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4. ESTRATÉGIAS DE GESTÃO SUSTENTÁVEL DA ÁGUA EM ESPAÇOS VERDES

4.2 CRITÉRIOS DE PLANEAMENTO – FATORES AMBIENTAIS

4.2.1.2 Caraterização do Clima Mediterrânico

- O período invernal, que ocorre entre outubro e abril, caracterizado pela presença de humidade, frio e chuva, registando-se um excesso hídrico mais acentuado a norte, comparativamente ao sul do país;

- O período estival, compreendido entre maio e setembro, com acentuado défice hídrico, sobretudo a sul do território (Feio, 1991).

O facto de a estação seca coincidir com a estação quente, constitui a principal condicionante que o clima imprime à manutenção de um espaço verde urbano, no nosso país. É durante este período estival que as plantas estão na fase mais intensa do ciclo vegetativo, pelo que é necessário regar para suprir a falta de humidade do solo e compensar as perdas por evapotranspiração. Assim, é durante este período que se devem concentrar esforços para a gestão racional e eficiente da água, uma vez que, durante este período, as necessidades são grandes e a disponibilidade reduzida. Assim, podemos considerar que, à luz do clima mediterrânico, são duas as caraterísticas climáticas que assumem maior importância: a temperatura e a deficiência hídrica (Cortes, 2011).

4.2.1.3 TEMPERATURA

O desenvolvimento vegetativo das plantas está intimamente relacionado com a temperatura do ar, ocorrendo apenas quando a temperatura se situa entre determinados intervalos (Abreu, 2010). Simultaneamente, para cada espécie, existe um intervalo de temperatura, mais alargado que o anterior, que permite a ocorrência da fotossíntese (Chaves et al., 2004). Quando a temperatura atinge valores fora do limite do intervalo, não muito distantes, a planta entra em estado de latência, até que as condições climáticas lhe sejam favoráveis. Quando são atingidos os limites críticos de sobrevivência, as alterações provocadas são irreversíveis e as plantas podem mesmo não sobreviver (Begon et al., 1990).

Podemos distinguir, relativamente à tolerância à temperatura do ar, duas tipologias de plantas: as que são afetadas por temperaturas demasiado baixas e as que sofrem com temperaturas demasiado elevadas. Ambas serão abordadas no subcapítulo 4.2.3 referente ao “fator vegetação”.

Com base na classificação do United States Department of Agriculture (USDA) feita para os Estados Unidos, Cortes (2011) elabora o mapa representado na figura 4.1, que classifica as várias zonas do território nacional de acordo as temperaturas anuais mínimas registadas. O mapa tem por base os dados fornecidos pelo Instituto Português do Ar e da Atmosfera (IPMA), registados entre 1971-2000. Para o cálculo das temperaturas médias mínimas, consideraram-se os dados em que não ocorreram falhas nos meses de dezembro, janeiro e fevereiro, assumindo que a temperatura mínima, calculada no período de inverno, equivalia à temperatura mínima anual. Através da aplicação do software estatístico R, que permitiu o tratamento dos dados, obtiveram-se as séries de temperaturas mínimas absolutas anuais para o período de trinta anos. O sistema USDA utiliza onze classes de amplitude de 10º F (equivalente a 5,6º C), subdivididas em duas, cada uma de 5º F (equivalente a 2,8º C). No entanto, face à variação das temperaturas no território nacional ser inferior à verificada nos EUA, Cortes (2011) divide as subclasses utilizadas no sistema USDA em dois intervalos, identificados com “a” e “b”, cada um deles correspondendo assim a um amplitude de 2,5º F (equivalente a 1,4º C), identificadas como “1” e “2”.

Pela análise do mapa, constata-se que predominam as zonas 9b1 (caraterizada pelo intervalo de temperatura mínima absoluta anual entre -3,9º C a -2,5º C) e 9b2 (que compreende o intervalo de temperatura mínima absoluta anual entre -2,5º C e -1,1º C), assinaladas ambas com os dois verdes de tonalidade mais clara na figura 4.1.

