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2 Unidades de Conservação: ideais e desafios.

2.3 O Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC)

2.3.1 Classificação das Unidades de Conservação segundo o SNUC

De acordo com o SNUC, as diferentes Unidades de Conservação podem ser classificadas em 02 grandes grupos, divididos de acordo com as possibilidades e autorização para manejo de seus territórios pelo homem, conforme

Unidades de Proteção Integral Unidades de Uso Sustentável Estação Ecológica Áreas de Proteção Ambiental

Reserva Biológica Área de Relevante Interesse Ecológico

Parque Nacional Floresta Nacional

Monumento Natural Reserva Extrativista Refúgio da Vida Silvestre Reserva de Fauna

Reserva de Desenvolvimento Sustentável Reserva Particular do Patrimônio Natural

Tabela 1 - Grupos e Categorias de Unidades de Conservação Previstos no Sistema Nacional de Unidades de Conservação – SNUC, 2000.

Fonte – MEDEIROS (2004, p.608)

As Unidades de Proteção Integral, segundo o SNUC, não podem ser habitadas pelo homem, sendo admitido apenas o uso indireto dos seus recursos naturais - em atividades como pesquisa científica e turismo ecológico, por exemplo, enquanto que o grupo das Unidades de Uso Sustentável podem, segundo o mesmo SNUC, compatibilizar a conservação da natureza com o uso sustentável dos recursos naturais ali existentes.

Dentre as categorias de classificação previstas no SNUC para as Unidades de Proteção Integral estão os Parques, categoria as quais estão os objetos de estudo da tese: (Parque Estadual de Campos do Jordão e Parque Estadual dos Mananciais de Campos do Jordão), cujas fragilidades e potencialidades em função da pratica do turismo em seus territórios serão discutidos a seguir.

De acordo com o SNUC, os Parques podem ser de administração Nacional, Estadual ou Municipal (PARNA – Nacional / PE – Estadual / PNM – Municipal) têm como função preservar áreas naturais ou pouco alteradas, contendo ecossistemas, paisagens ou sítios arqueológicos. Objetiva a preservação de ecossistemas naturais de grande relevância ecológica e beleza cênica, possibilitando a realização de pesquisas científicas e o desenvolvimento de atividades de educação e interpretação ambiental, de recreação em contato com a natureza e de turismo ecológico.

Esse tipo de UC é de posse e domínios públicos, com visitação pública permitida, mas sempre sujeita as normas e restrições estabelecidas no Plano de Manejo da UC em questão e àquelas previstas pelo órgão responsável pela sua administração. Nesse caso a pesquisa depende de autorização prévia da administração da UC e também está sujeita às condições e restrições estabelecidas no seu Plano de Manejo.

Para Serrano (1997), (...) dentre as categorias de unidades previstas, as únicas que permitem visitação são as de parques nacionais, monumentos naturais e florestas nacionais. Segundo a autora, nas estações ecológicas e refúgios de vida silvestre podem ser realizadas atividades de educação ambiental, o que de certa forma também possibilita algum tipo de exploração turística. Ainda segundo Serrano (1997), as variáveis estaduais e

municipais desses mesmos espaços também permitem e preveem a prática da atividade turística em seus limites.

A existência dos dois grupos de conservação, cada qual composto por diferentes categorias de manejo, reflete, segundo Freitas (2008), a tentativa de conciliar diferentes usos do território, como por exemplos nos casos dos Parques Nacionais e Estaduais, que são UCs de Proteção Integral, onde o objetivo é conciliar em um mesmo espaço a conservação com o desenvolvimento do turismo promovendo ainda a educação ambiental nesses locais. Mas a crítica que existe em relação a esse modelo é a de justamente tentar estabelecer, por meio do SNUC, uma classificação cujo marco divisor seja permitir ou não a prática do turismo ou ainda, a efetiva presença humana nas Unidades de Conservação, como se isso fosse suficiente para garantir a preservação desses espaços ou se moldasse perfeitamente a realidade existente nas Unidades de Conservação brasileiras.

Nesse caso, o erro está na interpretação de que a natureza deve ser mantida apartada da ação humana para a garantia de sua conservação. Segundo o Ministério Público Federal (2014) (...) essa concepção não é atualmente tão presente nos Sistemas Internacionais de Unidades de Conservação, pois os atuais sistemas estadunidense e francês preveem diferentes tipos de ocupação humana em Unidades de Conservação denominadas ou equivalentes aos Parques Nacionais.

