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AVALIAÇÃO DO IUT

No documento Tributação no Brasil e o Imposto Único (páginas 164-175)

SOBRE TRANSAÇÕES (IUT)

2) AVALIAÇÃO DO IUT

SIMPLICIDADE e CUSTO formam o primeiro requisito de um bom imposto. Devem-se avaliar a facilidade de sua aplicação e o custo de arrecadação - não . apenas os incidentes sobre o setor público, mas principalmente os encargos administrativo-tributários do setor privado.

Sob este prisma o IUT recebe excelente avaliação. Por ser automaticamente arrecadado a cada operação bancária, torna-se simples e de baixo custo. Reduzirá custos sociais e privados ao minimizar as despesas de fiscalização - eles serão restritos aos controles de sistemas e de programação dos computadores bancários - e eliminará a necessidade de coletorias e de controles de arrecadação e de partilha de tributos. Minimizará os gastos do setor público, inclusive os judiciais e de processamento de dados.

No setor privado haverá uma enorme redução dos custos administrativos, e serão liberados recursos humanos que poderão ser utilizados na gestão gerencial, e não na estéril escrituração e apuração tributárias que nada contribuem para a geração de riqueza. O empresário poderá dedicar-se integralmente ao seu negócio, em vez de usar parte substancial de seu tempo e de seus recursos para fins de mera administração tributária.

Sob o prisma de EFICIÊNCIA, o IUT também recebe boa avaliação.

Os críticos afirmam que o efeito cascata, tout court, representa um grave defeito do Imposto sobre Transações Financeiras e que a cumulatividade deve ser intransigentemente renegada, sem necessidade de nenhuma qualificação ou justificativa.

A avaliação dos impactos alocativos do IUT relativamente a impostos sobre o valor agregado - IVA - depende criticamente da existência de competição perfeita. Não se pode precipitadamente inferir implicações normativas acerca das distorções alocativas de impostos em mercados imperfeitos. Em situações não-ótimas, como nos ensinam a teoria de second best é as recentes pesquisas na área da tributação ótima, não se pode afirmar a priori se os impostos em cascata ou os IVAs são mais, ou menos, eficientes.

Por certo, todos os impostos introduzem elementos de ineficiência alocativa. No caso do IUT, porém, boa análise econômica exige a comparação de seus impactos positivos e negativos com os do atual sistema tributário brasileiro, mesmo melhorado por reformas estruturais. É uma falácia a verificação dos efeitos do IUT relativamente a uma situação de ausência tributária.

Por exemplo, um imposto cumulativo induz a verticalização se compara- ; do a uma situação de total isenção tributária; porém, pode reduzir sensivelmente a indução de verticalização frente aos enormes impactos cumulativos do atual sistema tributário brasileiro.

A comparação da magnitude das distorções causadas por impostos cumulativos versus impostos sobre valor adicionado depende não apenas da natureza do tributo (cumulativo ou não), mas sobretudo das alíquotas marginais aplicadas em cada caso. Assim, um imposto sobre valor adicionado, com alíquotas altas, pode introduzir distorções mais fortes do que impostos cumulativos com alíquotas baixas. Indago se não poderia ser este o caso com o ICMS e o IPI com alíquotas elevadas e que, consolidados, chegariam facilmente a 25% ou 30% em média.

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Pode-se avaliar o impacto do 1UT na formação de preços na economia através do uso de modelos de relações interindustriais. A mesma metodologia, por sinal, poderá ser utilizada para a desoneração de exportações mediante a técnica de rebates fiscais. Pretende- se comparar o impacto do IUT na formação de preços comparativamente a um imposto sobre valor agregado (IVA), tomando-se como base a mesma estrutura produtiva dada por coeficientes técnicos de produção para o Brasil de 1980, agregados em 35 setores, e fornecida ao autor por Ivo Torres e Décio Kadota da USP.

Para qualquer produto tributado pelo IUT, seu preço final é dado por Pi = (1 + t) {[ ∑ (Kij Pj + LiW] (1 + t) (1 + mi)} (4)

j

onde Pi = preço do produto i,com IUT t = alíquota do IUT

∑= somatório sobre j

j

Kij = insumo j por unidade de i

Pj = preço do insumo j, com IUT

Li = trabalho por unidade de i

W = taxa de salário (numéraire)

mi = mark-up sobre custos na produção de i

i, j = 1, ... n setores de produção

Em notação matricial, para n setores, pode-se calcular o preço de cada produto com o IUT segundo a equação (5):

P = [FK] P + FLW P- [FK] P = FLW [I - FK] P = FLW

P = [I - FK]-l FLW (5) onde P = vetor de preços finais (n x 1)

I = ma triz identidade (n x n)

F = matriz diagonal, [(1 + t) O + t) O + mi)] (n x n)

K = matriz de coeficientes técnicos (n x n)

L = vetor de unidades de trabalho por unidade de i (n x 1)

Neste modelo, por construção, o custo de produção sem impostos é definido como sendo igual a 1.

