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Caracterização e procedimentos metodológicos da pesquisa

DEFICIÊNCIA: PROCESSOS DE DESCENTRALIZAÇÃO, DESCONCENTRAÇÃO E MUDANÇAS NAS PARCERIAS PELA INCLUSÃO

4.1 DISCURSOS E PRÁTICAS EM NOME DA INCLUSÃO: PARCERIAS ENTRE A SEESP / MEC E AS ORGANIZAÇÕES ESPECIALIZADAS – DE 1996 A

4.1.1 Caracterização e procedimentos metodológicos da pesquisa

No processo desta investigação buscou-se, a partir da experiência prática do pesquisador, associada à revisão de teorias e conceitos, discutir e organizar aspectos referentes à inclusão social da pessoa com deficiência, de modo multidisciplinar, para entender e ordenar as observações sobre as parcerias entre Estado e sociedade civil no campo da educação das pessoas com deficiência. Assim, primeiro pode-se considerar “um quadro geral da vida social e, depois, pesquisar um aspecto particular dele para testar [ ] nossas teorias.” (MAY, 2004, p. 47).

Considerando esta investigação como pesquisa da realidade social, os procedimentos metodológicos adotados visam, além de garantir a cientificidade, descrever fatos da vida social, como são concebidos. Nesse caso, trata-se dos discursos e práticas nas parcerias Estado e organizações especializadas quanto à educação das pessoas com deficiência, objeto deste estudo. Indutivamente procurou-se investigar as evidências empíricas que evidenciam o fenômeno.

Os discursos das parcerias são entendidos, aqui a partir de Melucci (2001), que ao analisar a dinâmica dos movimentos sociais, define o conceito de discurso público da seguinte forma:

O discurso público não é um dado, mas um produto resultante de um complexo jogo de interações no qual intervêm, certamente, os objetivos e os interesses dos grupos de poder e dos aparatos políticos, e para o qual contribuem com um papel não subalterno, seja as competências profissionais e as dinâmicas organizativas dos adeptos aos trabalhos, seja as escolhas dos consumidores da comunicação (MELUCCI, 2001, p.144).

As práticas das parcerias são vistas pela forma concreta que assumem em termos de investimentos e financiamento da educação das pessoas com deficiência, resultados de programas e projetos propostos que objetivam a chamada educação inclusiva e a efetividade na garantia do direito a educação (especial ou comum) às pessoas com deficiência.

Adotando tais sistemas conceituais, busca-se, portanto, trabalhar na pesquisa além da qualidade formal que trata dos instrumentos e dos métodos, e dar prioridade à qualidade política que, trata das finalidades e dos conteúdos (DEMO, 1999). Dessa forma, a ênfase na qualidade política, talvez nos coloque

mais questões que respostas, mas que não deixa, por isso, de ser essencialmente [qualidade] na realidade histórica. Refere-se

fundamentalmente a conteúdos e é, em conseqüência, histórica. Não é dos meios, mas dos fins. Não é de forma, mas de substância (DEMO, 1999, p.12, itálico do autor).

Considerando tais explicitações conceituais, os motivos pessoais, técnicos e acadêmicos que justificam esta dissertação, e os distintos momentos profissionais e acadêmicos do pesquisador, buscou-se responder a algumas questões, já explicitadas na introdução deste trabalho:

a) Quais os significados e resultados das parcerias, no atual contexto da busca pela inclusão, presentes no discurso das organizações especializadas e do Estado, após a nova Lei das Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN / 96)?

b) Como se configuram historicamente as parcerias entre Estado e organizações especializadas para o atendimento educacional das pessoas com deficiência?

c) Quais os principais desafios e possibilidades para efetivação das parcerias intersetoriais, no sentido da garantia do direito à educação para as pessoas com deficiência?

Tendo em vista a amplitude das perguntas, inicialmente, pretendia-se fazer um estudo de caso das relações da SEESP / MEC com um movimento específico das organizações especializadas. Tendo em vista as dificuldades para acesso aos dados empíricos e a busca por evidências mais generalistas, as análises foram centradas nos discursos e posicionamentos, manifestos e latentes, sobre parcerias e inclusão educacional, pelos atores envolvidos nesses processos no âmbito da SEESP e de expressivas organizações especializadas. Delimitou-se, assim, esse campo para o estudo. Tal escolha considerou que a SEESP é o órgão nacional legítimo da burocracia estatal, historicamente definidor das estratégias de consolidação das parcerias pela educação especial e, mais recentemente, pela educação inclusiva no âmbito das pessoas com necessidades educacionais especiais, incorporando, principalmente, as pessoas com deficiência. Além disso, atentou-se para a influência direta que a Secretaria exerce em todos os níveis

políticos e governamentais, com impacto direto nas relações com as organizações especializadas em nível local.

