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5 REPRESENTAÇÕES SOCIAIS

5.3 As Representações Sociais e o sujeito

A teoria das representações sociais visa romper concepções com uma perspectiva evolucionista, na qual o desenvolvimento segue numa evolução natural, um processo evolutivo, gradual e fragmentado. “Moscovici opõe-se à natureza da psicologia social e busca resgatar as dimensões culturais e históricas na pesquisa psicossocial” (SANTOS, 2005, p. 17). Segundo a autora, Moscovici em seus pressupostos teóricos, concebe o sujeito como agente, ativo, “construtor da realidade e nela construído”, e não um expectador da realidade social ou um mero processador de informações do meio exterior. É o sujeito quem remodela e categoriza as informações num contexto de relações com outros indivíduos, sobre objetos “socialmente importantes para eles” (BONARDI; ROUSSIAU, 1999 apud SANTOS, 2005, p. 17).

Desta forma, a noção de sujeito ultrapassa as ideias de individualismo, humanismo e consciência. Sob influências do positivismo, marxismo, estruturalismo e pós-modernismo, a figura de um sujeito individual foi recusada, estas correntes focaram em lugares exteriores ao sujeito, contribuíram ao engajamento da abordagem social nos estudos. (JODELET, 2009). Tais contribuições,

[...] remetem a um sujeito que não seria um indivíduo isolado no seu modo de vida, mas seria automaticamente social; um sujeito que interioriza, se apropria das representações ao mesmo tempo que intervém na sua construção [...] Contanto que os estudos realizados no campo das representações sociais mirem tanto os indivíduos que estão inseridos em e são influenciados pelas redes e contextos sociais quanto os coletivos de natureza diversa (grupos, comunidades, conjuntos definidos por uma categoria social, etc.) (JODELET, 2009, p. 683).

Jodelet (2009, p. 680) enfatiza que Moscovici percebe a representação social como uma “elaboração psicológica e social”, aborda sua formação oriunda da triangulação “sujeito- outro-objeto”.

Spink (1993) reforça a noção de sujeito social na elaboração das representações sociais. A autora afirma que o sujeito não apresenta-se somente como produto de determinações sociais, nem se apresenta como produtor independente. As representações dos sujeitos são construções contextualizadas, isto é, resultam a partir das condições em que se originam e do meio ao qual incorporam.

Para melhor compreensão e análise das representações sociais apresentadas pelos indivíduos e grupos em determinados espaços, Jodelet (2009), propõe um esquema que demarca a abrangência de pertença das representações.

Figura 4. As esferas de pertença das representações sociais

Fonte: Jodelet, 2009.

Jodelet (2009, p. 696) explica que “[...] toda representação social é relacionada a um objeto e a um sujeito” e que as representações sociais podem ser relacionadas a três esferas de pertença: subjetividade, intersubjetividade e transubjetividade. A partir do esquema apresentado, a autora demonstra que os sujeitos não são concebidos como sujeitos isolados, são atores sociais ativos, que possuem influências a depender de seu modo de vida, e desenvolvem-se em um “contexto social de interação e inscrição” (JODELET, 2009, p. 696). A inscrição é compreendida por dois processos: a natureza dos objetos e os contextos em

questão. A interação é vista como a participação em uma gama de interações com os outros, através da comunicação social, a qual Moscovici apresentou o modelo da triangulação, sujeito-outro-objeto. “[...] nossas reações aos acontecimentos, nossas respostas aos estímulos, estão relacionadas a determinada definição, comum a todos os membros de uma comunidade à qual pertencemos (MOSCOVICI, 2011, p. 31)”.

A pertença social é definida por Jodelet (2009, p. 696) em diversos níveis: “[...] o do lugar na estrutura social e da posição nas relações sociais, o da inserção nos grupos sociais e culturais que definem a identidade, o do contexto da vida onde se desenrolam as interações sociais, o do espaço social e público”.

Jodelet (2009, p. 696) afirma que os processos pelos quais o sujeito constrói e se apropria de suas representações, são de múltiplas vertentes: natureza cognitiva, emocional, a depender de uma experiência de vida. Desse modo, “a noção de subjetividade nos conduz a considerar os processos que operam no nível dos indivíduos eles-mesmos”.

