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Clínica e classificação da urticária

No documento Urticária da clínica à terapêutica (páginas 55-73)

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Clínica e classificação da urticária

Celso Pereira

Introdução clínica

A primeira descrição do que na actualidade se entende por urti- cária é referida no tratado com o título Nei Ching Su Wen, escrito por Huang Di Nei Jing, conhecido como Imperador Amarelo (2697 a 2598 aC)1. Descreve-se o eritema oculto serpenteante, Fen Yin

Zheng, a designação chinesa para urticária. Já Hipócrates (460-377

aC) refere lesões da pele produzidas por urtigas ou mosquitos, a que designou com a palavra cnidosis significando urtiga2. Poste-

riormente, vem a ser designada como Aspritudo por Aulus Celsus (25 aC- 50 dC). A terminologia evolui com distintas designações,

Essera, Porcelana, Scarlatina urticata até à sua forma final, nos finais

do séc XVIII pela escola médica francesa de Lyon, pela similitude das lesões observadas por contacto com a Urtica dioica, herbácea muito prevalente nessa região3.

Trata-se de um distúrbio clínico muitíssimo frequente, estimando- se que praticamente maioria de todos os indivíduos venham a apresentar pelo menos um episódio agudo numa qualquer fase da vida, resultado de um vastíssimo conjunto de condicionantes ou de estímulos susceptíveis de sintomas. Naturalmente, a maio- ria destes episódios são frustes, autolimitados e, com frequência, resolvem de forma natural. É evidente, também, que as formas agudas são preponderantes face a doença de longa evolução. Tratando-se de uma entidade nosológica tão comum seria expec- tável dispormos de sólidos estudos epidemiológicos avaliando in- cidência e prevalência. No entanto, são muito escassos os estudos que permitam comparação assente em metodologias bem defini- das, em diferentes populações ou áreas geográficas, mesmo em países com estruturas organizativas bem estruturadas.

No estudo retrospectivo de Champion e col. em 1969 (554 indiví- duos) e de Hellgren em 1972 (n=1305) foi descrita uma prevalência de urticária aguda, respectivamente em 20 e 17% da amostra. No entanto não se sugerem dados sobre formas crónicas ou diferenças relevantes quanto a preponderância em faixas etárias específicas. O estudo mais sólido do ponto de vista epidemiológico (popula- cional transversal) surge em 2004 por Gaig e col. em Espanha, rea- lizado por inquérito a 5003 adultos, apresentando uma prevalência de 0,6% para urticária crónica e incidência acumulada de 18,72% para a forma aguda4. Já em populações pediátricas dados indirectos

sustentam que a incidência de urticária é mais elevada em lacten- tes comparativamente a crianças em idade escolar e adolescentes5.

A urticária, classicamente descrita como uma doença cutânea com etiologia multifactorial deve ser entendida, na actualidade, como uma síndrome. De facto, a lesão clínica mais não é que o padrão da reactividade da pele resultante de uma resposta intrínseca ou o resultado de uma miríade de potenciais estímulos exógenos. A urticária deverá, pois, ser entendida como um sintoma, tal como a resposta febril é um sintoma que poderá advir de múltiplas situações patológicas que abarcam desde processos infecciosos a neoplasias. Assim, a presença de lesões implica, sempre, um enquadramento lato e abrangente que deverá conduzir a uma caracterização exaustiva do ponto de vista clínico e laboratorial6.

O rigor na definição clínica desta entidade é, provavelmente, de- terminante uma vez que a designação de urticária é empregue de forma abusiva a muitas lesões cutâneas pruriginosas que de todo não cumprem todos os critérios requeridos ao diagnóstico. São exemplo as inúmeras designações: urticariformes, urticarial, pseudourticária ou falsa urticária. Apesar da urticária representar um grupo heterogéneo de doença com expressão cutânea e dever ser entendida como uma síndrome, as lesões podem ocorrer com uma multiplicidade e heterogeneidade num mesmo doente e com evolução divergente interindividual, mesmo no decurso de uma mesma agudização. No entanto, para garantir o diagnóstico clínico das lesões são requeridos de forma obrigatória e em simultâneos os seguintes critérios:

Eritema Pápula Prurido

Prova de digito-pressão positiva

Regressão completa de cada lesão em tempo inferior a 24 horas Recrudescência, eventual, de lesões em outras localizações