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O mesmo modelo pode ser adaptado para aferir o impacto de impostos sobre valor agregado (IVA) na formação de preços, como segue:

P' i = 1/(1- v) {[( ∑ (K i j P j) + L iW) (1 + m i)] - v ∑ (K i j P j)} (6)

j

onde P' i = preço do produto i, com IVA

v = alíquota do imposto sobre valor agregado P' j = preço do insumo j, com IVA

Em notação matricial pode-se avaliar o impacto do IVA nos preços finais segundo a equação (7):

P' = [F'K] P' + F"LW P' - [F'K] P' = F"LW [I - F'K] P' = F"LW

P' = [I - F'K]- 1 F"LW (7) onde F' = matriz diagonal, [(1 + m i - v)/(1 - v)] (n x n)

F" = matriz diagonal, [(1 + mi) / (1 - v)]

As equações (5) e (7) permitem calcular o impacto do IUT e do IVA nos preços dos produtos. Supõe-se que ambos os impostos indiretos serão totalmente repassados a preços e que os produtos tenham demandas inelásticas. Tomando-se t e v igual a zero, ambos os modelos se resumem a uma situação de ausência tributária, o que permite avaliar a carga tributária de cada um dos impostos em tela nos preços dos produtos.

Cabe acrescentar que, alterando-se o modelo (6) de forma a fazer com que o mark-up incida sobre os custos de produção líquidos dos créditos tributários, a incidência do IVA será uniforme em todos os setores e equivalente a 1/(1 - v). Acreditamos, porém, que o comportamento representado pela equação (6) reflita mais adequadamente os mecanismos de formação de preços vigentes na economia brasileira.

As tabelas e os quadros anexos demonstram que:

a) a carga tributária do IUT atinge um máximo de 9%, ao passo que com o IVA de 17% pode ultrapassar 30%;

b) o IUT implica variância de carga tributária sensivelmente inferior ao IVA;

c) alíquotas diferenciadas do IVA, como ocorre na prática, implicam variância ainda maior de carga tributária setorial, distorcendo mais fortemente os preços relativos na economia.

Concluiu-se portanto que, com as alíquotas avaliadas, o IUT, embora sendo um imposto em cascata, causa menos distorções nos preços relativos do que o IVA, além de possibilitar sensível redução de carga tributária e conseqüentemente de preços dos produtos tributados.

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A carga tributária do IUT varia na razão inversa do valor adicionado em cada estágio de produção e na razão direta do número destas etapas, o que, aliás, ocorre no atual sistema tributário brasileiro. Recente simulação (Luiz Zottmann, "Imposto sobre Transações Financeiras: Reflexões e Simulações", mimeo, Brasília, 1992) considerou até 15 etapas produtivas, com hipóteses de valor agregado por etapa de entre 20% e 200%.

A conclusão foi de que a carga tributária do IUT varia de 2% a 10,2%. Por outro lado, considerando-se apenas o ICMS, o Finsodal, o Pis e as contribuições ao INSS (sem IPTU, ISS, IR, IPI e outros), a sistemática atual brasileira impõe cargas com variação de 24% a 30,7%.

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Por certo, bem melhor seria uma estrutura cumulativa com cargas tributárias máximas em tomo de 10%, ao invés de uma estrutura de impostos sobre valores agregados com cargas de mais de 30%. Qual a estrutura mais eficiente do ponto de vista alocativo, se ambas arrecadam o mesmo volume de recursos?

Embora a atual estrutura tributária esteja longe de ser neutra nos preços relativos, ainda permanece a questão do impacto diferencial do IUT. Mas é inequívoco que nele a cunha fiscal cairia de forma generalizada, reduzindo custos e preços.