[...] o sujeito se situa no mundo, em primeiro lugar, por seu coro, como estabelece a fenomenologia. A participação no mundo e na subjetividade passa pelo corpo: não há pensamento desencarnado, flutuando no ar. Isso nos conduz a integrar na análise das representações os fatores emocionais e identitários, ao lado das tomadas de posição ligadas ao lugar social (DOISE, 1990) e das conotações que vão caracterizar, em função da pertença social, a estrutura das representações (ABRIC, 1994) (JODELET, 2009, p. 698).

Neste sentido, é possível identificar a importância das representações para o sujeito, seja no âmbito individual ou coletivo, pois está atrelada aos significados que concedem a um objeto, que se insere no círculo social e material. Também, conforme aborda Jodelet (2009, p. 697), “[...] examinar como os significados são articulados à sua sensibilidade, seus interesses, seus desejos, suas emoções e ao funcionamento cognitivo”.

No âmbito da intersubjetividade, as representações são constituídas na interação entre sujeitos em dado contexto, e são negociadas e firmadas pela comunicação verbal direta. Jodelet (2009) explica que nesta esfera da intersubjetividade, a interação decorrente do diálogo resulta na transmissão de informações, na construção de saberes, na expressão de acordos e desacordos acerca de um objeto consensual, em interpretações, significações e ressignificações a temas comuns aos indivíduos em interação.

Jodelet (2009, p. 698) afirma que a esfera da transubjetividade consiste de elementos pertencentes tanto do nível subjetivo, quanto do intersubjetivo, isto é, está tanto no indivíduo e grupo, quanto nos contextos de interação, nos discursos e trocas dialógicas: “Na formação

das representações sociais, a esfera da transubjetividade se situa diante da intersubjetividade e remete a tudo que é comum aos membros de um mesmo coletivo”.

As origens dos aspectos consensuais são diversas, a citar a cultura, as relações sociais e de poder, ou seja, as normas e valores que conduzem as práticas sociais e a identidade coletiva, os meios de comunicação de massa, os contextos institucionais, as ideologias, e outras: “Atravessando os espaços de vida locais, esta esfera constitui um meio onde mergulham os indivíduos. Pela sua circulação, as representações assim geradas ultrapassam o quadro das interações e são endossadas, sob a forma de adesão ou de submissão, pelos sujeitos” (JODELET, 2009, p. 699).

Para compreender a formação de representações sociais, evidencia-se a importância da interação entre as esferas de pertença das representações, pois

[...] um mesmo objeto ou acontecimento visto por horizontes diferentes dá lugar a negociações de interpretação, confrontos de posição pelos quais os indivíduos exprimem uma identidade e uma pertença. Cada um desses horizontes põe em evidência uma significação central do objeto em função de sistemas de representações transubjetivas específicos dos espaços sociais ou públicos nos quais evoluem os sujeitos. Estes se apropriam dessas representações em função de sua adesão, de sua filiação a esses espaços (JODELET, 2009, p. 702).

Segundo Moscovici (2011), as representações intervêm nas orientações daquilo que os indivíduos têm que se posicionar ou relacionar. É aquilo que se possui, que se ajusta aos sistemas cognitivos e perceptivos. E estas reações aos acontecimentos estão relacionadas a uma definição comum a todos os membros de uma comunidade à qual o sujeito pertence.

Os indivíduos que não possuem instrumentos científicos tendem a fazer considerações e análises sobre o mundo sob formas que se assemelham, em especial quando o mundo vivenciado é social. Sendo assim, as informações são distorcidas, dispersadas por “[...] representações „superimpostas‟ aos objetos e às pessoas que lhes dão certa vaguidade e as fazem parcialmente inacessíveis” (MOSCOVICI, 2011, p.32). No entanto, a estas informações, incorporamos imagens e hábitos já predispostos por fatores culturais.

Rosenthal; Jacobson (1989) desenvolveram estudos sobre os efeitos de valores, atitudes, crenças e expectativas no desempenho de papéis (no caso de seus estudos, do professor em relação aos alunos). Reconheceu-se que esta interferência funciona como uma profecia autorrealizadora, ou seja, uma conjetura que se autorrealiza. Os autores demonstraram em seus estudos que este conceito foi aplicado em diferentes contextos e com isto, explica algumas ações e representações dos sujeitos.

