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Se os artefactos estão já disponíveis antes de se racionalizar um uso para eles, como sugere Nietzsche (2000: 87) a propósito da génese e das finalidades da punição, também a reclusão surgiu muito antes de ser posta ao serviço do uso judicial. Na sua História da Beneficência Pública, Vítor Ribeiro remete-nos para a transição entre os séculos XII e XIII, quando se refere a uma forma primitiva e rigorosa de clausura, praticada nesse tempo por religiosas que se fechavam em celas de onde não mais saíam, denominando-se de “encelladas, inclusas ou emparedadas” (Ribeiro, 1907:10). Esse regime de clausura absoluta, de origem ainda mais antiga, era disperso e obedecia a uma decisão pessoal normalmente motivada por “desgostos, demência ou fanatismo”, tendo-se tomado uma prática algo comum na Europa. O isolamento do exterior era praticamente total, o que justificava a designação de emparedados aos seus adeptos, sendo a sua sobrevivência sustentada por alguma comida dada por esmola. Aqui se encontrava já uma confinação celular associada ao hábito de assistência por esmolas, embora o carácter espontâneo, desarticulado e disperso, sem alguma finalidade intencional ordenada por uma razão, não permita falar ainda de uma tecnologia.

A partir do século XII e até ao século XV, o bispado começou a congregar os casos isolados de devotos emparedados, reunindo-os principalmente nas grandes cidades e impondo-lhes regras e vidas monásticas (Ribeiro, 1907: 10-14). Criou-se assim um sistema de enquadramento e controlo de um grupo de indivíduos que se dedicavam a

uma prática comum, mas destituída de alguma orientação ou objectivo prático. Da sua clausura, da constituição desse universo populacional, não poderia portanto resultar-nenhum benefício comum.

Essa vida celular estava restrita ao ambiente monástico, não tendo ainda paralelo na organização social vigente. Foi em finais do século XVII e durante o século XVIII que se produziu uma profunda alteração na percepção que a família passou a ter de si própria, percepção essa que, conjugada com uma nova arquitectura doméstica que permitia modos de relacionamento inéditos, conduziu a uma retracção da vida social do espaço público para o do lar. A novidade da redistribuição do espaço habitacional consistia numa disposição das divisões por um corredor, criando talvez assim o primeiro dispositivo generalizado de distribuição espacial celular dos indivíduos, modelo que vai rapidamente difundir-se noutros' aspectos práticos da vida social (Ariès, 1973: xvi). É uma herança conventual que se mostrou produtivamente eficaz ao serviço de outras actividades sociais, permitindo a difusão do enclausuramento como prática institucional aceitável. Sobre a influência desses novos entrançados relacionais possibilitados por novos recortes espaciais, Foucault refere-se* lhes em síntese:

“São espaços que realizam a fixação e permitem a circulação; recortam segmentos individuais e estabelecem ligações operatórias; marcam lugares e indicam valores; garantem a obediência dos indivíduos, mas também um a m elhor economia do tempo e dos gestos” (Foucault, 1987: 126).

Também as técnicas de distribuição e hierarquização dos sujeitos vão chegar à aplicação de uma didáctica escolar reprodutiva. De um ponto de vista estritamente disciplinar, a articulação proposta na segunda metade do século XVIII por Joseph Lancaster e Andrew Bell, conhecida por ensino

mútuo, tinha um efeito multiplicador da presença, do mestre, normalmente à razão de. um para dez. Cada um dos melhores alunos, ao tomar-se decurião por incumbência do professor, ocupava-se de dez condiscípulos, o que tomava possível um ensino de escala, ideal para a massificação educativa que se vai ensaiar durante o século XIX. Toda a engrenagem que se estabelecia, o sincronismo, a vigilância, a didáctica que ainda não ultrapassara o processo recitativo e o exame, eram protagonizados pelos alunos mas segundo um código pautado pelas regras dos mestres e pontuado pela sinalética por estes empregue. Não é um olhar exclusivista, simplesmente está concentrada em formas disciplinares de distribuição de sujeitos que transportam e transmitem saberes ou estão encarregados de manter uma ordem escolar. No entanto esta táctica pode ser lida, como o faz Caruso (2003), contemplando uma obediência colectiva através do conhecimento e não exclusivamente por dispositivos de cariz militar, buscando assim encontrar um significado cultural nas técnicas de disciplina.

