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Aumento dos custos com a saúde nos países da OCDE

Depois de se ter visto que, genericamente os países da OCDE, têm obtido ganhos consideráveis em saúde nas últimas décadas, dá-se agora relevância ao facto de os custos e a despesa pública com a saúde, nesses mesmos países e durante esse mesmo período, ter vindo também a crescer. Neste ponto pretende-se ainda identificar alguns dos mais importantes factores que têm contribuído de forma decisiva para este aumento progressivo do peso do sector da saúde no PIB nos países desenvolvidos em geral e nos países da OCDE.

De facto, os países da OCDE enfrentam custos de saúde crescentes. Embora os países da OCDE tenham ganho uma longevidade impressionante nas últimas décadas, os custos com a saúde também aumentaram ao longo do tempo, e na maioria dos países, as despesas em saúde, aumentaram a um ritmo mais rápido que o crescimento económico global, o que se traduziu num aumento do peso da despesa em saúde no PIB dos diferentes países.

Para Simões (2004a) as despesas com a saúde têm, efectivamente constituído em muitos países o seu principal problema, que, no conjunto dos países da OCDE, mais do que duplicou, entre 1960 e 2000.

Segundo OCDE (2003), a média não ponderada da percentagem das despesas totais em saúde no PIB, nos países da OCDE, passou de 3,9% em 1960 para 8,1% em 2000. Segundo a mesma fonte e para o mesmo período de tempo, a média não ponderada da percentagem das despesas públicas nas despesas totais em saúde também cresceu com o tempo,

passando de 63% em 1960 para os 72,3% em 2000. Contudo este último indicador, ao contrário do primeiro, tem vindo a diminuir desde 1980 onde atingiu o seu máximo histórico com 74,5%.

Tabela 2.7: Despesas em saúde nos países da UE em 2002

Países

Despesas em saúde (2002)

Despesas Totais Despesas Públicas % do PIB Per capita (1) % do PIB Per capita (1)

Luxemburgo 6,2 3.062 5,3 2.618 Irlanda 6,5 2.104 5,1 1.779 Finlândia 7,0 1.875 5,3 1.470 Áustria 7,3 2.096 5,3 1.551 Espanha 7,4 1.593 5,2 1.176 Reino Unido 7,5 2.012 6,2 1.801 Itália 8,0 2.053 6,2 1.639 Dinamarca 8,6 2.516 7,1 2.142 Bélgica 8,7 2.407 6,4 1.790 Holanda 8,7 2.520 8,1 1.313 Suécia 8,8 2.402 7,6 2.148 Grécia 9,0 1.722 4,9 960 Portugal 9,1 1.673 6,4 1.201 França 9,5 2.671 7,2 2.080 Alemanha 10,6 2.738 8,3 2.212 (1) Em dólares PPP (a preços e paridade de poder de compra)

Fonte: OCDE, 2005a

Como se pode ver na Tabela 2.7, em 2002 Portugal era já um dos países que apresentava maiores despesas em saúde em percentagem do PIB com 9,1%, só superado pela França e pela Alemanha com 9,5% e 10,6% respectivamente. No entanto a despesa per capita continuava a ser uma das mais baixas dos 15, o que reflectia o estado de desenvolvimento económico do nosso país.

Há diversos factores que têm influenciado de forma decisiva este aumento progressivo do peso do sector da saúde no PIB nos países desenvolvidos em geral e nos países da OCDE em particular. São precisamente esses factores que vamos agora apresentar, tendo como base o relatório da OCDE de 2003 já referenciado.

Os progressos da medicina

O factor que, na nossa opinião, mais tem contribuído para o aumento dos gastos na saúde é o progresso a que temos assistido, nomeadamente a nível tecnológico, da medicina. Este progresso traduz-se na prática não apenas no diagnóstico e na terapêutica, mas também na prevenção da doença e nas preocupações crescentes com as condições sanitárias da população. Por outro lado, os cidadãos, em particular, destes países são cada vez mais utilizadores informados e exigentes para com o sistema de saúde do seu país, exigindo a cada momento a melhor tecnologia ao menor preço.

O aumento do PIB per capita

De modo geral, os países da OCDE com PIB per capita mais elevado, têm normalmente uma despesa per capita em saúde mais elevada também. Na verdade, observa-se que este conjunto de países têm visto, nos últimos anos, estes dois indicadores aumentarem, pelo que se pode concluir que existe um certo efeito indutor do PIB per capita na despesa em saúde.

