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Caso “Márcio Alvim de Almeida vs Google” (vigência do Marco Civil da

Capítulo 5 DECISÕES EMBLEMÁTICAS NO BRASIL SOBRE A

5.2. Caso “Márcio Alvim de Almeida vs Google” (vigência do Marco Civil da

Internet).

No dia 10 de maio deste ano de 2016, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial nº 1.582.981/RJ, novamente apreciou demanda em

limitando a indicar links onde podem ser encontrados os termos ou expressões de busca fornecidos pelo próprio usuário. 4. A filtragem do conteúdo das pesquisas feitas por cada usuário não constitui atividade intrínseca ao serviço prestado pelos provedores de pesquisa, de modo que não se pode reputar defeituoso, nos termos do art. 14 do CDC, o site que não exerce esse controle sobre os resultados das buscas. 5. Os provedores de pesquisa realizam suas buscas dentro de um universo virtual, cujo acesso é público e irrestrito, ou seja, seu papel se restringe à identificação de páginas na web onde determinado dado ou informação, ainda que ilícito, estão sendo livremente veiculados. Dessa forma, ainda que seus mecanismos de busca facilitem o acesso e a consequente divulgação de páginas cujo conteúdo seja potencialmente ilegal, fato é que essas páginas são públicas e compõem a rede mundial de computadores e, por isso, aparecem no resultado dos sites de pesquisa. 6. Os provedores de pesquisa não podem ser obrigados a eliminar do seu sistema os resultados derivados da busca de determinado termo ou expressão, tampouco os resultados que apontem para uma foto ou texto específico, independentemente da indicação do URL da página onde este estiver inserido. 7. Não se pode, sob o pretexto de dificultar a propagação de conteúdo ilícito ou ofensivo na web, reprimir o direito da coletividade à informação. Sopesados os direitos envolvidos e o risco potencial de violação de cada um deles, o fiel da balança deve pender para a garantia da liberdade de informação assegurada pelo art. 220, § 1º, da CF/88, sobretudo considerando que a Internet representa, hoje, importante veículo de comunicação social de massa. 8. Preenchidos os requisitos indispensáveis à exclusão, da web, de uma determinada página virtual, sob a alegação de veicular conteúdo ilícito ou ofensivo - notadamente a identificação do URL dessa página - a vítima carecerá de interesse de agir contra o provedor de pesquisa, por absoluta falta de utilidade da jurisdição. Se a vítima identificou, via URL, o autor do ato ilícito, não tem motivo para demandar contra aquele que apenas facilita o acesso a esse ato que, até então, se encontra publicamente disponível na rede para

divulgação. 9. Recurso especial provido.” Disponível em:

<http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?livre=xuxa&&tipo_visualizacao=RESUMO&b=ACO R>. Acesso em: 15/08/2016.

que usuário da internet objetivava compelir a empresa Google Brasil Internet Ltda. a excluir informação fornecida pela sua ferramenta de busca Google Search. A nova situação, contudo, apresentava peculiaridades em relação ao caso comentado na seção anterior e foi apreciada sob a vigência da Lei nº 12.965/14.

Assim ocorreu o episódio motivador do conflito336: a) o senhor Márcio Alvim de Almeida, advogado militante, teve o seu nome indevidamente vinculado a comentário ofensivo feito por terceiro no sítio eletrônico “www.todosuper.com.br”; b) após notificar o autor da publicação, este retirou o nome do senhor Márcio do comentário e passou a atribuir a autoria do texto ao cognome “anonimous”; c) sucede que, mesmo depois da retificação, o senhor Márcio, ao pesquisar o próprio nome no buscador Google, divisou nos links de resultados mostrados a referência ao pernicioso comentário ainda com a indevida vinculação ao seu nome, embora, ao adentrar o sítio mostrado pela busca, tenha visto a página com a correção já realizada sem alusão a sua pessoa.

Em virtude desses fatos, o senhor Márcio Almeida ingressou com ação judicial, na qual conseguiu a condenação da Google à obrigação de fazer de revisar seu índice de pesquisa para excluir qualquer associação do nome do demandante ao link “www.todosuper.com.br”, bem como ao pagamento de indenização por danos morais.

No Superior Tribunal de Justiça o relator designado para o Recurso Especial nº 1.582.981/RJ foi o ministro Marco Aurélio Bellizze, que no seu voto aludiu aos fundamentos encampados pela Corte para a decisão do paradigmático Recurso Especial nº 1.316.921/RJ, sobre o qual se discorreu na seção antecedente. O relator averbou que o serviço de busca da empresa Google no seu sítio eletrônico enquadra-se no conceito de provedor de conteúdo e, por conseguinte, na categoria mais ampla de provedor de aplicações, prevista no Marco Civil da Internet.