Acrescente-se que numa perspectiva meramente gerencial, arredando as intenções do método e concentrando-nos na sua forma e estrutura, afigura-se que a táctica do ensino mútuo era. um dispositivo praticado há muito nos colégios jesuítas, tendo sido apropriado por um discurso secular propício à escolarização de populações cada vez mais vastas. Mandava-se em 1739 no Colégio dos Meninos Õrfaos do Porto, que o Padre Vice-reitor e o mestre de latim, que poderia ser secular ou eclesiástico e vir de fora, “nomeassem na classe decuriões, que dessem as lições aos que eles não podiam dar e também quando por ocasião de alguma ocupação não pudessem ir ao estudo, dariam lição aos decuriões que, na aula seguinte, prestariam contas ao Padre Mestre” (Basto, 1951:

320). Mesmo que faltassem às aulas dos órfãos, devido a algum impedimento, os padres ou seculares faltosos tèriam forçosamente, a fim de completarem o horário, de dar lição aos pordonistas, aqueles que prestavam um contributo pecuniário e prestígio sodal fundamentais para o Colégio.

Dessa vertente de economato da distribuição como elemento primordial de governo - uma radonalidade gerencial de proveniênda empírica, estava consdente o filósofo utilitarista Jeremy Bentham [1748- 1822] ao dissertar sobre as virtudes da clausura correcaonal: “O provdto que se pode tirar no dia de hoje de uma casa de correcção bem governada, já não é hoje uma simples probabilidade fundada sobre radoanios; é uma experiência que tem sortido o seu efeito ainda muito além do que se esperava” (Bentham, 1822:183).

Toda uma sorte de instituições geradoras de determinados constrangimentos, onde também pontificavam os colégios, estabeleceu-se no iníao do século XIX, gerando uma forma social de poder que criou as condições para que se desenvolvessem modos de produção sufidentemente generalizados e orientados para um incremento dos resultados finais. Esta organização de corpos e actividades vai permitir o áparedmento da produção industrial e, genericamente, do capitalismo (Foucault, 1994). Aos resistentes a essa agregação sodal produtiva, esperava-os um qualquer dispositivo que, mesmo que não os reintegrasse, poderia corporizar uma ameaça sufidentemente eloquente para todos, evidenciando as virtudes de uma integração social adequada.

Coinadente com o esvaimento da monarquia absolutista, o poder governamental começa a ser exerddo através de dedsões baseadas em conhecimentos especializados nos processos económicos, sociais e

demográficos, constituindo-se uma aliança qualificada en tre. o saber e a capacidade de o incorporar na acção executiva. ...

Essa matriz distributiva dos sujeitos, um arranjo que se tomava mais proveitoso e com um valor produtivo próprio, estava associada a um fim específico que seria a construção idealizada de indivíduos que deveriam cumprir, também eles, um ideal de sociedade. Tal, não seria possível sem uma prévia hierarquização no. reduto escolar: no século XVm, ‘TJne discipline autoritaire et hiérarchique s’établissait au collège”, alterando profundamente o uso que as crianças faziam de si e das relações escolares com os “pedagogos” (Ariès, 1973: 316). Seria portanto uma disposição ordenada e sincronizada no espaço e no tempo mas, sobretudo, hierarquizada.

Do pedagogo que albergava os escolares, desfrutando estes fora das aulas de plena liberdade, transita-se para um modelo no qual a tutela completa da criança se transfere para uma realidade institucional e distinta da anterior, situação nova e estimulada pela necessidade de restringir a capacidade das crianças disporem de si próprias, quando fora das aulas e das suas obrigações misseiras (Ariès, 1973: 298-317). Da força da vergasta pessoal dos “pedagogos” à força do colectivo institucional, das obrigações pontuais das aulas à regulação constante da sua vida pessoal, há todo um conjunto de processos que se foram sofisticando em tomo de necessidades novas, cuja evolução fadlita a compreensão da retórica pedagógica e da sua utilização.

