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1.5 O TERCEIRO SETOR EM PORTUGAL

1.5.3 Caraterização do terceiro setor

Depois da abordagem mais teórica, importa agora caracterizar o terceiro setor de forma quantitativa, de forma a melhor compreender o peso deste setor na atualidade. Esta caracterização tem por base uma das publicações mais recentes referentes ao setor, o estudo “Conta Satélite da Economia Social 2010”, que retrata o setor em 2010.

Em 2010, este setor era constituído por 55.383 organizações, representando 2,8% da produção e do VAB nacional, ocupando o quinto lugar neste último indicador, sendo antecedido pelas atividades financeiras e de seguros com 6,9%, a construção com 6,3%, os transportes e armazenagem com 4,9% e a saúde com 4,7%. Ao nível do emprego remunerado, ocupava o segundo lugar com 5,5%, logo a seguir à construção com 9,9% (INE & CASES, 2013).

No que diz respeito a necessidades de financiamento, o terceiro setor necessitou de 570,7€ milhões líquidos, isto é, 0,3% do Produto Interno Bruto (PIB). Sendo os recursos estimados em 14.177,9€ milhões de euros provenientes: da produção, em 62,8%, de transferências e subsídios, em 23,8%, e de rendimentos de propriedade, em 10,3%. As despesas estimaram-se em 14.748,6 € milhões, distribuídas da seguinte forma: 31,4% para

consumo intermédio, 26,8% para remunerações e 24,3% para transferências sociais (INE & CASES, 2013).

1.5.3.1

Caracterização do setor por tipo de atividade desenvolvida

Importa agora caraterizar o setor através da tipificação das atividades desenvolvidas pelas suas organizações. Esta tipificação foi efetuada tendo em consideração a Classificação das Atividades das Organizações da Economia Social (CAOES), conforme Anexo 1.

A tabela seguinte ilustra a representatividade por tipo de atividade das organizações considerando os indicadores: número de organizações, VAB e Emprego Remunerado (equivalente a trabalhadores a tempo inteiro).

CAOES Número

Organizações VAB

Emprego Remunerado

Ação Social 14,0% 41,3% 48,6%

Agricultura, Silvicultura e Pescas 0,5% 0,2% 0,4%

Atividades de Transformação 0,7% 5,1% 2,8%

Atividades Financeiras 0,2% 12,4% 3,2%

Comércio, Consumo e Serviços 1,2% 3,1% 3,2%

Cultos e Congregações 15,8% 13,8% 15,8%

Cultura, Desporto e Recreio /Lazer 48,4% 6,8% 5,4%

Desenvolvimento, Habitação e Ambiente 4,9% 1,5% 2,3%

Ensino e Investigação 4,2% 11,8% 10,5%

Não Especificadas 4,1% 0,1% 0,3%

Organizações Profissionais, Sindicais e

Políticas 4,7% 0,4% 3,6%

Saúde e Bem-Estar 1,5% 3,5% 4,0%

Tabela 1- Comparação da representatividade por tipo de atividade das organizações do terceiro setor (adaptado de INE & CASES, 2013, p.15)

Ao analisar a tabela verifica-se que as organizações que desenvolvem atividade na ação social têm a maior representatividade, tanto ao nível do VAB (41,3%) como no emprego remunerado (48,6%), o que contrasta claramente com a representatividade do número de organizações (apenas 14%). As organizações de cultura, desporto e recreio representavam o maior número de organizações existentes, com 48,4%, mas representavam apenas 6,8% do VAB e 5,4% do emprego remunerado. As organizações de cultos de congregações têm uma representatividade idêntica nos três indicadores, 18,5% no número de organizações e emprego remunerado e 13,8% no VAB. Verifica-se que as organizações com atividade financeira, embora com uma representatividade de 0,2%, ocupam o terceiro lugar no que concerne ao VAB, com 12,4%. Constata-se, também, a relevância das organizações de ensino e investigação, que representavam 11,8% do VAB e 10,5% do emprego remunerado.

De seguida analisam-se os recursos financeiros das várias organizações do terceiro setor por atividade, considerando os indicadores: produção, transferências correntes e subsídios, rendimentos de propriedade e outros recursos6, com base no gráfico seguinte.

Gráfico 7- Recursos das organizações do terceiro setor, por atividade, em 2010 (INE & CASES, 2013, p.16)

Ao analisar o gráfico, verifica-se que as organizações da ação social se destacam claramente das outras, com um peso muito importante ao nível financeiro, uma vez que são as que movimentam os maiores montantes financeiros do setor, tendo a maior representatividade em todos os indicadores apresentados. Destacam-se, de seguida, as organizações de atividades financeiras, com uma representatividade de 43% nos rendimentos de propriedade e 9% na produção. As organizações de cultos de congregações têm algum peso significativo no setor ao nível financeiro, representando 14,6% das transferências correntes e subsídios, 14% de outros recursos e 10,2% da produção. Destacam-se ainda as organizações de ensino e investigação que representam 10,3% da produção, 13,9% nas transferências correntes e subsídios e 12,6% de outros recursos. As organizações de atividade de transformação estão no segundo lugar no indicador produção, representando 13,6%, tendo alguma representatividade em outros recursos. As organizações de cultura desporto e recreio têm alguma representatividade, apresentando 7,7% da produção, 5,5% das transferências correntes e subsídios e 9,2% em outros recursos.