4.2.1.4 DEFICIÊNCIA HÍDRICA

Conforme referido, para além da temperatura, o outro fator climático com grande influência nas regiões de clima mediterrânico é a deficiência hídrica uma vez que no verão, que corresponde à estação seca, as plantas perdem mais água por transpiração, através dos estomas. Quando o solo não apresenta a humidade necessária, capaz de suprir as necessidades das plantas, estas adotam várias estratégias, apresentadas no subcapítulo 4.2.3 referente ao “fator vegetação”, que lhes permitem, na maioria dos casos, sobreviver.

No âmbito da análise da influência dos fatores climáticos nas necessidades hídricas da vegetação, considera-se importante avaliar a relação entre a precipitação e a evapotranspiração 16. O índice agrometeorológico de aridez (Ag) definido pela FAO, compara estas duas variáveis, de acordo com a equação 4.1:

________________________________

16 O conceito de evapotranspiração é definido no capítulo três - “Necessidades Hídricas das Plantas –

Ag = ୔

୉୘୔ [4.1]

Em que:

P: precipitação;

ETP: evapotranspiração média, mensal ou anual.

No entanto quando se utiliza a equação 4.1 num compasso de tempo anual, o índice de aridez obtido não irá refletir a sazonalidade que carateriza o clima mediterrânico, pois o défice de precipitação no verão acaba por ser compensado pelo excesso de precipitação no inverno.

Assim, Cortes (2011) sugere a utilização de um outro indicador para avaliar a secura ou a humidade de um determinado local, designado por deficiência potencial hídrica (DH), obtido pela aplicação da equação 4.2:

DH = Σ (ETP – P)+ [4.2]

Em que:

Σ (ETP – P)+, em milímetros, se calcula para todo o ano, por períodos, apenas quando ETP – P > 0, refletindo assim a disparidade sazonal característica do clima Mediterrânico (Cortes, 2011).

Com base neste indicador, calculado para períodos de 10 dias, utilizando os dados de ETP e de P disponibilizados pelo Instituto Português do Mar e da Atmosfera, entre 1961 e 1990, Cortes (2011) elabora o mapa de deficiência hídrica de Portugal Continental (figura 4.2).

O quadro 4.1 identifica as classes de deficiência hídrica (DH) utilizadas no mapa, através do qual se verifica que os valores máximos de DH se verificam no Sudeste de Portugal, e os valores mínimos no extremo Noroeste. Em termos de área, a classe predominante corresponde às zonas DH 7, representada a verde-claro, e DH 8, representada a amarelo.

Simultaneamente, no quadro 4.1 identificam-se as classes de deficiência hídrica resultantes do cruzamento das duas variáveis (zonas USDA e DH), com base nos mapas das figuras 4.1 e 4.2, de que resulta o mapa da figura 4.3.

Figura 4.3 – Mapa cruzado das zonas USDA com as zonas de deficiência hídrica, para Portugal Continental Fonte: Cortes, 2011

Figura 4.2 – Mapa das zonas de deficiência hídrica em Portugal Continental. Fonte: Cortes,

2011 Figura 4.1 – Mapa de zonas USDA para

Quadro 4.1 – Classes de deficiência hídrica para Portugal Continental. Fonte: Cortes, 2011

Zona DH Intervalo de DH (mm) Classe de DH no mapa cruzado

3 200 a 300 Muito húmida 4 300 a 400 Húmida 5 400 a 500 Húmida 6 500 a 600 Húmida 7 600 a 700 Seca 8 700 a 800 Seca 9 800 a 900 Seca 10 900 a 1000 Muito seca

Pela análise do mapa cruzado (figura 4.3) das zonas USDA com as zonas de deficiência hídrica verificamos que, na maioria do território nacional, as zonas mais frias correspondem a zonas mais húmidas, enquanto as zonas mais quentes estão relacionadas com as mais secas. Em termos de área, predominam as zonas identificadas como “9 seca” e “9 húmida”.

Com o recente aquecimento global, a maior parte dos cenários de clima futuro preveem um substancial aumento na temperatura média do ar em todo o país (Miranda et al. 2002). Os aumentos poderão ser muito grandes em alguns índices, como o número de dias quentes (temperatura máxima acima de 35º C) e noites tropicais (temperatura mínima acima de 20º C). De acordo com os mesmos autores, são de esperar diminuições na pluviosidade, isto é, é de prever o aumento na aridez do clima, pelo que a gestão eficiente do recurso de água assume grande importância (Miranda et al. 2002).