Só no fim do século XIX, com o desenvolvimento das ciências, mecanismos de avaliação e validação científica eram concorrenciais entre vários saberes e academias na procura de diagnósticos e prescrições para os desvios de um comportamento aceitável. A antropologia criminal

contrapunham-se a sociologia, e a psicologia criminal, como Deusdado explicita, refutando as teorias da escola de Lombroso sobre a caracterização anatómica da criminalidade:

“A resolução do problema da criminalidade não pode vir da análise física do exterior do delinquente, da assimetria facial, do estrabismo, da tatuagem, da desproporção na dinamometria-e no calor, do prognatismo, e de outras anomalias somáticas. E stes materiais terão valor como elemento indirectamente subsidiário para o estudo da natureza psíquica, da sua forma e da' sua evolução, mas a luz há-de nascer do conhecimento dos fenómenos da consciência e dos factos externos e internos que sobre ele actuem” (Ferreira-Deusdado, 1889: 23).

Essa deslocação do enfoque no corpo dos indivíduos para os mecanismos mais subtis da sua natureza psicológica, é uma preferendalidade que se irá acentuar cada vez mais. Erigiu-se assim um poder crescente, alicerçado num vínculo ao radonalismo científico, através dá apropriação dos seus mecanismos de produção de verdade, congregando um saber e um p oder constitutivos das relações sociais em geral e dos regimes escolares em particular. E na aplicação desse “sistema de disciplina”, bem visível nos discursos e nas práticas, que reside uma prescrição constante, um agente cientificamente legitimador do controlo produtivo dos corpos e dos quadros de constituição moral propostos.

Na segunda metade do século XIX a nomenclatura médica foi-se cruzando com a razão teórica da pedagogia, introduzindo assim sistemas empíricos em quadros exclusivamente morais e filosóficos, alterando profundamente a natureza da fundamentação da prescrição pedagógica (Dekker, 1996a). A medicab^ação da sociedade surge então como um mecanismo de configuração e controlo social, sendo a higiene escolar a sua expressão poBcial junto do quadro educativo público (Abreu, 1999). O

higienismo associava-se às virtudes regeneradoras , do trabalho e disciplina, prescrevendo modalidades de acção - e instalando-se firmemente nas instituições que melhor dispunham de grupos populacionais. .

“E necessário realizar nas cadeias a regeneração, e condliá-la com o interesse da saúde e da vida. E necessário que se saiba que nem todos os que lá entram ficam impossibilitados de se reformar, ou condenados a morrer. E uma das maneiras de os conduzir para a regeneração física e moral é o estabelecimento de trabalhos industriais e agrícolas acompanhados de-uma certa disciplina, que lhes crie. o horror ,à ociosidade. Só assim se compreende a reforma penitenciária, à face da higiene” (Namorado, 1877:46).

Começava a tomar-se mais nítido um quadro institucional multidisciplinar e especializado, em que cada tecnologia deveria dar o seu contributo para a acção cotrecdonal, chegando a designar-se por “antropotecnia” o conjunto das “artes que têm por fim dirigir o homem — medicina, higiene, moral, educação, direito e política” (Ferreira-Deusdado,

1889:211).

Essa acção disdplinadora, resultante da aplicação de diferentes especialidades, prolonga-se pelo século XX, tendo-se estendido a uma população escolar em constante crescimento, marcando a sua presença curricular e exercendo-se principalmente junto daqueles que foram os primeiros alvos dessas tecnologias: os mais desfavoreddos (Nóvoa, 1994). Essas tecnologias de regulação dos indivíduos e a sua finalidade ou efeito produtivo, são centrais para o esforço da compreensão do que Foucault refere como uma economia de poder. Aqui, um poder muito mobilizador e em expansão constante, suportado por práticas pedagógicas que se foram construindo e sustentando por uma discursividade crescente em recursos teóricos e científicos. Essa extensão pedagógica da medidna, essa

“medicalizaçao geral dos comportamentos, das condutas, dos discursos, dos desejos, etc.,” pode-se considerar ser o ponto de encontro entre um princípio ■ de ordem jurídica è soberana e uma frente de articulação mecanidsta e disciplinar (Foucault, 2000).

Em classe, Posiçüo asseniaàa com os braços ao longo do corpo.-Monitora aaziliaodo ama inspiração. Àtençào geral. Uma excepçio-por vaidade. Demonstração pedagógica.

Figura 1 — A disciplina higienista dos corpos e o exemplo pedagógico da excepção.

Fonte: Organização da pré-aprendizagem (1931).