Depois de analisado o peso dos recursos das organizações por cada tipo de atividade, é agora altura para analisar distribuição da fonte de recursos em cada tipo de organização. O sub-capítulo seguinte ilustra essa realidade.

1.5.3.2

Caracterização por grupos de entidades do terceiro setor

Faz-se agora a caraterização tendo em consideração os grupos de entidades que constituem o terceiro setor português, por natureza institucional. Estes foram divididos em 5 grupos:

6

“Os outros recursos da Economia Social incluem as contribuições sociais, as transferências de capital e os outros impostos sobre os produtos.” (INE & CASES, 2013, p16)

cooperativas, mutualidades, misericórdias, fundações e associações e outras organizações da economia social.

A tabela seguinte compara a representatividade por grupo de organizações, considerando os seguintes indicadores: número de organizações, VAB e Emprego Remunerado (equivalente a trabalhadores a tempo inteiro).

Número Organizações VAB Emprego Remunerado Grupo organizações Nº % Valor 106 € % Nº % Cooperativas 2.260 4,1% 749,2 17,6% 31.783 14,0% Mutualidades 119 0,2% 329,9 7,7% 4.537 2,0% Misericórdias 381 0,7% 518,3 12,2% 32.493 14,3% Fundações 537 1,0% 361,1 8,5% 10.765 4,7%

Associações e Outras Organizações 52.086 94,0% 2.304,1 54,1% 147.357 64,9%

Total organizações terceiro setor 55.383 4.262,6 226.935 Tabela 2 - Comparação numérica e de representatividade por grupo das organizações do terceiro setor, em 2010 (adaptado de INE & CASES, 2013, p.19)

Da observação da tabela verificamos que o grupo de associações e outras organizações detêm a maior representatividade ao nível dos indicadores apresentados, com o maior número de organizações (com 52.086 unidades), que representam 54,1% do VAB e a maior percentagem de emprego renumerado, sendo responsáveis por 174.357 postos de trabalho (64,9%). As cooperativas apresentam o segundo lugar em número de organizações (com 2.260 unidades), contribuindo para 17,6% do VAB e representando 31.783 postos de trabalho. As misericórdias apresentam-se no segundo lugar ao nível do emprego remunerado (14,3%), sendo responsáveis por 32.493 postos de trabalho, e contribuindo para 12,2% do VAB. As mutualidades são as organizações com menos expressividade nos três indicadores, logo com menos peso no setor.

O gráfico seguinte representa a distribuição da fonte de recursos por grupo de organizações.

Gráfico 8 - Recursos da economia social, por grupos de entidades – estrutura (INE & CASES, 2013, p.21)

Da análise do gráfico verificamos que as associações e outras organizações são as que consomem mais recursos (54,5%), tanto ao nível da produção, com 51,9%, como transferências e subsídios, com 79,6%, como outros recursos, com 83,5%. Seguem-se as cooperativas, que consomem 20,8% dos recursos totais. Em terceiro lugar vêm as fundações, que requerem 10,1% dos recursos.

Como se pode verificar da sua caracterização, o terceiro setor apresenta-se com atividades muito diversificadas, sendo bastante heterogéneo, não existindo uma correspondência direta entre o número de organizações e a sua representação financeira ou de empregabilidade efetiva. Tem características económicas de produção e necessidades de recursos muito heterogéneas, em função das atividades desenvolvidas e dos grupos de organizações. Destaque-se, no entanto, o peso das organizações que trabalham na área da ação social, no que toca ao emprego, representando 48,6% do trabalho remunerado do sector.

2 A Rede de Serviços e Equipamentos Sociais (RSES) e

os programas de investimento

A área da ação social é particularmente relevante para o terceiro setor, como se pôde constatar através da análise dos indicadores económicos do setor (ver capítulo anterior) e através do papel que desempenha na sociedade atual, pautada por valores como o bem- estar e o conforto, voltada para a inclusão, caracterizada por ter uma população envelhecida e agregados familiares cada vez menores. Esta relevância torna-se acrescida pelo facto de o setor público não ter vocação para prestar determinados serviços, não só pela sua natureza, mas também por questões económicas. Com efeito, na prestação de serviços é fundamental o conhecimento das realidades locais e das suas necessidades específicas, sendo aqui que as instituições do terceiro setor têm um papel a desempenhar, trabalhando em parceria com as instituições públicas e privadas locais.

