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CAPÍTULO II A AUTORIDADE SEGUNDO OS ADOLESCENTES

2.2 MÉTODO

2.2.4 Coleta de dados

A coleta de dados, em ambas as escolas, foi realizada no primeiro semestre de 2013. Em novembro de 2012 foi efetuado o primeiro contato com as escolas, a fim de obter a autorização da direção para a realização da pesquisa e verificar se os alunos de fato pertenciam à localidade onde as escolas estavam inseridas. Essa preocupação ocorreu em função de se garantir que a amostra de todos os alunos participantes da pesquisa pertencesse a realidades socioeconômicas próximas, conforme indicavam os dados do IDH. Em ambas as escolas, a direção se mostrou bastante solícita e interessada em saber os objetivos da pesquisa e o motivo pelo qual aquela unidade escolar foi escolhida para a sua realização. Após os esclarecimentos necessários quanto aos objetivos da pesquisa, os critérios para a escolha das escolas e os procedimento de pesquisa, a autorização foi concedida.

No primeiro semestre de 2013, os professores da rede municipal de ensino de São Paulo realizaram desde o início do mês de abril, uma série de paralisações que culminaram em uma greve que durou até o final de maio. Por esse motivo, e também devido às alterações

que o projeto de pesquisa sofreu no mês de abril – após a avaliação do parecerista indicado pela comissão de bolsas do PEPG em Educação: História, Política, Sociedade (PUC-SP) – somente na primeira semana de junho foi efetuado um novo contato com as direções das escolas a fim de agendar uma data para a realização da pesquisa.

No calendário oficial da Secretaria Municipal de Educação, as aulas deveriam ocorrer até a primeira semana de julho. No entanto, sabendo da existência de um calendário “oficioso”, de caráter informal, optou-se por confirmar junto às diretoras qual seria a data limite para a realização da pesquisa, e ambas afirmaram que as aulas ocorreriam normalmente até o último dia útil de junho, pois a primeira semana do mês de julho seria dedicada a outras atividades, como conselho de classe, fechamento de notas, preenchimento de documentos etc. e, portanto, não seria possível garantir a presença de todos os alunos na escola. Diante da informação, foi combinado com as diretoras que a pesquisa seria realizada entre os dias 17 e 28 de junho, e que um dia antes a escola seria comunicada.

Escola A

Na Escola A, o procedimento ocorreu tal como combinado. No dia 19 de junho foi realizado um contato, agendando a visita à escola para o dia seguinte. No dia 20 de junho visitei a escola no período da tarde, horário em que estudam as turmas do ciclo II do Ensino Fundamental. Ao chegar à escola, fui recebida pela diretora e apresentada à coordenadora pedagógica, que me acompanhou durante todo o período em que estive no local. Nas duas turmas de 9º ano, a coordenadora me apresentou como pesquisadora para professor presente na sala de aula e aos alunos, e foi solicitado a todos que prestassem atenção a minha fala, pois teria um convite a fazer aos alunos. Informei os alunos sobre os objetivos da pesquisa, os procedimentos, o número de participantes e os critérios para a participação. De acordo com os critérios, seriam selecionados alunos que estivessem cursando o 9o ano, que estudassem na escola desde o início do Ensino Fundamental e que apresentassem facilidade para se expressar verbalmente. Além desses critérios, o grupo focal, como procedimento adotado na pesquisa, também exigia que a participação dos alunos fosse voluntária.

Durante a apresentação da proposta de pesquisa, em ambas as salas, os alunos permaneceram quietos e atentos a minha fala. Após o convite para a participação voluntária muitos alunos levantaram a mão indicando o interesse em participar. Nesse momento, um professor, que coincidentemente estava presente nas duas turmas no momento da apresentação, relembrou aos alunos sobre o campeonato de xadrez que estava ocorrendo na

escola e os orientou para que se dispusessem a participar apenas aqueles que, além de se encaixarem nos critérios, não estivessem envolvidos no campeonato. No total, 11 alunos se candidataram para participar da pesquisa. Os alunos foram levados para a sala de leitura, disponibilizada pela coordenadora pedagógica, e lá ouviram mais detalhes sobre a pesquisa, além de receberam o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), que foi lido e explicado detalhadamente aos alunos para que tivessem condições de explicar também para os seus responsáveis, e foram orientados a trazer o TCLE no dia seguinte, data em que seria realizada a pesquisa. Embora a intenção fosse realizar um grupo focal com apenas seis alunos (três meninas e três meninos), optou-se por entregar o TCLE para todos aqueles que se mostraram interessados em participar, pois se temia que nem todos os alunos comparecessem no dia ou apresentassem o TCLE assinado. Os interessados foram informados que o grupo focal comportaria apenas seis alunos e que, se todos comparecessem no dia, haveria sorteio. Na data marcada, não houve a necessidade de sorteio, pois somente seis alunos, três meninas e três meninos, trouxeram o TCLE assinado. A sala de leitura foi disponibilizada pela direção e organizada de maneira que os alunos pudessem sentar em semicírculo. Antes do início da realização do grupo focal, os participantes preencheram o questionário contendo perguntas relacionadas ao tema de pesquisa e ao perfil dos alunos, conforme o anexo 2, e foi solicitado a todos que desligassem seus celulares a fim de garantir uma maior atenção dos participantes durante as discussões. O grupo focal foi realizado com tranquilidade e sem intercorrências.