O internato correctivo — a clausura pedagógica — é também a forma mais distinta de traçar fronteiras de inclusão e exclusão. Aos novos sistemas de administração • social vão aliar-se os novos métodos

psicológicos que, ao aferirem os menores por referência a um padrão,.as qualificam ou desqualificam segundo um registo de normalidade estabelecido pela relação com o que seriam os princípios expressos e traduzidos e aferidos por uma racionalidade científica.

As inspecções médicas e antropométricas, bem como a avaliação psicológica, eram regulares e periódicas nos institutos dedicados à observação e categorização de menores, entre os quais, o modelo dos Refúgios da Tutoria, a que não faltava matéria de estudo. Aos que entravam era elaborado um “Registo Biográfico” que ficava apenso ao seu processo judicial. Eram minuciosamente mensurados e classificados taxinomicamente; a sua situação social e a da sua família, tal como os seus antecedentes, incluindo a condição de saúde e as causas de morte dos progenitores, eram também esmiuçadas, sendo a representação da crença científica na responsabilidade das origens hereditárias e deformações fisiológicas responsáveis por desvios comportamentais, não se colocando ainda por essa altura uma grande ênfase nas causas sociais e na sua profilaxia. O registo biográfico, sempre assinado por um Director-médico, terminava com o exame psicológico. Desse registo constavam, entre outros: “Dados pessoais; Antecedentes hereditários; Influências a que o menor esteve sujeito; Educação recebida; Antecedentes pessoais; Vacinas; Exame antropológico e Exames psicológicos”. A avaliação psicológica inquiria sobre itens como “o sentimento do dever; o amor pelo trabalho; o medo aos castigos; o amor-próprio; a inveja; a vaidade; a taciturnidade ou loquacidade; a afeição pelos pais e pelos mestres; o humor habitual; os maus hábitos”, etc (Portaria n.° 4:463, 1925). A medicina, com a sua discursividade e tecnologia próprias, vem aliviar a métrica universalmente aplicada, substituindo-a por uma individualização mais específica e

detalhada, dingindo-se agora também ao indivíduo e não somente ao todo, observando-o, controlando-o e solidtando-lhe o seu empenhamento.

Detenhamo-nos no discurso pedagógico sobre a virtude da disciplina escolar na viragem do século XIX. O palco é o dicionário Buisson:

‘Tendant les mouvements généraux, entrée en classe, changements de place, sortie, le plus, grand silence est observe dans les rangs; les élèves marchent en ligne, le corps droit, le bras dans une position uniforme, sois croisés sur la poitrine, soit rejetés en amère avex les mains au dos. On a beaucoup critiqué cette dernière posture qui, dit-on, donne aux enfants l’air de petits . captifs; elle est cependant, de l’avis des medicines, préférable à la première au point de vue de l’hygiène, car elle favorise le développement de la poitrine et force l’enfant à se tenir droit. Dans les marches ainsi conduits, on ne voit jamais les enfants se bousculer et même se batter, comme cela arrive lorsqu’ils conservent la liberté complete de leur attitude et de leurs mouvements: ils contractent de précieuses habitudes d’ordre er sè préparent au travail par une sorte dé recueillement. Quand ils ont pénétré dans la classe, ils ne se précipitent pas en désordre vers leurs places respectives mais ils marchent d’abord autour des tables en marquant légèrement le pas; souvent un chant ou une récitation cadencée accompagne la marche; chacun alors, au signal donné , se rend à sa place, s’y assied en plaçant ses bras dans la position indiqué par l’usage de la classe. Les enfants aiment ces marches en bon ordre, qui leur évitent beaucoup de punitions, car la repression devient inutile quan le désordre est prévenue” (Gaillard, 1887: 717).

