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O Banco Central Europeu possui uma estrutura bastante específica e recente. Suas características ainda estão sendo postas à prova, entretanto, ele vem modificando o conceito de autoridade monetária internacional.

Conhecido como BCE, o Banco Central Europeu foi criado em janeiro de 1999, quando 11 países europeus abandonaram suas moedas nacionais e adotaram o euro como moeda comum, colocando a política monetária conjunta nas mãos dessa instituição. Tornou-se, nesse momento, de maneira instantânea, uma instituição extremamente importante: embora nenhuma nação europeia tenha uma economia que seja próxima da economia dos Estados Unidos, o conjunto das economias da Zona do Euro, o grupo de países que adotou o euro como moeda,

92 Haroldo Malheiros Duclerc Verçosa ilustra que há uma acentuada preocupação com a

transparência do sistema perante a sociedade, devendo a junta de governadores, a esse propósito, publicar, semanalmente, informações sobre a situação de cada banco federal de reserva, isoladamente e de forma consolidada sobre todos eles. Tais documentos devem demonstrar, pormenorizadamente, a composição do ativo e do passivo dos bancos federais de reserva, individual e de forma consolidada, e fornecer plenas informações sobre as reservas disponíveis e a natureza e vencimento dos títulos e outros investimentos de tais instituições. Cf. Bancos centrais no

direito comparado: o Sistema Financeiro Nacional e o Banco Central do Brasil (o regime vigente e

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tem, aproximadamente, o mesmo tamanho que a economia dos Estados Unidos. Como consequência, o BCE e o FED são os dois gigantes do mundo monetário.93

É importante observar que os países da Europa, desde a instituição do padrão-ouro, quando surgiram os primeiros Bancos Centrais, procuram articular-se para proporcionar certa uniformidade no que tange à condução da política externa. A busca por uma atuação coordenada, e muitas vezes até protecionista, dos Estados nacionais europeus parece mesmo uma história antiga.

As inúmeras guerras enfrentadas pelo continente possuem, sem dúvida, um conteúdo de disputa pelo poder, pela hegemonia e pela liderança, especialmente no que tange à Inglaterra, França e Alemanha. Com efeito, a União Europeia possibilitou que, juntas, essas potências alcançassem aquilo que sozinhas não conseguiriam: enfrentar em pé a consolidação do imperialismo, germinado com a eclosão da Segunda Guerra Mundial e fertilizado com a adoção da paridade do dólar, do ouro e, posteriormente, o padrão-dólar como padrão mundial.94

Assim, a Europa, para se proteger das crises econômicas em meio à globalização, e não ficar para trás dos Estados Unidos, a partir da segunda metade do século passado, integrou-se para se fortalecer.

Essa estrutura é resultado de um longo e paulatino processo de integração e maturação de ideias, e vem logrando sucesso desde os primeiros estágios de sua formação até os dias de hoje, em que a moeda única, o euro, circula pelos países que a adotaram, com uma política monetária emanada do organismo supranacional mais bem-sucedido de nossa era, a União Europeia, instituído pela assinatura do Tratado da União Europeia (TUE), em Maastricht, em 1992.95

Florinda Figueiredo Borges enfatiza que, após a assinatura do referido Tratado, foi possível identificar três fases distintas de evolução pela qual passou a

93 KRUGMAN, Paul; WELL, Robin. Macroeconomia. Rio de Janeiro: Elsevier, 2015, p. 102.

94 BORGES, Florinda Figueiredo, Intervenção estatal na economia: o Banco Central e a execução das

políticas monetária e creditícia, p. 103.

95 O Tratado sobre a União Europeia (TUE), firmado em Maastricht, em 17 de fevereiro de 1992, e

que entrou em vigor em 1º de novembro de 1993, instaurou uma nova etapa no processo de criação de uma união mais estreita entre os Estados europeus. Seus principais objetivos são a criação de um espaço sem fronteiras internas, com o reforço da coalisão econômica e social e a instauração de uma união econômica e monetária. Visa, ainda, ao desenvolvimento de estreita cooperação nos setores de justiça e dos negócios internos, além de uma atuação de política externa e de segurança comum, incluindo uma possível defesa comum dos Estados-membros. Cf. VILLATORE, Marco Antonio Cesar. Direito Internacional do trabalho. Curitiba: Iesde, 2011, p. 32.

