• Nenhum resultado encontrado

Fases do processo de construção social do governo eletrônico

CAPÍTULO 3 QUADRO TEÓRICO

3.5 O governo eletrônico numa perspectiva social construtivista

3.5.1 Fases do processo de construção social do governo eletrônico

Considerando a implementação de programas de governo eletrônico como resultado de uma política pública específica, pode se decompor seu processo de construção em etapas distintas (Diniz et al., 2006), incorporando aspectos políticos, tecnológicos, sociais e organizacionais. Com base nos conceitos de redes sociotécnicas e de grupos sociais relevantes, o processo de construção social do e-gov é socialmente construído por uma rede de atores. As etapas do processo seguem, em linhas gerais, o ciclo das políticas

24 Governança eletrônica refere-se à aplicação das TIC na governança pública e tem como áreas: a e-Administração Pública, melhoria dos processos governamentais e do trabalho interno do setor público com a utilização das tecnologias de informação e comunicação; a e-Serviços Públicos, melhoria na prestação de serviços ao cidadão, e a e-Democracia, maior participação do cidadão, mais ativa, possibilitada pelo uso das tecnologias de informação e comunicação no processo de tomada de decisão.

públicas (policy cycle), tal como descrito por Frey (2000) e Peters (1996), em cinco etapas (Quadro 13):

• Etapa 1: Definição de políticas públicas e estratégias de governo eletrônico; • Etapa 2: Elaboração de projetos de governo eletrônico;

• Etapa 3: Implementação de projetos de governo eletrônico;

• Etapa 4: Operação e manutenção de projetos de governo eletrônico; • Etapa 5: Monitoração e avaliação de desempenho de governo eletrônico.

Etapas propostas por Peters (1996) - Ciclo de políticas públicas

Etapas propostas por Frey (2000) - Ciclo de políticas públicas

Etapas do framework utilizado nesta pesquisa

• Definição do problema • “Agenda Setting”

• Percepção e definição de problemas • “Agenda Setting” • Elaboração de políticas públicas de governo eletrônico • Formulação • Legitimação • Conexão a Recursos

• Elaboração de programas e decisão • Elaboração de projetos de governo eletrônico

• Implementação • Implementação de políticas • Implantação de projetos de governo eletrônico • Avaliação • Avaliação de políticas e correção • Operação e manutenção de programas de

governo eletrônico - - - - - - - -

• Monitoração e avaliação de desempenho de governo eletrônico

Quadro 13 – Processo de elaboração de políticas públicas e de construção do e-gov.

Fonte: Barbosa et al. (2007).

De forma análoga ao processo de elaboração de políticas públicas, o processo de construção do e-gov considera as influências dos fatores intervenientes de natureza política, social, econômica ou tecnológica, e da ação dos grupos sociais que participam do seu processo.

Para Avgerou et al. (2004), a percepção, interpretação e codificação do desempenho dos artefatos tecnológicos (sistemas de informação, serviços públicos eletrônicos, portais de serviços) pelos grupos sociais relevantes são afetadas por fatores sócio-culturais. Assim, os fatores influenciadores interferem nas diversas etapas do processo de construção do e-gov

por intermédio dos grupos sociais relevantes. Nesta tese, focaram-se apenas os grupos sociais relevantes, conforme a Figura 19.

1 1 22 33 44 55 Elaboração de projetos de e-gov Operação e manutenção de projetos de e-gov Implementação de projetos de e-gov Definição de Políticas públicas e estratégia de e-gov Monitoração e avaliação de desempenho de e-gov

Grupos sociais relevantes Processo de construção do governo eletrônico

Executivos políticos Executivos políticos Gestores públicos Gestores públicos Equipe de tecnologia Equipe de tecnologia Sociedade Governo: administração pública

Grupo de Cidadãos 1 Grupo de Cidadãos 1 Grupo de Cidadãos 2 Grupo de Cidadãos 2 Grupo de Cidadãos n Grupo de Cidadãos n Grupo de Empresas 1 Grupo de Empresas 1 Grupo de Empresas 2 Grupo de Empresas 2 Grupo de Empresas n Grupo de Empresas n

Figura 19 – Framework do processo de construção social do e-gov.

Fonte: Adaptado de Barbosa et al. (2007).