O envelhecimento da população

O envelhecimento da população destes países, resulta quer da diminuição da taxa de mortalidade quer do aumento da esperança média de vida. Este facto por si só contribui para o aumento das despesas de saúde, uma vez que as populações mais idosas tendem a precisar de maiores cuidados de saúde e por isso a serem mais onerosas para o sistema de saúde dos seus países. Este factor, aliás tal como os dois anteriores assinalados, não será, à partida, de resolução fácil.

Será interessante referir ainda que de acordo com OCDE (2003) espera-se que o peso dos idosos continue a aumentar, nestes países, nas próximas décadas, particularmente em resultado do envelhecimento da chamada da geração do baby-boom (que atingirá a idade de 65 anos a partir de 2010). Pelo que se pode concluir que, analisando este factor

isoladamente, não se pode esperar uma diminuição da despesa pública em saúde nos tempos mais próximos.

A cobertura pública dos gastos em saúde

Dado que, na grande maioria destes países, predomina a cobertura de seguro de saúde financiada pelo sector público ou mesmo o financiamento público directo, o sector público representa a maior parte das despesas públicas em todos os países, salvo raras excepções como os Estados Unidos, México e a Coreia. No entanto, mesmo nos Estados Unidos, onde o sector privado desempenha um papel excepcionalmente importante no financiamento, as despesas públicas de saúde representam 6,6% do PIB, e são comparáveis à média dos países da OCDE. Do nosso ponto de vista este é um factor onde, apesar das tradições evidenciadas de financiamento público nestes países, se poderá esperar uma diminuição da despesa pública em saúde transferindo para o sector privado, mas não necessariamente de forma directa para os cidadãos, alguma dessa despesa.

O aumento das despesas com medicamentos

De todo o tipo de despesa em saúde, o factor que teve o mais rápido crescimento da despesa nos últimos anos foram as despesas com medicamentos. Segundo OCDE (2003) este factor tem contribuído para o crescimento da despesa em saúde com uma taxa de crescimento média anual superior a 5% deste 1997. Este facto é tanto mais relevante quando se estima no mesmo relatório que em média, nos países da OCDE, 60% das despesas farmacêuticas provêm de fundos públicos, sendo o resto basicamente suportado pelos utentes e, apenas uma pequena parcela é suportada por seguros privados. Tal como seria de esperar, também aqui, a despesa com medicamentos aumenta com o nível de rendimento per capita do país.

Na nossa opinião, muito coisa há aqui a fazer, nomeadamente racionalizar o consumo de medicamentos e inverter a tendência para aumento dos preços com uma progressiva liberalização da indústria farmacêutica.

De todos estes factores agora apresentados, pensamos que o progresso tecnológico é o principal responsável pelo crescimento da despesa pública na saúde. Um estudo realizado

por Newhouse (1992) procurou chegar a esta conclusão desagregando – numa tentativa de atribuir o aumento da despesa a um factor concreto – o crescimento da despesa em saúde desde a II GM aos anos 90 em várias componentes. Pela sua importância e/ou pela dificuldade de medição, o progresso tecnológico foi obtido por diferença. O ponto de partida foi o do crescimento da despesa médica per capita (nos EUA) a um ritmo de 4% ao ano, durante meio século, ou seja, em cinquenta anos, a despesa em saúde tinha crescido cerca de 780%.

Segundo este autor, os factores que estiveram por detrás deste crescimento foram os seguintes:

Envelhecimento – estimou que o aumento da despesa em saúde decorrente da evolução

demográfica resultou num acréscimo de despesa na ordem dos 15%;

Aumento da cobertura de seguro – estimou que o aumento da cobertura de seguro de

uma taxa de média de comparticipação de 27% para os 67% resultou num aumento de 50% das despesas;

Aumento do rendimento real – usando uma elasticidade procura preço próxima da

unidade, estimou uma contribuição deste factor de 180%;

Indução da procura2– não havendo evidência forte e consistente sobre a magnitude deste

efeito, Newhouse (1992) não o considerou estatisticamente relevante;

Produtividade dos factores – este argumento é conhecido como a doença de Baumol3.

Estando, o sector da saúde incluído nas actividades afectadas por esta doença de Baumol,

2 Entende-se que o simples facto de existir um maior número de profissionais leva, por si só, a um

aumento da procura de serviços médicos.

