

constitucional, “[...] qualquer indivíduo sem título científico podia dedicar-se à construção de edifícios e pontes, à medição de terras, quaisquer trabalhos de arquitetura ou agrimensura. Exercer a engenharia era exercer um ofício comum de artífice, como o dos marceneiros e alfaiates.” (RIOS FILHO, 1956, p. 07).

Restara, apenas, nas primeiras décadas da Era Imperial, um esboço normativo que regia as construções, mas não quem as projetava ou as dirigia. Eram as Ordenações do Reino, muitas vezes complementadas por Cartas Régias e Posturas Municipais, as quais constituíam uma espécie de Código de Obras da época, detalhando o que era permitido ou não fazer, sendo, em muitos casos, atribuição da polícia67 a fiscalização das construções.

65 Tal dispositivo, se por um lado se harmonizava com os ideais libertários acima referidos, por outro,

se colocava na contramão do processo de desenvolvimento científico, tecnológico e do sistema de ensino acadêmico, que mais e mais se consolidavam, ao mesmo tempo em que se tornava mais complexo o exercício das referidas profissões nas décadas seguintes.

66 Este sistema de ensino acadêmico vinha se estabelecendo desde a criação da Real Academia de

Artilharia, Fortificação e Desenho – que depois se tornaria Academia Real Militar – e da Real Academia de Desenho, Pintura, Escultura e Arquitetura Civil – futura Academia Imperial de Belas Artes – ambas no Rio de Janeiro. (Ver Seção 4 desta tese).

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Segundo TELLES (1994), no início do século XIX a fiscalização das construções, em todos os municípios, era atribuição da polícia, ainda que tenha existido no Rio de Janeiro uma Casa de Obras com a mesma finalidade, análoga a que então havia em Lisboa.

Isto se configurava, pelo menos na perspectiva dos profissionais dotados de formação acadêmica, totalmente incompatível com as necessidades de um país em franco processo de modernização, cujo ambiente sócio-econômico mais e mais se fundamentava no binômio “industrialização-urbanização”, onde se tornava imperativo o concurso de profissionais devidamente habilitados para atuar como propulsores do desenvolvimento nacional. Por esta razão, já nos primeiros anos seguintes à Independência e em reação à política liberalizante então estabelecida, os profissionais diplomados apresentaram as primeiras reivindicações em prol da criação de normas que disciplinassem o exercício das profissões. Ainda que em pequeno número, vis-à-vis a imensa maioria de “práticos” não diplomados, estes profissionais começaram a se organizar para assegurar os seus direitos, cobrando a criação de instrumentos que definissem os deveres e as responsabilidades advindos do exercício das profissões.

Durante o Primeiro Reinado (1822-1831) foram criados os dois primeiros instrumentos voltados para a disciplina do exercício profissional: a Portaria nº 147, de 13 de julho de 1825, assinada pelo ministro do Império, que instituía um plano para a Inspeção das Obras da Intendência Geral da Polícia e da Administração da Iluminação da Cidade, que em seu artigo 5º determinava: A construção e direção de todas as obras, e seus riscos ficam pertencendo ao Engenheiro Diretor, e por isso o Inspetor Geral se não intrometerá nesta parte, nem passará ordem alguma ao dito Engenheiro, porque este não é seu subordinado, mas só ao chefe da Repartição, a quem unicamente compete ordenar o que for conveniente; e a Lei de 27 de agosto de 1828, que em seu artigo 3º estabelecia: Logo que as sobreditas obras forem projetadas, as autoridades, a quem competir promovê-las, farão levantar a sua planta e plano, e orçar sua despesa por engenheiros, ou pessoas inteligentes na falta destes. (COLECÇÃO DAS LEIS DO IMPERIO DO BRAZIL, 1828).

Também merece referência a Lei de 29 de agosto de 1828, que veio ditar algumas “[...] regras para a construcção das obras publicas, que tiverem por objecto a navegação de rios, abertura de canaes, edificação de estradas, pontes, calçadas e aquedutos” (COLECÇÃO DAS LEIS DO IMPERIO DO BRAZIL, 1828), estabelecendo as primeiras exigências sobre a apresentação de projetos e o exercício das funções de empresário, isto é, de empreiteiro. Foi o primeiro instituto legal do Império Brasileiro a tratar de temas viários, determinando em seu artigo 3º:

“[...] que a cada projeto de obra, deveria corresponder uma planta, um plano e o orçamento das despesas, elaborados por engenheiro ou pessoa que entendesse do assunto, na falta daquele.” (VASCONCELOS, 2000). Importa compreender que tais medidas representavam, já nos primeiros anos pós-Independência, a preocupação da Corte com o problema das comunicações terrestres e marítimas no Brasil, tanto em razão da política de integração do território, como devido à necessidade de atender à infra-estrutura necessária à crescente exportação do café, que caminhava para se afirmar como principal produto nacional.