Descrevem-se, a seguir, as cinco etapas do framework do processo de e-gov proposto pelo pesquisador:

Etapa 1 – Definição de Políticas Públicas e Estratégia de Governo Eletrônico:

Composta pelo conjunto de atividades realizadas pelos atores políticos da cúpula dos governos, essa etapa tem como objetivo promover o alinhamento de interesses das áreas- meio (planejamento, orçamento, finanças, administração e controle) aos das áreas-fim (aquelas que provêm serviços públicos à sociedade, como educação, saúde, segurança pública, transportes etc). Inclui também as atividades de elaboração das principais diretrizes estratégicas e direcionamentos técnicos e políticos do programa de governo eletrônico que subsidiarão as políticas públicas.

Checchi et al. (2003) afirmam que durante a fase de desenvolvimento das políticas públicas, o processo de comunicação entre os atores sociais internos ou externos ao ambiente de governo interfere diretamente no alinhamento dos atores políticos participantes nessa fase. O uso adequado dos instrumentos formais de comunicação, disponíveis na administração pública, poderá contribuir para a definição de políticas

públicas mais eficazes e efetivas para atender os interesses da sociedade. Checchi et al. (2003) afirmam que as políticas públicas voltadas ao uso da tecnologia no setor público devem ser flexíveis o suficiente para acomodar mudanças ambientais e tecnológicas, bem como devem se integrar a políticas de outros setores, tais como educação e infra-estrutura.

Etapa 2 - Elaboração de Projetos de Governo Eletrônico:

Composta pelas atividades de criação de novos projetos de governo eletrônico, convergentes com aqueles já existentes dentro das políticas públicas em vigor na administração pública, nessa etapa definem-se os projetos de tecnologia necessários para que se alcancem os objetivos estratégicos do programa de governo eletrônico.

Para cada projeto de tecnologia identificado nessa etapa, os gestores públicos, com a ajuda de especialistas em tecnologia, detalharão o escopo do projeto, os recursos materiais, humanos e tecnológicos necessários para a sua consecução, sua fonte orçamentária, suas principais inter-relações e dependências com outros projetos ou recursos e as formas de avaliação dos resultados.

O processo de concepção de projetos tecnológicos no contexto de e-gov é uma atividade complexa e requer o domínio do contexto de negócio da área-fim prestadora de serviços públicos. No caso do Estado de São Paulo, por exemplo, existem comitês setoriais responsáveis pela proposição e análise dos projetos de tecnologia voltados ao programa de governo eletrônico (AGUNE e CARLOS, 2005).

Etapa 3 – Implementação de Projetos de Governo Eletrônico:

Esta etapa é composta pelas atividades de execução dos projetos tecnológicos, definidos pelas políticas públicas relativas aos programas de governo eletrônico. Nela, definem-se os mecanismos de gestão de projetos para controlar a execução e os recursos necessários, visando maior eficiência e desempenho.

Gil-Garcia e Pardo (2005), ao classificarem os principais desafios e fatores críticos de sucesso na implementação de um projeto de governo eletrônico, indicam cinco fatores críticos de sucesso no processo de implementação: (i) limite entre transparência e sigilo dos dados dos cidadãos; (ii) questões relacionadas à integração de sistemas transversais entre agências governamentais; (iii) compatibilidade tecnológica entre a multiplicidade de

infra-estrutura e plataformas tecnológicas (sistemas de informação e bases de dados); (iv) problemas de continuidade orçamentária, representada pela disponibilidade de recursos financeiros ao longo da execução do projeto; e (v) restrições regulatórias e legais que impõem uma rigidez burocrática excessiva à implementação de projetos tecnológicos. Esses fatores críticos requerem um adequado tratamento dos aspectos tecnológicos, organizacionais, legais e políticos por parte dos implementadores dos projetos, para que se possam minimizar os impactos potenciais associados a estes.

Etapa 4 – Operação e Manutenção de Projetos de Governo Eletrônico:

Esta etapa compreende as atividades de manutenções evolutivas e corretivas do programa de governo eletrônico e as atividades necessárias à sua operação, como atualização de informações, continuidade na prestação de serviços, ajustes e refinamentos de processos ou sistemas etc.

