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Canais digitais de acesso e entrega de serviços públicos eletrônicos

CAPÍTULO 2 REVISÃO DA LITERATURA

2.4 Portais de serviços públicos na Internet

2.4.1 Canais digitais de acesso e entrega de serviços públicos eletrônicos

Fountain (2001) ao tratar do “governo virtual”, O’Looney (2002), do “governo conectado”, Holmes (2002), do “governo eletrônico” ou West (2005), do “governo digital” convergem para uma base conceitual comum quando discutem a evolução da adoção das TIC no setor público que conduziu à criação do conceito de governo eletrônico. A base comum é o entendimento da importância dos canais digitais que permitem às agências governamentais conectarem-se entre si e essas aos cidadãos e organizações privadas. O conceito de canal digital associa-se diretamente àquele de serviços públicos eletrônicos.

Os serviços públicos eletrônicos provenientes dos programas de governo eletrônico são o resultado do uso das tecnologias de informação e comunicação aplicados à modernização da administração pública (DINIZ, 2000; LENK e TRAUNMÜLLER, 2001, 2002; OSBORNE, 1997), e ao uso da Internet como canal de acesso e entrega dos serviços públicos eletrônicos (GRANT e CHAU, 2005; MEDEIROS 2004; RONAGHAN, 2002).

Para Lenk e Traunmüller (2002), os serviços públicos eletrônicos representam um subconjunto do tema e-gov e possuem grande relevância na institucionalização de novos canais digitais de acesso e entrega de serviços eletrônicos, como a Internet. Ao introduzir o

conceito de governo conectado (wired government17), por meio da utilização de canais digitais, O’Looney (2002, p.3 – tradução nossa) afirma que:

Um governo conectado é aquele em que as partes dispersas de informações são conectadas para criar novos níveis de eficiência. A tecnologia em si, como os fios e os transistores num computador, habilita a conexão, mas não garante que será feita. Apenas pessoas e organizações podem fazê-la. [...] O termo “conectado” refere-se às características técnicas que permitem conexões e às características das organizações e do ambiente que conduzem as pessoas a utilizarem a tecnologia para efetivamente estabelecer as conexões. Nesse sentido, à medida que os governos se tornem conectados, as pessoas no governo e à sua volta começarão a saber mais e a comunicar o que sabem de forma mais eficiente.

Assim, a existência dos canais digitais por si só não garante a concretização do conceito de “governo conectado”.

Os canais digitais são canais de comunicação criados por meio do uso das tecnologias de informação e comunicação, e da infra-estrutura pública da Internet, utilizados no suporte de aplicações baseadas em web, como portais de serviços na Internet, Intranet, e Extranet (WESLEY, 2005). Na perspectiva da comunicação e integração interna do governo, esses canais criam o suporte necessário para a integração dos processos internos, dos sistemas de informação, das bases de dados e, sobretudo, possibilitam a implementação do conceito de governo focado no cidadão. Na perspectiva de integração externa com os cidadãos, fornecedores e parceiros do governo, esses canais permitem a obtenção de informações ou realização de transações de serviços e negócios com o governo.

Alguns autores argumentam que a universalização dos canais digitais e sua conseguinte disponibilidade para acessibilidade contínua tornou-se tema central na agenda estratégica de muitos governos (SCHOLL, 2004; BRUECHER et al., 2004; BATHNAGAR, 2004). Além disso, Fountain (2001) acrescenta que os canais digitais são uma inovação no setor público, e tem mudado rapidamente a percepção dos cidadãos em relação à qualidade dos seus serviços prestados. Portanto, pela visão desses autores, além de alterar significativamente para melhor a percepção dos serviços recebidos, esses canais digitais impactam em várias dimensões a vida dos cidadãos: comodidade, acessibilidade, tempo de resposta etc (WEST, 2005).

17 Ver O’Looney (2002) – Wired Governments – Challenges and Possibilities for Public Managers. Capítulo 1 – Introducing the wired concept.

Embora exista um consenso na literatura sobre a importância dos canais digitais, o mesmo não ocorre quando tratamos da estruturação dos serviços eletrônicos que serão disponibilizados nesses canais. Holmes (2002), Huang et al. (2005), Pavlichev e Garson (2004) apresentam vários casos práticos de implementação de canais digitais de acesso e entrega em diversos países, mas não apresentam um modelo conceitual genérico que possa se utilizar na estruturação dos serviços públicos eletrônicos a ser ofertados. Lenk e Traunmüller (2002) propuseram um modelo conceitual para a oferta de serviços eletrônicos (ESD – Electronic Service Delivery) que detalha as dimensões a se considerar na concepção, desenvolvimento e entrega dos serviços. Esse modelo abrange as dimensões mais relevantes a se levar em conta na definição e implementação de serviços eletrônicos. São sete as dimensões do modelo proposto por Lenk e Traunmüller18, conforme o Quadro

8, a seguir.