Nesses modelos, ainda de acordo com o Ministério Público Federal (2014), observa-se a tentativa de (...) conciliar conservação e o desenvolvimento por meio do estabelecimento de um zoneamento diferenciado, onde existem zonas de uma UC a qual a prática do turismo é permitida enquanto que em outras zonas da mesma UC o seu uso e ocupação é mais restrito.

Nas Unidades de Conservação estudadas nesse trabalho a demarcação da UC por zonas de diferentes usos está prevista a partir de seus respectivos Planos de Manejo e é respeitado na prática, tendo em vista do que foi observado nas visitas in loco realizadas nesses locais.

Categoria de UC Características e Objetivos Usos Permitidos Observações I – Área de Proteção

Ambiental (APA)

- proteção da biodiversidade e de atributos abióticos, bióticos, estéticos ou culturais importantes para a qualidade de vida e bem estar das populações humanas;

- disciplinar o processo de ocupação humana;

- assegurar a sustentabilidade do uso dos recursos naturais.

- Permite ocupação humana

- As APAs podem ser constituídas tanto em áreas públicas quanto em áreas privadas, sendo que, neste último caso, sendo respeitados os limites constitucionais, poderão ser estabelecidas normas e restrições para a utilização de uma propriedade privada localizada em uma APA.

O estabelecimento da ZA (Zona de Amortecimento) é optativo II Área de Relevante Interesse Ecológico

- área de pequena extensão, com pouca ou nenhuma ocupação humana, dotada de características naturais extraordinárias ou que abriga exemplares raros da biota regional;

- manter os ecossistemas de importância regional ou local; - regular os usos permitidos, compatibilizando-os com a conservação da natureza.

- permite ocupação humana,

- constituídas por terras públicas ou privadas, sendo que, neste último caso, sendo respeitados os limites constitucionais, poderão ser estabelecidas normas e restrições para a utilização de uma propriedade privada localizada em uma ARIE.

O estabelecimento da ZA no plano de manejo é obrigatório III Floresta Nacional (Estadual ou Municipal)

- área com cobertura florestal de espécies predominantemente nativas

- permite o uso múltiplo sustentável dos recursos florestais, a pesquisa científica e a visitação pública; - permite à permanência de populações tradicionais que habitavam a área anteriormente a implantação da UC.

O estabelecimento da ZA no plano de manejo é obrigatório

IV Reserva Extrativista

Área de domínio público, com uso concedido as populações extrativistas tradicionais;

- proteção dos meios de vida e a cultura das populações extrativistas - assegurar o uso sustentável dos recursos naturais da unidade.

Visitação pública, pesquisa científica e ocupação por populações extrativistas tradicionais;

- Extrativismo em bases sustentáveis, conforme disposto em regulamento e no plano de manejo da unidade.

O estabelecimento da ZA no plano de manejo é obrigatório

V – Reserva de Fauna

Área natural de posse e domínios públicos, com populações animais de espécies nativas, terrestres ou aquáticas.

Visitação pública, - pesquisas científicas. O estabelecimento da ZA no plano de manejo é obrigatório

VI – Reserva de Desenvolvimento Sustentável

- Área natural de domínio público que abriga populações tradicionais cuja a existência baseia-se em sistemas sustentáveis de exploração dos recursos naturais.

- preservar a natureza; - assegurar as condições e os meios necessários para a reprodução das populações tradicionais; - valorizar, conservar e aperfeiçoar o conhecimento e as técnicas de manejo do ambiente.

- visitação pública - pesquisas científicas,

- sistemas sustentáveis de exploração dos recursos naturais praticados pelas populações tradicionais; - manejo sustentável e cultivo de espécies sujeitos ao zoneamento que consta no plano de manejo.

O estabelecimento da ZA no plano de manejo é obrigatório VII Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN)

- Área privada que, após verificação pelo órgão público ambiental do efetivo interesse público, é gravada com perpetuidade, com o objetivo de conservar a diversidade biológica.

- pesquisa científica e visitação pública com objetivos turísticos, recreativos e educacionais.

O estabelecimento da ZA é optativo.

Tabela 2 - UCs do Grupo de Uso Sustentável – segundo SNUC Fonte: Lei Federal nº 9.985, de 18 de julho de 2000.

