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3.3.1 Princípios do Direito

3.3.1.2 Princípios gerais do Direito Financeiro

Nesta subseção, será apresentada a visão de Eduardo Marcial Ferreira Jardim sobre os princípios constitucionais de índole financeira. O referido autor trabalha os seguintes princípios: estrita legalidade, anualidade, universalidade, unidade, proibição de estorno, especialização e publicidade.203

O primado da legalidade, em sua feição genérica, comunica efeitos a todo o Direito. Sem dúvida, é um dos princípios sobranceiros do sistema normativo brasileiro, daí representar, também, um dos vetores do Sistema Constitucional Financeiro.

Genericamente considerada, a legalidade significa que apenas a lei pode criar direitos e deveres, consoante preceitua o artigo 5º, inciso II, da Carta Magna.

A função administrativa, verbi gratia, traduz hipótese de atividade infralegal, portanto, sujeita à preeminência da legalidade lato sensu. Exemplifica hipótese do

202 Direito econômico, p. 76-103.

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princípio em apreço a disposição legal que investe a Administração Pública de poderes para exercer a atividade censória relativa a espetáculos teatrais ou cinematográficos, pois, nesses casos, a lei formula um conceito indeterminado que deve ser aquilatado e implementado pelo Executivo, segundo critérios subjetivos. Igual sorte se verifica, amiúde, nos mais variados campos do Direito.204

No Sistema Financeiro, por outro lado, a legalidade assume foro de intenso rigor, donde adjetivar-se como estrita, pois nessa seara não basta a lei criar um dado direto ou dever apenas em tese, mas é de mister fazê-lo de modo exaustivo e pormenorizado, emitindo conceitos determinados, de que falam Larenz e Roxin, em contranota aos comandos incompletos ou elásticos. Como corolário, temos que a estrita legalidade não deixa espaço para o Executivo expedir decretos que introduzam critérios subjetivos na aplicação da lei, vedando, ainda, a edição de atos administrativos discriminários.205

A legalidade estende-se aos programas, às operações de crédito, à transposição de recursos de uma dotação orçamentária para outra, à abertura de crédito suplementar etc.

Jardim classifica a anualidade como comportando dois sentidos, pois tanto pode significar o lapso temporal de vigência da lei orçamentária como pode dizer respeito ao pré-requisito que autoriza a cobrança dos tributos num dado exercício, na medida em que estejam eles incluídos no orçamento.206

Ilmo José Wilges sustenta que o princípio da anualidade orçamentária indica que o Poder Legislativo deve exercer o controle político sobre o Executivo pela renovação anual de permissão para a cobrança de tributos e a realização de gastos, sendo inconcebível a perpetuidade ou a permanência da autorização para a gestão financeira.207

Por sem dúvida, a anualidade representa uma expressiva manifestação do postulado da segurança jurídica. Nesse sentido, constitui um limite ao poder interventivo do Estado Democrático de Direito, pois a cada ano os mandatários do povo votam e aprovam o respectivo orçamento. Com isso, evita-se a adoção de um período mais amplo, que poderia desequilibrar a atuação do Estado, que pela estipulação de poderes excessivos ao Executivo, como meio de tornar exequível um orçamento a longo prazo, quer, na hipótese inversa, pela restrição dos poderes do Executivo, comprometendo, assim, o próprio interesse público. Sobremais, um período menor do que um ano seria insuficiente para a realização dos objetivos públicos.208

De acordo com esse princípio, o orçamento pode subordinar-se ao regime de caixa, ao orçamento de gestão ou ao regime de competência.

204 JARDIM, Eduardo Marcial Ferreira, Manual de direito financeiro e tributário, p. 67. 205 Ibidem, loc. cit.

206 Ibidem, p. 68.

207 Finanças públicas: orçamento e direito financeiro. Porto Alegre: AGE, 2006, p. 106. 208 JARDIM, Eduardo Marcial Ferreira, op. cit., p. 69.