4.2.2 FATOR SOLO

4.2.2.1 ENQUADRAMENTO

O solo resulta da ação de um conjunto de elementos que contribuíram para a sua formação, nomeadamente o tempo, o clima, organismos vivos, o Homem, a rocha-mãe e o relevo, constituindo um sistema de natureza dinâmica e em permanente evolução, reflexo da paisagem em que se insere (Madeira, 2008).

Na camada superficial da crosta terrestre, registam-se com frequência ações erosivas, pelo desgaste e remoção de materiais, causados pela água, que não se infiltra e escorre sobre o terreno. Assim, em condições naturais, o processo de “erosão geológica” seria um processo gradual e lento, no qual o binómio solo natural - vegetação natural coexistem em equilíbrio, numa relação de relativa estabilidade, em que o desenvolvimento do solum em profundidade compensaria a destruição causada pela destruição natural (Costa, 1999). No entanto, a intervenção do Homem sobre o solo, provocada por algumas práticas incorretas de utilização, que reduzem a sua capacidade de produção, assim como pela sua ocupação excessiva com edificação e infraestruturas, tende a provocar o aumento dos processos erosivos, fomentando uma “erosão acelerada” (Magalhães, 2001).

De acordo com a Food and Agriculture Organization (FAO), os processos de degradação do solo, que influenciam a sua capacidade de fornecer bens e serviços à população, ocorrem a uma velocidade bastante mais rápida do que a velocidade de formação do solo (pedogénese). A FAO identifica que, em 2015, 33% dos solos do Mundo estão degradados. Esta degradação ameaça a capacidade de se garantirem as necessidades das gerações futuras, uma vez que os solos permitem, entre outros benefícios, a produção alimentar (FAO, 2015). Por outro lado, de acordo com vários investigadores, a taxa de formação de solo varia entre os 0,025 mm/ ano e os 1 mm/ ano, podendo considerar-se um recurso não renovável quando considerado à escala de vida humana (Magalhães, 2001).

O solo é um recurso fundamental atuando como suporte das atividades sociais e das funções ecológicas, interferindo no balanço térmico atmosfera e constituindo um sistema de filtro e tampão, do qual depende a quantidade e a qualidade de água doce disponível (Magalhães, 2001). Simultaneamente, o solo serve de suporte às plantas terrestres, que nele desenvolvem as suas raízes, retirando dele grande parte dos elementos nutritivos de que carecem (Costa, 1999).

A Carta Europeia dos Solos, publicada em 1972 pelo Conselho da Europa, defende o solo como sendo um bem raro, sensível e dificilmente renovável, que deve ser preservado. De acordo com o mesmo documento, o solo arável deve ser protegido, como um objetivo prioritário de planeamento à escala rural e urbana.

Durante as fases de construção e manutenção dos espaços verdes urbanos, devem ser adotadas medidas que potenciem a preservação do solo, das quais se destacam:

- Adoção de medidas que promovam a mobilização mínima do solo, que não danifiquem a sua estrutura;

Figura 4.4 – Triângulo textural que permite identificar a textura do solo. Fonte: adaptado de Botelho da Costa,

1999

- Decapagem e armazenamento, em pargas, da camada superficial de solo, para posterior utilização;

- Revestimento da cobertura do solo;

- Promoção do melhoramento do solo através da compostagem de resíduos orgânicos resultantes de operações de limpeza e manutenção locais, devolvendo nutrientes ao solo.

As propriedades físicas do solo influenciam o uso a que está sujeito. Por outro lado, também as condições do uso do solo podem condicionar e alterar as suas características, uma vez que o solo é um meio bastante vulnerável às agressões externas. A título de exemplo, em solos nos quais se pratique uma atividade desportiva intensa, o regime de rega e o excesso de pisoteio podem degradar, de forma irreversível, o solo (Palomo, 2003).

