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4. ESTRATÉGIAS DE GESTÃO SUSTENTÁVEL DA ÁGUA EM ESPAÇOS VERDES

4.2 CRITÉRIOS DE PLANEAMENTO – FATORES AMBIENTAIS

4.2.3 Fator vegetação

A vegetação desempenha uma componente fundamental no projeto de Arquitetura Paisagista. No sentido de projetar espaços verdes sustentáveis, o arquiteto paisagista deve ter em conta critérios ambientais que condicionam a adaptabilidade de determinada espécie, nomeadamente as necessidades hídricas, a temperatura, a tolerância ao vento, a resistência a pragas, doenças ou poluição, entre outros fatores, entendendo a vegetação como “elemento vivo” que é (Fálcon, 2007).

Por outro lado, a seleção das espécies também pode ser condicionada por diversos fatores paisagísticos, como sendo, por exemplo, a taxa de crescimento, o porte atingido, o regime da folha ou a periodicidade da floração.

Um projeto de um espaço verde sustentável pressupõe a existência de uma estreita relação entre as plantas propostas no projeto de Arquitetura Paisagista e as condições edafo- climáticas locais, na medida em que a ação do clima sobre as plantas condiciona a sua sobrevivência.

Em países de clima Mediterrânico, conforme caraterizado no subcapítulo 4.2.1.2, a aplicação de rega na estação seca é fundamental para a sobrevivência de muito do material vegetal. Ainda que seja possível melhorar a adaptação de espécies caraterísticas de outros climas às condições mediterrânicas, tornando-as melhor adaptadas a condições que não são as que constituem o seu ambiente natural, essa aclimatação estará sempre associada ao aumento de custos ambientais e económicos.

4.2.3.1 TOLERÂNCIA AO CALOR

Conforme referido no subcapítulo 4.2.1.3 inserido no “fator clima”, podemos considerar que, em regiões que apresentam clima mediterrânico, a temperatura representa uma das variáveis climáticas com maior influência na adaptabilidade da vegetação, distinguindo-se duas tipologias de plantas: as que são afetadas por temperaturas demasiado baixas e as que sofrem com temperaturas demasiado elevadas (Abreu, 1985).

Relativamente às primeiras, a maioria das plantas cultivadas em Portugal, só sofre danos irreversíveis quando ocorre a formação de gelo dentro dos seus tecidos o que, de acordo com Raposo (1998), acontece quando a temperatura atinge os -1,5º C.

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4.2.3.2 TOLERÂNCIA À DEFICIÊNCIA HÍDRICA

A par do calor, a tolerância à deficiência hídrica representa outro fator importante que condiciona a adaptabilidade das espécies em clima mediterrânico. As plantas resistem à seca ou porque a evitam (plantas que só vivem na estação húmida do ano), ou porque evitam a desidratação (fechando os estomas para limitar a perda de água) ou porque têm mecanismos metabólicos para tolerar alguma desidratação dos tecidos (plantas tolerantes).

A figura 4.8 traduz a resposta das plantas a situações de deficiência hídrica. No “diagrama a” é representada a sensibilidade das várias funções e processos celulares com a diminuição do potencial hídrico. As linhas horizontais mostram a gama de potencial hídrico para a qual, na maioria das plantas ocorre uma resposta clara, enquanto a linha vertical tracejada representa o início do fechar dos estomas. O “diagrama b” identifica o desenvolvimento temporal das respostas moleculares a uma perturbação da turgidez (Larcher, 1995).

Figura 4.8 – Diagrama representativo da resposta das plantas a situações de deficiência hídrica Fonte: adaptado de Larcher, 1995

A perda de turgidez é o primeiro efeito biofísico da carência hídrica, pelo que as atividades relacionadas com a turgidez, nomeadamente, o crescimento, são as mais sensíveis ao défice hídrico (Taiz e Zeiger, 2002). Assim, as plantas podem desenvolver diversas estratégias que lhes permitem sobreviver em condições de deficiência hídrica:

- Alteração no crescimento da planta, não só da dimensão das folhas individuais, mas também do número de folhas, uma vez que diminui quer o número, quer o crescimento dos ramos. O processo do crescimento dos caules é menos estudado, mas provavelmente é afetado pelas mesmas forças que limitam o crescimento foliar durante o período de stress (Taiz e Zeiger, 2002);

- Alteração (decréscimo) na área foliar permite um ajustamento da transpiração da planta a condições de défice hídrico, ao longo do tempo. As folhas de muitas espécies entram em senescência e posteriormente caem, durante os períodos de seca, voltando a surgir folhas novas após uma chuvada podendo, nos desertos, este ciclo ocorrer várias vezes durante uma estação (Taiz e Zeiger, 2002);

- Alteração (expansão) do sistema radicular que permite à planta melhorar a absorção da água, quer pelo aumento da parte radicular, em vez do desenvolvimento da parte aérea (Larcher, 2005), aumentando o rácio entre o sistema radicular e as folhas, quer pelo rápido crescimento das raízes para camadas de solo mais profundas, presumivelmente mais húmidas, assegurando a reidratação da planta.

O fecho dos estomas representa uma outra resposta por parte das plantas com vista à adaptação a situações de stress hídrico, que lhes permite diminuir a transpiração (Meidner e Sheriff, 1976). Muitos estudos indicam que muitas espécies fecham os estomas quando pelo menos uma parte do sistema radicular experiencia a falta de água, mesmo sem que as folhas estejam em carência hídrica. Mansfield e Davies (1985) classificam esta resposta dos estomas como feedforward, isto é, as raízes transmitem às folhas um sinal de que a disponibilidade de água é reduzida, mesmo antes que aquelas sofram essa carência.

O espessamento da cutícula, que permite reduzir a perda de água pela epiderme (transpiração cuticular), o desenvolvimento de pelos nas folhas que as protegem do sol, a produção de substâncias resinosas que cobrem as folhas, assim como a redução das folhas a espinhos são outro tipo de estratégias que as plantas desenvolvem como resposta à carência hídrica (Taiz e Zeiger, 2002).

Simultaneamente, o estado fisiológico da planta, a sua idade, a sensibilidade dos estomas e do lenho aos défices hídricos, assim como a extensão e profundidade do seu sistema radicular, são fatores que condicionam a absorção da água (Sebanek, 1992). Para

além destas características da planta, quer os fatores ambientais, nomeadamente a temperatura, quer o solo, abordados nos subcapítulos anteriores, condicionam a água que está disponível para as plantas absorverem.

4.2.3.3 VEGETAÇÃO E QUALIDADE DA ÁGUA DE REGA

No âmbito desta tese que visa a Gestão Sustentável da Água no Projeto de Arquitetura Paisagista e que aborda a reutilização de água para rega, entende-se pertinente abordar a forma como a qualidade da água pode afetar o desenvolvimento do material vegetal.

As plantas necessitam de determinados nutrientes considerados essenciais para o seu desenvolvimento. São eles: carbono, oxigénio, hidrogénio, azoto, fósforo, potássio, cálcio, magnésio, enxofre – designados por macronutrientes; ferro, manganês, zinco, cobre, molibdénio, boro e cloro – considerados micronutrientes. Com exceção do oxigénio (obtido para a respiração da planta) e do carbono, todos os outros nutrientes são extraídos do solo através das raízes (Costa, 1999).

Por um lado, a utilização de água reciclada para rega poderá contribuir para o fornecimento de nutrientes às plantas. No entanto pode também ter na sua composição, elementos que impeçam o normal desenvolvimento das plantas, pelo que é necessário conhecer a sua composição química, a quantidade e a natureza das substâncias em suspensão, a composição bacteriológica, assim como a temperatura da água e o oxigénio dissolvido, entre outros parâmetros. Simultaneamente, as águas residuais tratadas podem ser responsáveis pela introdução de poluentes emergentes, nutrientes, metais pesados e agentes patogénicos no solo, pelo que os parâmteros físico-quimicos e biológicos do solo devem ser avaliados e acautelados em qualquer estratégia de gestão de água.