A lesão característica de eritema papular pruriginoso tem, geral- mente, um início súbito apresentando, no entanto, características muito divergentes entre diferentes doentes que partilham um mesmo diagnóstico clínico, Figuras 1 a 3. Classicamente, as lesões eritemato papulares apresentam um centro claro com dimensão extremamente variável, circundado por halo eritematoso, embo- ra na maioria dos doentes possa ocorrer coalescência de lesões. O prurido está sempre presente com maior ou menor intensida- de e com claras repercussões na qualidade de vida. Quando as lesões de urticária se associam a compromisso em estruturas mais profundas da hipoderme, pode associar-se angioedema, sendo que, nestas situações, o prurido é substituído por sensação de dor ou queimadura.

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Figura 1 Lesões clínicas urticária aguda em criança de 8 anos com infecção bacteriana amigdalina.

Figura 2 Lesões clínicas urticária crónica.

A. Lesão de eritema pápula bem delimitada, com centro claro, sem infiltração à digito pressão. B. Lesões de grandes dimensões coalescentes.

Figura 3 Lesões clínicas urticária física.

A. Dermografismo em adolescente com 15 anos de idade.

B. Lesões de urticária ao frio, localizadas na região cervical, em adulto do sexo masculino com 22 anos de idade.

A B

Frequentemente, as lesões ocorrem em todo o tegumento cutâ- neo, de forma generalizada e bilateral, mas habitualmente poupan- do a face e superfícies palmares e plantares das extremidades. As lesões de eritema papular, podem e devem, ser bem quantifi- cadas por scores clínicos padronizados, já o prurido é um sintoma fortemente dependente da subjectividade própria de cada doente e de limiares divergentes de tolerância7. Na Tabela 1 apresentam-

se os parâmetros da avaliação da actividade clínica.

Classificação da urticária

O diagnóstico clínico da lesão é de extrema importância para o enquadramento diagnóstico e terapêutico subsequente, numa entidade tão heterogenia como esta síndrome. A recente classifica- ção de urticária proposta em final de 2009 tem enorme relevância porque permite excluir um conjunto expressivo de entidades com algumas similitudes na apresentação sintomatológica7. Na Tabela

2 esquematizam-se os diferentes grupos e subgrupos de urticária que apresentam características próprias, bem individualizadas e bem definidas, apesar de poderem ocorrer num mesmo doente diversos tipos em simultâneo. Genericamente, consideram-se 3 grandes grupos: as espontâneas, físicas e um terceiro grupo que inclui formas com especificidade própria.

Tabela 1 Actividade clínica em doentes com urticária

Score Pápulas Prurido

0 Ausente Ausente

1 Ligeiro

(<20 pápulas/24 horas)

Ligeiro

(presente mas não limitativo) 2 Moderado

(20-50 pápulas/24 horas)

Moderado

(problemático, mas sem interferência na actividade quotidiana ou no sono) 3 Intenso

(>50 pápulas/24 horas ou áreas confluentes de lesões)

Intenso

(grave, incapacitante na actividade quotidiana ou n sono)

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Abordagem clínica

No espectro clínico da urticária têm sido reconhecidos uma multiplicidade de indutores e mecanismos, dependentes do tipo ou subtipo específico, apesar dos efeitos sintomatológicos comuns, embora com gradientes de gravidade distintos, apresentação ou duração8,9.

Nesta síndrome as formas de apresentação, os tipos e distintos subtipos conferem um carácter verdadeiramente heterogéneo, pelo que o rigor de uma história clínica detalhada é imprescindível para um correcto enquadramento diagnóstico e terapêutico. Se nas formas agudas o diagnóstico é, na maioria das vezes, muito facilitado pela estreita correlação entre o desencadeante próximo e o início da sintomatologia, já nas formas crónicas é necessária uma descriminação exaustiva, progressiva e paulatina.

A garantia da presença dos critérios lesionais de urticária é fundamental para excluir diagnósticos diferenciais que cursam com compromisso cutâneo7,8,9. São exemplo alguns distúrbios (Figuras

4 a 9) que em condições particulares podem ter associadas lesões concomitantes de eritema papular não infiltrado, Tabela 3.

Tabela 2 Classificação da urticária, segundo características clínicas e desencadeantes característicos.

