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Capítulo IV – Análise de Resultados do Plano de Investigação

3. Literacia Social – uma proposta de formação integral

3.1. Estabilização do Conceito

Quando confrontados com uma definição detalhada do conceito4, a generalidade dos professores entrevistados afirma compreender, de uma forma geral, os objetivos e finalidades da Literacia Social, sendo sobretudo consensual a crescente e fundamental importância de tratar o tema na escola.

“Compreendo e valorizo imenso!”; “Não consigo conceber a educação de

uma criança, que não seja no seu todo.

No entanto, o inquérito aplicado, que procurava também medir este nível de compreensão, apresenta uma afirmação inequívoca em não mais do que 57% dos casos, em que os dirigentes escolares tendem a ter mais precaução que os professores em afirmar que estes partilham de um entendimento comum sobre o assunto. Mais de 30% daqueles dirigentes creem mesmo que os seus professores não partilham desse entendimento comum.

Figura 89 - Entendimento partilhado de Literacia Social, 2010/11

150 Em entrevistas individuais aprofundadas, os coordenadores das escolas consideram que o trabalho da escola neste âmbito é razoavelmente positivo, afirmando que os professores da sua escola não só compreendem os objetivos e finalidades de trabalhar as diferentes dimensões da Literacia Social na escola, como estão preocupados com esta questão no quotidiano, sobretudo perante os problemas escolares crescentes. No entanto, quando questionados sobre se consideravam se o conceito de Literacia Social já se encontrava suficientemente estabilizado no seio dos professores/escola, a grande maioria dos professores entrevistados refere que não, sendo que os dirigentes escolares afirmam haver ainda “um caminho a percorrer”, convergindo no entendimento da crescente necessidade de a escola assegurar algo que muitas vezes não é assegurado em casa. Isto embora esteja presente a necessidade e importância de trabalhá-lo, o que de certa forma significa que o conceito está minimamente estabilizado nas suas condições de arranque.

Neste ponto será importante salientar que esta estabilidade conceptual pode ser observada a dois níveis. Ou seja, existe a consciência partilhada e geral da necessidade de trabalhar este conceito nas escolas o que, portanto, significa que a este nível o conceito está estabilizado (a importância e necessidade de o trabalhar na escola). No entanto, ao nível da aplicação e operacionalização generalizada a realidade já não é a mesma, justificando-se assim a resposta negativa dada por parte dos professores entrevistados.

“Existe dificuldade em aplicá-lo e muitas vezes perceber de forma completa o que é.”; “É necessário aprofundar o conceito para facilitar a aplicação no terreno.”

Validado pelo questionário a ambos os interlocutores, o gráfico abaixo (numa escala de 1 a 4) demonstra uma compreensão globalmente positiva sobre os objetivos e propósitos de programas de Literacia Social, destacando a menor sensibilidade dos professores que dos dirigentes para estas diretrizes. Assim como, pelo contrário, uma maior facilidade de adaptação dos professores aos recursos operacionais para a sua implementação.

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Figura 90 – Entendimento sobre programas de Literacia Social, 2010/11

Outros fatores que contribuem para o conceito não se encontrar mais estabilizado no seio dos professores em geral, e que não podem deixar de ser referidos, está relacionado com a gestão do fator tempo e com a motivação para os agentes escolares se envolverem neste esforço.

“Muitos professores acham que não é a função deles.”

Para aferir esta permeabilidade a uma responsabilidade cívica mais ampla, a aplicação do inquérito procurou avaliar a abertura/disponibilidade dos professores para operacionalização do conceito de Literacia Social na sua vida social e profissional, apresentando-se no seguinte gráfico, numa dupla perspetiva do próprio professor e numa heteroavaliação pelos seus dirigentes escolares.