Categoria de UC Características e Objetivos Usos Permitidos Observações I Estação

Ecológica (EE)

- Área de posse e domínio públicos que objetiva a preservação da natureza e a realização de pesquisa científica.

- realização de pesquisa científica com autorização prévia do órgão responsável pela UC.

O estabelecimento da ZA (Zona de Amortecimento) é obrigatório

II Reserva Biológica

- Área de posse e domínio públicos cujo objetivo é a preservação integral da biota e demais atributos naturais existentes em seus limites.

- realização de pesquisas científicas (com autorização prévia do órgão responsável)

- visitação pública apenas com objetivo educacional e com autorização prévia.

O estabelecimento da ZA (Zona de Amortecimento) é obrigatório

III - Parque Nacional - Área em geral extensa, cujo objetivo é a preservação de ecossistemas naturais de grande relevância ecológica e beleza cênica.

pesquisas científicas com autorização prévia do órgão responsável.

- visitação pública, sujeita a normas e restrições estabelecidas no Plano de manejo da UC

- ênfase no desenvolvimento de atividades de educação e interpretação ambiental, na recreação em contato com a natureza e de turismo ecológico. O estabelecimento da ZA (Zona de Amortecimento) é obrigatório IV – Monumento Natural

Área que tem como objetivo preservar sítios naturais raros, singulares ou de grande beleza cênica.

- pode ser constituída em áreas particulares desde que seja possível compatibilizar os objetivos da unidade com a utilização da terra e dos recursos naturais.

- visitação pública sujeita às normas e restrições estabelecidas no Plano de Manejo

O estabelecimento da ZA (Zona de Amortecimento) é obrigatório

V – Refúgio de Vida Silvestre

- Proteção de ambientes naturais onde se asseguram condições para a existência ou reprodução de espécies ou comunidades da flora e da fauna (local ou migratória).

- pode ser constituída em áreas particulares desde que seja possível compatibilizar os objetivos da unidade com a utilização da terra e dos recursos naturais do local pelos proprietários.

- visitação pública (sujeita às normas e restrições estabelecidas no plano de manejo)

- pesquisa científica (com autorização prévia).

O estabelecimento da ZA (Zona de Amortecimento) é obrigatório

Tabela 3 - UCs do Grupo de Proteção Integral – segundo SNUC. Fonte: Lei Federal nº 9.985, de 18 de julho de 2000.

Diegues (1993) acentua a crítica ao modelo de Unidades de Conservação proposto pelo SNUC ao apontar que sua proposta atual reflete, mais uma vez, a visão extremamente conservadora da questão ambiental no Brasil, pois o modelo brasileiro proposto está na opinião do mesmo autor (...) bem aquém do que se debate a nível internacional, em especial com relação a propostas existentes para solucionar o caso das populações tradicionais nesses espaços.

Para Silva (2012), a perspectiva de natureza sob o ponto de vista urbano, de onde partiu a discussão sobre a ideia do Sistema Nacional de Unidades de Conservação, aprofunda ainda mais o distanciamento sociedade-natureza, já que ela é considerada como algo externo à cidade, confinada em Unidades de Conservação a serem visitadas e transformadas em atrativos turísticos que devem ser visitados por meio de roteiros pré- concebidos pelas empresas pelas empresas localizadas nos grandes núcleos urbanos, na maioria das vezes sem qualquer controle previsto para o máximo de número de visitantes possíveis, definido por meio de um estudo de capacidade de carga, previsão de envolvimento da comunidade no processo ou práticas que estimulem a integração e maior entendimento e consequente respeito do visitante com a natureza visitada.

O estímulo á participação dessas comunidades na gestão e preservação desses espaços as colocaria de fato dentro do processo da prática da atividade turística da UC em questão, seja por meio da possibilidade de ganhos econômicos provenientes da comercialização de artesanato, gastronomia e roteiros de visitação pré-definidos, por exemplo, seja por meio da maior valorização e integração dessa própria comunidade, assim como dos respectivos visitantes, com a natureza existente nas Unidades de Conservação. Nesse sentido, as potencialidades e fragilidades da prática da atividade turística nas Áreas Naturais Protegidas, por meio dos estudos de caso propostos, são discutidas de forma mais ampla a seguir no decorrer dos próximos capítulos.