Tipos Subtipo Características/Desencadeante

Urticária Espontânea

Urticária aguda Lesões com duração inferior a 6 semanas Urticária crónica Lesões com duração superior a 6 semanas

Urticária Física

Urticária contacto ao frio Objecto frio/líquido/vento

Urticária pressão retardada Pressão vertical; lesões com aparecimento 3-12 horas após

Urticária solar Radiações UV e/ou luz visível Urticária dermográfica/Factícia Fricção mecânica com aparecimento de

lesões após 1-5 minutos Urticária/Angioedema vibratório Vibração

Outros tipos Urticária

Urticária aquagénica Contacto com água Urticária colinérgica

Aumento da temperatura corporal por exercício físico, emoção, alimentos condi- mentados

Urticária contacto Contacto com substância indutora Anafilaxia induzida pelo exercício Exercício físico

Figura 4 Lesões clínicas com angioedema associado a eritema papular coalescente e prurido, numa doente do sexo feminino, 44 anos, com posterior diagnóstico de Síndrome Wells

Figura 5 Lesões clínicas de exantema súbito de etiologia virusal em criança do sexo masculino, com 9 meses de idade.

Sistema imune cutâneo 63

Figura 6 Lesões de grattage em doente do sexo feminino com 49 anos, com eczema de contacto a corantes têxteis.

Figura 7 Lesões de vasculite hipersensibilidade medicamentosa, eritema ptequial dos membros inferiores, com contornos bem delimitados em doente do sexo feminino com 52 anos de idade.

Figura 8 Eritema pleomórfico solar no membro inferior, em doente sexo feminino com 24 anos de idade.

Figura 9 Eritema papular infiltrado em doente, sexo masculino, com 38 anos de idade, com o diagónstico subsequente de lupus eritematoso sistémico

65 Tabela 3 Diagnóstico diferencial de urticária

Mastocitose

Vasculite leucocitoclástica Vasculite linfocitária urticariana Síndrome de Muckle-Wells Síndrome Schnitzler Síndrome Wells Eritema morbiliforme minor Urticária familiar ao frio Exantema vírico

Hipersensibilidade por alergénios ocultos Dermatomiosite

Eritema pleomorfico solar Eczema contacto Eritema fixo medicamentoso

A maioria destas entidades detêm características clínicas bem de- finidas, mas podem numa fase evolutiva apresentar dificuldades diagnósticas com lesões, ocasionais, que cumprem todos os cri- térios anteriormente referidos. É exemplo o eritema multiforme

minor em que a descamação e pigmentação residual pode não

ocorrer em todas as lesões ou ser interpretada como resultan- te de lesão de grattage, Figura 10. Os distúrbios infecciosos ou patologia inflamatória sistémica subclínica podem, em condições particulares serem antecedidas por expressão cutânea com lesões compatíveis com urticária.

A avaliação muito atenta destes doentes é, pois, determinante e deverá incluir, naturalmente, uma história clínica detalhada, exaustiva e repetida em observações subsequentes. O tempo de duração da doença é fundamental, indicando desde logo dois grandes grupos: agudo e crónico que requerem abordagens diferenciadas. As formas físicas quer de forma isolada quer associa- das a formas crónicas, situação mais frequente, têm um enquadra- mento diagnóstico muito específico.

O tamanho, a forma e distribuição deverão ser aspectos a obser- var e com claras implicações no diagnóstico, bem como a potencial associação a angioedema, Figura 11. A frequência e duração das lesões deverá ser quantificada em scores, bem como a variabilidade ao longo do dia, a sazonalidade, a correlação com períodos de actividade profissional, ambientes adversos, exposições acidentais entre outros. Apesar das limitações o prurido deverá ser outro aspecto a quantificar na fase inicial e ao longo do decurso da ob- servação subsequente.

Figura 10 Eritema multiforme minor em criança de 3 anos e 6 meses com infecção por Mycoplasma pneumoniae.

Figura 11 Angioedema e urticária em doente sexo feminino, 61 anos de idade, na sequência de reacção de hipersensibilidade a anti-inflamatórios não esteroides.

