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4. Método do estudo

4.1 Aspectos operacionais da pesquisa

O cenário para a realização da pesquisa foi uma instituição psiquiátrica de lógica asilar de gestão Estadual e pública, da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo, localizada no Município de São Paulo e que dispõe leitos psiquiátricos. Essa instituição, que já foi, formalmente, um Hospital Psiquiátrico e que não pertence à RAPS, conta hoje com uma equipe multiprofissional e com um conjunto de serviços para atendimento a pessoas com sofrimento psíquico, abrangendo a população adulta e a população infantil, sendo que a proposta de assistência envolve, predominantemente, um regime de internação. Atualmente, considerando apenas a população infantojuvenil, existem dois serviços específicos para atendimento: uma enfermaria com capacidade para internação de até 18 crianças e/ou adolescentes com sofrimento psíquico, e um centro de referência para atendimento de crianças e adolescentes com espectro autista. A pesquisa foi realizada no primeiro serviço. Segundo descrito por esse serviço, a população da enfermaria é constituída por crianças e adolescentes de até 18 anos de idade, do sexo masculino, com sofrimento psíquico e em situação de crise.

Por conseguinte, tendo em vista a natureza da pesquisa qualitativa, o quadro de indagações do estudo, e considerando como abordagem compreensiva do problema em questão a Hermenêutica-Dialética, foram previstos como aspectos operacionais da pesquisa: o estudo dos documentos institucionais contidos nos prontuários das crianças e dos adolescentes internados em uma instituição psiquiátrica de caráter asilar, a realização de entrevistas abertas com crianças e/ou adolescentes internados, e a imersão no campo a partir da observação participante. O trabalho de campo teve início em 12 de Julho de 2013 e término em 12 de Novembro de 2013 e, nesse período, 45 crianças e adolescentes estiveram internados nessa instituição.

Considerando esse cenário, para a compreensão da perspectiva dessa instituição psiquiátrica acerca dos motivos de internação de crianças e adolescentes, foram selecionados todos os documentos institucionais que tratavam especificamente desse assunto e que estavam contidos nos prontuários das crianças e dos adolescentes que estiveram internados na instituição durante o período do trabalho de campo. Ou seja, foi selecionado e analisado um conjunto de documentos de um total de 45 prontuários. Nos documentos incluídos nesses prontuários, buscou-se identificar, analisar e compreender o que e de que maneira essa instituição reconhecia e definia como premissa e como justificativa de internação de crianças e adolescentes; isto é, pesquisar quais eram os aspectos de uma situação para a qual a instituição reconhecia como sendo as razões para a internação e qual era a argumentação desenvolvida para fundamentar o ato de internação de crianças e adolescentes.

Além dessa pesquisa documental, foram previstas e foram realizadas entrevistas abertas (ANEXO A) com oito adolescentes que estiveram internados durante o período de trabalho de campo. Como critério de inclusão, podiam participar da pesquisa as crianças e os adolescentes que demonstrassem interesse, desde que as exigências dos aspectos éticos fossem cumpridas. Nessas entrevistas, buscou-se identificar, analisar e compreender a perspectiva das crianças e dos adolescentes sobre os motivos de suas internações na instituição que foi cenário do estudo, tendo sido investigados, também, aspectos relativo ao cotidiano de vida fora da instituição, à própria situação de internação e aos projetos de vida dos entrevistados. Em relação à estrutura da entrevista, Minayo (2007, p. 190) assinala que um roteiro para entrevista aberta trata do tema da investigação e deve conter uma “descrição sucinta, breve e, ao mesmo tempo, abrangente” do objeto da investigação, orientando o pesquisador nos rumos da entrevista. Assim, esse instrumento de pesquisa precisava estar na memória do pesquisador, que ouviu e conduziu os entrevistados para que explicitassem os seus pontos de vista acerca dos motivos de internação, mas que, também, trataram de outros

temas para eles relevantes. Todas as oito entrevistas foram gravadas e transcritas. Ainda, todos os nomes foram alterados para preservar a identidade dos sujeitos.

Ainda, por meio da observação participante, foi realizada uma imersão no campo em seus diferentes momentos institucionais. Nessas ocasiões, buscou-se uma aproximação com as crianças e com os adolescentes internados na instituição, em uma postura de escuta atenta às palavras, aos gestos e aos movimentos desses sujeitos, bem como aos de outros atores desse cenário de estudo, tais como os profissionais da instituição e os familiares e cuidadores desses sujeitos. Nessas ocasiões, e pelo próprio estabelecimento de relações, foram sendo constituídos processos vinculares entre a pesquisadora e os sujeitos ligados à instituição. Esse foi o primeiro elemento considerado para a realização do convite à participação na pesquisa. Justamente, esses momentos de interação com os usuários do serviço, anterior à realização das entrevistas, podem ser compreendidos na perspectiva de “aquecimento”, assinalada por Minayo (2007, p. 264), e foram centrais para o conhecimento recíproco, para a disponibilização das pessoas para a pesquisa, e para a construção de relações entrevistador- entrevistado no caso dos oito sujeitos que foram entrevistados.

Ainda acerca da observação participante, pela via da produção de acontecimentos, estando junto aos sujeitos, foi possível a criação de inteligibilidades para algumas questões. A experiência do cotidiano na instituição foi registrada em um Diário de Campo através da descrição de cenas-acontecimentos (falas, gestos, interações, presenças, movimentos e outros), de observações e percepções pessoais. O Diário de Campo configurou-se como um caderno de notas e como um material para depositar um diálogo intenso da pesquisadora, o qual acontecia no contato com os sujeitos e na vivência do local de estudo. O trabalho de retomar esses escritos remete à experiência de reviver as intensidades produzidas nos encontros.

Essa composição de modos de operar a pesquisa justifica-se pela complexidade da problemática, o que é próprio da pesquisa qualitativa, já que essa permite a “combinação de uma multiplicidade de práticas metodológicas, materiais empíricos, perspectivas e observadores em um único estudo”, aproximando o pesquisador qualitativo de um “confeccionador de colchas”, que “utiliza as ferramentas estéticas e materiais de seu ofício, empregando efetivamente quaisquer estratégias, métodos ou materiais empíricos que estejam ao seu alcance” (DENZIN; LINCOLN, 2006, p. 18).