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A edição de número 19 da revista Amazônia Viva chama a atenção pela comunicação visual empreendida tanto pelas fotografias de capa, quanto pelas que permeiam a matéria principal. O título de capa destaca e expressão “Carajás preservada” (Figura 10) e a matéria principal acrescenta a este o hiperbólico termo “magnitude” (MAGNITUDE..., 2013, p. 34), já como uma preparação para a quantidade vasta de hipérboles que serão acessadas pelo narrador nesta narrativa, dividida em três episódios. A fotografia selecionada na capa é a imagem de uma onça pintada em posição frontal, porém o animal não é apresentado de forma ameaçadora, mas em posição de quem está se espreguiçando. Ao se associar com a mensagem verbal “preservada”, logo abaixo lendo-se a característica “encantadora” atribuída à onça, transmite- se ao leitor uma ideia de segurança, mesmo para um animal como a onça, que está ameaçado de extinção.

Figura 10 - Capa da Revista Amazônia Viva, n. 19, mar. 2013

No primeiro episódio o narrador apresenta a Floresta Nacional de Carajás, a chamada Flona, que completa quinze anos sob a proteção da Vale (MAGNITUDE..., 2013, p. 36-37). Logo no subtítulo da matéria, identificamos algumas características atribuídas à Flona, “viva”, “produtiva” e “consagrada”. O texto aparece em destaque dentro de uma imagem de duas páginas inteiras da floresta densa e de aparência selvagem, na qual predomina o verde das árvores e um céu envolto em neblina. Percebemos na construção narrativa que o autor trabalha a manutenção da Flona de maneira proporcional à exploração da mina de Carajás pela Vale, por meio da construção utilizada, na qual ele seleciona no mesmo excerto os termos contraditórios: “exploração” e “sustentável”.

A Flona é exaltada por meio de vários adjetivos nos três quadros, seu nome é retomado 44 vezes no texto, enquanto o da Vale é mencionado 11 vezes. Entre os adjetivos que gravitam em torno do nome da floresta encontramos os três já citados, além de: modelo, heterogênea, rica, intacta, imensa, belíssima, riquíssima, diversa, produtiva, conservada e preservada. Porém, além dos adjetivos que produzem efeitos de sentido, o narrador acrescenta uma fartura de números, dados e comparativos, que produzem efeitos de realidade e acrescentam ao personagem principal, a floresta, uma dimensão de grandeza. Assim, o narrador busca manter o caráter jornalístico e pretensamente fático do texto, sem perder também o caráter narrativo, o que transforma o texto em uma

[...] narrativa singular: um jogo de linguagem situado entre a narrativa da história (realista) e a literária (imaginativa). É esse jogo entre correspondência e desvios textuais da comunicação jornalística que a análise da narrativa pode observar e desvelar o sentido. (MOTTA, 2013, p.200)

Mesmo que o leitor não possua a exata noção do que representa o tamanho da área da floresta nacional (repetido seis vezes no texto) em quilômetros quadrados, o narrador utiliza-se de recursos facilitadores, como comparar, por exemplo, o tamanho da Flona ao de áreas como Cabo Verde, Luxemburgo, Polinésia Francesa e Ilha da Madeira ou a 400 campos de futebol, conforme informado no texto (MAGNITUDE..., 2013, p. 38). Dessa forma, ele aproxima a informação numérica do mundo do leitor e constrói o efeito de sentido desejado.

A utilização de recurso numérico e comparativo é bastante recorrente, sendo retomada em todos os episódios da narrativa. Ao todo são mencionados 45 dados numéricos, entre datas, porcentagens, área, e contagem de espécies.

O segundo episódio é composto de infográficos, localizados na narrativa principal logo após a apresentação da floresta. A natureza é personificada no título, denominada pelo narrador como “mãe-natureza”, e, além de fotos, percebemos a utilização de recursos visuais como mapas, gráficos que demonstram a área de preservação e quadros com nomes e números de espécies (MAGNITUDE..., 2013, p. 38). Os termos em destaque nos quadros são respectivamente: floresta, gigante, proteção, preservação, vigilância e biodiversidade; e estes introduzem o assunto tratado em cada box.