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Jardim salienta que, no Brasil, o princípio da universalidade foi adotado com a postura preconizada na doutrina francesa, que entrevê, no aludido princípio, não só a obrigatoriedade de registro de todas as receitas e despesas, mas a não afetação das receitas públicas como um aspecto mais profundo a prescindir o orçamento público.209

Wilges ressalta que o princípio da universalidade estabelece as parcelas da receita e da despesa que devem figurar em bruto orçamento, isto é, sem quaisquer deduções. Esse princípio, hoje, tem sentido de globalização orçamentária, significando a inclusão de todas as rendas e despesas dos Poderes, fundos, órgãos, entidades da Administração direta e indireta etc.210

Vale notar que a contabilização de todas as receitas e despesas, conquanto represente algo aparentemente óbvio, exprime um importante avanço na contabilidade pública, em termos de rigor técnico e de moralidade administrativa.

Já o princípio da unidade, conforme Jardim, estava consagrado na Constituição de 1934, por meio do seu artigo 50 e, na Carta Magna de 1937, pelo artigo 68, assim como no Estatuto Político de 1946, por intermédio do artigo 73. Para o autor, a unidade ganhou cores novas e passou a denotar a existência de um orçamento básico, em torno do qual se agregam orçamentos miniaturas, que, ao cabo de contas, se incorporam e se integralizam ao aludido orçamento-base, compondo um todo indivisível. Essa é a visão atual do postulado da unidade.211

Como salienta Wilges, segundo a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 165, § 8º, a lei orçamentária anual não conterá dispositivo estranho à previsão de receita e à fixação de despesa, não se incluindo na proibição a autorização da abertura de créditos suplementares e a contratação de operações de crédito, inclusive por antecipação da receita, nos termos da lei.212

Para Jardim, trata-se de um princípio positivado na Lex Suprema, o qual já fora constitucionalizado em Textos anteriores. Com efeito, o aludido comando proíbe expressamente que a lei orçamentária contenha disposições estranhas a receitas e despesas.213

Quanto à proibição de estorno, em resumo, Wilges entende que esse

209 Manual de direito financeiro e tributário, p. 70.

210 Finanças públicas: orçamento e direito financeiro, p. 108. 211 Op. cit., p. 72.

212 Op. cit., p. 103. 213 Op. cit., p. 73.

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princípio proíbe a transferência de recursos de uma dotação orçamentária para outra, sem que, para tanto, haja uma prévia autorização do Poder Legislativo.214

Por fim, os princípios de especialização e publicidade. O primeiro, de acordo com Jardim, é tido por alguns autores, como José Afonso da Silva, e na doutrina francesa, como o primado da especialização, cujo significado compreende a obrigatoriedade de pormenorização de todas as receitas e despesas públicas, vale dizer, a lei do orçamento haverá de especificá-las e identificá-las, sublinhando rigorosamente a sua origem e sua destinação. O segundo não representa um princípio orçamentário exclusivamente, mas um postulado magno de índole genérica, como tanto se conhece, e, por isso mesmo, aplicável a todo o Direito.215

3.4 Regulação e Sistema Financeiro

Especificamente em relação aos bancos, Hyman Minsky aponta que, segundo a literatura sobre sistemas bancários, banqueiro prudente seria aquele que “aceita apenas aquantidade certa de risco”.216

Embora a busca pelo lucro seja uma constante, a forma como ela é realizada se altera conforme a evolução da economia. Com as intervenções governamentais nos bancos insolventes e com a criação de seguros aos depositantes, estes passaram a acreditar que seria desnecessária a fiscalização da ação do banqueiro, fato que acabaria lhe dando mais liberdade de ação. Da mesma forma, o controle do mercado também seria amenizado quando se conta com o auxílio governamental.

Minsky assinala que as mudanças na economia ocorridas ao longo da história levaram a alterações na teoria econômica. Nesse sentido, logo após a crise de 1929-1933, estava legitimada a regulação financeira. A literaturabancária tradicional se consolidou no sentido de que os bancos deveriam ser solventes e com liquidez. Já a partir da década de 1970, essa tradição foi deixada de lado, sendo acompanhada por um movimento de desregulamentação, e os bancos passaram a se expor demais, em parte em razão da expectativa de socorro pelas autoridades governamentais, por meio de injeções de liquidez (bail-outs).217