Em seguida, explicou que a técnica de funcionamento do Google Search consiste no mapeamento de todo o conteúdo existente na internet (trilhões de páginas), formando-se um índice de acesso que facilita a pesquisa dos usuários às

336 BRASIL. 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 1.582.981/RJ.

Recorrentes Google Brasil Internet Ltda, Márcio Alvim de Almeida. Recorridos os mesmos. Relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, julgamento em 10.05.2016. Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ITA&sequencial=1511081 &num_registro=201502238660&data=20160519&formato=PDF >. Acesso em: 15 ago. 2016.

informações disponíveis sem embaraços causados por filtragens ou censura prévia. Dessa forma, a ferramenta de busca organiza os conteúdos colhidos no ciberespaço segundo critérios internos de classificação e relevância das páginas reunidas no seu banco de dados, formando um índice que orienta a pesquisa, o qual pode, sim, ser atualizado, mas geralmente, nas palavras do ministro, “o sistema trabalha apenas acrescentando à base de dados as páginas novas localizadas por seu sistema de varredura”. Na prática, portanto, considerando a tecnologia empregada pelo Google Search para conferir celeridade à pesquisa e variedade às informações procuradas pelos usuários, é possível que inicialmente links com resumos de informações desatualizadas sejam exibidos nos resultados, o que não configura necessariamente falha na prestação do serviço geradora de responsabilidade civil. Ocorre que os links com informações não atualizadas que eventualmente apareçam após a busca não representam o conteúdo ofensivo em si, mas apenas um caminho para encontrar-se uma página, que, uma vez acessada, mostrará o seu teor atualizado.

Foi isso o que aconteceu com o senhor Márcio Almeida, na medida em que a pesquisa realizada no Google Search com o seu nome mostrava nos resultados antiga referência ao comentário vexatório publicado no sítio “www.todosuper.com.br”, porém ao acessar-se o link surgia a página retificada sem a alusão ao nome do autor. Esclarece o ministro, pois, que no sistema de busca da empresa não se pode asseverar com exatidão que os resultados um dia armazenados no bando de dados da ferramenta serão necessariamente excluídos, porque podem novamente aparecer se ainda figurarem com destaque na varredura feita pelo sistema no ranking entre as páginas mais acessadas ou mencionadas por usuários no ciberespaço.

Diante desse contexto, concluiu que a falta de atualização constante do índice do sistema de busca não pode ser reputada como falha causadora de dano, razão pela qual inexiste fundamento para a condenação da Google ao pagamento de indenização, porquanto o sítio de busca dela apenas mostra, em relação ao demandante Márcio Almeida, resultado já programado no banco de dados que responde aos parâmetros de pesquisa fornecidos pelos usuários, resultado, aliás, que se limita a exibir link de site onde, se acessado, não exibirá o conteúdo ofensivo já excluído.

Contudo, mesmo não havendo dano moral indenizável no caso, o ministro salientou que se impõe à empresa Google, por força do Código de Defesa do Consumidor, a obrigação de adequar e atualizar sua base de dados para evitar que nos resultados da pesquisa com o nome do senhor Márcio Almeida este apareça relacionado ao conteúdo ofensivo publicado no sítio “www.todosuper.com.br”. A imprecisão técnica, conquanto identificada pelo usuário afetado e comunicada judicialmente por ele à empresa, precisa ser corrigida. Esse direito do usuário deriva da obrigação das empresas atuantes na rede mundial de computadores de retificação de dados ou informações pessoais incorretos exibidos na web.

Na leitura do Marco Civil da Internet realizada pelo ministro Marco Aurélio Bellizze, o entendimento acima expendido harmoniza-se com o disposto no artigo 19 da Lei nº 12.965/14337, que versa sobre a responsabilidade do provedor de aplicações da internet por conteúdo gerado por terceiros. O dispositivo, de plano, decanta seu objetivo de assegurar a liberdade de expressão e proscrever a censura, somente considerando lesiva a conduta do provedor de conteúdo por material publicado por terceiros no ciberespaço quando, depois de cientificado por ordem judicial para excluir o conteúdo, deixar de proceder à eliminação do teor lesivo. A norma evidencia que o Marco Civil da Internet não atribuiu às atividades desses provedores a responsabilidade objetiva, fundada na teoria do risco, por danos causados aos usuários, conforme, aliás, já havia se manifestado o Superior Tribunal de Justiça em precedentes anteriores à Lei nº 12.965/14338. Com essa regência, procurou-se não prejudicar a potencialidade do ciberespaço para fomentar a comunicação e a expressão entre as pessoas, estimulando-as através do conhecimento à percepção ampla da realidade comunitária interna e de outras regiões do globo.

No desfecho do Recurso Especial nº 1.582.981/RJ, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, acompanhou o voto do relator para, afastando a condenação ao pagamento de indenização por danos morais, somente

337 Lei nº 12.965, de 23 de abril de 2014

: “Art. 19. Com o intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura, o provedor de aplicações de internet somente poderá ser responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros se, após ordem judicial específica, não tomar as providências para, no âmbito e nos limites técnicos do seu serviço e dentro do prazo assinalado, tornar indisponível o conteúdo apontado como infringente, ressalvadas as disposições legais em contrário.”

338 No ponto, podem também ser mencionados o Recurso Especial nº 1.193.764/SP e o Recurso

corroborar a obrigação da empresa Google Brasil Internet Ltda. de atualizar o banco de dados da sua ferramenta de busca para excluir dos resultados a menção à publicação ofensiva relativa ao senhor Márcio Almeida, vergastada na ação339. O precedente, recentíssimo e à luz do Marco Civil da Internet, aclarou ainda mais o horizonte jurisprudencial brasileiro no tratamento da liberdade de expressão e do direito à informação na rede mundial de computadores, delimitando com precisão a responsabilidade dos provedores de aplicações por conteúdo lesivos veiculados no ciberespaço.