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União Europeia.96 A primeira delas, entre 1990 e 1993, caracterizou-se pela constituição de um mercado único europeu, possibilitando a livre circulação de pessoas, mercadorias, capital e serviços na Europa. A segunda fase teve início com a criação do Instituto Monetário Europeu e durou de 1994 a 1998. Trata-se do período mais decisivo na formação do Bloco, tendo em vista que possibilitou a real integração e a equiparação econômica entre os países, e foi dedicada aos preparativos técnicos para a moeda única e ao reforço da uniformidade das políticas monetárias dos Estados-membros. A terceira e última fase iniciou-se em 1999, com a fixação das taxas de câmbio, a transferência da responsabilidade pela política monetária dos Bancos Centrais nacionais para o Banco Central Europeu e, finalmente, com o euro passando a ter um curso legal em 1º de janeiro de 2002.

Com a evolução do sistema, o número de países integrantes também cresceu gradualmente, à medida que as etapas evolutivas do projeto foram tomando corpo e ganhando credibilidade. Essa adesão em massa das nações europeias, especialmente da Europa Oriental, teve de ocorrer de forma equilibrada, a fim de não gerar desestabilizações para o Bloco. Nesse sentido, foram estatuídos os critérios de Copenhagen, os quais propunham um sistema de convergência hábil a determinar se os países estariam ou não prontos para ingressar na União Europeia, passando à próxima fase.

No que tange às estratégias econômicas do Bloco, existe o Sistema Europeu de Bancos Centrais (SEBC), composto pelo Banco Central Europeu e pelos Bancos Centrais de todos os Estados-Membros. Como nem todos os Estados-membros adotam a moeda única, o Conselho do BCE cunhou o termo Eurosistema para descrever o modo como o SEBC executa as suas funções dentro da área do euro. O Eurosistema é assim composto pelo BCE e pelos Bancos Centrais dos Estados- membros que adotam o euro. Em virtude de disposições do TCE (artigo 122), dos Estatutos (artigo 43) e dos Protocolos anexos ao TCE (Protocolo 25, relativo a certas disposições relacionadas com Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, e Protocolo 26, referente a certas disposições respeitantes à Dinamarca, ambos de 1992), várias menções ao SEBC e aos Estados-membros da União Europeia devem

96 Intervenção estatal na economia: o Banco Central e a execução das políticas monetárias e

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ser entendidas como se fossem, respectivamente, ao Eurosistema e aos Estados- membros que adotam a moeda única.97

O objetivo primordial do Eurosistema é manter a estabilidade de preços, tal como definido no artigo 105 do Tratado. Deve, também, apoiar as políticas econômicas gerais da Comunidade Europeia.

Além disso, o TUE impõe que o Banco Central do respectivo país seja independente. Nesse sentido, ao exercer as funções relacionadas com o Eurosistema, o BCE não deve solicitar ou receber instruções de instituições ou organismos comunitários, dos governos dos Estados-membros ou de qualquer outra entidade.

No momento de definição e execução das políticas monetárias, o Eurosistema é também independente. O BCE está autorizado a decidir autonomamente como e quando utilizar os mecanismos hábeis a conduzir a política monetária, de acordo com os objetivos estabelecidos para a economia do SEBC. Por fim, não é permitido ao Eurosistema conceder empréstimos a organismos comunitários ou a entidades do setor público nacional, pois isso poderia interferir e comprometer o seu acordo com a independência.

De todo o exposto, no que tange ao Banco Central Europeu, verifica-se que a estrutura supranacional gerada pela política financeira para fortalecer os países membros da União Europeia é bastante diferenciada e passa por uma fase de testes. Não é possível, ainda, afirmar que seus objetivos serão completamente atingidos, tampouco que todos os países permanecerão aderentes a tal estrutura, mesmo quando frontalmente os comandos supranacionais desagradarem seus interesses e necessidades.

A verdade é que, em larga medida, os países integrantes da União Europeia abriram mão de sua soberania em troca de promessa de incremento nas atividades comerciais, do desenvolvimento e, também, da proteção de uma entidade política mais forte e respeitada no cenário internacional. Isso porque, somente unidos, os países da Europa poderiam concorrer em pé de igualdade com a potência norte- americana.

97 VALERIO, Alexandre Scigliano. Direitos do Bloco de Integração: contribuição para uma teoria geral

e para uma crítica com base nos princípios fundamentais da União Europeia. 2013. Tese (Doutorado em Direito) – Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2013, p. 174.

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Portanto, a partir do momento em que decidiram se unir, esses países assumiram o ônus de agir de acordo com as determinações superiores, e de forma coordenada, tendo deixado de possuir todas as características definidoras do Estado Moderno como o conhecemos, uma vez que não têm mais liberdade para escolher os seus próximos passos conforme suas necessidades e peculiaridades, a não ser de forma coordenada com todos os outros membros.