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Os caminhos e descaminhos da responsabilidade sócio ambiental no

NOVA RACIONALIDADE ECONÔMICA

3.6 RSA nas Usinas Trapiche e Cruang

As duas usinas foram escolhidas para o trabalho de campo por, além de estarem em condições bem distantes no que diz respeito à RSA, foram às únicas onde foi permitido as visitas de campo. Vale salientar que se trata de um tema de pesquisa de difícil acesso haja vista que a maior parte do empresariado não se mostra interessado a participar de entrevistas. Como o Sindaçúcar PE começou a investir em Desenvolvimento Sustentável, principalmente após a divulgação de material a respeito do Etanol como combustível “ecologicamente

316 Ambientalistas fontes de vários veículos de informação, como o jornal Folha de São Paulo, Estadão e de

emissoras de televisão como a rede Globo e a TV jornal.

317 MONTAÑO, Carlos. Terceiro setor e questão social: crítica ao padrão emergente de intervenção. São

correto”, abriu-se um espaço para o debate no 1° Fórum Latino Americano de Bio combustíveis, realizado em Olinda em Abril de 2009, Durante o Fórum, onde um dos subitens tratados foi a responsabilidade sócio ambiental, se reuniram representantes do setor, de indústrias de bens e maquinaria para a agroindústria bem como representantes do Governo Federal e Estadual. A partir daí foi possível ter acesso aos empresários do setor nacional e de Pernambuco que pretendiam tratar do tema.

Logo após o Fórum foi marcada uma entrevista, com o atual presidente do sindicato Renato Cunha, no Sindaçúcar PE, onde ele foi representado pelos responsáveis pelo departamento que tratam do tema. Paralelamente às entrevistas ocorriam encontros entre os usineiros e o departamento jurídico do sindicato a respeito da operação Engenho Verde. O que permitiu contato direto com os empresários bem como a marcação das visitas de campo nas Usinas Trapice e Cruangi. As entrevistas ocorreram no sindicato e nas usinas e com a condição de não fossem gravadas nem filmadas.

Vale ressaltar que os dados apresentados como número de empregados, área de reflorestamento, número de alunos nas escolas, entre outros são fornecidos pelas empresas. Raramente encontram-se dados oficiais sobre o tema, inclusive a área das usinas e seus limites geográficos.

A Trapichesa está localizada na Mata Sul de Pernambuco, sediada no município de

Serinhaém. É a mais avançada nas questões ambientais e da “sustentabilidade” do estado. É a única usina a ter um departamento de gestão ambiental, a produzir açúcar sem enxofre o que a faz a única de PE a fornecer açúcar à Coca-Cola, Kibon, AmBev, entre outros clientes coorporativos.

Por isso a empresa investe “maçiçamente” em estratégias de gestão ambiental e de responsabilidade sócio ambiental, exigência desses grandes clientes. Segundo o manual de

Supplier Guiding Principles da Coca Cola (Guia de princípios dos fornecedores) para ser

fornecedor, entre outros itens é necessário cumprir com uma série de normas de RSA, entre elas:

Liberdade de associação e negociação coletiva, permitir que os funcionários se reúnam e formem sindicatos ou associações de classe

Proibir trabalho infantil, estar de acordo com a legislação local e nacional

Proibir trabalho forçado, e/ou abuso da mão de obra. Incluindo servidão por dívida, trabalho militar, prisional e escravo contratual. Não abusar fisicamente dos funcionários no que diz respeito a esforço físico exagerado, como também a coerção no local de trabalho.

Eliminar a discriminação nos locais de trabalho

Remunerar os trabalhadores de acordo com a legislação local, incluindo os direitos do trabalho.

