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3 IDENTIDADE DAS EMISSORAS: PROGRAMAÇÃO E PRODUTOS

5 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

5.1 O caso principal: a TVU RN

A primeira emissora do Rio Grande do Norte e uma das primeiras do tipo Universitária do país, a TVU RN, conhecida por muitos como Canal 5, iniciou a transmissão em dezembro de 1972. Por quinze anos foi a única emissora do estado. Muitas histórias e mudanças ocorreram nestes quarenta e cinco anos de existência – o que necessita ser levado em consideração nesta pesquisa, pois as tecnologias e os hábitos dos telespectadores, ultimamente, tem ultrapassado o tempo e o espaço, alterando modelos de negócio consagrados e, até então, imaculados.

Financiada por recursos da UFRN, a TVU RN atualmente está localizada no campus Central da instituição de ensino e é parte da Superintendência de Comunicação, a Comunica, conjuntamente com a Agência de Comunicação (Agecom) e a Rádio Universitária FM de Natal (UFM). A última atualização do organograma aconteceu em função da aprovação do regimento interno efetivado por meio da Resolução nº 004/15 – CONSUNI, de 13 de março de 2015. Neste documento, a emissora está dividida em três setores: Jornalismo, Operação e Produção e Programação. Antes do regimento efetivado em 2015, os setores de Produção e Programação encontravam-se separados. Neste trabalho, optamos pelo entendimento de que os setores apresentam atividades distintas, tendo a Produção uma atividade meio, responsável por pensar a confecção dos produtos; já a Programação tem uma natureza final do processo, voltada principalmente para a transmissão dessas produções. Essa distinção torna-se relevante porque a coleta de dados perpassa por esse entendimento.

Atualmente, a emissora apresenta uma grade de programação com nove programas e dois interprogramas. Além desses, mais outras produções estão previstas para iniciar no segundo semestre de 2018, dentre elas, um programa de meia hora, que pretende dar voz às periferias da capital potiguar e região – o “Peri”, sendo uma temática inédita para a cidade. A emissora também exibe produções de instituições parceiras: o IFRN em Pauta do Instituto Federal do Rio Grande do Norte (IFRN), o Hora do Enem da TV Escola, o Som sem Plugs e programas diversos do Canal Saúde da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) como o Unidiversidade e o Ciência e Letras. Contudo, em sua maioria, a programação da TVU RN é a retransmissão das produções da TV Brasil, canal público da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), sendo uma emissora parceira regida por contrato desde 2010.

Ao todo, considerando até o primeiro semestre de 2018, a TVU RN produziu nove programas e dois interprogramas11:

Quadro 1 - perfil das produções internas da TVU RN

Programas e interprogramas produzidos pela TV Universitária (por ordem alfabética)

Periodicidade Duração Sinopse disponível no site da

emissora

1 - Café Filosófico Semanal 30 minutos A cada programa, um especialista convidado trata de um tema à luz da filosofia. Programa semanal, produzido em parceria com o Departamento de Filosofia da UFRN.

2 - Cena Potiguar Diário nos intervalos com estreia em dia fixo. Na TV Brasil, Começou a fazer parte a partir de julho de 2018, das 9h às 9h15 das terças, quartas e quintas. Interprograma até 4 minutos Um espaço de valorização da cultura norte-rio-grandense e de expressão das diversas formas de arte, o Cena Potiguar é um interprograma diário da TVU.

3 - Grandes Temas Semanal 1 hora e 15

minutos

Os grandes temas de interesse social são debatidos nas segundas-feiras ao vivo na TVU. O programa conta com a participação de especialistas e dispõe de um espaço interativo aberto à população por meio de telefone e WhatsApp.

4 - Memória Viva Semanal 1 hora Personalidades que marcaram a história do Rio Grande do Norte e algumas com repercussão no cenário nacional. Perfil biográfico de uma personalidade, convidada a relatar sua vida e obra. O programa é um acervo exclusivo da história contemporânea do estado.

5- Olhar Independente Semanal 30 minutos Espaço para divulgar e discutir a produção audiovisual nordestina, promovendo a interação da televisão universitária com os produtores independentes por meio da exibição de curtas- metragens, entrevistas com os realizadores e coberturas de eventos ligados ao audiovisual.

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6 - Por Dentro do Campus Semanal (2 vezes)

15 minutos O programa é uma síntese do que acontece nas áreas acadêmica, científica e cultural da UFRN. Um telejornal semanal, com entrevistas e matérias para divulgar o que é produzido no Campus da Universidade.

7- Tela Rural Semanal 30 minutos Com uma linguagem leve,

dinâmica e informativa, o programa se propõe a discutir e disseminar a temática rural no estado do Rio Grande do Norte. O programa também é exibido em rede nacional na TV Brasil e realizado em parceria com a Escola Agrícola de Jundiaí (UFRN) e a Universidade Estadual do Rio Grande do Norte. 8 - TVU Esporte Semanal 30 minutos O esporte profissional, amador e

universitário você também acompanha na tela da TVU. Conteúdo qualificado e formato envolvente, com entrevistas e matérias produzidas. Nesta nova temporada, o programa é apresentado exclusivamente por mulheres.