Convém destacar, por outro lado, que esta legislação incipiente estava voltada apenas para ditar algumas regras básicas da disciplina construtiva, mas nada relacionado a qualquer forma de regulamentação profissional nos termos em que esta é atualmente compreendida. Mesmo o “Engenheiro Diretor” ou “Engenheiro” citado nos três atos normativos acima não seriam necessariamente profissionais diplomados, podendo ser um técnico com formação empírica, reconhecido pela experiência adquirida, o que ratificava o ideário do livre exercício profissional.

As cinco décadas seguintes foram marcadas por uma quase total ausência de novas regras para a prática da arquitetura e da engenharia, bem como das demais profissões liberais. Num cenário de absoluta liberdade de exercício profissional, de um lado, e de escassa organização dos poucos profissionais diplomados, do outro, as mudanças que levariam à criação de mecanismos de controle dessas profissões somente vieram a ganhar impulso a partir do último quartel do século, principalmente a partir da criação da Escola Politécnica do Rio de Janeiro.

Dos anos iniciais do Segundo Reinado (1831-1889), relativa importância deve ser atribuída à edição, em 28 de abril de 1836, do Aviso nº 253 que, tratando do regulamento para o pessoal da Administração das Obras Públicas do Município da Corte, proclamava em seu artigo 1º: “Haverá um Oficial de Engenheiros Inspetor com as seguintes obrigações: 1º- Levantar as plantas das obras concebidas pelo governo; 2º- Fiscalizar o exato desempenho das mesmas plantas.” (CASTRO, 1995, p. 27). Este foi o primeiro instrumento normativo a abordar, ainda que de forma tangencial, o direito de autoria, garantindo ao profissional o direito de acompanhar e fiscalizar a execução das obras que tivesse projetado. Em que pese essa norma

poder significar um passo importante na direção do controle do exercício da profissão, buscando garantir a presença de engenheiros em obras de maior complexidade técnica, cumpre lembrar que ela não se referia necessariamente a um profissional diplomado, mas a alguém que, seja através da formação acadêmica ou do aprendizado empírico, fosse considerado habilitado.

No início da década de 1860, a edição de dois decretos representou um passo mais significativo em direção ao controle do exercício profissional. Inicialmente foi editado o Decreto nº 2.748, de 16 de fevereiro de 1861, que dispunha sobre a organização da Secretaria de Estado dos Negócios da Agricultura, Indústria e Comércio do Império. Este decreto estabelecia, em seu artigo 1º, que haveria uma Diretoria das Obras Públicas e Navegação e, em seu artigo 4º, que na referida Diretoria haveria um Corpo de Engenheiros para o exame, inspeção, execução e fiscalização das Obras Públicas daquela instituição. (CÂMARA DOS DEPUTADOS, 1861).

No ano seguinte editou-se o Decreto nº 2.922, de 10 de maio de 1862, que “Crêa um Corpo de Engenheiros civis ao Serviço do Ministerio da Agricultura, Commercio e Obras Publicas, e approva o respectivo Regulamento.” Referência especial deve ser feita ao seu artigo 1º, §4º, que determinava:

Só poderão ser Inspetores Gerais e Engenheiros de qualquer das classes os indivíduos que tiverem o Curso de Engenharia Civil pela atual Escola Central ou pelas antigas Academias e Escolas Militares que precederam a esta, ou os que apresentarem títulos de escolas estrangeiras acreditadas, pelas quais mostrem ter habilitações iguais às daqueles. (CÂMARA DOS DEPUTADOS, 1862).

Esse decreto, de fato, representou um divisor de águas. Ainda que não se tenha traduzido em qualquer medida efetiva oposta à liberdade do exercício profissional em termos gerais, o decreto trouxe uma inovação muito importante: ele fez referência, pela primeira vez no Brasil, a certas condições para o preenchimento de cargos, relacionando-as à habilitação, através do ensino acadêmico ministrado nas escolas credenciadas para tal.

Uma medida mais definitiva para a regulamentação profissional foi tomada já no ano seguinte, quando da edição do Decreto nº 3.198, de 16 de dezembro de 1863, que aprovou as Instruções para a nomeação de agrimensores para a medição de terras públicas ou particulares. Em seu artigo 1º, ele determinava:

Somente poderão ser empregados, como Agrimensores, nas medições de terras públicas e particulares, feitas por ordem ou participação do governo: 1º- os engenheiros geógrafos com carta de curso passada pelas escolas nacionais; 2º- os Habilitados com carta de curso completo da Academia ou Escola de Marinha da Côrte; 3º- os pilotos de carta pela mesma Escola ou Academia, ou por elas reconhecidas; 4º- os agrimensores habilitados com títulos na forma destas instruções; 5º- os que, como tais, tiverem sido empregados pelo governo até esta data. (CÂMARA DOS DEPUTADOS, 1863).