Neste indicador proxy de disponibilidade pessoal dos professores para os esforços de integração que a Literacia Social exige na prática educativa, verifica-se que a perceção dos coordenadores é mais negativa do que aquela que os professores autoavaliam, como aliás seria expectável. Sendo que os professores assumem uma postura de “nem concordo nem discordo” com afirmações que aludem à sua disponibilidade para articular esforços que programas de Literacia Social podem exigir, nomeadamente enquanto não fizerem parte dos curricula oficial, verifica-se ainda uma superior indisponibilidade para atividades de voluntariado fora da escola, o que acentua esta falta de predisposição individual. Os mesmos quatro indicadores abaixo

152 apresentados sofrem um agravamento de cerca de um nível na escala de avaliação, quando são objeto de reflexão por parte dos dirigentes escolares, que portanto atribuem uma elevada indisponibilidade geral dos professores para os referidos esforços adicionais às suas estritas obrigações profissionais (entendidas como o cumprimento dos programas curriculares).

Figura 91 – Avaliações sobre predisposição cívica dos professores, 2010/11

No entanto, parte significativa dos professores entrevistados afirmaram sentirem-se motivados para a implementação de programas/projetos/disciplinas relacionadas com o conceito de Literacia Social, referindo que, por todas as razões anteriormente referidas, este lhes parece ser um conceito importante de ser implementado e generalizado nas escolas.

“Há valores não estão a ser assegurados pela família”; “Toda a gente reconhece a crise de valores na nossa sociedade!”

Também os dirigentes escolares referem a falta de tempo que convive com o que consideram ser uma genuína vontade dos professores abordarem estes temas, que reforça a necessidade de equilibrar estes dois fatores, quando

“os professores vão ganhando cada vez mais consciência da importância de trabalhar estas questões.”; “Com tanta coisa imposta a motivação não é grande.”; “A grande maioria dos professores está disponível e motivada.”

153 Neste sentido, a totalidade dos dirigentes entrevistados afirma que a Literacia Social é um conceito importante de ser implementado e generalizado nas escolas por todas as razões já referidas, contudo defendem igualmente uma definição de prioridades que evite sobrecargas, bem como uma extensão aos pais/encarregados de educação.

“Faz sentido que a escola trabalhe estas questões em conjunto com a família”; “Os pais têm de ser chamados e responsabilizados”; “A realidade social impõe uma maior atenção a estas questões”; “Perante a sociedade que temos e com os pais cada vez com menos tempo só teríamos todos a ganhar”; “o suporte familiar e a transmissão de valores perde-se cada vez mais, e como tal há que encontrar formas de os transmitir”

É também no mesmo sentido, ainda sublinhado pelos professores entrevistados, que as características dos alunos de hoje em dia justificam cada vez mais uma aposta séria nesta área, sendo defendido por alguns um reforço no currículo, uma vez que neste momento “as coisas são pouco claras,

objetivas e exploradas”.

“São valores e princípios que se estão a perder”; ”A vida é cada vez mais acelerada e os pais têm pouco tempo para transmitir alguns valores e princípios.”; “Cada vez mais temos de atuar nesta área e se calhar era importante haver orientações mais definidas!”

Em consonância com estes resultados, o inquérito aponta para uma maioria de três quartos (76%) dos professores e dirigentes a concordar com a alocação de um tempo letivo próprio da Literacia Social no currículo oficial, conforme demonstra o gráfico seguinte.

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Figura 92 – Impacto da introdução de Literacia Social no currículo oficial, 2010/11

Por vezes aparentando alguma contradição entre a escolha de tempo letivo ou abordagem transversal, alguns professores entrevistados consideram que, de alguma forma, esta área/conceito faz já parte do curricula oficial, embora não na sua totalidade nem com espaço letivo próprio. A abordagem transversal e transcurricular parece ser a que reúne maior consenso quando o tema é aprofundado, embora tenha sido referido que, por exemplo, as AECs poderiam ser uma boa aposta neste âmbito, bem como a hipótese de ser abordada em tempos específicos do horário escolar – opinião que vai no sentido contrário das recentes opções de política pública em 2012.

Em torno desta discussão, o inquérito aos dirigentes escolares vem trazer um contributo de reforço do impacto primordialmente transcurricular como consequência do investimento na Literacia Social.

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