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Além de um exame geral meticuloso da pele e mucosas, atenden- do a potenciais infestações fúngicas ou outra patologia infecciosa, deverá ser identificada a presença de alguns dados relevantes: atopia, doenças concomitantes como infecções e patologia sisté- mica, medicação em curso, distúrbios psicossomáticos e labilidade emocional tão frequente nestes doentes. Distúrbios intestinais, refluxo gastro-esofágico, hábitos dietéticos, eventual evidência de correlação com ciclo menstrual são outros factores que deverão ser atendidos na abordagem clínica. Intervenções cirúrgicas prévias, implantes dentários ou hormonais, utilização de fármacos ditos na- turais, actividades de lazer, profissionais e domésticas são outros factores de interesse na história clínica.

Como é sabido esta patologia pode condicionar enorme instabili- dade emocional pelo incómodo intrínseco, e pelas próprias limita- ções nos contactos e nas relações interpessoais que podem ficar seriamente comprometidas. A labilidade emocional induzida pela própria doença pode agravar um distúrbio psíquico pré-existente com implicações muito relevantes no sono, na concentração, na actividade de vigília e na qualidade de vida.

Numa primeira abordagem é fundamental, ainda, caracterizar a resposta à terapêutica introduzida uma vez que nos permite aferir a magnitude da doença e perspectivar o estudo diagnóstico e plano de tratamento.

A colaboração do doente é imprescindível, não só no esclareci- mento do interrogatório clínico, como também determinar quais as condições que ele próprio reconhece com factores indutores, determinantes ou condicionantes da doença. Importa salientar que na maioria das vezes alguns factores são desvalorizados ou não são reconhecidos como relevantes, mas que para o clínico são nucleares para o diagnóstico correcto. Desta forma, solicitar registos escritos com os designados “diários de urticária” são fun- damentais para estabelecer eventuais situações ou condicionantes que nos facilitam a investigação.

As formas agudas, as mais comuns, são habitualmente autolimita- das e raramente requerem uma investigação subsequente. Nestas, os mecanismos de hipersensibilidade mediada por IgE, infecções víricas e de hipersensibildade a fármacos são determinantes, mas muitíssimo raras nas formas crónicas7. Outros mecanismos indu-

tores são identificados com maior ou menor relevância depen- dendo da maior abrangência do estudo laboratorial estabelecido no estudo destes doentes10.

Já as formas crónicas, particularmente em doentes com histórias minimalistas ou em período de relativa estabilização, requerem uma maior rigor na caracterização. É disso exemplo a correlação entre urticária crónica com processos infecciosos subjacentes (Helicobacter pylori, Herpes simplex II, por exemplo), reacções de intolerância a alimentos, aditivos ou fármacos de uso crónico ou a auto-reactividade traduzida quer por auto-imunidade mediada por anticorpos funcionais anti-receptor de IgE, auto-imunidade ti- roideia ou mais raramente outro distúrbio sistémico subclínico. Em doentes com formas crónicas sem condicionantes conhecidos, anteriormente designados por idiopáticos ou recorrentes a doença pode persistir durante períodos muito prolongados, embora se considere ser auto-limitada. Num estudo prospectivo em 220 doentes crónicos em 47,4% ocorreu remissão após 1 ano de evo- lução11. Noutro estudo espanhol 8,7% dos doentes mantinham

sintomas durante os primeiros 5 anos e 11.3% em período supe- rior4. Não existem, porém, marcadores clínicos ou laboratoriais

que possam prever a duração da doença pelo que a abordagem clínico-diagnóstica deverá sempre importar estratégias incisivas e abrangentes.

As formas agudas embora possam ocorrer em todas as faixas etárias têm uma maior incidência em crianças, adolescentes e adul- tos jovens. Já as formas crónicas têm um claro predomínio no sexo feminino e em idades mais tardias9. O doente padrão tem um início

de doença aos 40 anos de idade, tal como descrito na maioria dos estudos4.

A urticária como paradigma de uma síndroma é verdadeiramente um distúrbio multifactorial, bem distante dos anos 70 em que se considerava ser resultado de um distúrbio emocional, psicossomá- tico, embora com já se referiu condicione uma instabilidade que terá de ser enquadrada no plano terapêutico global10. Esta situação

é, perfeitamente, compreensível em doentes com doença grave e persistente em períodos superiores a mais de 20 anos de evolução. Se as formas agudas estão mais reportadas em atópicos com inevitáveis repercussões etiopatogénicas, a atopia não está envolvida nos doentes com formas crónicas8,9. Na Tabela 4

apresentam-se algumas das causas potenciais mais comuns na indução de urticária.

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Tabela 4 Etiologias potenciais na urticária.