Gil-Garcia e Pardo (2005) apontam que questões como restrições orçamentárias e descontinuidade de gestão podem impactar as atividades de operação e manutenção dos programas governo eletrônico. Além disso, é razoável considerar que problemas relacionados à manutenção da equipe técnica, com expertise no sistema, associados a eventual deficiência documental dos sistemas de informação, podem resultar em pontos de risco para a continuidade dos programas de governo eletrônico. Deve-se monitorar esse processo a partir de um conjunto de indicadores que permitam a medição, avaliação e controle do desempenho dos programas de governo eletrônico, possibilitando sua avaliação gerencial e operacional.

Gupta e Jana (2003) sugerem um modelo de avaliação de desempenho que incorpora indicadores quantitativos (hard measures), indicadores qualitativos (soft measures) e rankings. O critério de escolha do tipo de medição deve ser coerente com o grau de detalhamento das informações existentes e, em geral, são complementares. A avaliação de um projeto unicamente pela sua vertente financeira (hard measure) possivelmente não refletirá se a expectativa do usuário foi atendida (soft measure).

Etapa 5 – Monitoração e Avaliação de Desempenho de Governo Eletrônico:

Este processo é composto pelas atividades de definição dos mecanismos de avaliação e controle que serão utilizados para a gestão efetiva do desempenho do programa de governo eletrônico, implementado a partir de políticas públicas específicas. Esses mecanismos visam avaliar os níveis específicos de desempenho e confiabilidade dentro das condições de escopo, custo e prazos definidos em cada projeto. Como os projetos podem gerar resultados de natureza tangível e intangível, devem-se criar indicadores de desempenho que possam tornar quantificáveis e mensuráveis todos os seus resultados.

Das cinco etapas apresentadas, as de definição de políticas públicas e estratégias e de elaboração e implementação de programas de governo eletrônico são cruciais para o sucesso da criação de um programa consistente de e-gov. No entanto, a etapa de monitoração e medição de desempenho é fundamental para o processo de institucionalização do e-gov (SCHEDLER et al., 2004). Os mecanismos de medição dos impactos (internos e externos) e os benefícios tangíveis e intangíveis para a sociedade são definidos nessa etapa. As informações de desempenho geradas devem resultar do amplo entendimento do processo de negociação entre os grupos sociais relevantes, e servir de insumos para o processo de elaboração de políticas públicas, de tomada de decisão nas fases de desenvolvimento e de implantação dos artefatos tecnológicos.

A medição de desempenho de programas governo eletrônico possibilita avaliar o resultado das políticas públicas (KLITGAARD e LIGHT, 2005), o desempenho dos canais digitais de acesso e entrega de serviços, e o desempenho dos serviços eletrônicos quanto a sua funcionalidade e satisfação dos cidadãos (SCHEDLER et al., 2004).

O foco central desta pesquisa está justamente na etapa cinco – monitoração e avaliação do desempenho do e-gov a partir da perspectiva do cidadão. Adotou-se a premissa de que as relações sociais entre os atores humanos (políticos, equipe técnica e cidadãos) e não- humanos (serviços públicos eletrônicos e portais) afetam sua percepção em relação ao desempenho do governo eletrônico.

Os modelos conceituais de medição de desempenho atuais, conforme discutido em 2.3, podem se caracterizar como determinísticos, ou seja, consideram a realidade um conjunto de fatos desconectados de seus contextos sociais, tendo o desempenho dos artefatos

tecnológicos medido a partir de um conjunto de fatos objetivos (OLPHERT e DAMODARAN, 2007; MUMFORD, 1991). Adotou-se visão do construtivismo social como alternativa ao paradigma implícito nos modelos de medição de desempenho atuais.

Esta pesquisa busca identificar as dimensões relevantes que devem se incorporar em um modelo conceitual de medição e avaliação de desempenho a partir da perspectiva do cidadão.

Estabelecido o quadro teórico baseado nas abordagens teóricas do construtivismo social, passamos ao Capítulo 4, que descreverá a estrutura metodológica criada com base nos conceitos-chave estabelecidos no quadro referencial, explicitando a posição epistemológica do pesquisador, as estratégias de investigação que caracteriza o método, a técnica de coleta de dados e o modo de análise.