Considerando tais pressupostos, os objetivos desta pesquisa foram:

a) analisar os discursos e práticas do Estado e organizações especializadas para o planejamento e gestão das parcerias pelo atendimento educacional das pessoas com deficiência, no período pós LDBEN / 96;

b) avaliar como os discursos pela inclusão vêm sendo utilizados no contexto das parcerias intersetoriais pela educação das pessoas com deficiência;

c) analisar como se construíram historicamente as relações entre Estado e organizações especializadas enfatizando os problemas institucionais e de gestão; d) analisar a Política de Educação Especial e o impacto da legislação, após a LDBEN / 96, para construção das propostas de integração / inclusão e concretização das parcerias intersetoriais; e

e) identificar os principais desafios e possibilidades para efetivação das parcerias intersetoriais pelo o atendimento educacional das pessoas com deficiência.

Para atingir os objetivos e responder às questões propostas, optou-se por metodologia de natureza qualitativa, considerando, também, a análise de dados secundários quantitativos, a fim de compreender as diferenças entre os discursos e práticas.

A discussão gerada pela ciência clássica quanto aos problemas da ideologia, da neutralidade e do distanciamento do pesquisador são consideradas, porém, tomadas como fenômeno intrínseco ao caminho científico, como parte da realidade histórica (DEMO, 1999). Ou seja, mesmo considerando o caráter qualitativo e o fato de que as questões desta investigação não partem de definições apriorísticas, “a pesquisa não se realiza numa estratosfera situada acima das atividades comuns e correntes do ser humano, sofrendo, assim, as injunções típicas dessas atividades.” (LÜDKE; ANDRÉ, 2003, p. 2). Assume-se, dessa maneira, neste estudo, algumas hipóteses:

a) As parcerias entre Estado e organizações especializadas se constituem historicamente num processo de promiscuidade, operando diferentes significados e definindo ações de retração e aproximação, de acordo com os interesses políticos contextuais.

b) Os discursos do Estado em nome da inclusão têm caráter minimalista e, até mesmo, assumem um tom de arrogância ao defender radicalmente uma proposta de

educação inclusiva como “educação pública estatal”. Coloca-se, assim, por vezes favorável ao desmonte do atendimento educacional das pessoas com deficiência nas organizações especializadas.

c) As organizações especializadas utilizam discursos em nome da inclusão muito mais por questões circunstanciais que por convicção ideológica.

d) Os principais desafios relacionados às parcerias intersetoriais relacionam-se à falta de consenso sobre a inclusão educacional, a focalização das ações e aos problemas de gestão no Estado e nas organizações especializadas.

Obviamente, ao delimitar tais suposições como variáveis previamente aventadas, não significa que estas limitem ou reduzem a análise qualitativa, podendo as evidências empíricas trazer outros dados e informações em contrário, a serem analisadas (CHIZZOTTI, 2000). Logo, estabelece-se o compromisso com o critério da discutibilidade, fixado não apenas em procedimentos formais, mas, sobretudo, em relação a conteúdos que emergirem nos dados empíricos (DEMO, 1999, p. 40).

4.1.1.1 Procedimentos para coleta dos dados

Optou-se por articular e combinar diferentes técnicas de coleta de dados para atingir as finalidades propostas no estudo: pesquisa documental, estatísticas oficias e entrevistas.

Como critério para seleção dos documentos e estatísticas oficiais a serem analisados, foi delimitado, em termos de espaço temporal, o período pós nova LDBEN, ou seja, de 1997 até início 2006 – este último, o ano em que terminei o levantamento dos documentos. Considera-se essa Lei, entre outras, como um dos recentes marcos nacionais para efetiva garantia do direito à educação para as pessoas com deficiência, bem como, principal justificativa para os processos de inclusão educacional. Outrossim, esse período também coincide com o fortalecimento e legitimação dos discursos do terceiro setor e da necessidade de novas formas de articulação entre Estado e sociedade, ou seja, das parcerias intersetoriais, já bastante analisadas em seu contexto, nos capítulos 2 e 3.