9 - TVU Notícias Segunda a sexta- feira

30 minutos Noticiário local que exerce uma prática jornalística voltada para o interesse público. O jornal busca provocar a reflexão e a crítica do telespectador e contribui para a formação do aluno do Curso de Comunicação Social da UFRN.

10 – TVÚtil Diário nos

intervalos

Interprograma até 2 minutos

Reportagens com conteúdos de utilidade pública

11 - Xeque Mate Semanal 1 hora O programa conta com a

participação de alunos do curso de Comunicação Social da UFRN como entrevistadores, guiados por um professor do Departamento de Comunicação Social da UFRN. Sempre com um convidado para debater assuntos atuais.

Fontes: autora e TVURN (2018)

A emissora também foi a primeira Universitária do Brasil a ter o canal digital aberto no ano de 2015. O fato foi bastante comemorado, porém, as dificuldades em manter uma transmissão digital ainda são muitas. Por diversos períodos, entre 2016 e 2018, o sinal aberto digital ficou fora do ar. Algumas vezes, a “queda” durou meses, sem explicações terem sido dadas publicamente ao telespectador. Alguns telespectadores questionavam principalmente em redes sociais - como o Facebook,

mas respostas padrão foram elaboradas aleatoriamente por não ter um servidor ou setor responsável. Sobre os equipamentos da antena digital, a manutenção é onerosa e a empresa responsável pelo conserto fica em Belo Horizonte, o que dificulta ainda mais a agilidade nesses tipos de problemática, já que, uma emissora de televisão depende da transmissão broadcast. Além disso, os equipamentos de gravação e transmissão ainda não foram modernizados por possíveis questões orçamentárias e burocráticas do serviço público, sendo um canal digital com transmissão em qualidade SDTV (standard-definition television), resolução similar aos de sistemas analógicos. Sobre inovação e a maneira como a emissora expõe ao telespectador o que considera relevante ao ter um sinal digital, o texto localizado no histórico sobre a TVU na internet diz que:

Essa trajetória se passou ao longo de algumas décadas e agora os

desafios estão voltados à inovação e à operacionalização do seu canal

digital. A TV Universitária foi a primeira emissora de uma instituição federal a explorar um canal digital em sinal aberto, em maio de 2015, o que exige a utilização de tecnologias recentes e a produção de novos conteúdos em

formatos inovadores, sem esquecer, sobremaneira, da sua missão por

vocação: a de debater os grandes temas da atualidade e os grandes desafios da contemporaneidade. (TV Universitária do Rio Grande do Norte, 2018)

Apesar deste estudo não ser sobre o sinal digital da emissora e por considerarmos que a televisão digital ainda não é o que um dia poderá vir a ser, essa informação da própria emissora justifica a nossa problemática. De antemão, podemos dizer que poucas foram as mudanças em conteúdo desde então, principalmente nos formatos dos programas. Por isso, não conseguimos compreender o discurso da emissora ao considerar “formatos inovadores”, já que, a grade de programação é praticamente a mesma desde muito antes de 2015, e os programas apresentam os mesmos formatos, cenários e conteúdos. Atualmente, podemos considerar que as únicas alternativas digitais usadas pela emissora são: o website e redes sociais, questões de nossa análise. E até onde a emissora inova e converge entre transmissão broadcast e as plataformas digitais/sociais?

Como se pode perceber, a presença digital da TVU RN está no site da emissora (www.tvurn.ufrn.br), com layout alterado no final de 2017, como também, presente nas seguintes redes sociais: YouTube, Facebook e Instagram. A programação não é transmitida ao vivo em nenhum tipo de plataforma e a emissora não possui aplicativo digital.

Sobre o perfil da audiência, pesquisas de aferição não são realizadas e o desconhecimento do público se faz presente nos corredores da emissora. Há dez anos, esta situação institucional vivida hoje foi relatada, em 2007, pelo então apresentador do programa Grandes Temas (uma das unidades de análise deste estudo), Rogério Cruz, que publicou no blog da época um texto com o título TV Universitária de Natal: uma audiência maior do que se supõe? que diz:

Na atualidade, esse Programa apresenta uma lacuna: a de não contar com o perfil do seu público. Por essa razão entende-se que haja a necessidade de que seja feita uma sondagem em que se tenha esse perfil - estimado e prévio - do tipo de telespectador. (CRUZ, 2007)

O ex-apresentador conclui:

Por fim, essas observações iniciais levantam uma nova questão de pesquisa: esse tipo de perfil de telespectador do programa Grandes Temas pode ou não ser generalizado para o telespectador da TVU? Afinal, qual tipo de público a TVU atende? Em suma, essas perguntas, por si só, sugerem a necessidade de que esse veículo tenha um acompanhamento mais sistemático e, portanto, constante, de verificação de sua audiência. (CRUZ, 2007)

Este cenário não difere de um outro relatado pela pesquisadora Denise Cortez da Silva Accioly, que publicou pela UFRN, em 2012, a tese Televisão Universitária do RN (TVU): contribuição para a democratização da informação e a difusão do conhecimento científico produzido pela universidade. A pesquisa coletou, no segundo semestre de 2010, as opiniões de 1.624 alunos da instituição a respeito da percepção dos entrevistados sobre a emissora, a partir de questionário com questões fechadas e abertas. É claro que a programação da TVU RN abrange não somente a comunidade acadêmica, mas também a sociedade civil de maneira geral, todavia, reforçamos a relevância e possível atualidade desses dados, apesar de quase oito anos de distanciamento.

