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Classificação das normas constitucionais quanto ao seu grau

9. A atuação do Poder Público em face dos problemas socioambientais

2.2. A aplicabilidade das normas constitucionais

2.2.2. Classificação das normas constitucionais quanto ao seu grau

A doutrina revela a importância de uma pauta classificatória das normas constitucionais que nos indique, além do grau de eficácia dos comandos exarados pela Constituição, também a causa determinante dessa variação do grau eficacial.234 Em obra clássica, Afonso da Silva

232 Cf. DINIZ, Maria Helena. Norma Constitucional e Seus Efeitos,1998, p. 114. 233

DINIZ, Maria Helena. Ob. cit., p. 115.

234 Cf. BASTOS, Celso Ribeiro; BRITO, Carlos Ayres de. Interpretação e Aplicabilidade das Normas

enunciou a célebre divisão das normas constitucionais, quanto à eficácia e aplicabilidade. Dividiu-as em: i) normas constitucionais de eficácia plena e aplicabilidade imediata;235 ii) normas constitucionais de eficácia contida e aplicabilidade imediata, mas passíveis de restrição; e iii) normas constitucionais de eficácia limitada ou reduzida, em geral dependentes de integração infraconstitucional para operarem a plenitude de seus efeitos.236

De acordo com essa formulação, normas de eficácia plena são as que receberam do constituinte normatividade suficiente à sua incidência imediata e independem de providência normativa ulterior para sua aplicação. Normas de eficácia contida são as que receberam, igualmente, normatividade suficiente para reger os interesses de que cogitam, mas prevêem meios normativos (leis, conceitos genéricos etc.) que lhes podem reduzir a eficácia e aplicabilidade.

Normas de eficácia limitada são as que não receberam do constituinte normatividade suficiente para sua aplicação, o qual deixou ao legislador ordinário a tarefa de completar a regulamentação das matérias nelas traçadas em princípio ou esquema. A doutrina divide-as em dois grupos: i) normas programáticas, como as dos artigos 196 e 217 que versam sobre matéria eminentemente ético-social, constituindo verdadeiramente programas de ação social (econômica, religiosa, cultural etc.); e ii) normas de legislação, aquelas que não têm conteúdo ético-social, mas se inserem na parte organizativa da constituição.237

235 SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das Normas Constitucionais,1998, pp. 82ss. A propósito, Luís Roberto Barroso (O Direito Constitucional e a Efetividade de suas Normas: Limites e Possibilidades da

Constituição Brasileira, 2000, pp. 143-144) ilustra a matéria apresentando-nos como exemplos de normas de

eficácia plena e aplicabilidade imediata, na Constituição de 1988, os art. 44, 76, 2º e 30, I.

236 Celso R. Bastos e Carlos A. de Brito (Interpretação e Aplicabilidade das Normas Constitucionais, 1982, p. 3) discordam desse grupamento, afirmando que ele se afigura insuficiente para “revelar as múltiplas situações decorrentes de uma classificação exaustiva das regras constitucionais, seja quanto ao seu modo de incidência, seja quanto à produção dos seus efeitos.

237 Cf. SILVA, José Afonso da. Ob. cit., p. 84. A propósito, Luís Roberto Barroso (Ob. cit., pp. 92 e 94) enquadra as normas constitucionais, quanto a sua efetividade, na seguinte tipologia: i) normas constitucionais cujo objeto é organizar o exercício do poder público: de organização; ii) normas constitucionais que visam fixar os direitos fundamentais dos indivíduos: definidoras de direito; iii) normas constitucionais que têm por objeto traçar os fins públicos a serem alcançados pelo Estado: programáticas. Celso Ribeiro Bastos e Carlos Ayres de Brito (Interpretação e aplicabilidade das normas constitucionais, 1982, pp. 118 e 121) focam o assunto da aplicabilidade das normas constitucionais sob à luz de dois critérios: i) quanto ao modo de incidência: a) normas integráveis (ou de integração): normas restringíveis e normas completáveis; e b) normas inintegráveis (ou de mera aplicação): normas de conteúdo e operatividade reforçáveis; ii) normas de conteúdo e operatividade irreforçáveis;no tocante à produção de efeitos: a) normas de eficácia parcial: normas completáveis; e b) normas de eficácia plena: normas inintegráveis; iii) normas restringíveis. Acerca da produção dos seus efeitos, aduzem tratar-se de normas “que se dotam de plena eficacidade. Incidem sobre os fatos constitutivos de sua hipótese de incidência, por virtude ou merecimento próprio. Dispensam a intermediação de comando subalterno para realizar aquilo que integra o seu real desígnio. A subsunção dos fatos empíricos à sua hipótese de incidência opera automaticamente, pois elas se auto-instrumentam o bastante para isso”. Celso A. B. de Mello (Eficácia das