Os documentos, lidos como a sedimentação das práticas sociais, têm o potencial de informar e estruturar as decisões que as pessoas tomam diariamente e a longo prazo; eles também constituem leituras particulares dos eventos sociais. Eles nos falam das aspirações e intenções dos períodos aos quais se referem e descrevem lugares e relações sociais de uma época... (MAY, 2004, p. 206).

São considerados documentos “quaisquer materiais escritos que possam ser utilizados como fonte de informação sobre o comportamento humano.” (PHILLIPS, 1974 apud LÜDKE; ANDRÉ, 2003, p. 38). Além disso, de acordo com Sparks (1992) apud May (2001, p.214), os documentos “são vistos como meios através dos quais se expressa o poder social. Eles são abordados em termos do contexto cultural no qual são redigidos e podem ser vistos ‘como tentativas de persuasão’”.

Conforme as classificações apresentadas por May (2001), os documentos podem ser primários, secundários e terciários; públicos e privados; solicitados e não- solicitados. No caso desta pesquisa, foram levantados, analisados e comparados dados quantitativos e qualitativos obtidos em documentos primários (coletados por aqueles que testemunharam o fato ou evento descritos, ou seja, o próprio pesquisador) e secundários (surgidos em eventos que o pesquisador não testemunhou). Estes, também, podem ser classificados como documentos públicos produzidos pelos governos nacionais, já que são leis, decretos, resoluções, posicionamentos e relatórios gerenciais de atividades. Foram publicados após a nova LDBEN / 96 pela SEESP / MEC e por algumas organizações especializadas e, também, por outros agentes políticos que influenciam diretamente nas parcerias e na educação das pessoas com deficiência. Mesmo sendo documentos públicos, a maioria deles foram solicitados à SEESP, tendo em vista que não estavam disponíveis na internet e nem em bibliotecas especializadas, inclusive a do MEC, onde foram inicialmente coletados os documentos.

Considerando o grande rol de documentos produzidos durante o espaço temporal delimitado, defini alguns critérios para escolha das unidades documentais: - a autenticidade, a credibilidade, a representatividade e o significado dos documentos, considerando as categorias teóricas e a facilidade para codificação destas (BAUER, 2005; MAY, 2004).

- o fato de relatarem planejamento ou resultados de ações cujo objetivo esteja voltado à inclusão de pessoas com deficiência.

- conterem posicionamentos com relação à inclusão educacional de pessoas com deficiência.

- designarem normas legais ou procedimentos técnicos relativos ao atendimento educacional das pessoas com deficiência, principalmente quanto às relações entre Estado e sociedade.

- serem, preferencialmente, de acesso público.

Tais critérios facilitaram uma comparação mais clara dos discursos técnicos e políticos sobre as relações Estado e sociedade civil contidos em leis, decretos, relatórios de gestão, projetos e outros documentos analisados, conforme descritos abaixo:

a) Alguns marcos legais119, no que se refere, especificamente, às referências às parcerias pela educação especial e/ou educação inclusiva, incluindo a:

- Lei 9.394/96, que institui as Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN / 96);

- Decreto nº 3.298/99, que regulamenta a Política Nacional para a Integração da Pessoa com Deficiência

- Lei nº 10.172/2001, que institui o Plano Nacional de Educação;

- Parecer CNE / CEB nº 17/2001 e Resolução CNE / CEB nº 2/2001, sobre as Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica; - Parecer CNE/CEB nº 04/2002, sobre a Recomendação ao Conselho Nacional de Educação, tendo por objeto a educação inclusiva de pessoas com deficiência;

- Lei nº 10.845/2004, que institui Programa de Complementação ao Atendimento Educacional Especializado às Pessoas Portadoras de Deficiência (PAED);

- Despacho CNE / CEB nº 1/2006.

b) Relatórios de Gestão da SEESP / MEC dos seguintes anos: de 1994 a 1998 (documento único), 1999, 2000, 2001, 2002, 2003 a 2004120.

c) Programa Educação Inclusiva – Direito a Diversidade, implementado pela SEESP / MEC, desde 2004.

d) O Acesso de Alunos com Deficiência às Escolas e Classes Comuns da Rede

Regular, publicado pela Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão com o apoio

da SEESP / MEC, em 2004.

e) Documento Subsidiário à Política de Inclusão, da SEESP / MEC, publicado em 2005.

Além desses documentos, também são analisados outros oriundos de respostas das organizações especializadas que subsidiam uma maior discussão sobre as relações Estado e sociedade civil, como o Posicionamento do Movimento

Apaeano sobre a Educação Inclusiva, publicado pela Federação Nacional das

APAEs, em 2006.