Do ponto de vista da gestão da rega de espaços verdes, devem ser consideradas as propriedades do solo como sendo a sua textura, estrutura, profundidade, arejamento, capacidade de retenção de água, permeabilidade, taxa de infiltração, além de outros fatores como o pH e a salinidade.

4.2.2.2 TEXTURA

A textura do solo relaciona-se com a proporção relativa em que os diferentes tipos de partículas minerais estão presentes no solo: areia (partículas com diâmetro compreendido entre 2 a 0,02 mm), limo (compreende as partículas com diâmetro entre 0,02 e 0,002 mm) e argila (quando as partículas apresentam diâmetro inferior a 0,002 mm) (Costa, 1999).

A textura do solo depende de vários fatores, nomeadamente a rocha-mãe, a topografia e o clima, podendo ser determinada através de análises mecânicas, também designadas por análises granulométricas, que determinam a proporção dos diversos elementos minerais constituintes do solo (Costa, 1999). A figura 4.4 representa um triângulo textural do solo que permite determinar a sua classe textural em função da proporção relativa em que areia, limo e argila estão presentes. A título de exemplo, se um solo possui menos de 15% de argila e limo,

considera-se um solo arenoso; quando a percentagem de argila é superior a 40%, estamos perante um solo argiloso; uma composição de 40% de areia, 40% de limo e 20% de argila constitui um solo de textura franca (Cortez, 2003).

4.2.2.3 ESTRUTURA

Por estrutura do solo entende-se a característica física do solo expressa pelo tamanho, forma e arranjo das partículas e dos respetivos vazios, tendo em conta não só as partículas individuais de areia limo e argila, mas também as partículas compostas, designados por “pedes” ou agregados estruturais (Costa, 1999). A definição da estrutura do solo é feita através da análise completa das unidades de organização (pedes, fundo matricial e carateres pedológicos), da descrição da sua tessitura e da especificação do nível de organização que constituem esse mesmo solo (Costa, 1999).

Além da matéria mineral, o solo contém matéria orgânica, resultante da decomposição de restos de plantas e outros organismos, principalmente devido à ação de microrganismos presentes no solo (Costa, 1999). A produção da matéria orgânica, também designada por húmus, é influenciada por vários fatores, nomeadamente a temperatura e a humidade, sendo praticamente interrompida em clima mediterrânico durante a estação quente. Consequentemente, a fase de destruição de matéria orgânica é, para solos que sofrem influência de clima mediterrânico, muito superior à sua renovação (Magalhães, 2001).

4.2.2.4 AREJAMENTO

O solo contém ainda, nos espaços intersticiais, proporções variáveis de água com substância dissolvidas (solução do solo) e ar (atmosfera do solo), sendo ambos indispensáveis para a sobrevivência da vegetação (Costa, 1999). Quando todos os poros estão totalmente preenchidos por água, e todo o oxigénio é eliminado, considera-se que o solo está saturado. Se, pelo contrário, o ar ocupa quase a totalidade dos poros e a presença da água é reduzida, o solo apresenta-se seco. Consequentemente, quando o solo apresenta arejamento elevado, as plantas vão ter dificuldade para extrair a água do solo. Quando não existe oxigénio, encontrando-se o solo saturado, as raízes das plantas não podem respirar, libertando não só produtos tóxicos em resultado de alterações metabólicas, como podendo ficar inibidas de absorver água. Assim, é necessário manter um equilíbrio entre a quantidade de água e a quantidade de oxigénio presentes no solo, de modo a que ambos estejam em quantidade suficiente para as plantas (Irrisoft, 2004). As proporções de ar e água no solo podem variar consideravelmente num curto espaço de tempo (Costa, 1999).

4.2.2.5 PROFUNDIDADE

A profundidade do solo pode atuar como fator limitante ao desenvolvimento do material vegetal, pois se a sua profundidade for muito reduzida, as raízes das plantas não vão conseguir desenvolver-se adequadamente. Utilizando como exemplo os relvados, “a altura média ideal de terra deve ser de 15 a 20 centímetros. Se fosse menos espessa, a camada não permitiria um enraizamento profundo e o relvado ficaria mais sensível às variações climáticas, à secura e ao frio” (Brochard, 1999).