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2 O PAPEL DO ESTADO AVALIADOR NA ELABORAÇÃO E

3.1 Avaliação: tipologias e contextos

O conceito e aplicação do processo avaliativo têm sido pauta, historicamente, de discussões e embates no campo da educação. Do processo de mensuração e descrição das características intrínsecas a um objeto, instituição, programa ou desempenho do aluno, passou-se à formulação de um juízo de valor sobre estes.

O estudo histórico da avaliação, bem como sua evolução enquanto objeto de pesquisa levou autores como Guba e Lincoln (1982), resgatado em Escudero (2003) e Vargas (2004) a dividirem a avaliação em cinco gerações, detalhadas a seguir.

A primeira geração recebeu destaque no fim do século XIX e início do século XX, influenciada pela Psicometria11, o ato de avaliar, durante essa geração estava associado ao ato de medir, demonstrando a forte influência positivista na educação, buscava-se encontrar diferentes pontuações que definissem a posição do aluno dentro do grupo ao qual pertencia.

A segunda geração surge por volta de 1930 com Ralph Tyler, considerado o precursor da avaliação educacional. Tyler buscou fornecer ao conceito de avaliação o caráter científico, partindo da ideia de determinar os resultados alcançados a partir dos objetivos propostos previamente, nessa perspectiva, os objetivos preestabelecidos deveriam ser a referência central na avaliação, pois marcavam o desenvolvimento individual dos alunos.

Com o fim da Segunda Guerra Mundial, o contexto histórico dos anos 1950 e 1960 foi marcado pela disputa da hegemonia política, econômica e militar, período que ficou conhecido como Guerra Fria e teve como protagonistas os Estados Unidos da América (EUA) e a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS). Tal disputa estabelecia-se também no campo científico, e em particular, na corrida espacial. O descrédito direcionado a escola pública americana na época também foi elemento marcante e transformou-se em estímulo

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Este campo de estudos possuía em seu formato uma relação íntima entre avaliação e mensuração (ato de medir). O objetivo da Psicometria era estabelecer as diferenças individuais a partir de modelos de características que a psicologia da época oferecia. Atualmente o enfoque da Psicometria baseia-se em novos modelos de medida, conhecidos genericamente pelo nome de Teoria da Resposta ao Item (TRI) (ANDRIOLA, 2010).

para o aumento de investimentos e a indução aos estudos avaliativos, de modo a alavancarem- se as reformas promovidas. O estímulo à mudança educacional impulsionou a busca pela compreensão das deficiências do sistema, as possibilidades de mudança e os resultados pós- reformas (ESCUDERO, 2003).

Destaca-se, nesse momento, a atividade de prestação de contas (accountability), pois uma vez injetadas grandes quantias de verbas públicas, esperava-se um retorno que fosse capaz de justificar e subsidiar novos aportes financeiros. Nesse momento é posto em relevo, ainda que embrionariamente, os questionamentos acerca do uso dos resultados da avaliação no contexto das pesquisas científicas, inaugurando, assim, a terceira geração.

De acordo com Escudero (2003), durante os anos 1970 ocorreu a consolidação das pesquisas em avaliação, gerando diversos modelos avaliativos. Os EUA passam a investir no desenvolvimento de material de pesquisa para os avaliadores. A questão central girava em torno dos propósitos da avaliação e a influência dos resultados no cotidiano escolar. Para isso, vários autores dedicaram-se a organizar desenhos de pesquisa bem fundamentados e organizados a partir de critérios, enquanto outros buscavam compreender o papel da avaliação no contexto escolar, criando nomenclaturas de avaliação e promovendo a ―eclosão de modelos‖ (MATEO, 1986). Importante destacar que Guba e Lincoln (1982) contabilizam mais de 40 modelos propostos nesta década.