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Conclui o autor das simulações que "cairá por terra outra preocupação relativa ao IUT. A da distorção que imporia aos preços relativos. Na verdade será bem inferior a do sistema vigente, ainda que do sistema atual extraíssemos todos os impostos em cascata. Afinal em nenhuma das hipóteses consideradas, a carga fiscal por ela gerada chega próxima sequer à do ICMS, imposto que por sinal não chega a ser nem universal nem neutro. Claro fica, por todas essas razões, que os efeitos negativos do IUT só deverão ser fonte de preocupação se este imposto vier a ser adotado não como um substituto dos impostos indiretos vigentes, mas sim como mais um imposto, a se somar a outros tantos que hoje incidem sobre as atividades formais do sistema econômico brasileiro".

Hoje, quase todos os tributos aplicados no país são cumulativos. Até o ICMS e o IPI tornam-se impostos em cascata quando a cadeia de débito/ crédito se rompe, como ocorre com intensidade na agricultura. Igualmente o imposto de renda de pessoa jurídica, com base no lucro presumido (uma opção permitida por Lei 8541/92), e junto com a contribuição social incidem sobre o faturamento bruto com alíquotas de 1,875% (3% no caso de serviços).

Somando-se a isto o Cofins, o Pis, o ISS e outros tributos em cascata, chega-se aos seguintes resultados: o IUT proporcionará impacto cumulativo menor do que o da situação atual e, portanto, com impacto indutor da verticalização mais fraco do que ocorre hoje.

O IUT, por contar com um fato gerador de grande abrangência, permite a minimização da alíquota marginal. Sob o prisma de análise de equilíbrio parcial esta conclusão é reforçada pela divisão da alíquota entre os dois participantes na transação monetária.

A EQÜIDADE é o terceiro critério de análise a que se deve submeter o IUT.

Inicialmente, cabe lembrar que a atual sistemática tributária brasileira é notoriamente iníqua e regressiva. Tomando-se apenas o imposto de renda como exemplo, nota-se que ele deixa muito a desejar para justificar sua fama de imposto de cidadania, imposto justo, imposto progressivo, imposto social e outras alegadas virtudes.

Cerca de 45% da arrecadação do IR no Brasil vem de empresas, o que configura um imposto indireto e sem a progressividade que está sendo exigido do IUT; outros 33% são de pessoas físicas e de retenções na fonte sobre rendimento do trabalho, um percentual superior à participação do fator trabalho na renda nacional; apenas cerca de 20% das receitas do IR, portanto, incidem sobre rendimentos de capital. Como se vê, um imposto que não configura sua imagem de instrumento redistributivo.

O IUT é um imposto híbrido. Na medida em que incide sobre a renda- salários lucros, juros e aluguéis - é um tributo direto proporcional- nem regressivo nem progressivo.

Sob este aspecto, o IUT conta com a vantagem de que sua proporcionalidade não pode ser transformada, de fato, em regressividade, como ocorre com alguns tributos tradicionais. Hoje há enorme potencial de evasão por parte das famílias de mais alta renda que, ao receberem fringe benefits e ao lançarem despesas pessoais como sendo de suas empresas, acabam disfarçando a distribuição de lucros e destruindo a progressividade do imposto sobre a renda.

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Com o IUT não há formas de evadir a tributação e portanto este risco não surge, garantindo-se a proporcionalidade do IUT como imposto direto.

O IUT também é um imposto indireto na medida em que incide cumulativamente sobre a formação dos custos de produção. Nesse sentido, a progressividade deve ser buscada no imposto embutido no preço dos produtos adquiridos pelos consumidores finais.

Há uma diferença fundamental entre o IUT, que é um imposto cumulativo, e os impostos indiretos sobre valor adicionado. Neste último caso, o custo tributário embutido no preço é exatamente a alíquota do IVA. Portanto, com alíquotas únicas, o IVA toma-se um imposto cuja incidência é constante no valor de cada produto. No conjunto dos gastos das famílias de diferentes segmentos de renda e com alíquota única de imposto sobre valor adicionado, a incidência tributária seria proporcional aos dispêndios. Portanto, o IVA é proporcional no conjunto dos gastos familiares.

Esta conclusão não é válida para o IUT. Por ser cumulativo, a parcela do imposto no custo final dependerá do processo de produção. Quanto mais longa a cadeia produtiva e, simultaneamente, quanto mais reduzida a taxa de valor agregado em cada etapa de produção, maior o número de transações na produção de um determinado bem ou serviço e, conseqüentemente, maior a incidência de imposto no custo e no seu preço final. Isto faz com que a análise da progressividade do IUT dependa da composição dos gastos das famílias nas diversas faixas de renda.