3 A ideia crucial por detrás da doença de Baumol é a de que alguns sectores da economia, que usam

intensivamente trabalho, caracterizam-se por um tipo de progresso tecnológico que não poupa a utilização de trabalho. São sectores com um menor crescimento de produtividade. O exemplo apresentado por Baumol (1993) é a necessidade de tanto hoje como há duzentos anos precisarmos

será inevitável o aumento do preço relativo dos bens e serviços de saúde e o aumento da sua importância no PIB. Contudo, Newhouse (1992) alegou que a diferença de produtividades não será assim tão grande que faça com que este efeito seja dominante.

Newhouse (1992) conclui assim que somando todos estes factores não ultrapassam os 50% do total de crescimento das despesas com cuidados médicos. Sendo que os restantes 50% são atribuídos, pelo autor, à evolução do progresso tecnológico, com o aparecimento de novas terapêuticas e tecnológicas, que são mais caras que a geração precedente.

Já Simões (2004a) prefere classificar os factores que podem explicar o crescimento da despesa pública com a saúde como ligados à procura e à oferta de cuidados. Desta forma o autor destaca três factores do lado da procura e dois do lado da oferta de cuidados, como se pode ver na Tabela 2.8.

Tabela 2.8: Factores que explicam o crescimento da despesa publica com a saúde

Do lado da procura Do lado da oferta O envelhecimento da população A inovação tecnológica

O crescimento do rendimento O aumento dos meios materiais de prestação de cuidados e de pessoal

O alargamento do acesso e da cobertura dos seguros

Fonte: Simões, 2004a (Adaptado)

Em suma pode-se dizer que, tanto a publicação da OCDE, como os diversos autores aqui referenciados têm ideias bastante próximas no que toca à identificação dos principais factores que têm contribuído para o aumento progressivo do peso do sector da saúde no PIB nos países desenvolvidos em geral e nos países da OCDE.

A inovação tecnológica – que na prática se traduz não apenas no diagnóstico e na terapêutica, mas também na prevenção da doença e nas preocupações crescentes com as

de quatro músicos para tocar um quarteto de cordas de Mozart. No caso da saúde, um médico não vê hoje três vezes mais doentes em 20 minutos do que o fazia há 20 ou 30 anos.

condições sanitárias da população – talvez mereça especial destaque na medida em que de forma consensual constitui o principal factor de crescimento dos gastos em saúde. Para além deste factor deve ainda destacar-se o efeito rendimento com os países com uma população com maiores rendimentos a gastarem também mais em cuidados médicos e o progressivo alargamento do acesso e da cobertura dos serviços de saúde às populações. Por outro lado o envelhecimento da população, apesar de ser um factor que por si só contribui para o aumento das despesas de saúde destes países, pensa-se que o seu impacto será menos significativo quando comparado com outros factores já identificados.

Após a descrição dos factores que mais têm contribuído para o aumento dos custos com a saúde nos países da OCDE, no próximo ponto far-se-á uma breve referência sobre algumas das medidas mais consensuais que podem contribuir para a sua contenção desses mesmos custos.

2.6 Medidas de contenção dos gastos com a saúde nos países da OCDE

Identificados que foram os principais factores que podem estar na origem do aumento progressivo do peso dos gastos em saúde no PIB dos países da OCDE, será agora o momento para se apresentar algumas das medidas que estão a ser levadas a cabo por estes mesmos países no sentido da contenção da despesa pública em saúde. As medidas de contenção de gastos podem dividir-se em dois grandes grupos, as que actuam do lado da procura e as que actuam do lado da oferta de cuidados.

Simões (2004a) apresenta uma metodologia combinada sobre novas orientações na política da saúde de Mossiolos e Le Grand (1999) e do relatório da OCDE (1995). Esta metodologia assenta, como se pode ver na Tabela 2.9 em três tipos de medidas: a limitação de recursos públicos, as novas técnicas de orçamentação e as formas de controlo.

Em Comunicação da Comissão ao Conselho (2001) podia ler-se que desde o início dos anos 90, os Estados-Membros empreenderam diversas reformas, utilizando dois tipos principais de alavanca: a regulação da procura, nomeadamente através do aumento das contribuições ou de um aumento crescente dos custos pelo consumidor final; a regulação da oferta,