No terceiro episódio, o narrador direciona o enfoque para as espécies animais presentes na Floresta Nacional e utiliza uma grande quantidade de adjetivos ao trabalhar o tema principal deste quadro (MAGNITUDE..., 2013, p. 40). Gravitando em torno da palavra espécie, encontramos expressões como “infinidade”, “milhares” e “riquíssima variedade”. Outros sentidos, de ameaça, também são configurados, quando o narrador menciona “espécies” juntamente com a ação humana e utiliza as expressões “ameaçadas de extinção”, “ação lesiva do homem”, “ameaça”, “extinção”, “incêndios”, “degradada”, “desmatamento” e “extrema violência”, excertos que produzem o conflito, configurado na possibilidade de uma mudança de sorte da floresta, enquanto personagem central da narrativa. O sentido de ameaça é configurado fora da narrativa da Flona, como um antagonismo à preservação que ocorre dentro dela. O narrador constrói a seguinte argumentação: “a floresta guarda ainda uma espécie ameaçada nacional e mundialmente, a conhecida arara-azul-grande, e cinco em risco de extinção no planeta” (MAGNITUDE..., 2013, p. 41), e configura a Flona como resistência à degradação ambiental. Observamos que essa construção semântica atravessa a construção narrativa inteira, como no excerto:

[...] a Flona de Carajás compõe o mosaico de unidades de conservação do complexo de Carajás. O conjunto reúne uma área de biodiversidade preservada de mais de um milhão de hectares, em uma região em que já muito degradada pela atividade humana, onde o ‘arco do desmatamento’ passou com extrema violência. (MAGNITUDE..., 2013, p. 41).

No terceiro episódio, o narrador apresenta o tema da educação ambiental, já trabalhado em edições anteriores da revista Amazônia Viva, e destaca as parcerias com instituições de pesquisa e com o Estado em prol da comunidade do entorno da Flona Carajás (MAGNITUDE..., 2013, p. 42-43). Ele utiliza discurso direto de um porta-voz da Vale, engenheiro agrônomo da empresa, na busca por um equilíbrio discursivo, visto que a empresa, no plano da ação do mundo fora do texto, sofre críticas de ambientalistas por suas atividades exploratórias, tendo sido eleita, em 2002, conforme já apontamos acima, pelo Public Eye Awards, “que se apresenta

como o ‘Prêmio Nobel da vergonha corporativa mundial’” (PINTO, 2012a, p. 229), como a pior corporação do mundo, em uma votação feita via internet, na qual obteve 25 dos 80 mil votos e ganhando das outra cinco empresas multinacionais.

Por esta razão, o personagem em discurso direto busca oferecer um discurso antagônico ao da exploração, com um tom conciliador, como o disposto no excerto

Outra maneira de conservar a floresta é operar nossas minas com o máximo respeito ao meio ambiente, desenvolvendo e buscando pesquisas científicas que nos permitam aplicar a mais moderna tecnologia disponível no mercado mundial para mitigar ou minimizar os impactos ambientais inerentes à exploração de minérios. (CASTILHO, Alexandre apud MAGNITUDE..., 2013, p. 42).

Além desse personagem, o chefe da Flona Carajás também é apresentado ao leitor, e são reproduzidas algumas falas em discurso direto, distribuídas no primeiro, terceiro e quarto episódios. Todas elas são semanticamente similares aos sentidos evocados pela fala do personagem supracitado e também pelas do narrador: de conciliação entre degradação e preservação, e de compensação por parte da empresa pelas atividades extrativistas exercidas na mina.

De uma forma geral, além do conteúdo informativo da narrativa, ela também apresenta conteúdo técnico e pedagógico, utiliza nomes científicos de todas as espécies citadas no texto entre parênteses, ao lado do nome utilizado correntemente. Assim, cria “referencialidade de autoridade para dizer e poder dizer [...] que autentica e legitima a relação” (MOTTA, 2013, p. 201) e a informação. O narrador opta ainda por ilustrar várias dessas espécies citadas com imagens, fornece dados sobre quantas dessas espécies ainda existem e quais estão ameaçadas de extinção. Ao todo 26 são citadas, entre animais e vegetais. Desse modo, se consolida a dimensão de poder técnico sobre o assunto tratado e se criam as “condições de verdade” (MOTTA, 2013, p. 201) assentadas na ideia de fidelidade e veracidade da representação narrativa.