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3.10 Regulação do Banco Central e a contribuição para o desenvolvimento

3.10.3 Pleno emprego

3.10.3.1.1 Trabalho

Na Antiguidade, o trabalho era entendido como a atividade dos que haviam perdido a liberdade. O seu significado confundia-se com o de sofrimento ou infortúnio. Isso porque o homem, no exercício do trabalho, sofre ao vacilar sob um fardo. O fardo pode ser invisível, pois, na verdade, é o fardo social da falta de independência e de liberdade, como entende Robert Kurz.356

Nas palavras de Aimoré Woleck:

Os gregos utilizavam duas palavras para designar trabalho, a palavra

ponos, que faz referência a esforço e à penalidade, e ergon, que designa

criação, obra de arte. Isso estabelece a diferença entre trabalhar no sentido de penar, ponein, e trabalhar no sentido de criar, ergazomai. Parece que a contradição “trabalho-ponos” e “trabalho-ergon” continua central na

354 O emprego no desenvolvimento da nação, p. 10.

355 Segundo matéria publicada na Folha de S. Paulo, o mercado de trabalho brasileiro passou por

uma significativa piora em 2015, com reflexos sobre o emprego, a renda e a formalização do trabalho. Cf. PAMPLONA, Nicola. Taxa de desemprego do Brasil cresce para 8,5% na média de

2015. Folha de S. Paulo, São Paulo, 15 mar. 2015. Disponível em:

<http://www1.folha.uol.com.br/mercado/2016/03/1750059-taxa-de-desemprego-do-brasil-cresce- para-85-na-media-de-2015.shtml>. Acesso em: 20 mar. 2015.

356 A origem destrutiva do capitalismo: modernidade econômica encontra suas origens no

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concepção moderna de trabalho. Pode-se observar em diferentes línguas (grego, latim, francês, alemão, russo, português) que o termo trabalho tem, em sua raiz, significados: esforço, fardo, sofrimento e criação, obra de arte, recriação.357

O referido autor ainda salienta que é por meio do trabalho que o homem cria coisas a partir do que extrai da natureza, convertendo o mundo num espaço de objetos partilhados.358

O trabalho, na Antiguidade, não se desvinculava do entendimento da escravatura, que foi um recurso usado para excluí-lo da condição de vida do homem. Essa exclusão só podia ser viabilizada pela institucionalização da escravatura, dadas a capacidade de produção e a concepção de vida e de sociedade vivenciadas no período. Já no final da Idade Média, expressava-se o trabalho com o sentido positivo que passou a incorporar: era encarado como uma ação autocriadora, e o homem, em seu trabalho, como senhor de si e da natureza. Deu-se valorização positiva ao trabalho, considerado, então, como um espaço de aplicação das capacidades humanas.359

No século XVIII, com a ascensão da burguesia, o desenvolvimento das fontes produtivas, a transformação da natureza e a evolução da técnica e da ciência, enfatizou-se a condenação do ócio, sacralizando-se o trabalho e a produtividade. Na Idade Moderna, passou-se a fazer diferenciação entre o trabalho qualificado e o não qualificado, entre o produtivo e o não produtivo, aprofundando-se a distinção entre o trabalho manual e o intelectual. Essas concepções diferenciadas não deixam de ser o entendimento subjacente à distinção fundamental entre labor e trabalho do período helênico. O que ocorreu foi o deslocamento do labor, que possui, tanto na esfera pública como na esfera privada, uma produtividade própria, por mais fúteis ou pouco duráveis que sejam os seus produtos e seu consumo. Nessa era, o trabalho tornou- se uma atividade compulsiva e incessante; a servidão tornou-se liberdade, e a liberdade, servidão.360

O trabalho é a categoria que funda o desenvolvimento do mundo dos homens como uma esfera distinta da natureza; não é apenas a relação dos homens entre si no contexto da reprodução social, visto que o seu desenvolvimento exige o

357 O trabalho, a ocupação e o emprego: uma perspectiva histórica. Revista de Divulgação Técnico-

científica do Instituto Catarinense de Pós-Graduação, p. 3.

358 Ibidem, loc. cit. 359 Ibidem, p. 4.

360 KURZ, Robert, A origem destrutiva do capitalismo: modernidade econômica encontra suas origens

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desenvolvimento concomitante das relações sociais. O modo antigo de produção baseia-se no trabalho do escravo; o feudal, no trabalho dos servos da gleba; o capitalista, no trabalho do empregado assalariado.361

Tecidas essas considerações, relevante se faz discorrer um pouco sobre o trabalho na Constituição Federal de 1988.

O trabalho é inerente à condição humana, que necessita dele para a subsistência. Desse fato fundamental, é possível induzir, de imediato, a necessária correlação dos direitos fundamentais dele decorrentes.

A necessidade histórica do direito ao trabalho, como garantia da efetividade dos direitos fundamentais individuais, afirma-se na proteção constitucional. Pois a Constituição prescreve ordens de proteção do trabalho no Título I, nos princípios fundamentais; no Título II, no rol de direitos e garantias individuais, sociais e coletivos; no Título VII, quando trata da ordem econômica e financeira, assentada na livre iniciativa e na valorização do trabalho humano, em vista da garantia da existência digna a todos, conforme os ditames da justiça social, por meio da busca do pleno emprego (artigo 170, caput e inciso VIII); e no Título VIII, ao cuidar da ordem social, colocada sob o primado do trabalho e os objetivos do bem-estar e da justiça social (artigo 193).

Cabe ao Estado o compromisso político definitivo de proteção do direito ao trabalho. Interessa, aqui, estabelecer que o mesmo dever também cabe à sociedade. E isso decorre não só da dimensão objetiva do direito ao trabalho, obviamente de eficácia universal própria das normas jurídicas, base para a sua irradiação sobre todos os âmbitos, e, portanto, também sobre o Direito Privado.362

Robert Alexy afirma que a Constituição adotou os princípios da livre iniciativa, da liberdade individual de trabalho e da economia de mercado (artigo 1º, inciso IV; artigo 5º, inciso XIII; e artigos 170 e 173), reconhecendo aos particulares a liberdade que constitui a razão pela qual sobre o objeto do Direito do Trabalho “o Estado tem controle apenas limitado”, não lhe sendo possível, desse modo, obrigar alguém a prestar trabalho. 363

Segundo Carmén Camino, o Direito do Trabalho se materializa nos contratos de trabalho, em geral, e nos contratos de emprego. No plano das relações entre

361 WOLECK, Aimoré, O trabalho, a ocupação e o emprego: uma perspectiva histórica. Revista de

Divulgação Técnico-científica do Instituto Catarinense de Pós-Graduação, p. 5-6.

362 ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 101. 363 Ibidem, loc. cit.

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empregado e empregador, a Constituição Federal, buscando alcançar um maior equilíbrio na relação contratual, tanto individual quanto coletiva, esmerou-se em determinar o denominado contrato mínimo – o que evoca a garantia do mínimo existencial –, em seus artigos 7º a 11, além de incluir, indiretamente, no artigo 114, a judicialização de outros direitos individuais, sociais e coletivos.364