Moscovici (2011) enumera duas funções das representações: a primeira é a convencionalização dos objetos, pessoas ou acontecimentos. Melhor explicando: as representações definem uma forma, localizam em dada categoria e, num processo gradativo apresentam como um modelo de certo tipo distinto, e é partilhado por certo grupo de indivíduos, e também novos elementos juntam-se e sintetizam-se a ele. “[...] as representações constituem, para nós, um tipo de realidade” (MOSCOVICI, 2011, p. 32).

A segunda função das representações é que são prescritivas por impor-se sob força irresistível aos indivíduos. Esta força justifica-se na combinação de estruturas do que se está presente e da tradição que conduz ao que deve ser pensado. Moscovici (2011) afirma que a representação não se relaciona diretamente à maneira de pensar dos indivíduos, pois este pensar é dependente das representações.

Na seção a seguir, encontra-se a fundamentação da metodologia utilizada para conduzir esta pesquisa.

6 MÉTODO

De acordo com Severino (2002, p. 162), “[...] entende-se por métodos os procedimentos mais amplos de raciocínio, enquanto técnicas são procedimentos mais restritos que operacionalizam os métodos, mediante emprego de instrumentos adequados” (grifos do autor).

Na concepção de Minayo e Sanches (1993, p. 240), “[...] o conhecimento científico é sempre uma busca de articulação entre uma teoria e a realidade empírica; o método é o fio condutor para se formular esta articulação”. Neste sentido, a escolha do método configura-se como um momento crucial da pesquisa, pois deve adequar-se ao problema da investigação, aos objetivos estabelecidos, às hipóteses levantadas e à delimitação do universo ou da amostra (MARCONI; LAKATOS, 2003). Além desses aspectos, Minayo e Sanches (1993, p. 239) alertam que:

Um bom método será sempre aquele, que permitindo uma construção correta dos dados, ajude a refletir sobre a dinâmica da teoria. Portanto, além de apropriado ao objeto da investigação e de oferecer elementos para a análise, o método tem que ser operacionalmente exequível.

Partindo desses princípios, há de se concordar com a afirmação de Marconi e Lakatos (2003) quanto à utilização de mais de um método de pesquisa e não somente aqueles que conhecemos, é preciso adequação aos propósitos da pesquisa, e por este motivo, combinar o uso concomitante de dois ou mais métodos de pesquisa.

6.1 TIPO DE PESQUISA

De acordo com as proposições do problema que esta pesquisa apresenta, o plano de investigação tem uma abordagem qualitativa e quantitativa, básica quanto à sua natureza, exploratória e descritiva quanto aos seus objetivos.

A pesquisa básica, segundo apresentação de Ander-Egg (1978), “[...] é aquela que procura o progresso científico, a ampliação de conhecimentos teóricos, sem a preocupação de utilizá-los na prática. É a pesquisa formal, tendo em vista generalizações, princípios, leis. Tem por meta o conhecimento pelo conhecimento” (apud MARCONI; LAKATOS, 1996, p. 19).

Moresi (2003, p. 8), define a pesquisa básica como geradora de “[...] conhecimentos úteis para a ciência sem aplicação prática prevista. Envolve verdades e interesses universais”.

Flick (2009) traz reflexões sobre a pesquisa qualitativa e apresenta as características comuns a alguns pesquisadores. O autor afirma que os estudos qualitativos têm aspirações de abordar o mundo como ele se apresenta e não em contextos específicos para pesquisas. Incluem-se os objetivos de entendimento, descrição e até mesmo, explicação de fenômenos sociais através de análises de práticas individuais e grupais, de interações e situações de comunicação, e investigações de documentos.

Conforme explica Moresi (2003, p. 8-9), a pesquisa qualitativa “[...] considera que há uma dinâmica entre o mundo real e o sujeito, isto é, um vínculo indissociável entre o mundo objetivo e a subjetividade do sujeito que não pode ser traduzido em números. A interpretação dos fenômenos e a atribuição de significados são básicas no processo”.