Normas Constitucionais sobre Justiça Social,1981, p. 108), ao classificar as normas constitucionais, toma como

pressuposto o critério da consistência e amplitude dos direitos imediatamente resultantes. Para o jurista existem: i) normas que conferem poder jurídico a um sujeito, que, por si, sem o concurso de outrem, frui do bem jurídico

Azzariti separa as normas constitucionais em: i) preceptivas, de caráter obrigatório e impositivo; ii) diretivas, sem obrigatoriedade, que podem ser violadas pela lei ordinária, sem que esta seja inconstitucional. Elas não têm qualquer eficácia, nem são consideradas normas jurídicas, contendo só uma diretriz ao futuro legislador.238 Crisafulli propõe a seguinte classificação: i) normas de eficácia plena e com imediata aplicação; ii) normas de eficácia limitada, que podem ser de legislação e programáticas.239

Miranda denominou normas bastantes em si e normas não bastantes em si, conforme dispensassem, ou não, regulamentação para sua aplicação.240 Barbosa, sob a inspiração do sistema norte-americano, foi quem introduziu, no Brasil, o conceito das normas. Diversamente de Miranda, conceitua as normas como auto-executáveis e não-executáveis. As primeiras, como sendo

“as determinações para executar, as quais não se haja mister de constituir ou designar uma autoridade, nem criar ou indicar um processo especial, e aquelas onde o direito instituído se ache armado por si mesmo, pela sua própria natureza, dos seus meios de execução e preservação”. E não-executáveis as que “não se revestem dos meios de ação essenciais ao seu exercício os direitos, que outorgam, ou os encargos, que impõem: estabelecem competências, atribuições, poderes, cujo uso tem de aguardar que a Legislatura, segundo o seu critério, os habilite a se exercerem".241

Concluímos anotando o posicionamento pioneiro de Barbosa, para quem as disposições constitucionais, em sua maioria, não são auto-aplicáveis, sob o argumento de que a Lei Maior

deferido, por exemplo, o art. 5º, X (inviolabilidade de domicílio); ii) normas que compõem o necessário para gerar uma utilidade concreta, suscetível de fruição positiva dependente de uma prestação alheia, por exemplo, o art. 210, parágrafo 1º, que trata do ensino religioso nas escolas; iii) normas que se limitam a determinar um fim a ser cumprido pelo Poder Público, sem apontar os meios para atingi-lo, por exemplo, o art. 226. Outra classificação das normas constitucionais, quanto à eficácia, oferece-nos Maria Helena Diniz (Norma

Constitucional e Seus Efeitos, 1998, pp. 109-115), tendo por critério a questão da sua intangibilidade e da

produção dos seus efeitos concretos: i) normas com eficácia absoluta – intangíveis, contra as quais não há sequer o poder de emenda, por exemplo, os textos constitucionais que amparam a federação (art. 1º); ii) normas com eficácia plena – idôneas, contém todos os elementos imprescindíveis para que haja a possibilidade da produção imediata dos efeitos previstos; iii) normas com eficácia relativa restringível, de eficácia redutível ou restringível, por serem de aplicabilidade imediata ou plena; iv) normas com eficácia relativa complementável ou dependente de complementação – normas que não receberam do constituinte normatividade suficiente para sua aplicação imediata, cabendo ao Legislativo a tarefa de sua regulamentação. Assim, não podem produzir todos os seus efeitos de imediato. Têm, porém, aplicabilidade mediata, já que incidirão totalmente sobre os interesses tutelados. Podem ser: i) normas de princípio institutivo, dependentes de lei para dar corpo a instituições, pessoas, órgãos, nela previstos; e ii) normas programáticas, que comandam o próprio procedimento legislativo, por serem estabelecedoras de programas constitucionais a serem desenvolvidos mediante legislação integrativa da vontade do constituinte.

238 AZARITI, Gaetano. Problemi attuali di diritto costituzionale, 1951, p. 98.

239 CRISAFULLI, Vezio. La costituzione e le sue disposizione di principio,1952, p. 68. A doutrina italiana conclui pela seguinte classificação dos mandamentos constitucionais: i) diretivos, ou pragmáticos; ii) preceptivos, obrigatórios, ou de aplicabilidade imediata; iii) preceptivos, obrigatórios, mas sem aplicabilidade imediata.

240 MIRANDA, Pontes de. Comentários a Constituição de 1946, 1963, p. 85.

241 BARBOSA, Ruy. Comentários à Constituição Federal Brasileira, 1933, vol. 2, pp. 488-489. Nos EUA há, ainda, quem apresente as normas constitucionais como: i) prescrições mandatórias, por serem normas constitucionais materiais e essenciais, de cumprimento irrecusável; e ii) prescrições diretórias, se tiverem conteúdo regulamentar, permitindo ao legislador dispor diferentemente.

não se executa a si mesma, antes impõe ou requer a ação legislativa para lhe tornar efetivos os preceitos.242