Seria lícito supor que na composição total dos gastos de famílias de alta renda será mais elevada a participação de bens mais sofisticados, com mais avançada tecnologia, com mais elevados níveis de especialização na fabricação de componentes e, portanto, com um maior número e mais alto valor de transações monetárias por unidade de produto. Já as famílias de renda mais baixa teriam uma participação maior de "bens de salários", mais simples, e com processos produtivos menos roundabout.

Assim, as famílias de alta renda sofrerão, no conjunto de seus gastos, uma tributação proporcionalmente mais elevada do que as famílias de renda mais baixa. Nota-se, portanto, que a afirmação usualmente feita no sentido de que os impostos indiretos são sempre regressivos é incorreta. E verdade que na margem, ou seja, para produtos analisados isoladamente, o IUT seria regressivo. Contudo, o que interessa avaliar é progressividade na média de todos os gastos das famílias, e nesse caso o IUT seria progressivo.

O IUT apresenta enorme flexibilidade do ponto de vista operacional. Nesse sentido, toma-se possível garantir imunidade tributária para as transações que não ultrapassem, durante certo período, um valor predeterminado de isenção. Torna-se possível, portanto, garantir às famílias de baixa renda a não-incidência tributária sobre seus rendimentos, bem como o saque em dinheiro, sem oneração tributária.

Cabe acrescentar, ainda, que o que se busca é a progressividade do processo fiscal, e não apenas, a progressividade tributária. De nada adianta a arrecadação de impostos ser progressiva se os dispêndios são realizados de maneira regressiva, privilegiando os que menos necessitam dos recursos públicos. Tem sido esta a tradição brasileira. Os gastos públicos privilegiam os detentores de poder, os donos dos cartórios e os que controlam as várias instâncias políticas de decisão.

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Ao atentar apenas para o lado, a arrecadação orientando todos os recursos de fiscalização e de controle para o sistema arrecadatório, está-se fazendo o jogo dos que desejam manter a distribuição de recursos tributários com os mesmos padrões atuais, ou seja, profundamente injustos e anti-sociais.

Urge reorientar o foco da discussão acerca de progressividade do processo fiscal para a face das liberações de verbas e dos gastos. O IUT pretende certa progressividade e reduz a necessidade de fiscalização e de administração tributária. Assim, libera recursos para serem orientados ao controle dos gastos, garantindo-lhes a desejada progressividade redistributiva.

Cabe lembrar ainda que os impostos indiretos estão sendo paulatinamente resgatados do ostracismo em que foram colocados por intransigentes defensores da progressividade tributária.

O conceito da "progressividade a qualquer custo" vem sofrendo um rápido processo de desgaste, do ponto de vista de políticas públicas. Além de ineficaz, a progressividade na arrecadação de impostos diretos tem desincentivado o investimento e introduzido elementos de estagnação econômica nas economias onde é aplicada com excessiva intensidade. Daí um certo declínio nas economias desenvolvidas.

Neste sentido, os impostos indiretos alcançam novas posições nos modelos tributários atuais. Impostos indiretos não são necessariamente regressivos por duas razões básicas. Em primeiro lugar, porque as alíquotas não precisam ser uniformes, o que lhes pode conceder características de maior progressividade. Em segundo lugar, porque eles são mais fáceis, mais baratos, e encontram menor resistência para ser arrecadados.

Já foi dito que "o imposto justo é o que se consegue cobrar". Há uma inegável constatação de que os impostos indiretos são mais facilmente arrecadados por acharem-se incluídos no preço de mercado dos produtos e serviços.

Com isto não é exigida a ativa participação do próprio contribuinte na apuração e no recolhimento do imposto, como é praxe nos impostos diretos que exigem declarações. Ademais, ao adquirir um produto, o contribuinte iguala o preço à sua utilidade marginal. Há um equivalente, em termos de utilidade subjetiva, em cada cruzeiro de imposto recolhido indiretamente, o que não ocorre com os impostos diretos, quando o contribuinte desembolsa o imposto sem contrapartida direta de aumento de seu bem-estar subjetivo.

Defensores da progressividade tributária apontam para os méritos do imposto de renda. Seria o ideal, afirmam eles. Contudo, do ponto de vista administrativo, o imposto de renda perde grande parte de sua atratividade por incentivar a sonegação e pelas dificuldades de arrecadação. Do ponto de vista teórico, se não houvesse evasão, poderia ser um imposto adequado. Mas o conflito entre o idealismo conceitual e a realidade administrativa acaba por negar seus méritos teóricos.

Na formulação de política tributária, há que se ouvir o policy maker, o administrador público, e não apenas os economistas, tão ciosos de seus modelos quanto cegos à inexorável imposição da realidade.

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