214 Finanças públicas: orçamento e direito financeiro, p. 113. 215 Op. cit., loc. cit.

216 Estabilizando uma economia instável. Tradução de Sally Tilelli. Osasco: Novo Século, 2009, p.

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A atuação estatal provocaria instabilidade, na medida em que interromperia um fluxo natural da estrutura capitalista. Essa instabilidade acabaria gerando incerteza, que, por sua vez, inibiria investimentos de longo prazo.218 Em um ambiente de incerteza, o instrumento mais adequado para defesa é o mais líquido, o instrumento financeiro. Em última análise, a instabilidade levaria a um ambiente propício à especulação financeira, em busca de ganhos no curto prazo, prejudicando a atividade produtiva. Um elemento-chave da crise seria a fuga de capitais. A solução para essa crise, com a injeção de liquidez pelos financiamentos de última instância, gera potencialidades para a inflação.219

Segundo Minsky, restaria apenas o controle da análise bancária, com técnicas contábeis superficiais que não conhecem a realidade de cada negócio. Enfim, de acordo com o autor, a ausência de controles efetivos, aliada à pressão por lucros, leva ao alavancamento e a desajustes no fluxo de caixa.220

José Xavier Carvalho de Mendonça já mencionava que havia muita discussão sobre a necessidade de fiscalização dos bancos. Em sua visão, haveria, fundamentalmente, duas posições:

A que defendia a total liberdade, fundada principalmente no fato de que os tomadores de crédito seriam já pessoas do comércio, da indústria e profissionais que não necessitariam de tutela; e a corrente que afirmava a necessidade de uma completa regulamentação, para manter o grau de crédito e garantir os depósitos, além de pregar que essa regulamentação deveria ser específica, em razão da peculiaridade da atividade bancária, cuja falência afetaria a vida da sociedade. Com relação a essa segunda corrente, haveria a teoria de que a regulamentação deveria ser rígida e uniforme para todos os bancos e a teoria que admitiria uma disciplina facultativa, com vantagens para os que a ela se submetessem.221

Após mencionar essas teorias, Mendonça expressa a opinião de que a fiscalização dos bancos meramente comerciais geraria dois problemas. De um lado,

218 Por outro lado, “[...] com a recessão nas vendas, nem mesmo com taxa de juros mínima, ninguém

acha que pode tomar empréstimos, investir e ganhar dinheiro. O dinheiro simplesmente se acumula nos bancos, pois deixa de haver demanda de crédito. Quando surge a ‘armadilha da liquidez’, é aplicável a grande descoberta keynesiana: o governo deve não apenas emitir dinheiro, mas também assegurar sua aplicação e sua velocidade, gastando-o. Foi dessa maneira que o mundo saiu da Grande Depressão de 1929.” Cf. COSTA, Ana Clara; FERNANDES, Talita. O Banco Central e o extraordinário mundo das fraudes. Revista Veja, São Paulo, 4 nov. 2012, p. 479. Disponível em: <http://veja.abril.com.br/noticia/economia/o-banco-central-e-o-extraordinario-mundo-das-fraudes>. Acesso em: 7 jan. 2015.

219 MINSKY, Hyman P., Estabilizando uma economia instável, p. 364.

220 Dentro dessas transformações, a criatividade dos agentes econômicos para fugir das normas que

restringem a sua atuação dá início ao surgimento de derivativos. Esses instrumentos, contudo, não eliminariam o risco de variação abrupta dos ativos, mas apenas o repartiriam e ampliariam o risco sistêmico. Para complicar, até então, eles não ficariam registrados nos balanços, dificultando a fiscalização. Cf. BELLUZZO, Luiz Gonzaga. Antecedentes da tormenta: origens da crise global. São Paulo: Unesp, 2012, p. 62.

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poderia acarretar a responsabilidade estatal, além de passar a falsa imagem de que a União garantiria os depósitos. De outro, causaria entraves ao normal funcionamento das operações bancárias.222

A respeito da ação estatal e das formas de gerir crises, Charles Kindleberger e Robert Aliber mencionam que, em um primeiro momento, um remédio seria a inércia, isto é, deixar a crise se resolver sozinha, por meio de ajustes na economia. O fundamento para essa postura seria afastar um risco moral, ou seja, evitar que investidores, acreditando que haveria uma ajuda governamental para minorar suas perdas, deixassem de ter uma conduta mais cautelosa em suas operações especulativas. Além disso, uma eventual ajuda poderia representar uma recompensa indevida e injusta àqueles que especularam por sua conta e risco. Mas o problema se complica quando a crise se alastra e atinge também quem não especulou e tem sólidos empreendimentos, fazendo o dinheiro simplesmente sumir, ainda que tenha o seu preço elevado.223

