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Atos jurídicos stricto sensu x negócios jurídicos processuais

1. NEGÓCIOS JURÍDICOS PROCESSUAIS

1.4. FATOS JURÍDICOS PROCESSUAIS

1.5.2. Atos jurídicos stricto sensu x negócios jurídicos processuais

Os atos jurídicos processuais stricto sensu e os negócios jurídicos processuais são atos humanos nos quais a vontade é relevante para sua ocorrência e consequente produção de efeitos. Questiona-se qual elemento seria essencial para estabelecer a diferença entre essas duas espécies de atos jurídicos lato sensu.

No caso dos atos jurídicos processuais stricto sensu, os efeitos dele advindos são aqueles previstos em lei, cabendo ao agente tão somente a escolha entre a sua prática ou não. No caso dos negócios, as partes acordantes podem estabelecer os efeitos daquele ato (lato sensu), dentre aqueles permitidos em lei.

Em ambas as situações o ato consciente de vontade dirigido a obter um resultado juridicamente regulado constituiu elemento nuclear do suporte fático. A diferença é que no

182 Para um rol exemplificativo, DIDIER JR, Fredie. Princípio do respeito ao autorregramento da vontade no

Processo Civil. In: CABRAL, Antonio do Passo; NOGUEIRA, Pedro Henrique Pedrosa (coord.). Negócios Processuais. Coleção Grandes Temas do Novo CPC. v. 1. Salvador: Juspodivm, 2015, p. 24 e 25; CUNHA, Leonardo Carneiro da. Negócios jurídicos processuais no Processo Civil Brasileiro. In: CABRAL, Antonio do Passo; NOGUEIRA, Pedro Henrique Pedrosa (coord.). Negócios Processuais. Coleção Grandes Temas do Novo CPC. v. 1. Salvador: Juspodivm, 2015, p. 42 e 43. Tratando de alguns negócios processuais típicos, BERTÃO, Rafael Calheiros. Negócios jurídicos processuais: a ampliação das hipóteses típicas pelo novo Código de Processo Civil. In: DIDIER JR., Fredie; MACÊDO, Lucas Buril de; PEIXOTO, Ravi; FREIRE, Alexandre (coord.). Coleção Novo CPC: doutrina selecionada. Parte geral. 2. ed. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 1.347- 1.376.

183 Exemplo retirado de YARSHELL, Flávio Luiz. Convenção das partes em matéria processual: rumo a uma

nova era? In. CABRAL, Antônio do Passo; NOGUEIRA, Pedro Henrique. (coord.). Negócios Processuais. Coleção Grandes Temas do Novo CPC, v. 1. Salvador: Juspodivm, 2015, p. 63.

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ato jurídico processual stricto sensu o poder de escolha da categoria jurídica é inexistente, enquanto que no negócio jurídico processual esse poder existe sempre, embora com amplitude que varia conforme os seus tipos.

A ideia do respeito ao autorregramento da vontade traduz bem a diferença entre os atos negociais e os demais fatos voluntários184. Seria o respeito ao autorregramento da

vontade, verdadeiro princípio que busca no processo a obtenção de um ambiente que possa exercer o direito fundamental de liberdade sem restrições irrazoáveis e injustificadas185.

Segundo Fredie Didier Jr., existiria um verdadeiro princípio do autorregramento da vontade no processo:

“Esse princípio visa tornar o processo jurisdicional um espaço propício para o exercício da liberdade. O direito de a parte, ora sozinha, ora com a outra, ora com a outra e com o órgão jurisdicional, disciplinar juridicamente as suas condutas processuais é garantido por um conjunto de normas, subprincípios ou regras, espalhadas ao longo de todo o Código de Processo Civil. A vontade das partes é relevante e merece respeito”186.

Para Antônio do Passo Cabral, o processo civil seria pautado pela atividade das partes em equilíbrio com os poderes judiciais, sendo que há uma redução do espaço para o exercício da função jurisdicional quando permitida qualquer esfera de liberdade para atuação legítima dos sujeitos privados187. Os limites ao autorregramento da vontade no processo são,

portanto, maiores quando relacionados com aqueles previstos no direito privado188. No

mesmo sentido é o entendimento de Leonardo Carneiro da Cunha, para quem está fundado o Código de Processo Civil de 2015 na concepção de democracia participativa, valorizando a

184 NOGUEIRA, Pedro Henrique. Negócios Jurídicos Processuais. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 152;

CABRAL, Antonio do Passo. Convenções Processuais: entre publicismo e privatismo. Tese de livre docência. São Paulo: USP, 2015, p. 34-35.

185 DIDIER JR., Fredie. Princípio do respeito ao autorregramento da vontade no Processo Civil. In: CABRAL,

Antonio do Passo; NOGUEIRA, Pedro Henrique Pedrosa (coord.). Negócios Processuais. Coleção Grandes Temas do Novo CPC. v. 1. Salvador: Juspodivm, 2015, p. 22.

186 DIDIER JR., Fredie. Princípio do respeito ao autorregramento da vontade no Processo Civil. In: CABRAL,

Antonio do Passo; NOGUEIRA, Pedro Henrique Pedrosa (coord.). Negócios Processuais. Coleção Grandes Temas do Novo CPC. v. 1. Salvador: Juspodivm, 2015, p. 22-23.

187 CABRAL, Antonio do Passo. Convenções Processuais: entre publicismo e privatismo. Tese de livre

docência. São Paulo: USP, 2015, p. 145-146.

188 Nesse sentido, CHIOVENDA, Giuseppe. Principios de derecho procesal civil. t. II., Trad. José Casais y

Santaló. Madrid: Editora Reus, 1925, p. 240. Também GRECO, Leonardo. Os atos de disposição processual: Primeiras reflexões. In: MEDINA, José Miguel Garcia el al. (coord.). Os poderes do juiz e o controle das decisões judiciais. 2. tir. São Paulo: Editora Revistas dos Tribunais, 2008, p. 290, e MOREIRA, José Carlos Barbosa. Convenção das Partes Sobre Matéria Processual. In: Temas de Direito Processual, terceira série. São Paulo: Saraiva, 1984, p. 91.

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vontade dos sujeitos processuais “a quem se confere a possibilidade de promover o autorregramento de suas situações processuais” 189.

Não só em relação ao Código de Processo Civil, a autonomia da vontade é princípio presente ainda no regramento do Código de Processo Civil de 1973, seja em razão das previsões da Constituição Federal de 1988, seja pelo próprio artigo 158 daquele diploma, como também não se pode deixar de atribuir relevância à vontade a partir da própria classificação dos atos jurídicos lato sensu, como bem percebeu Jaldemiro Ateíde190.

Portanto o negócio jurídico processual é fato jurídico voluntários, cujo suporte fático estaria descrito em norma processual, apto a produzir efeitos no processo, cujo elemento nuclear do suporte fático consiste em manifestação ou declaração consciente de vontade, conferindo-se ao sujeito o poder de escolha da categoria jurídica ou o estabelecimento de certas situações jurídicas processuais, exercendo, assim, o autorregramento da vontade dentro dos limites impostos pelo ordenamento jurídico.