4.2.3.4 CONTRIBUTO DA VEGETAÇÃO PARA A GESTÃO SUSTENTÁVEL DA ÁGUA EM ESPAÇOS VERDES EM CLIMA MEDITERRÂNICO

A escolha da vegetação deverá estar adequada a cada situação e projeto, considerando aspetos paisagísticos (porte e forma da planta, taxa de crescimento, regime da folha, período e duração de floração, textura, entre outros) e aspetos ambientais.

Assim, no sentido de projetar espaços verdes sustentáveis, adaptados ao clima mediterrânico, que possibilitem a gestão eficiente da água, considera-se importante avaliar a disponibilidade hídrica do local. A seleção de plantas com necessidade hídrica próxima da disponível, assim como a escolha de plantas pertencentes à série de vegetação do local

garantem melhor adaptabilidade do projeto às condições edafo-climáticas. Simultaneamente, promove o desenvolvimento da biodiversidade, promovendo a fixação de fauna através da criação de maciços arbóreos e arbustivos densos.

Outros critérios ambientais a ter em conta na escolha da vegetação são, por exemplo, a resistência a pragas e doenças, assim como a tolerância à poluição e à densidade de uso pretendida (Palomo, 2003).

A aplicação do conceito de hidrozona (já definido no capítulo 3.7), isto é, de agrupar espécies com necessidades hídricas semelhantes, permite otimizar os consumos de água de rega. As plantas com necessidade hídrica reduzida devem ser colocadas nas áreas extensivas ou de enquadramento, com função maioritariamente cénica. Em oposição, a vegetação com necessidade hídrica moderada ou alta, deve ocupar as áreas mais intensivas dos espaços verdes. A área de relvados, em situação de clima Mediterrânico, deve restringir-se às áreas cuja utilização e valência justifiquem a sua existência uma vez que acarretam maior consumo de água, entre outros recursos, nomeadamente energia e mão-de-obra. De notar que o conceito de hidrozona não equivale ao conceito de setor de rega, uma vez que uma hidrozona pode conter vários setores Ainda assim, a criação de hidrozonas, numa perspetiva de sustentabilidade, deve ser limitada ao essencial uma vez que obrigam “a um grande esforço de monitorização e avaliação, e as vantagens que provêm da existência de um elevado número de zonas não compensam o esforço” (Sanchez, 2009).

Simultaneamente, conforme já referido, a topografia pode estar coordenada com estas estratégias, colocando nas zonas mais baixas do terreno a vegetação que necessita de maior dotação de rega.

Ao mesmo tempo, a criação de áreas com revestimentos permeáveis intercalados com vegetação nas áreas denominadas extensivas, pode permitir reduzir os consumos de água para rega. Para tal, o sistema de rega tem de estar adaptado de forma a não regar as áreas com revestimentos inertes, direcionando a água apenas para as zonas plantadas.

A existência de vegetação desempenha um papel importante na regulação do ciclo hidrológico em meio urbano, à escala local. As espécies com raiz aprumada, que penetram no solo a uma maior profundidade, permitem a infiltração da água até às camadas mais profundas do solo, contribuindo para a recarga mais eficiente dos aquíferos. Por oposição, a existência de espécies de raiz fasciculada aumentam a área potencial de infiltração e acumulação de água ao nível radicular, melhorando a estrutura do solo (Gale, 2005). No entanto, em ambos os casos, a vegetação desempenha um papel importante na diminuição do escoamento superficial, contribuindo simultaneamente para a diminuição da velocidade de escoamento, bem como para o aumento da evapotranspiração.

Quando possível, o projeto de Arquitetura Paisagista deve prever a colocação das zonas verdes a um nível mais baixo que as zonas pavimentadas, permitindo que aquelas beneficiem do escoamento superficial da água proveniente das zonas pavimentadas (Bodeker, 1996).

Em fase de construção, pode optar-se pela programação dos trabalhos de plantação e sementeira de forma a tirar partido da época de chuvas (Palomo, 2003).

A manutenção frequente do material vegetal, retirando nomeadamente as folhas velhas e improdutivas também permite reduzir consumos de água desnecessários (Fálcon, 2007).