A metáfora ortopédica exerdda sobre os corpos provinha do saber médico da higiene e a sua distribuição e ordem eram ainda muito militares, funcionando de acordo com o princípio da obediência aos toques e vozes de comando. A “saúde” era a contrapartida a uma docilidade que acarretava frequentemente a humilhação; a gratificação imediata era a ausência do castigo. A referência a “disciplina” não significa então, por

castigos nas suas diversas modalidades; não se trata aqui de: rigidez no cumprimento de normas ou de .intolerância; só num sentido muito simplista é tudo isso um pouco.mas, essencialmente, é aquilo que pode ser um instrumento de “submissão da vontade” a uma metodologia de cariz tecno-político, uma expressão prática de um saber/poder dedicado à distribuição e controlo dos indivíduos de modo a que se tomassem colectiva e individualmente mais dóceis, governáveis-e produtivos — um objectivo básico e comum nos Estados modernos. Assim, nao sendo a disciplina impositiva mas relacional, tal como a pedagogia, é nos espaços celulares de educação compulsiva que melhor se cruzam o discurso pedagógico e as práticas das disciplinas, numa expressão de exigência moral materializada pela obediência.

A disciplina é um elemento central de uma “economia de govemo”, não num sentido de rigor, mas no do estabelecimento de uma determinada ordem, um ordenamento espacial e temporal dos indivíduos, uma gestão de recursos através de uma disposição matridal de dispositivos e agentes, correspondendo a uma finalidade politicamente aferida. A esse nível, toda uma troca de poderes se manifesta em acções, muito diversas em intensidade ou influência e muitas vezes reduzidas à dimensão do detalhe, mas sempre produtivas.

“A minúcia dos regulamentos, o . olhar esmiuçante das inspecções, o controlo das m í n i m a s parcelas da vida e do

corpo darão em breve, no quadro da escola, do quartel, do hospital. ou da oficina, um conteúdo laicizado, . uma racionalidade económica ou técnica a esse cálculo místico do ínfimo e do infinito” (Foucault, 1987: 121).

Não se trata portanto de uma disciplina regulamentar, reduzida ao prémio e à sanção, nem cumprida na sacralização da norma. Nos regimes

disciplinares as punições não necessitam de ser aplicadas para se sustentarem: a aplicação do castigo é um inconveniente que gera hostilidades, ressentimento e por vezes a vingança. A verdadeira função das sanções, a sua universalidade na abrangência de todos os indivíduos, é a sua existência, a ameaça que induzem, o seu enunciado e a possibilidade iminente da sua aplicação. A configuração do castigo é o código institucional de comportamento, mas também é o estímulo à sua fuga: nem todã a acção é inibida, pelo contrário, ela é muitas vezes estimulada pela possibilidade de cumulativamente praticar a infracção e conseguir a isenção sandonatória. A ausênda de castigo esvaziaria este último estímulo. É a capaddade produtiva do poder que está aqui ilustrada.

“A Cesta — Algumas vezes põem-se os meninos dentro de um saco ou cesta, suspensos no tecto da sala, à vista de todos os outros, que frequentemente se riem dos pássaros na gaiola. Este castigo é o mais terrível que se pode dar aos discípulos de • senso e habilidade; sobretudo é temido pelos decuriões. O seu nome é bastante, e portanto poucas vezes é usado” (Lancaster, 1823: 60).

Os outros castigos menos terríveis induíam as práticas confessionais de admissão pública de culpa, o uso de uma canga ao pescoço e outra nos pés, por vezes aplicada a um grupo, a humilhação dos meninos sujos por uma menina, (<fUm castigo desta qualidade faz com que os meninos tenham a cara lavada por dois anos” [Lancaster, 1823: 60]), a prisão depois das aulas, etc.

Os recursòs disciplinares não são opressivos, mas sim, desde a idade clássica, libertadores dos constrangimentos do ser humano e da sua condição, são criadores de responsabilidades consdèntes e objectivadores de todas as sujeições e necessidades que pendem sobre a sua própria

“As disciplinas sào, em primeiro lugar, uma física do espaço .e - do tempo: antes de serem formas da sensibilidade, o espaço e o tempo são fabricações do poder. Trata-se de dispor espaços, constituir células, de .quadricular, de. ordenar,, de definir empregos do tempo, de os acumular, de os programar, de os compor de acordo com exercícios, manobras1 e tácticas, o espaço e o tempo talvez sejam formas, mas formas de poder constitutivas da nòssa sensibilidadè” (Ewald, 2000: 52).

Num regime, de correcção disciplinar não são, somente as tecnologias distributivas que agem; elas não teriam talvez a eficácia pretendida sem o acto derradeiro e omnipresente de controlo. E um terreno fértil, onde todos os dispositivos de vigilância e atenção se evidenciam pela constância da sua presença, acentuando os efeitos e a