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Aula 2: Alunos planejam o texto (coletivamente) e a professora é a escriba da turma; em seguida, alunos fazem

4.3.4 Atividade de oralidade

Neste tópico o eixo da oralidade será tratado, partindo do princípio de que ele é necessário, ao contrário do que o senso comum divulga. Marcuschi (2007), dentre

outros autores, concebe que a fala e a escrita se complementam já que ambas são formas sob as quais a língua funciona e não meras propriedades de sociedades distintas. Portanto, se na vida pessoal e social as pessoas se comunicam de forma mais evidente a partir da fala, em busca de “fazer parte” de determinado (s) grupo (s) – nas conversas e/ou diálogos produzidos no ambiente familiar e/ou de trabalho, quando explicam ou dão instruções sobre a realização de algo, quando contam histórias para os filhos na hora de dormir, quando se expressam através de cânticos e louvores durante um rito religioso, ou mesmo quando defendem um posicionamento político, então, na escola é preciso ensinar como produzir tais textos orais. Ou seja, aqui também defendemos, assim como Brandão e Leal (2005), que a escola tem um papel fundamental nesse aspecto, pois nela, é possível desenvolver habilidades para a exposição de temas, ideias e opiniões, a partir de atividades como debates, exposição oral e/ou seminários, palestras, entrevistas, entre outros.

É na escola que se devem ensinar modos de fala que são usados diante de públicos específicos, pois a conversação entre colegas, a linguagem ali usada, não é a mesma se nos reportamos a uma plateia de especialistas em determinada área, por exemplo. Logo, cabe aos professores desenvolver em sala de aula,

situações em que as crianças falem e escutem (ou seja, produzam e compreendam textos orais), para que através das intervenções do (a) professor (a) e do próprio grupo, elas desenvolvam o conhecimento e a segurança necessária para se comunicarem cada vez melhor (BRANDÃO e LEAL, 2005, p. 32).

Nas aulas observadas, ocorreram muitos momentos de conversa e exposição oral (e informal) dos alunos na turma da professora Ana, mas só foi identificada uma atividade no eixo da oralidade ao longo das dez observações, conforme descrito no quadro a seguir. Com relação à professora Betânia, houve poucos momentos de conversa e nenhuma exposição oral por parte dos alunos, apenas leitura oralizada de textos. Além disso, não foi identificada nenhuma atividade específica no referido eixo. Desse modo, as análises se referem apenas à professora Ana, embora alguns comentários possam abarcar ambas as professoras.

Quadro 12: Atividade de oralidade realizada pela professora Ana/2º ano.

PROFESSORA ANA/ 2º ANO

Atividades Realizadas Feita pelo aluno (individual)

Reconto em voz alta de final da história lida Aula 2: Alunos criam um novo final para a história lida pela professora.

Conforme é possível verificar no Quadro, nessa aula a professora abriu espaço para que os alunos Juca (alfabético), F. e Fe. (alfabéticos não consolidados) inventassem um novo final para a história lida anteriormente pela professora, porque alguns disseram que não gostaram do que aconteceu no final (na história, após procurar o tempo, um menino encontra um enorme relógio, só que devido sua busca, o tempo passou e ele não percebeu que envelhecera, só descobrindo no final da história). Vejamos o trecho:

P – Vocês gostaram da história? A – Sim.

P – Ei, presta atenção, Leo. Gostaram da história? A – Sim.

A – Não. P – Hãm? A – Não.

P – Gostou não foi Juca, por quê? Juca falou que não gostou, fica em pé Juca, por que não gostou?

Juca (ALF) – Porque naquela hora o menino (inaudível).

P – Ah, o menino ficou velho. Mas ele não queria ficar velho? Não é não? Ele não queria apressar. Ele ficou triste porque o menino ficou velho. Mas olhem, presta atenção, essa história aqui, Juca vou lhe dar uma chance, fique em pé (o menino se aproxima da professora), você vai ter a oportunidade de mudar o final da história. A história ficou que o menino quando ele chegou perto do rio ele ficou o que?