Ao eleger a pesquisa qualitativa, considera-se que esta abordagem “[...] parte do fundamento de que há uma relação dinâmica entre o mundo real e o sujeito, uma interdependência viva entre o sujeito e o objeto, um vínculo indissociável entre o mundo objetivo e a subjetividade do sujeito” (CHIZZOTTI, 2000, p. 79).

Uma questão de relevância na condução de uma pesquisa qualitativa é a respeito da ética. Gibbs (2009) argumenta que os dados qualitativos são, em sua maioria, pessoais e individuais. Nesse sentido, espera-se que o pesquisador tenha sensibilidade ao prever que seus estudos não provocarão danos ou prejuízos aos pesquisados.

O estudo exploratório permite aumentar a experiência em torno do problema. Triviños (1987, p. 109), explica que o “[...] pesquisador parte de uma hipótese e aprofunda seu estudo nos limites de uma realidade específica, buscando antecedentes, maior conhecimento para, em seguida, planejar uma pesquisa descritiva ou de tipo experimental”. O caráter exploratório da pesquisa, segundo Marconi; Lakatos (2001) apontam tripla finalidade: o desenvolvimento de hipóteses, o aumento de familiaridade com dado fenômeno, fato ou ambiente e modificação ou esclarecimentos de conceitos. Este estudo possibilita a utilização de certa variedade procedimental para a coleta de dados, resultando um estudo de relativa intensidade junto a um número não tão amplo de unidades pesquisadas.

Quanto aos objetivos descritivos, o autor supracitado esclarece que a maioria dos estudos no campo da educação é desta natureza.

O foco essencial destes estudos reside no desejo de conhecer a comunidade, seus traços característicos, suas gentes, seus problemas, suas escolas, seus professores, sua educação, sua preparação para o trabalho, seus valores, os problemas do analfabetismo, a desnutrição, as reformas curriculares, os métodos de ensino, o mercado ocupacional, os problemas do adolescente etc (TRIVIÑOS, 1987, p. 110).

Por estes fundamentos, o autor esclarece que os estudos descritivos exigem uma série de informações sobre o que se deseja pesquisar para poder descrever os fatos e fenômenos de determinada realidade, e além da coleta, ordenação e classificação dos dados, estabelecer relações. A análise documental, enfocada nesta pesquisa como um dos instrumentos metodológicos é um estudo descritivo, pois fornece “[...] uma grande quantidade de informação sobre leis [...], processos e condições escolares, planos de estudo, requisitos de ingresso, livros-texto etc” (TRIVIÑOS, 1987, p. 111). A combinatória do estudo exploratório descritivo permite um acúmulo de informações precedendo um caráter representativo sistemático (MARCONI; LAKATOS, 2003).

Outra abordagem é a quantitativa, pois permite que um conhecimento seja considerado suficientemente preciso devido a contagens e medições, isto é, “acompanhados de um adequado instrumento matemático” para manipulá-lo (MINAYO; SANCHES, 1993, p. 240). Como esta pesquisa estrutura-se sob pilares de fenômenos sociais, os autores mencionados esclarecem:

Quanto mais complexo for o fenômeno sob investigação, maior deverá ser o esforço para se chegar a uma quantificação adequada, em parte porque algumas atividades são inerentemente difíceis de serem mensuradas e quantificadas e, em parte, porque, até o presente momento, descrições matemáticas excessivamente complicadas são extremamente intratáveis, do ponto de vista de solução, para que tenham algum valor prático (MINAYO; SANCHES, 1993, p. 241).

É importante observar que, diante desta preocupação, optou-se pela escolha da abordagem quantitativa conhecendo suas limitações na área das ciências sociais, porém, tornando-a complementar à pesquisa qualitativa.

O delineamento de levantamento também compõe o estudo no que tange às legislações brasileiras que permeiam o processo educativo. Para contemplar a abordagem dada às competências do professor da educação básica, foi necessário recorrer ao estudo descritivo dos documentos legislativos. Appolinário (2006, p. 115) explica que o levantamento trata-se de uma modalidade de pesquisa “[...] que tem por finalidade apenas investigar as características de determinada realidade ou mesmo descobrir as variáveis componentes dessa realidade”.