Ainda no entender de Kindleberger e Aliber, cumpre observar que há um grande dilema quanto à liberdade da autoridade para injetar liquidez. De um lado, quanto maior a liberdade, mais adequada pode ser a atuação em cada caso concreto. Porém, essa mesma liberdade, quanto mais ampla, mais abre caminho para arbitrariedades e punições ou favorecimentos indevidos. Em princípio, somente os agentes solventes deveriam ser atendidos. Da mesma forma, em relação ao momento certo para agir, para os referidos autores, deve-se procurar proteger os agentes sólidos, deixando perecer os falidos, mesmo porque se trata de socorro de liquidez, e não de insolvência. O tema do credor de última instância também é tratado no âmbito internacional, em razão de a deflação de um país poder atingir outros. Nesse cenário, seu papel é possibilitar a adaptação da taxa de câmbio conforme as necessidades de cada economia.224

Para Rosa Maria Lastra:

Considerando a peculiaridade da atividade financeira, a ação estatal, de modo amplo, seria concretizada pela regulação. Fazendo uma análise dos argumentos favoráveis e contrários à regulação bancária, constata que, historicamente, a ação estatal sempre aparece como uma resposta governamental a uma crise ou a um conflito [...] também aponta as externalidades causadas pelas quebras dos bancos como perdas adicionais à economia, donde a necessidade da atuação do governo e, por outro lado,

222 Tratado de direito comercial brasileiro, p. 95.

223 Da euforia ao pânico: uma história das crises financeiras. Tradução de Leonardo Abramowicz. São

Paulo: Gente, 2009, p. 236.

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lembra que eventual sistema de proteção oficial pode induzir bancos a condutas mais arriscadas, isto é, o abuso moral ou moral hazard.225

Ao lado dos argumentos econômicos, Lastra cita ainda os seguintes fundamentos utilizados para justificar a regulação: (i) a responsabilidade assumida pelo governo na manutenção da solidez do Sistema Financeiro; (ii) a forte vinculação da atuação dos bancos na execução da política monetária, também conduzida pelo governo; (iii) a preocupação de certos governos com os depositantes individuais e investidores, em razão da hipossuficiência ou vulnerabilidade de alguns; (iv) o interesse de alguns governos em limitar a desnecessária concentração de recursos financeiros e poder econômico; (v) a preocupação de alguns governos em direcionar a alocação de crédito; (vi) a intenção de alguns governos em manter a autonomia nacional em relação a empresas internacionais; e (vii) o eventual interesse histórico em preservar certas instituições financeiras.226

E a autora complementa, dizendo que a atuação do Estado na crise, como doador de última instância, por meio de seguro de depósito governamental ou por diversos tipos de pacotes de salvamento, “[...] é uma das maiores razões que justificam a regulamentação e supervisão públicas”.227

Tratando dos fundamentos da regulação do mercado financeiro, Jairo Saddi sustenta que as peculiaridades desse mercado demandam uma “justificativa própria e específica”. Segundo assevera o autor, a função da intermediação financeira de propiciar poupança e investimento se torna mais eficiente quando há uma organização e coordenação dos intentos dos agentes que possuem recursos disponíveis e daqueles que necessitam de tais recursos.228

Não obstante a regulação desse mercado objetive corrigir falhas, ela vai além, na medida em que a atividade bancária consiste em operar recursos de terceiros, ao

225 Banco Central e regulação bancária, p. 63-64.

226 Na conclusão do capítulo relativo à regulação, sobre o

seu cabimento, sustenta Lastra: “A despeito dos méritos dos argumentos econômicos e lógica padrão que justificam a regulamentação bancária governamental, hoje em dia a liberalização financeira e desintermediação, uma certa hostilidade à regulamentação pública e uma tendência intrínseca da autoridade de super regular – independente

de quem esteja com poderes de regular – nos conduz a um tratamento mais cuidadoso sobre as

vantagens e desvantagens de tal regulamentação. Se a regulamentação deixa de ajudar a melhoria do mercado ou, ainda pior, se ela prejudica o mercado, então ela deveria ser revisada ou repelida. A regulamentação deve ser eficiente e benéfica para o mercado como um todo. A regulamentação não pode ser o controle absoluto, excessivamente trabalhosa ou uma colcha de retalhos. Mesmo considerando que as autoridades deveriam sempre se preocupar com a segurança e solidez dos

bancos e a ameaça de risco sistêmico, elas deveriam se ocupar menos – ser menos

‘intervencionistas’ – no detalhamento das regras de proteção ao consumidor, que geralmente impõem um custo regulatório elevado aos bancos.” Cf. Ibidem, p. 126-127.