T – Velho.

P – Velho. Termine a história, aí faça uma mágica aí. O rio, o riacho não era mágico? Espera aí que ele (Juca) vai dar um final da história presta atenção. Peraí, ele está dando outro final à história. Leo presta atenção. Vá diga, ó o que aconteceu. Olhe pros seus colegas e diga.

Juca (ALF) – Ele não tava de um lado do rio? P – Ele tava de um lado, aí ele passou...

Juca (ALF) – Passou para o outro e ficou um menino de novo.

P – Porque um lado do rio transformava as pessoas em idosas e o outro o tornava criança não é? (Juca confirma com a cabeça) Pronto, palmas pra Juca que terminou a história. (crianças batem palmas e gritam) Quem quer dá outro final a história? Vem cá J. (o menino não quer). As meninas, ME, quem quer dá outro final a história? (alguns levantam a mão) Vem F. Escuta, F vai dar outro final à história. (a professora para e chama a atenção de 2 alunos que estavam brincando, sem dar atenção...)

F – Em vez do menino envelhecer. P – Em vez dele envelhecer, diga. F – Ele virou bebê.

P – Ele virou bebê? Ele virou bebê de novo. Pronto, brigada. Quem quer dar outro final, vem Fe.

Fe – Eu não! P – Diga daí então.

Fe – O soldado veio e matou o bebê (faz o gesto de uma arma), só com uma metralha. (Fe e mais alguns alunos riem bastante) E uma bazuca.

A – É melhor com a dinamite.

P – Peraí, a imaginação de Fe ó... Fe, que violência Fe. Eu quero uma representante feminina. Não vem nenhuma menina não é (como as meninas se recusam, a professora encerra a atividade).

(trecho da Aula 2, 21/10/2015).

Nesse caso houve uma tentativa de atividade no eixo da oralidade, realizada na turma da professora Ana. Essa atividade teve origem diante de uma negativa do aluno com relação ao final da história lida pela professora. Na realidade é possível que se ninguém tivesse se colocado contra, a atividade tivesse acabado ali mesmo. Isto é, foi a partir de determinada estratégia de leitura que a professora costumava desenvolver na sua prática cotidiana, dando voz à turma, que surgiu a oportunidade de explorar a oralidade.

Isso ocorreu de forma um pouco insipiente, inclusive porque diante de uma das respostas (a de F), Fe, criou outra: F – Ele virou bebê. [...] Fe – O soldado veio e matou o bebê (faz o gesto de uma arma), só com uma metralha. (Fe e mais alguns alunos riem bastante) E uma bazuca. Isso não significa que a professora errou por não ter ampliado a discussão ou improvisado uma ação complementar mais elaborada. Mas é importante valorizar e destacar que houve uma tentativa bem sucedida na ação didática desta professora porque ela teve a sensibilidade e o interesse em conhecer e respeitar o sentimento do aluno diante de um final que não favorecia o desejo particular do mesmo.

Talvez Juca (o aluno que disse não ter gostado da história) tenha se visto no lugar daquela personagem em busca do tempo, de querer ser adulto logo e vivenciar coisas diferentes, sem se preocupar com as consequências de tal busca (que no caso da personagem da história foi não perceber que enquanto buscava alcançar o relógio do tempo, sua idade avançava até o envelhecimento).

Por fim, essa escassez de atividades nesse eixo foi constatada, como já afirmaram outros especialistas (BECHARA, 2011; MARCUSCHI, 2011; ANTUNES, 2013) porque ainda persiste a concepção na escola de que alfabetizar é ensinar a escrita, a gramática, a norma culta, e que falar se aprende em casa. Mas, vários autores, como Brandão e Leal (2005) e Morais (2012) afirmam que o que cabe à

escola ensinar são os usos orais e escritos da língua, nem a oralidade deve ser esquecida e nem a escrita pode ser supervalorizada.

4.4 O uso dos recursos didáticos: em que medida contribuiu para o