Combinada à análise documental, foram utilizadas a análise de estatísticas oficias e entrevistas em profundidade. As estatísticas oficiais são referentes aos dados sobre acesso à educação (comum e especial) de alunos com deficiência, publicados nos Censos Escolares, realizados pelo Instituto Nacional de Estudo e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP). São analisados dados de 1996 a 2005, associando-os aos dados do Censo Populacional do IBGE (2002). Busca-se, assim, considerar os pontos fortes e fragilidades dos dados, sob outro olhar, não o daqueles que as criam e divulgam (MAY, 2004).

A intenção de, também, utilizar as entrevistas como técnica de investigação foi no sentido de aprofundar o estudo, já que esta permite a expressão das percepções individuais dos gestores e técnicos de forma mais ampla, possibilitando que os entrevistados possam expressar e acrescentar conteúdos que não estejam explícitos nos documentos oficiais (LÜDKE; ANDRÉ, 2003); ou seja, aprofundar pontos e variáveis levantadas nos documentos e estatísticas oficiais que sejam alvos inclusive de novos questionamentos.

Foram realizadas quatro entrevistas em profundidade, de escolha não- probabilística, julgada a relevância de sua tipicidade pelo próprio pesquisador, a partir das necessidades do estudo: “casos julgados exemplares ou típicos da população-alvo, ou de uma parte desta.” (LAVILLE; DIONNE, 1999, p. 170).

120 O Relatório de Gestão da SEESP referente ao ano de 2005, até maio de 2006, não estava

disponível. Em alguns momentos, são feitas analise complementares pelos Relatórios de Gestão do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE).

Entrevistaram-se no final do ano de 2004, dois gestores da SEESP e dois de organizações especializadas, considerados como lideranças políticas, formadores de opinião, que exercem cargos em altos escalões e tem importante papel no planejamento e gestão das parcerias intersetoriais. Além disso, considerou-se a acessibilidade, a cognição e a motivação dos entrevistados, facilitando, assim, a

igualdade e comparabilidade durante a análise (MAY, 2004).

As entrevistas foram individuais, com roteiro semi-estruturado, incluindo pequeno número de perguntas abertas (APÊNDICE A), para facilitar a sistematização, codificação e transcrição delas (RIZZINI; CASTRO; SARTOR, 1999). Cada entrevista durou, em média, uma hora e meia e foi integralmente gravada, respeitando os princípios da ética. Foi garantido o anonimato dos entrevistados, assinando-se um termo de compromisso com o pesquisador (APÊNDICE B), tendo em vista que são considerados policemakers nas relações Estado / sociedade civil, ou seja, pretende-se que o sigilo possa “favorecer uma relação mais espontânea, e conseqüentemente a revelação de dados que poderão comprometer o entrevistado se sua identidade não for protegida” (LÜDKE; ANDRÉ, 2003, p. 50). Com tais procedimentos, pode-se possibilitar a fala espontânea dos entrevistados e não apenas a escolha de uma resposta mais apropriada.

Por tais razões, não são apresentados os nomes dos entrevistados, assim como todas as características dos seus perfis. A seguir, mostra-se discretamente algumas das características destes, sendo-lhes atribuídos pseudônimos:

- SEESP 1: técnico de alto escalão na SEESP / MEC desde o governo Fernando Henrique Cardoso, ocupando cargo de gestão a partir de 2003, no governo Lula. Atua na educação especial há muito tempo, tendo exercido vários cargos nos níveis federal e estadual. Tem vínculos com outros técnicos, gestores e políticos atuantes em organizações especializadas. Possui nível superior, especialização e mestrado na área de educação.

- SEESP 2: ocupa cargo de gestão na SEESP / MEC, desde 2003. Ocupou cargos ligados à educação como um todo, em nível local. Não é especialista e nem possui histórico algum na área da educação especial e da deficiência. Nível superior e mestrado na área de ciências humanas e sociais.

- OE 1: político e militante em movimentos nas áreas de famílias e pessoas com

deficiência, e da criança e adolescente. Exerceu vários cargos de gestão em organizações especializadas locais e em órgãos representativos estaduais e

nacionais, assim como em órgãos públicos. Possui filho com deficiência e é considerado uma autoridade na área, tendo formação acadêmica em nível de doutorado. Possui um perfil mais conservador quanto à educação inclusiva.