Distúrbio imunológico

Hipersensibilidade tipo I, mediada por IgE

Alimentos: frutos secos, crustáceos, moluscos, peixe, ovo, leite, soja, trigo,… Medicamentos: penicilina, aspirina, AINEs, sulfamidas, quinolonas,… Aeroalergénios: fungos, ácaros, pólens, fâneros

Substâncias orgânicas: látex, veneno de himenópteros Aditivos, conservantes

Produtos naturais

Hipersensibilidade tipo II, mediada por anticorpos Reacção transfusional

Hipersensibilidade tipo III, mediada por reacção antigénio-anticorpo Reacção doença soro

Hipersensibilidade tipo IV, retardada celular (quatro subtipos) Medicamentos, manipulação alimentos, exposição a proteínas animais,… Doença autoimune

Tiroidite Hashimoto, LES, vasculite, hepatite,… Infecção viral

CMV, EBV, hepatite, Herpes simplex virus II, … Infecção parasitária, micótica ou bacteriana Doença sistémica

Neoplasia ou distúrbio endócrino

Leucemia linfocítica crónica, neoplasia do ovário, contraceptivoshormonais,… Distúrbio não imunológico

Estímulo físico

Exposição solar, frio, vibração, pressão directa, estímulo físico Água

Contactante

Aumento da temperatura corporal Exercício

Desgranulação mastocitária directa

Opiácios, vancomicina, produtos radiocontraste, relaxantes musculares, dextran, sais biliares, aspirina e AINEs

Alimentos com elevados teores de aminas biogénicas

Morango, tomate, camarão, queijos fermentados, espinafres, beringela, frutos secos, bacalhau, chocolate,…

Alimentos, aditivos, conservantes, medicamentos e outros agentes etiológicos reportados a hipersenbilidade tipo I mediada por IgE são frequentes nas formas agudas, mas não deverão de todo ser considerados na urticária crónica ou quanto muito têm uma ex- pressão residual8,10. Os aditivos e conservantes como benzoatos,

salicilatos naturais ou corante amarelo nº 5, designados como pseu- doalergénios, podem agravar as lesões, mas raramente são causa objectiva do distúrbio. Estas substâncias presentes em muitos alimentos pré-cozinhados, são também utilizados como corantes, conservantes, adoçantes e têm uma aplicação muito diversificada na indústria alimentar como os compostos aromáticos presentes no vinho ou presentes de forma natural em tomate e especiarias como fenois ou ácido D-hidroxi-benzóico em citrinos10. A remis-

são resultante de dietas de eliminação é muito divergente nos doentes crónicos e é consensual que não deverão merecer qualquer contributo na patogenia destes doentes, tanto mais que após ter ocorrido a interrupção de sintomas a livre ingesta não condiciona qualquer tipo de lesões.

Relativamente aos medicamentos são aplicadas as mesmas consi- derações. Na história clínica a identificação da prescrição farma- cológica em curso é obrigatória pelo que desde logo pode facilitar o estudo subsequente, sendo que as reacções a fármacos têm um conveniente enquadramento.

A etiopatogenia infecciosa, particularmente a vírus é extrema- mente importante nas formas agudas, mas mais questionável em doentes com longas evoluções7. A correlação da infestação por

Helicobacter pylori e urticária crónica é muito questionável uma vez que a sua presença no homem é substancialmente superior às taxas de prevalência da doença cutânea. Estes aspectos me- recerão um desenvolvimento e discussão mais aprofundado em capítulos subsequentes.

A auto-imunidade tiroideia está reconhecida num número apreci- ável de doentes crónicos10. Estes auto-anticorpos dirigidos a pro-

teínas da tiróide estão presentes habitualmente em estadios eu- tiroideus, sustentando-se que a inflamação glandular conduzirá a activação e libertação citocínica que promove a autoexcitabilidade mastocitária. Esta agressão autoimune, não perfeitamente escla- recida, será oportunamente desenvolvida, bem como os estadios de auto-imunidade anti-receptor de IgE reconhecidos em doentes com formas habitualmente mais graves de urticária crónica. Parece evidente, pois, que o grupo de doentes com urticária cró- nica espontânea tem, comparativamente, aos doentes com clínica aguda uma etiologia claramente divergente. Uma vez mais se re- força a necessidade de uma história rigorosa para caracterização clínica com alguns exemplos que facilitam o racional diagnóstico,

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