Depresbiteris e Tavares (2009) explicam que Michael Scriven agregou aos estudos sobre avaliação da época a ideia de mérito, valor do que está sendo objeto da avaliação (programas, currículos, materiais, desempenhos dos alunos, entre outros). No entanto, um de seus maiores feitos foi estabelecer os conceitos de avaliação formativa e avaliação somativa.

Para o autor, a avaliação formativa permite identificar o valor de um programa simultaneamente ao acontecimento de tais atividades. Este tipo de avaliação centra-se no processo, uma vez que a ação ainda encontra-se em andamento. Seu principal objetivo é identificar as deficiências para que as intervenções adequadas possam ocorrer concomitantemente à ocorrência dos processos ou atividades. A avaliação somativa permite julgar o valor de um processo ao final deste (soma), revelando o foco no resultado. Todas as avaliações podem ser somativas, ou seja, têm o potencial de servir a uma função somativa, mas apenas algumas têm a capacidade adicional de servir à função de formação.

Depresbiteris e Tavares (2009) explicam que Daniel Stufflebeam (1971) avançou no sentido de dar continuidade aos estudos sobre avaliação, acrescentado-lhe a concepção de tomada de decisão. O autor em questão, juntamente com Guba, Hammond e Provus, Stufflebeam, concebeu o modelo conhecido pelo anagrama CIPP, para designar contexto,

inputs, processos e produtos. De acordo com estes autores, em cada uma dessas fases deve-se avaliar e tomar decisões acerca da próxima fase. A avaliação, nesse contexto, se configuraria como resultado de um processo sistemático e contínuo, cujas características primordiais seriam o fornecimento de informações úteis ao julgamento das alternativas de decisão.

As teorias e os autores da quarta geração da avaliação educacional pretenderam superar as deficiências das gerações anteriores, dentre as quais: ―visão gestora da avaliação, escassa atenção ao pluralismo de valores e excessivo apego ao paradigma positivista‖ (ESCUDERO, 2003 p. 24). No que se refere à redução do caráter positivista, deixa-se de lado a verificação e passa-se a ter uma postura de descobrimento, aproximando-se dos fatores contextuais inerentes ao processo.

David Fetterman (2001) prossegue os estudos durante os anos 1990 e assenta as bases da quinta geração. Nesta geração, o uso político dos resultados é um princípio primordial da avaliação. A medida que as gerações avançam, o ranço positivista perde espaço, fala-se nos sujeitos envolvidos, os resultados e os impactos causados. Haja vista a quantidade de modelos avaliativos desenvolvidos, muitos confundem-se entre as gerações, uma vez que o surgimento de uma não anula a existência das demais.

Atualmente a concepção e o conceito de avaliação tem se estruturado envolto em uma série de concordância e discordância entre os educadores. São inúmeras e, quase sempre, inconciliáveis as razões que apresentam para que o consenso não seja alcançado, no entanto, estes sujeitos convergem quando a questão refere-se á complexidade do fenômeno da avaliação.

Independente da profundidade de análise que fazem ou da lógica que usam para justificar as razões desta complexidade, há acordo que a avaliação é uma categoria particularmente especial e árida. As formas práticas de lidarem com a avaliação, inclusive, tornam a refletir os diferenciados posicionamentos ético-epistemológicos que embasam as escolhas aparentemente técnicas que fazem. Como se percebe, identificam-se nas dificuldades e distanciam-se nas eventuais formas de superação destas. Isso deve significar alguma coisa (SORDI, LUDKI, 2009, p.314)

Para este trabalho nos apoiamos na ótica de Sant‘Anna (1998), que compreende a avaliação como: ―um processo pelo qual se procura identificar, aferir, investigar e analisar as modificações do comportamento e rendimento do aluno, do educador, do sistema, confirmando se a construção do conhecimento se processou, seja este teórico (mental) ou prático‖. (p.29-30).

