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Bem-Estar e Felicidade como Efeito da Vivência de Valores

Capítulo III – Análise de Resultados do Plano de Investigação de Valores

9. Bem-Estar e Felicidade como Efeito da Vivência de Valores

Por fim, apesar do contexto socioeconómico de recessão vivido no final da década de 2000, das dificuldades vividas e das desconfianças sentidas, os Portugueses afirmam-se predominantemente felizes.

Figura 66 - Indicador de bem-estar e felicidade, 2009

Este sentimento mais revelador do bem-estar individual, comumente aferido nos mais importantes inquéritos mundiais como os referidos no capítulo metodológico deste trabalho (Cap. II) é, no contexto nacional, significativamente influenciado por duas variáveis principais, nomeadamente, o estado civil e o nível de rendimento.

127 No primeiro caso, verificam-se níveis estáveis de felicidade plena na ordem dos 70 a 75% entre os indivíduos em relação conjugal, independentemente do regime ou da forma, mas também dos solteiros. São os divorciados e os viúvos que apresentam decréscimos significativos neste indicador, sendo os primeiros menos felizes em cerca de 20% e os segundos em menos 10% que os indivíduos em conjugalidade.

Quanto ao rendimento, verifica-se um comportamento da variável muito interessante, e de elevada significância estatística. Os dois extremos da escala de rendimentos têm níveis equivalentes de felicidade, nos seus três níveis. Por um lado, nitidamente a privação financeira em limites mínimos como os 500€ mensais afeta consideravelmente o sentimento de felicidade, sendo que há uma significativa variação destes níveis logo no escalão seguinte, realçando essa perceção de limiar de pobreza. De seguida, os níveis de felicidade mantêm-se aproximadamente estáveis entre o segundo e o quinto escalão, ou seja, entre os 500€ e os 2000€ mensais, subindo nos dois escalões seguintes até ao ponto máximo, nos indivíduos que auferem entre 2500€ e 4000€ por mês.

No entanto, esses níveis de felicidade caem abruptamente para níveis próximos do primeiro, no escalão de indivíduos mais abastados, com rendimentos superiores a 4000€ mensais.

128 Apesar de não ter um nível de significância aceitável, o grau de instrução também indica este comportamento, quando é nos níveis de instrução intermédios que se apresentam os níveis de felicidade mais elevados e estáveis e sendo, pelo contrário, nos extremos da escala que se encontram os níveis mais baixos.

Já através de análises multivariadas podemos distinguir com mais clareza um afastamento dos solteiros, divorciados e indivíduos em união de facto para o nível intermédio de felicidade, em relação aos perfis dos casados nos níveis mais elevados de felicidade, onde o perfil “ótimo” associa estes indivíduos casados e escalões de rendimentos entre os 2000 e 4000€ mensais. Os viúvos são claramente associados a um baixo nível de felicidade, tal como o escalão mais baixo de rendimento.

Numa tentativa de aferir a correlação do nível de bem-estar associado a este indicador de felicidade com os valores explicitados em diversos indicadores trabalhados até aqui, verifica-se que os indivíduos que perseguem predominantemente objetivos de vida de riqueza material, poder e posição social distanciam-se significativamente de um sentimento de felicidade plena, o

Figura 68 - Análise de homogeneidade de variâncias da felicidade, rendimento do agregado e estado civil, 2009

129 que confirma a análise bivariada pelo rendimento dos inquiridos. Por outro lado, os indivíduos que afirmam que ter fé é um objetivo de vida irrelevante, tendem a ser indivíduos muito infelizes.

Numa análise idêntica mas introduzindo a variável sobre os fatores mais importantes quando se tem de tomar uma decisão moral, verifica-se que os indivíduos mais felizes são os que tomam decisões morais ouvindo sobretudo a sua consciência, experiência e a lei, mas também a ciência e os seus pais. A voz da comunicação social, dos amigos e das entidades religiosas sobrepõem- se muito menos a um estado pleno de felicidade. No sentido contrário, os indivíduos menos felizes são os que consideram nada importante ouvir os pais, a experiência e a consciência quando têm de decidir moralmente.

Um dos possíveis indicadores deste contacto com a consciência poderá ser aferido pelo hábito de dedicação de algum tempo à introspeção, meditação ou oração. Sendo uma prática significativa quando mais de 60% da população afirma ter este hábito, é de realçar que ela é tanto mais relevante quanto maior a idade dos inquiridos e que as mulheres fazem-no frequentemente em mais 15% do que os homens. O estado civil também se apresenta uma variável

ter fé – nada importante; nada feliz ter poder, posição, ser rico – muito importante amar, ser honrado, … - muito importante; muito feliz

Figura 69 - Análise de homogeneidade de variâncias da felicidade e objetivos de vida, 2009

130 independente de relevo quando quatro vezes mais indivíduos casados (40%) o fazem que os em união de facto (10%), quando os solteiros (25%) o fazem menos que os casados e os viúvos mais que todos (50%. Como seria expectável, os indivíduos que professam uma religião específica são mais praticantes deste tipo de hábitos, mas ainda assim os agnósticos (18%) não apresentam significativa diferença dos crentes sem religião específica (24%).

Figura 70 – Dedicação a meditação, introspeção, contemplação, oração, 2009

Quando cruzado com o indicador de felicidade, verifica-se que quem pratica meditação/oração com frequência tende a ser muito feliz no dobro das vezes que quem não o faz (35% - 18%), assim como o contrário é igualmente verdade, ou seja, os indivíduos que afirmam não serem nada felizes e nunca praticam aquele tipo de introspeção são mais do dobro dos que se afirmam muito felizes sem aquele hábito (33% - 17%).

Em termos de perfil de respondente distingue-se claramente um grupo de indivíduos com 35 a 44 anos de idade que raramente se dedicam àquele tipo de introspeção e afirmam o nível mínimo de felicidade. Discrimina ainda a população mais jovem, com menos de 25 anos de idade, que nunca pratica tal hábito e tendencialmente do sexo masculino, de uma população menos jovem e tendencialmente do sexo feminino que o faz frequentemente e com índices mais elevados de felicidade.

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Figura 71 - Análise de homogeneidade de variâncias da felicidade, sexo, idade e dedicação a meditação, 2009