- OE 2: também político e militante na área há muitos anos, tendo exercido vários

cargos como gestor nas esferas locais, estadual e federal em organizações especializadas e órgãos públicos. Destaca-se na área pela sua fluência e idéias inovadoras para as organizações especializadas e pelo perfil mais favorável a inclusão, com algumas ponderações. Possui nível superior na área de saúde.

4.1.1.2 Procedimentos para análise dos dados

Para chegar às conclusões, respostas às questões e cumprimento dos objetivos da pesquisa, buscou-se correlacionar as variáveis e categorias levantadas teoricamente com os documentos, estatísticas oficiais, além das surgidas nas entrevistas. Aplicou-se a técnica da análise de conteúdo para todos os dados, buscando identificar os discursos e práticas explicitados, e considerou-se nas diferentes fontes pesquisadas, um processo de elaboração no qual confrontam-se as motivações, desejos e investimentos dos sujeitos (BARDIN, 1977). Foram analisados os significantes e os significados dos textos e formas de expressão dos sujeitos envolvidos nas parcerias e na educação inclusiva, sendo realizada em duas etapas: a análise do conteúdo e a interpretação.

A análise de conteúdo é um método fundamentado nos estudos de Bardin (1977), que considera a comunicação como um processo, a palavra como mediadora do sentido, o discurso enquanto um processo de elaboração no qual confrontam-se as motivações, desejos e investimentos do sujeito, considerando as imposições do código lingüístico e as condições da produção da fala. Consiste em “operações de desmembramento do texto em unidades, em categorias segundo reagrupamentos analógicos” (BARDIN, 1977, p.153). Conforme Bauer (2005), o agrupamento dos conteúdos significativos em categorias, de acordo com os aspectos comuns entre estes, apresenta-se como uma forma de organizar e sintetizar os resultados da pesquisa. Ou seja, é uma técnica para produzir inferências de textos focais para contextos sociais de modo objetivado.

Embora as análises de conteúdo clássicas culminem com descrições numéricas de algumas características do corpus do texto, dá-se uma considerável atenção aos “tipos”, “qualidades” e “distinções” no texto, antes de qualquer quantificação. Desse modo, a análise de conteúdo é híbrida, pois faz uma ponte entre um formalismo estatístico e a análise qualitativa dos textos (BAUER, 2005). Concorda-se com Demo (1999, p.42) quando este explicita que a

análise de conteúdo em si se refere a conteúdos de prática, deixando em segundo plano a roupagem formal da elaboração discursiva. [...] Conteúdo, pois, será a implicação histórica concreta de vida das pessoas, os compromissos ideológicos em jogo, as lutas que envolvem o dia-a-dia, os fins que perseguem, os resultados obtidos e assim por diante.

Assim, esse método não fica preso apenas aos instrumentos que utiliza, mas trata, de modo hermenêutico, outros aspectos latentes, analisando aquilo que se inclui ou se deixa de fora dos textos oficiais: as insinuações, supressões, argumentações e retóricas, presentes nas verbalizações feitas durante as entrevistas (BAUER, 2005; MAY, 2004; DEMO, 1999).

Considerando tais premissas para o tratamento dos dados das entrevistas – que foram gravadas e transcritas – e dos documentos, seguiram-se os seguintes procedimentos da análise de conteúdo enumerados por Bardin (1977): 1. a pré-

análise, com a leitura geral ou como denominada “leitura flutuante”; 2. a exploração do material, com a nova leitura dos textos, com identificação de verbalizações e seus

respectivos temas; e 3. o tratamento dos resultados, mediante o agrupamento dos conteúdos (temas) em categorias, prosseguindo a inferência e a interpretação destas.

Utilizou-se a técnica da análise categorial temática proposta no método da análise de conteúdo, seguindo o procedimento da divisão do texto das entrevistas em unidades temáticas (conteúdos / temas), para em seguida agrupá-las e classificá-las em categorias específicas, definidas conceitualmente a partir da freqüência / recorrência dos temas predominantes nas verbalizações e nos escritos dos documentos (BARDIN, 1977).

Durante todas as etapas da análise, o vocabulário dos entrevistados e dos documentos foi respeitado e utilizado na íntegra, visando unicamente a auxiliar

na definição de temas e categorias, e registrar com fidelidade a percepção dos sujeitos sobre as parcerias e educação inclusiva.

Seguindo o método descrito nesta seção, são apresentados, a seguir, os resultados da pesquisa: intercalam-se e comparam-se os discursos contidos nos documentos e entrevistas quanto às práticas demonstradas neles e, também, nas estatísticas e dados oficias sobre os projetos e programas desenvolvidos em nome da integração / inclusão.