227 Ibidem, p. 128.

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passo que o capitalista, conforme certa acepção desse termo, trabalha com seus próprios recursos. Os depositantes não possuem condições de avaliar a solvência da instituição financeira, assim como não podem reaver seus recursos, se todos os demais correntistas pretenderem fazer o mesmo simultaneamente.229

Por sua vez, Calixto Salomão Filho salienta que uma preocupação importante existente em áreas como o Sistema Financeiro Nacional é a conciliação dos objetivos de manter a concorrência e, ao mesmo tempo, garantir a higidez do sistema. Isso porque a proteção da estabilidade acabaria criando condições propícias à concentração do poder econômico. Dessa forma, seria ilógica a defesa de formações monopolísticas e oligopolísticas do sistema, fundadas na busca da estabilidade, na medida em que isso poderia ser conseguido com normas de organização interna, como capital mínimo e alavancagem, entre outras. Já as normas relativas à concorrência seriam um elemento externo às estruturas das instituições financeiras, que impediria a concentração de poder e levaria à proteção ao consumidor, por inibir abusos. Além disso, a diminuição desse poder faria reduzir o risco de contágio ou o risco sistêmico decorrente de problemas de uma instituição específica.230

Ana Clara Costa e Talita Fernandes afirmam que “[...] não haveria mercado em funcionamento sem a presença ativa do Estado”, e, no caso de instituições financeiras, “[...] por trabalharem com um bem público universal, composto pelos meios de pagamento, os interesses corporativos necessariamente devem se submeter a alguma forma de regulação da chamada autoridade monetária”.231

No que diz respeito ao papel do Banco Central dentro da atuação estatal, Haroldo Malheiros Duclerc Verçosa traz um interessante panorama, em que apresenta as posições favoráveis e também as contrárias à existência daquele ente. A corrente que defende a inexistência de um Banco Central, denominada “free banking”, seria minoritária e sustentaria, com base nas ideias do livre comércio de Adam Smith, que deveria haver um sistema bancário competitivo, sem uma autoridade com poder monopolista de emissão, pois não haveria necessidade de um controle externo especial em relação aos bancos. Para essa corrente, o governo não

229 SADDI, Jairo, Crise e regulação bancária: navegando por mares revoltos, p. 60. 230 Regulação da atividade econômica: princípios e fundamentos jurídicos, p. 59-60. 231 O Banco Central e o extraordinário mundo das fraudes. Revista Veja, p. 409.

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teria autoridade nos assuntos relativos à moeda, e os Bancos Centrais, em sua origem, teriam servido para beneficiar o governo.232 Por outro lado,

A corrente majoritária denominada central banking, estaria escorada em cinco aspectos. Em primeiro lugar, as quebras dos bancos causariam prejuízos principalmente à população mais carente e menos informada, fato que não seria devidamente tratado no outro sistema. Em segundo, o Banco Central seria um melhor instrumento para controlar a inflação. Em terceiro, o Banco Central, em situação de crise, teria como servir de apoio, por meio de empréstimos de última instância, contendo o pânico que se alastraria em um sistema sem esse instrumento. Em quarto, o desenvolvimento da política monetária de forma racional exigiria um ente centralizador, sem o que os agentes econômicos perseguiriam apenas os próprios interesses em prejuízo da sociedade. Por fim, a existência de um Banco Central possibilitaria a integração e colaboração internacional, que não ocorreria no sistema do free banking. Assim, a melhor postura seria a adoção do sistema do central banking, porém com controles para evitar abusos governamentais.233

Na evolução da abordagem regulatória, Gustavo José Marrone de Castro Sampaio menciona que, em um primeiro estágio, a preocupação estaria em restringir determinadas práticas, com foco no passivo das instituições. Em seguida, com a passagem da atenção para o lado ativo das operações bancárias e o risco das operações a ele ligadas, entra em cena o Acordo de Basileia de 1988. O próximo estágio se relaciona à constatação da insuficiência dos riscos considerados