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Os caminhos e descaminhos da responsabilidade sócio ambiental no

NOVA RACIONALIDADE ECONÔMICA

3.2 Breve Histórico da RSA no Mundo

Segundo os autores de RSA estudados,270 ela surge em conseqüência da globalização e da interdependência entre mercados e economias para além dos Estados nacionais. O processo de globalização seria impulsionado por duas correntes, a tecnológica e a “onda de quinze anos

de desregulamentação, privatização, liberação dos fluxos de capitais, abertura das economias domésticas, expansão do comércio global e as políticas de crescimento orientadas para a exportação...”.271

A corrente tecnológica trata do barateamento dos transportes, desenvolvimento das comunicações, substituição gradativa do trabalho vivo por máquinas, entre outros aspectos o que permitiu acelerar a circulação de informações, fluxos financeiros e mercadorias ao redor do planeta. Segundo Milton Santos uma das características da globalização é a unicidade técnica, onde é possível instalar qualquer instrumento técnico em qualquer parte do planeta.272

A tecnologia, como já afirmado anteriormente, não pode ser considerada neutra. Segundo Mészáros “... pois a inserção social da tecnologia capitalista mostra que ela

estruturada com único propósito da reprodução ampliada do capital a qualquer custo social”.273

Isso parece ser ignorado pelos autores de RSA onde a tratam como saída para a crise ambiental. O Instituo Ethos, principal fonte de indicadores em RSA no Brasil, aposta em tecnologias ditas “limpas” ou “verdes”.

O novo horizonte da indústria sucroalcooleira, neste ramo, é a produção de biocombustíveis a partir do bagaço e palha da cana, resíduos mais abundantes do processo produtivo, o chamado etanol celulótico, além de novas variedades de cana modificadas geneticamente. Para esse grande projeto “modernizador” várias parceiras estão sendo realizadas entre Estado e entidades de terceiro setor, entre elas uma parceira público privada

269

Instituo Ethos de responsabilidade sócio ambiental.

270 NETO, Fpm & FROES, César. Gestão da responsabilidade social corporativa: o caso brasileiro. Rio de

Janeiro: Qualitymark, 2001. PORTILHO, F. Sustentabilidade ambiental, consumo e cidadania. São Paulo: Cortez, 2005. HENDERSON, H. Além da globalização: modelando uma economia global sustentável. São Paulo: Cultrix, 2003.

271 HENDERSON, H. Além da globalização: modelando uma economia global sustentável. São Paulo: Cultrix,

2003, p. 51.

272

SANTOS, Milton. A natureza do espaço: técnica e tempo, razão e emoção. São Paulo: Hucitec, 1996.

273 MÉSZÁROS, István. Para além do Capital. Trad. Paulo Cezar Castanheira e Sérgio Lessa. São Paulo:

(PPP) formada por dez Universidades Federais e Federais Rurais do Brasil, a Ridesa (Rede Interuniversitária para o Desenvolvimento do Setor Sucroalcooleiro); a Financiadora de Estudos e Projetos (FINEPE), empresa vinculada ao Ministério da Ciência e Tecnologia além de várias instituições privadas entre elas o Sindaçúcar PE.274 Em nome do desenvolvimento, ocorre, novamente, o financiamento público das pesquisas que irão intensificar ainda mais a produção.

Os autores de RSA tratam da globalização como um fenômeno recente que começou em torno no fim dos anos 60 e início dos 70 a partir da desregulamentação dos mercados, o “fim” da União Soviética e o Consenso de Washington.275 Ela se apóia em três pontos, a eficiência, a busca por matéria prima e mão de obra em abundância.276 A globalização é parte integrante do capital desde a era mercantilista, segundo Sidney Mintz, no século VII, as classes privilegiadas da Europa já haviam provado o açúcar levados a eles pelo comércio, já em processo de globalização.277

Celso Furtado afirma que a globalização teve origem na natureza de um sistema produtivo transnacional global, cujo dinamismo se traduz em novo desenho na alocação geográfica dos recursos e em forte concentração social de renda.278 Paralelamente a aumento da globalização, houve a “diminuição programada” da atuação dos Estados nacionais. Permitindo assim que as empresas ocupassem espaços políticos privilegiados.279

Anterior à idéia de responsabilização empresarial existia o conceito de filantropia empresarial. Onde, por meio de ações pontuais, as empresas deveriam retornar à sociedade uma parte de seus lucros. “Como não podem fazê-lo sob forma de melhores salários, mais empregos e mais investimentos sociais, pois tais parâmetros não condizem com os preceitos

básicos da sua racionalidade, as empresas descobriram o filão da inserção social”.280

A principal forma de atuação se dá por meio de apoio a programas governamentais, práticas ainda atuais, doações, devidamente dedutíveis dos impostos. Em 1899 o presidente

274 Jornal folha de PE. Quinta-feira, 10 de Junho de 2010.

275 Marco do neoliberalismo trata de um conjunto de políticas baseadas no livre mercado que pregavam entre

outras a austeridade fiscal, ajustamento e privatizações com intuito de promover o desenvolvimento econômico dos países em desenvolvimento que passavam por crises financeiras. Ele serviu de base para a política oficial do FMI em 1990.