Na pesquisa, a primeira opção de escolha dos entrevistados de um canal de televisão foi a Intertv Cabugi (Rede Globo) com 68,06% e a TVU RN é pouco citada, por apenas 5,90% dos entrevistados. Porém, outros canais da cidade também foram pouco citados, como a TV Tropical (4,19%) e a TV Ponta Negra (1,02%).

Sobre a frequência com que os entrevistados assistem à TVU RN, 55,80% disseram que “de vez em quando”, 30,70% nunca assistem, 7,50% que sempre assistem e, não souberam responder, 6,0%. Já nesta época, 98,30% dos alunos disseram que a mídia que mais acessavam para obter informações sobre a UFRN é

a internet, ficando a televisão em segundo lugar, com 19,60%. Os dados podem ser considerados desatualizados, mas são significativos porque mesmo em 2012, a pesquisa já mostra uma emissora de televisão pouco assistida e reconhecida dentro do seu próprio contexto, a UFRN. Se formos pensar atualmente, por exemplo, no Restaurante Universitário da UFRN, o aparelho televisor dificilmente está sintonizado na TVU RN.

Por observação participante da pesquisadora, o desconhecimento da grade de programação não é apenas do público externo, mas do público interno que, muitas vezes, demonstra não valorizar ou não assistir aos próprios produtos produzidos. Na primeira semana da pesquisadora como servidora na emissora, em fevereiro de 2016, um dos colegas de trabalho disse após erro: “Não se preocupe, ninguém assiste mesmo”. Essas observações levam a diversos questionamentos, como neste caso ocorrido em um dos programas que também é unidade de análise deste estudo:

Sexta-feira e o primeiro final de semana de novembro de 2017 estava se aproximando. Mais uma pauta a ser realizada pela equipe de jornalismo da emissora. A escolha: trazer ao telespectador a opção entre sair de casa ou assistir séries da Netflix. A pauta do “Agendão” – quadro antigo do principal jornal da casa, é aparentemente uma escolha antenada, trazendo ao telespectador duas opções usuais hoje: o streaming e a balada. A retranca do quadro é: “Rolé vs Netflix”.

O quadro começa assim: “Sexta-feira, já passam das seis horas. O final de semana está oficialmente aberto. Eu vou procurar uma festa para me divertir bastante”, disse o apresentador. Em seguida, a outra apresentadora prossegue: “Já o meu decreto vai ser por aqui mesmo curtindo Netflix”. Os dois estão sentados, falam lado a lado e, ao fundo, uma televisão apagada compõe o cenário. Depois, uma enquete mostra pessoas, estas que trabalham na emissora, optando pelas produções da Netflix ao serem questionadas se sairão de casa ou não.

Além de diversas dicas de festas na cidade, o quadro também ofertou a dica de filme, que no caso foi a série da Netflix: Stranger Things. O quadro também iniciou naquele dia a “dica de cinema” com o filme nacional “Boi Neon”, que já não estava mais em cartaz nos cinemas. Naquele mesmo dia, dois filmes internacionais seriam exibidos pela emissora, mas nenhuma menção a eles foi feita durante a produção do quadro.

A escolha por essa temática do quadro, que oferta ao telespectador diversas opções de lazer da cidade, seria antenada e válida se não fosse por um motivo em especial: o quadro em questão é de um jornal de uma emissora pública. A Netflix também é uma empresa de entretenimento, que nunca divulgaria a emissora pública, pelo contrário, é até concorrência considerando-se ambas enquanto produtoras de conteúdo em tempos de internet.

Alguns questionamentos foram suscitados desde então. Não que faremos aqui um reproche destas escolhas porque o papel desta pesquisa é trazer reflexões e não criar fissuras no objeto escolhido. Questionamos se os telespectadores da emissora – pública e aberta, têm acesso aos produtos da empresa americana, que só são liberados a partir de uma assinatura mensal. É usual uma emissora de televisão, sendo aberta ou fechada, pública ou comercial, fazer menção à uma outra empresa sem ganhar nada em troca? Até onde uma emissora de televisão pode citar em seu conteúdo ferramentas pagas oriundas da segunda tela? Como a televisão pública e educativa pode convergir com a segunda tela sem precisar ser refém dos conteúdos que estão na moda na internet? Por que não se estimulou a participação dos telespectadores durante a enquete? Esse é o modelo de negócio buscado pelas emissoras públicas brasileiras? Será que uma emissora de televisão tão antiga aprendeu com o tempo a se reinventar? Como os avanços tecnológicos perpassam pelo seu fazer diário, pelos processos institucionais e pela cultura organizacional? Isso é inovação?