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5.2 Compreendendo o processo de trabalho da supervisão em enfermagem

5.2.2 Autonomia para o trabalho

Nas narrativas dos participantes do nosso estudo, percebemos certa contradição quanto à autonomia para tomar decisões no trabalho da supervisão. Alguns supervisores referem ter autonomia para decisões cotidianas, porém, quando essas esbarram em questões políticas ou de ordem assistencial médica, não são respeitados em sua opinião, mesmo justificando sua decisão com base nas normas institucionais (por exemplo: questões de frequência ao trabalho, ocupação de leito, horários de coleta de exames), destacando-se o sentimento de falta de apoio e insatisfação.

Há relatos de enfermeiros que referem que os supervisores possuem “certa autonomia” para desenvolver seu trabalho, isso se justifica pelas divergências de opiniões e condutas entre supervisores e diretores e, nesse caso, prevalece a opinião da autoridade hierárquica.

Notamos certa confusão do que se entende por autonomia, pois há conceitos sobre autonomia profissional, autonomia pessoal e autonomia no trabalho. A autonomia profissional é atribuída quando o enfermeiro assume a responsabilidade pelo planejamento da assistência, com fundamento em princípios e nas teorias da enfermagem, considerando as necessidades e a integralidade do

paciente, além do cumprimento e/ou supervisão das tarefas rotineiras decorrentes da prescrição médica: seria a autonomia para a ação assistencial (130-131).

A autonomia pessoal é influenciada pela experiência e pelo tempo de serviço do profissional, permitindo-lhe relacionamentos interpessoais que favorecem sua tomada de decisão. Essa autonomia facilita a resolução de problemas devido ao fato de o profissional ter conhecimentos da cultura, das normas, da maneira de funcionamento da estrutura hierárquica e dos serviços de apoio (131).

A autonomia no trabalho é determinada pelas relações de autoridade hierárquicas, com forte influência nos modelos de gestão. Ambientes burocráticos com trabalho fragmentado e centrado em rotinas e inadequada comunicação dificultam o processo de autonomia dos seus profissionais, diferente de ambientes onde há práticas participativas, integradoras e sensíveis que estimulam a autonomia, considerando a capacidade intelectual para decisões e para inovações no trabalho (132)

.

Nessa perspectiva, compreendem-se os motivos pelos quais os supervisores ora são autônomos nas decisões ora não o são. A conquista da autonomia na prática da gerência em enfermagem é um processo complexo que depende da construção entre os fatores condicionantes que influenciaram o percurso da profissão, a subjetividade de cada profissional, suas competências, os relacionamentos interpessoais e de interesses políticos desenvolvidos no espaço institucional (130-132).

Autores que estudam a gestão do trabalho em saúde (82:243) alertam que a “liberdade é potência para o cuidado em saúde”: quando discutida e planejada no microcosmo do trabalho cotidiano, os trabalhadores são direcionados a manejar os casos com a singularidade necessária para tomar decisões contextualizadas e com os recursos disponíveis do ambiente. Tendo autonomia, o trabalhador desenvolve trabalho vivo, criativo, estabelecendo vínculos com os pacientes, familiares e com a equipe num movimento de troca de saberes e colaboração (82). Ao contrário da gestão do trabalho exclusivamente administrativa, burocrática, cumpridora de tarefas, em que há pouca oportunidade de o profissional colocar em prática seu saber e, desse modo, não consegue se identificar com os resultados alcançados.

Estudos norte-americano (133) e português (131) fazem forte relação da promoção de autonomia na equipe de enfermagem com a melhora da qualidade de atendimento, satisfação e comprometimento dos profissionais no trabalho.

Pelas questões citadas, entendemos que a autonomia na gestão é fundamental para criar condições de mudanças no processo de trabalho em direção à finalidade determinada. Para tanto, buscamos entendimento e sustentação nos fundamentos da autonomia de Freire (112). Para esse autor, o ser humano é “inacabado” e tem a possibilidade de “fazer e refazer” sua história a partir de um processo reflexivo e crítico sobre os condicionantes de subjugação determinados por processos históricos, culturais e políticos.

Essa consciência é pré-requisito fundamental para se tomar atitude na construção da autonomia, intelectual, ética e moral no contexto em que se insere (134)

. A autonomia implica que o profissional tenha responsabilidade pelos seus atos, pelos atos delegados a outrem ou, ainda, pelas tarefas que lhe foram confiadas. Dessa forma, um requisito fundamental na gestão é a clareza da designação das atribuições e determinações das tarefas pelas categorias profiassionais (135).

Nessa direção, analisamos a necessidade de discussões sobre alinhamento de condutas e determinação das responsabilidades entre enfermeiros, supervisores e diretores. Para tanto, há a necessidade de confiança para determinar as tarefas aos profissionais bem como para planejar capacitações que sejam necessárias para a responsabilização e compromisso dos enfermeiros para tomada de decisões no seu plantão, favorendo sua autonomia.

Quanto às responsabilidades para os cargos (diretores, assistentes, supervisores), apesar de estarem descritas no regimento do DENf., percebemos que alguns serviços encontraram melhor equilíbrio na relação de trabalho entre diretor e supervisores. Sabidamente os serviços de enfermagem têm suas especificidades, porém há condutas de abordagem gerencial (exemplo: critérios de férias, trocas de folga, faltas abonadas etc.) que precisam ser acordadas para terem direcionamento comum para toda a instituição, garantindo um projeto gerencial com identidade da enfermagem, evitando conflitos nas relações de trabalho.

Além disso, em alguns aspectos, a divisão e o compartilhamento de responsabilidades seriam estratégias motivadoras para os enfermeiros, por exemplo,

dando a oportunidade de fazer as escalas de trabalho junto com a equipe de seu plantão. Isso estimularia a participação, envolvimento e maior comprometimento de todos da equipe de enfermagem com a presença ao trabalho.

Ainda, na questão do controle da frequência, os funcionários administrativos poderiam assumir mais atividades pertinentes à documentação burocrática e ao sistema informatizado de recursos humanos, principalmente no período noturno, conforme sugestão dos supervisores. Dessa forma, o processo de trabalho do supervisor seria organizado com tempo para o acompanhamento e discussões clínicas sobre planejamento e avaliação da assistência com sua presença constante nas enfermarias junto a sua equipe e pacientes.