276 NETO, Fpm & FROES, César. Gestão da responsabilidade social corporativa: o caso brasileiro. Rio de

Janeiro: Qualitymark, 2001.

277

MINTZ, Sidney W. O Poder amargo do açúcar. Produtores escravizados, consumidores proletarizados. Organização e tradução Christine Rufino Dabat. Recife: EDUFPE, 2003.

278 FURTADO, Celso. O mito do Desenvolvimento Econômico. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1974.

279 BEHRING, Elaine Rossetti. Brasil em contra-reforma: desestruturação do Estado e perda de direitos. São

Paulo: Cortez, 2003.

280 NETO, Fpm & FROES, César. Gestão da responsabilidade social corporativa: o caso brasileiro. Rio de

do conglomerado americano U.S. Steel Corporation, Andrew Carnegie, publicou um livro, onde estabeleceu a visão clássica da filantropia nas empresas. Baseado na custódia e na caridade, princípios de cunho paternalista e cristão.

Carnegie, “... prescrevia que as empresas e os ricos se enxergassem como guardiães

ou zeladores, mantendo suas propriedades em custódia para benefício da sociedade como um todo”.281 A partir daí várias empresas norte americanas passaram a incorporar esses princípios. A filantropia trata de uma forma particular da tentativa de se camuflar ou disfarçar a luta de classes pela burguesia com o princípio de “ajuda aos pobres”.282 A RSA pode também ser assim tratada, pois a intenção é a mesma, mas de uma forma renovada com novo discurso para novas contradições do capital e com o intuito de adquirir legitimidade perante o “novo consumidor responsável”.

A primeira vez que o termo responsabilidade sócio ambiental foi usado foi em 1953 por Bowen. As empresas teriam o “dever moral” de tomar decisões desejáveis de acordo com os valores da sociedade a que pertencem.283 Esses princípios não estavam apoiados na custódia e caridade e sim com os de poder e responsabilidade.

A idéia de valores sociais nas empresas foi polêmica na época.

Mas a evolução da idéia de responsabilidade social viveu-se um momento em que os estudiosos acreditavam que cabia ao governo, igrejas e sindicatos e organizações não governamentais o suprimento das necessidades comunitárias por meio de ações organizadas, e não às corporações, que, na verdade, necessitavam satisfazer seus acionistas.284

Na década de 70, paralelamente aos estudos sobre ética empresarial, a responsabilidade social passou a contar com a colaboração de profissionais de áreas externas à administração, como psicologia, filosofia e marketing. A partir daí começou-se a desenvolver o “marketing social”.

“Assim, de objeto de ações filantrópicas, a participação no sentido de prover

condições para melhor desenvolvimento social, tornou-se alvo de ações de comunicação e

281

STONER, James A. F. & FREEMAN. R. Edward. Administração. 5° Ed. Rio de Janeiro. Prentice-hall do Brasil. 1985, p. 72.

282 KAMEYAMA, Nobuco. “Filantropia empresarial e entidades da sociedade civil, Capacitação em Serviço

Social e política social”. In: O trabalho do assistente social e as políticas sociais. Modulo V. Brasília, CFESS, Abepss, Cead/NED, Unb, 2000.

283 Prêmio Ethos Valor e Responsabilidade Social das Empresas: A contribuição das Universidades, VII. São

Paulo: Instituto Ethos, 2003.

284

FABIÃO, F. F. “O negócio da ética: um estudo sobre o terceiro setor empresarial.” In: Prêmio Ethos Valor e

Responsabilidade Social das Empresas: A contribuição das Universidades, VII. São Paulo: Instituto Ethos,

marketing social”.285 Essa estratégia tenta conquistar o público do chamado “consumo verde” o que na prática trata de uma nova forma de concorrência. Assunto que será tratado na conclusão do presente trabalho.

Nessa época a ideologia do “poder traz responsabilidade” trouxe a prática de divulgação do “balanço social”, uma das estratégias de RSA mais utilizadas pelas empresas na contemporaneidade. Na Europa várias empresas passaram a publicar o balanço anualmente, inicialmente as alemãs e francesas. Este país foi o pioneiro a ter uma legislação que obrigasse as empresas a publicar periodicamente o desempenho social no que dizia respeito à mão de obra e condições de trabalho.

Em 1976 foram criadas as diretrizes para empresas multinacionais, aprovada em 2000 pelos ministros da Organização para Cooperação Econômica e Desenvolvimento (OCED).286 As diretrizes inovaram ao tratar das condutas em relação ao meio ambiente, condições de trabalho e direitos humanos.287

Em julho de 2001, a Comissão das Comunidades Européias, reunidas na cidade de Bruxelas, na Bélgica, apresentou a comunidade internacional uma publicação sobre responsabilidade social com o seguinte título: promover um quadro europeu para a responsabilidade social das empresas.288

Da filantropia à responsabilização, os princípios por tás da RSA continuam os mesmos, “na realidade, o que se esconde por trás deste desenvolvimento dos laços de

solidariedade particulares, categorias, voluntária, é tanto a recusa ao princípio de solidariedade baseado em direitos universais quanto na recusa da solidariedade de classe”.289 O conceito de RSA, que está intimamente conectado ao da solidariedade do terceiro setor, baseado na doação e não nos direitos e no cumprimento das leis e obrigações.