Foi um passo gigantesco rumo à regulamentação da profissão e sua repercussão foi enorme. Este dispositivo, em tese, representava o fim do trabalho de leigos, pelo menos no que se refere ao campo da agrimensura.

Por essa razão tal decreto provocou forte reação dos “práticos”, que até então exerciam livremente a atividade, uma vez que ao longo dessa década e da seguinte muitos deles foram demitidos dos cargos que ocupavam.

Entretanto, devido à ausência de uma estrutura de fiscalização e de regras de punição aos infratores, seus efeitos reais se limitaram ao campo das funções públicas, enquanto que na área privada a atuação dos referidos “práticos” permaneceu totalmente livre durante as duas décadas seguintes.

Outro grande passo em direção à regulamentação profissional foi o Decreto nº 3.001, de 09 de outubro de 1880, que “Estabelece os requisitos que devem satisfazer os engenheiros Civis, Geographos, Agrimensores e os Bacharéis formados em mathematicas, nacionais ou estrangeiros, para poderem exercer empregos em commissões de nomeação do Governo”, dispondo em seu artigo 1º que: “Os Engenheiros Civis, Geographos, Agrimensores e Bacharéis formados em mathematicas, nacionais ou estrangeiros, não poderão tomar posse de empregos ou commissões de nomeação do Governo sem apresentar seus títulos ou cartas de habilitação scientifica.” (SENI, 1880). Esse decreto foi cumprido com maior rigor que os anteriores que tratavam de temas semelhantes e, a partir de sua edição, diversos ocupantes de cargos que não possuíam diplomas foram dispensados, o que novamente provocou muitas reações. Mesmo assim, como nos dispositivos que o antecederam, seus efeitos se limitaram aos casos que envolviam funções públicas. Na atividade privada, os práticos continuaram atuando normalmente, em grande medida devido ao pequeno número de profissionais diplomados naquela época.68

68 A transformação da Escola Central em Escola Politécnica do Rio de Janeiro, por força do Decreto

nº 5.600, de 25 de abril de 1874, representou um passo importante para, nas décadas seguintes, alterar este quadro. O referido decreto “[...] reformulou os currículos escolares, regulamentou os títulos acadêmicos, instituiu a defesa de tese para os graus e dignidades de doutor, os exames para o

Em resposta à escassez de profissionais diplomados diante das crescentes necessidades da época, a Escola de Minas de Ouro Preto modificou o seu regulamento, que até então estabelecia que os alunos que concluíssem o terceiro ano do Curso Geral receberiam o título de agrimensor. O novo regulamento, instituído pelo Decreto nº 9.448, de 27 de junho de 1885, em seu artigo 93 determinava: “Será conferido pela Escola de Minas o título de Agrimensor aos alunos do 2º ano nas condições declaradas no artigo” isto é, no regulamento, “antecedente.” (CÂMARA DOS DEPUTADOS, 1885). A partir dessa mudança aumentou a pressão para regulamentar a profissão de agrimensor, com a criação de instrumentos legais que exigissem diploma acadêmico tanto no serviço público, como na esfera privada.69

Todos esses precedentes deixavam indubitavelmente claro que estava em curso um processo consistente de organização e controle das profissões tecnológicas, que certamente resultaria na construção de uma regulamentação profissional. Portanto, a aprovação em lei de uma estrutura regulatória para o exercício dessas profissões era apenas uma questão de tempo.

No período de 1884 a 1886, o Instituto Polytechnico Brasileiro, então presidido pelo príncipe consorte Luís Felipe Gastão d’Orleáns, o Conde D’Eu, empreendeu, por iniciativa e liderança do arquiteto Luís Schreiner, forte mobilização junto ao Governo para obter a regulamentação das profissões de engenheiro e de arquiteto, numa ação que contava com a participação de grandes nomes do cenário nacional como Paulo de Frontin, Luís Rafael Vieira Souto, Carlos Sampaio e Benjamin Constant Botelho de Magalhães70. (RIOS FILHO, 1956). A partir dessa mobilização elaborou-se um documento, que foi encaminhado em forma de ofício ao Ministério da Agricultura, Comércio e Obras Públicas em 23 de outubro de 1886, em que se pedia a criação de uma estrutura regulatória para as profissões, à grau de bacharel, e restringiu o direito de trabalho aos não formados.” (CASTRO, 1995, p. 28). Além disso, afastando-se definitivamente de sua origem militar, fortaleceu a estrutura do ensino de natureza civil, o que significou um importante aumento na capacidade de formação de engenheiros – em que havia um ensino arquitetônico de base tecnológica – com nítidos reflexos sobre o processo