O modelo teórico proposto por Lenk e Traunmüller (2002) é bastante abrangente e orienta a organização dos serviços públicos eletrônicos a partir das necessidades do cidadão e da integração entre as diversas agências governamentais, fundamentais na idéia de cidadão como centro dos processos do governo. Por se tratar da entrega de serviços por meios eletrônicos, sem a presença humana, o uso desses serviços torna-se um fator crítico de sucesso na utilização dos canais digitais. O modelo trata esse uso a partir de considerações feitas sobre a complexidade de cada serviço eletrônico e das características de cada canal, (por exemplo: Internet, dispositivos móveis, TV digital). A privacidade, segurança e confiabilidade dos serviços eletrônicos são também questões importantes consideradas pelo modelo. Finalmente, a crítica a ser feita ao modelo é que, embora considere a possibilidade de acesso por múltiplos canais digitais, as sete dimensões propostas pelo modelo quatro (integração, segurança, privacidade, confiabilidade e usabilidade) ainda estão muito associadas à Internet, talvez pelo fato da pouca exploração dessas dimensões em outros canais digitais de acesso. Não cabe aqui discutir as razões de a Internet ter se tornado um canal tão relevante, mas é importante destacar que esse fato faz com que ela se torne foco de uma discussão quase inevitável para as agências governamentais quando estas planejam participar, de modo ativo, nos programas de governo eletrônico.

18 O detalhamento das sete dimensões do modelo de estruturação de serviços eletrônicos pode ser encontrado em LENK, K.; TRAUNMÜLLER, R. Electronic Government: Where Are We Heading? In: ELETRONIC GOVERNMENT, FIRST INTERNATIONAL CONFERENCE, 2002, Aix-en-Provence, France, September 2-5, 2002. Proceedings. pp. 1 – 9, 2002.

Adequação dos ESD

Os serviços eletrônicos devem se projetar de forma a atender às diferentes necessidades dos grupos de usuários. Para isso, é necessária uma fase de levantamento e mapeamento de requisitos de usuários que deve ser conduzida da forma mais ampla possível, a fim de abranger representantes dos diferentes grupos de usuários e em particular aqueles com necessidades especiais.

Canais de Acesso aos ESD

Embora a grande maioria dos serviços eletrônicos hoje existentes esteja apoiada no uso da

Internet como canal digital de acesso e entrega, o modelo conceitual dos ESD deve prever

outros canais digitais, como dispositivos móveis celulares e TV digital.

Complexidade dos ESD

Alguns serviços tradicionais apresentam um alto grau de complexidade quando trazidos para o ambiente digital. Os projetos de serviços eletrônicos devem ser capazes de mapear todas as complexidades dessa mudança de ambientes. Os serviços puramente transacionais, por exemplo, são menos complexos para se implementarem no ambiente digital quando comparados aos serviços que exigem, por algum motivo, a presença física do usuário. Nesse último caso, a barreira da presença física pode ser transposta, em outros não. O exemplo típico é o caso de uma consulta médica, cujo processo pode ter o seu início (agendamento) e o seu fim (entrega dos resultados) no ambiente digital, mas existe uma fase do processo na qual a presença física do usuário do serviço é obrigatória.

Integração dos ESD

Os serviços eletrônicos devem se projetar e se implementar a partir de premissas de integração de sistemas de informação e bases de dados entre as agências governamentais. O compartilhamento dos recursos informacionais entre esferas do governo incentiva um maior grau de integração. A falta dessa integração é a fragmentação de serviços eletrônicos ofertados.

Segurança Cada categoria de serviço eletrônico deve estabelecer níveis de segurança adequados. A segurança relaciona-se à utilização de componentes tecnológicos, como o uso de certificados digitais para acesso a serviços com determinado nível de sensibilidade.

Privacidade Desenvolvimento e implementação de serviços eletrônicos devem se apoiar em uma política de privacidade e em mecanismos de transparência e controle. O estabelecimento de marco legal e de políticas públicas específicas devem definir os critérios de privacidade para a coleta, o uso e a divulgação de informações dos usuários dos serviços eletrônicos.

Confiabilidade e usabilidade

Desenvolvimento, implementação e melhoria dos serviços eletrônicos devem se realizar a partir de premissas e de critérios de confiabilidade e usabilidade.

Quadro 8 – Dimensões do modelo de ESD proposto por Lenk e Traunmüller.

Fonte: Lenk e Traunmüller (2002).