Essa perspectiva compreende que a avaliação não está associada apenas ao ato de avaliar o aluno, mas o contexto escolar na sua totalidade, permitindo a realização de

diagnóstico para trabalhar em prol da superação das dificuldades de aprendizagem. Para Both (2007), a avaliação deve estar atrelada a qualidade do ensino, ultrapassando os limites da verificação. Corroborando com esse autor, Demo (1999) chama atenção para o fato de que

Refletir é também avaliar, e avaliar é também planejar, estabelecer objetivos etc. Daí os critérios de avaliação, que condicionam seus resultados estejam sempre subordinados a finalidades e objetivos previamente estabelecidos para qualquer prática, seja ela educativa, social, política ou outra. (p.01).

O processo avaliativo, portanto, demanda reflexão, planejamento e objetivos para se atingir, sem esquecer que a proposta de avaliação que se defende em determinado espaço ou período histórico está associada ao processo educativo, social e político, ou seja, ao projeto maior de sociedade. Assim, Libâneo (1994) explica que a avaliação é

Uma tarefa didática necessária e permanente do trabalho docente, que deve acompanhar passo a passo o processo de ensino e aprendizagem. Através dela, os resultados que vão sendo obtidos no decorrer do trabalho conjunto do professor e dos alunos são comparados com os objetivos propostos, a fim de constatar progressos, dificuldades, e reorientar o trabalho para as correções necessárias. A avaliação é uma reflexão sobre o nível de qualidade do trabalho escolar tanto do professor como dos alunos. Os dados coletados no decurso do processo de ensino, quantitativos ou qualitativos, são interpretados em relação a um padrão de desempenho e expressos em juízos de valor (muito bom, bom, satisfatório, etc.) acerca do aproveitamento escolar. A avaliação é uma tarefa complexa que não se resume a realização de provas e atribuição de notas. A mensuração apenas proporciona dados que devem ser submetidos a uma apreciação qualitativa. A avaliação, assim, cumpre funções pedagógico-didáticas, de diagnóstico e de controle em relação as quais se recorrem a instrumentos de verificação do rendimento escolar. (p. 195).

Avaliação é, portanto, um instrumento permanente do trabalho docente, cujo intuito é observar se a aprendizagem está ocorrendo, utilizando como instrumento para reflexão acerca da qualidade do trabalho escolar, tanto do aluno quanto do professor, podendo gerar mudanças significativas.

A avaliação pode se expressar de diferentes formas a depender da proposta, concepção e objetivos a serem atingidos. Segundo Santos (2005) avaliação é algo bem mais complexo do que apenas atribuir notas sobre um teste ou prova que se faz, ela deve estar inserida no processo de aprendizagem do aluno podendo se expressar, das seguintes formas: Cumulativa: permite reter tudo aquilo que se vai aprendendo no decorrer das aulas possibilitando que o docente acompanhe o aluno cotidianamente, e utilizar quando necessário; Diagnóstica: auxiliando o professor a detectar o que já foi apreendido ou não pelos alunos

diante do que foi trabalhado em sala ou para investigar o conhecimento prévio do aluno, e assim retomar os conteúdos que o aluno não conseguiu aprender ou desconhece, replanejando suas ações, trabalhando nas lacunas, necessidades e atingindo os objetivos propostos; Autoavaliação: podendo ser realizada tanto pelo aluno quanto pelo docente, para se ter consciência do que se aprendeu ou se ensinou e assim melhorar o processo de ensino e de aprendizagem. Para além dessas dimensões da avaliação, o processo formativo e somativo também se materializam como possibilidades, como já foi mencionado anteriormente nesse tópico.

Importante ressaltar que essas dimensões não apresentam limites bem definidos, podendo se utilizar mais de uma em um mesmo ano escolar a depender dos objetivos que se quer atingir. Atualmente a avaliação educacional tem se desdobrado em um tipo de avaliação que nem sempre dialoga com essa perspectiva reflexiva, dialógica e processual que se discutiu até aqui. Esse desdobramento tem recebido o nome de avaliação em larga escala e será explorada no tópico a seguir.