A atual Lei de Bases da Segurança Social, Lei n.º 4/2007 de 16 de janeiro de 2007, prevê que o “Sistema de Proteção Social de Cidadania” seja desenvolvido por organizações privadas lucrativas ou organização privadas sem fins lucrativos, podendo para isso ter apoio do Estado, nomeadamente, apoio financeiro para o desenvolvimento de equipamentos e serviços, ou /e acordos para a prossecução das suas atividades e serviços, se forem IPSS ou equiparadas. Este sistema de proteção é desenvolvido no âmbito local, em cooperação com instituições públicas e privadas, a saber: das áreas da saúde e da edução, autarquias e outros organismos públicos. O sistema prevê a existência de uma rede de serviços e equipamentos sociais que preste serviços na área de apoio à família, apoio aos mais carenciados, criação de serviços de bem-estar, combate à exclusão social e à pobreza. O objetivo é apoiar os segmentos da população mais desprotegidos, frágeis e carenciados da sociedade, sejam idosos, pessoas com necessidades especiais, deficiência ou demência, crianças e jovens. Os serviços são desenvolvidos e planeados em função das necessidades dos cidadãos e da sua distribuição territorial, sendo que “o Estado exerce poderes de fiscalização e inspeção sobre as IPSS e outras de reconhecido interesse público sem caráter lucrativo, que prossigam objetivos de natureza social, por forma a garantir o efetivo cumprimento das respetivas obrigações legais e contratuais, designadamente das resultantes dos acordos ou protocolos de cooperação celebrados com o Estado” (n.º 3 do art.º 32º da Lei n.º 4/2007 de 16 de Janeiro).

O subsistema da ação social, integrado no “sistema de proteção social de cidadania”, “tem por objetivos garantir direitos básicos dos cidadãos e a igualdade de oportunidades, bem como promover o bem-estar e a coesão sociais” (n.º 1 do art.º 26º da Lei n.º 4/2007 de 16 de janeiro). Esta área é caracterizada por prestar serviços a segmentos da população considerados mais vulneráveis, nomeadamente: crianças e jovens, pessoas idosas, pessoas com deficiência ou demência, pessoas com necessidades especiais e /ou em risco (n.º2 do art.º 29 º da Lei n.º 4/2007 de 16 de janeiro). Nestes segmentos, a ação social proporciona serviços de bem-estar, cuidado, combate à exclusão social e à pobreza, bem como conciliação da vida familiar com a vida profissional, compensação por encargos familiares e compensação por encargos nos domínios da deficiência e da dependência.” (n.º 2 do art.º 26º da Lei n.º 4/2007 de 16 de janeiro). Importa referir que os serviços prestados nesta área, atendendo ao rendimento médio dos seus utilizadores, familiares e tipo de serviços, normalmente onerosos, são pouco apetecíveis ao setor privado.

Neste subsistema, o Estado assume um papel fulcral, enquanto estímulo ao desenvolvimento e prestação dos serviços nesta área, apoiando as instituições que se dedicam à solidariedade social, nomeadamente no apoio de serviços e equipamentos sociais, sejam elas IPSS ou equiparadas, ou instituições com fins lucrativos (n.º 1 dos arts.º 32 º e 33º da Lei n.º 4/2007 de 16 de janeiro). Neste mesmo âmbito, o Estado tem a responsabilidade de fiscalizar e inspecionar (n.º 2 do art.º 32 º da Lei n.º 4/2007 de 16 de janeiro), tendo, inclusivamente, a competência de licenciar os serviços e equipamentos sociais desenvolvidos pelas referidas instituições, sem as quais estas não poderiam funcionar (art.º 34 º da Lei n.º 4/2007 de 16 de janeiro). Está ainda previsto o estímulo e apoio por parte do Estado a “iniciativas das empresas que contribuam para o desenvolvimento das políticas sociais, designadamente através da criação de equipamentos sociais e serviços de ação social de apoio à maternidade e à paternidade, à infância e à velhice e que contribuam para uma melhor conciliação da vida pessoal, profissional e familiar dos membros do agregado familiar” (art.º 35 º da Lei n.º 4/2007 de 16 de janeiro). Aliás, a promoção à natalidade é outro ponto a que o Estado tem especial atenção, conforme plasmado no n.º 1 do art.º 27 º da Lei n.º 4/2007 de 16 de janeiro, que refere que “a lei deve estabelecer condições especiais de promoção da natalidade que favoreçam a conciliação entre a vida pessoal, profissional e familiar e atendam, em especial, aos tempos de assistência a filhos menores.” Podendo estas condições ser desenvolvidas através “de equipamentos sociais de apoio na primeira infância, de mecanismos especiais de apoio à maternidade e à paternidade e da diferenciação e modulação das prestações.” (2 art.º 27 º da Lei n.º 4/2007 de 16 de janeiro).