Respeitar o meio ambiente

Segundo o manual da empresa:

Reconhecemos que há diferenças em leis, costumes e condições econômicas que afetam as práticas de negócios em todo o mundo, portanto, acreditamos que os valores compartilhados devem servir como base para as relações entre a The Coca-Cola Company e seus fornecedores. Os Princípios de Orientação do Fornecedor comunicam nossos valores e expectativas, além de enfatizar a importância de políticas e práticas responsáveis no local de trabalho que cumprem, no mínimo, com as leis ambientais aplicáveis e com as leis e regulamentações de trabalho.318

Aqui percebemos uma figura interessante as “leis ambientais aplicáveis”, o que permite a usina manter o fornecimento, apesar do Código Florestal não ser totalmente respeitado nas áreas cultivadas. Entre os itens que tratam da não conformidade do meio ambiente estão a eliminação de dejetos, usos de químicos319, armazenamento de materiais inflamáveis e licenças ambientais. Não há itens que falem em desmatamento, ou reservas ambientais. Como tratado no segundo capítulo à usina responde processo pela eliminação de vinhoto no Rio Serinhaém.

Quanto às licenças ambientais, como todas as usinas do estado de Pernambuco, a Trapiche não tem licença para plantar cana, e apenas para atividade industrial, o que foi alvo de multa devido à operação Engenho Verde. Outro ponto que não é tratado no manual é o uso dos recursos hídricos, um dos mais utilizados pela Coca-Cola.

Os representantes das usinas entrevistados afirmam que se há licença para a atividade industrial é previsível que o poder público entenda que há plantação de cana-de-açúcar na área da usina. E que para as outras atividades, inclusive a queima, há licença fornecida pelo Cprh. Na imagem V pode-se perceber uma das licenças para a queima da cana, parte integrante da defesa da usina apresentada ao IBAMA.

318

Guia de implementação dos princípios de orientação do fornecedor. Disponível em http://www.thecoca- colacompany.com/citizenship/pdf/Supplier SGPImplementationGuide.pdf coleta em Maio 2010.

319

IMAGEM VIII:

LICENÇA PARA QUEIMA AGRÍCOLA DA CANA-DE-AÇÚCAR320

Essas normas exigidas por mercados coorporativos internacionais, apesar de serem restritivas e com várias exigências válidas, não mudam os principais problemas do setor sucroalcooleiro, monocultura, desmatamento, uso de agrotóxicos em grande escala e exploração do trabalho. Esse processo, o mesmo dos selos verdes, buscam, por meio de conformidades pontuais, certificar e/ou autorizar que uma empresa continue produzindo, com

algumas limitações e cuidados, agora, atestadas de ambientalmente e socialmente corretas. Um caso de apropriação da sustentabilidade pelo mercado corporativo.

A Usina Trapiche foi fundada em 1935, após mudar de administradores duas vezes tem como proprietário atual Luiz Antônio de Andrade Bezerra, o mesmo dono da usina Serra Grande no estado de Alagoas, empreendimento com maior área de Mata Atlântica nativa do Brasil, segundo o Sindaçúcar PE . A Trapiche e a Serra Grande são as usinas do Nordeste com maior participação do filão da RSA internacional. Além disso, com uso intenso de tecnologia agrícola a usina conseguiu atingir a maior safra de cana-de-açúcar própria do estado, 1.090.000 toneladas na safra 2003/2004.

Atualmente produz uma média 2.500.000 sacos de 50 kgs de açúcar por safra, 17.000.000 litros de álcool anidro e exporta por meio da usina de cogeração de energia elétrica pelo bagaço de cana 8.000MWH de energia elétrica.

Na tabela VII estão os dados fornecidos pela usina Trapiche quanto à área total, área de cana colhida, extensão das reservas de Mata Atlântica e Mata Ciliar e Mangue, rios, números de trabalhadores, número de moradias e engenhos. Segundo dados da usina todas as exigências quanto às reservas contidas na legislação já foram cumpridas e que o reflorestamento na propriedade está acima das cotas legais.

A usina pretende como futuras medidas que visam a sustentabilidade a ampliação da produção de álcool anidro, ampliação da área de mangue, e credenciar suas reservas de Mata Atlântica no mercado de resgate de carbono mundial, para assim poderem receber além de financiamentos, selos “verdes” com objetivo de fornecimento a outros grandes mercados corporativos mundiais.

QUADRO VII:

DADOS DA USINA TRAPICHE321