Escola B

Na Escola B foram enfrentados alguns obstáculos que dificultaram a coleta de dados. O primeiro deles foi o fato de não se conseguir entrar em contato com a direção para confirmar a data da realização do grupo focal. Durante dois dias foram realizadas várias ligações para a escola, sem que ninguém atendesse, aparentando tratar-se de um problema técnico na linha telefônica. Diante do fato, optou-se por comparecer à escola sem aviso prévio, no dia 24 de junho. A visita foi realizada no período da manhã, pois três das quatro turmas do 9º ano do Ensino Fundamental estavam distribuídas nesse período. A direção ainda não havia chegado à escola e, por isso, foi solicitado autorização junto à coordenação pedagógica, que se mostrou favorável, mas informou que não teria condições de me acompanhar até as salas devido à necessidade da sua participação no conselho de classe que estava ocorrendo na escola naquele momento.

A visita às três turmas do 9º ano foi acompanhada por um inspetor de alunos que, de início, encontrou dificuldades para colocar os alunos de uma das turmas que estavam no pátio dentro da sala, para que ouvissem o convite de participação na pesquisa. Diante da resistência dos alunos, o inspetor sugeriu que o convite fosse realizado primeiramente a outra turma, que nos recebeu com indiferença. O inspetor, portando uma chave mestra, abria a porta das salas por fora e, independente da presença dos professores na sala e sem pedir licença, gritava: “A professora quer falar com vocês”. A conversa com os alunos, então, era iniciada com a retratação da fala do inspetor, pois se considerou importante esclarecer que não se tratava da fala de uma professora, mas, sim, da apresentação de uma proposta de pesquisa por uma pesquisadora. Essa situação, assim como a indiferença dos alunos diante da minha presença, se repetiu nas três turmas.

De imediato, encontrei resistência por parte dos alunos, muitos deles permaneceram fazendo o que faziam antes da minha chegada: jogando baralho, estando em pé na sala, conversando em grupos, estando de costas para a frente da sala ou copiando o que estava na lousa. Os professores presentes nas salas se mantiveram indiferentes à minha presença, alguns aproveitaram para sair da sala enquanto eu conversava com os alunos e outros continuaram as suas atividades, como preencher o diário ou passar texto na lousa. A conversa entre os alunos era grande e o barulho impedia que todos ouvissem. Foi necessário falar muito alto, quase gritar, para que todos percebessem a minha presença na sala. Mesmo assim, grande parte se mostrou indiferente.

Durante a explicação dos objetivos da pesquisa, muitos alunos faziam brincadeiras, piadinhas e, no momento em que foi solicitado àqueles que estavam interessados em participar da pesquisa que levantassem a mão, muitos alunos zombavam dos colegas por meio de vaias ou forçavam outros alunos a participarem. Também foi comum em todas as salas os alunos oferecerem informações falsas sobre o tempo em que estudavam na escola. Entre todas as turmas, apenas 13 alunos se dispuseram a participar.

Após o convite, foi solicitado ao inspetor que disponibilizasse uma sala vazia para que os alunos recebessem mais detalhes sobre a pesquisa, para que o TCLE pudesse ser lido e esclarecido e para que os alunos fossem orientados quanto ao preenchimento do documento. Durante a apresentação dos métodos e objetivos da pesquisa, tive novamente dificuldade para ser ouvida. Os alunos se juntaram em grupos e muitos ignoravam a minha presença na sala. Foi necessário algum tempo para que todos se dispusessem a ouvir. Alguns alunos questionaram o que eles ganhariam em troca da participação na pesquisa. Foi enfatizada a

relevância de pesquisas que analisam a relação dos alunos com a escola e a importância de se coletar dados a partir da fala dos alunos.

Após a leitura do TCLE, três alunos levantaram e saíram da sala sem dar satisfação. Além disso, fui surpreendida por uma aluna que disse não querer participar da pesquisa, pois, segundo ela, tratava-se de “coisa de religião”. Foi esclarecido à aluna que se tratava de um mal entendido, pois a pesquisa não envolvia religião. Diante da desconfiança da aluna, optei por perguntar o que a teria levado a chegar a essa conclusão. A aluna então comentou que estava escrito no TCLE que a pesquisa era relacionada à religião, e leu: “Pontifícia Universidade Católica de São Paulo”. Foi esclarecido, portanto, que esse era apenas o nome da universidade à qual a pesquisa está vinculada e que de forma alguma envolveria religião. A aluna não se mostrou convencida, insinuou que se tratava de uma tentativa de converter os alunos ao catolicismo e disse que sua mãe não autorizaria a sua participação, pois é evangélica.

Outra aluna questionou se os alunos participantes da pesquisa seriam dispensados da aula durante todo o período. Foi informado que não, que haveria aula normalmente e que os alunos deixariam de assistir as aulas somente durante o tempo em que participassem do grupo focal. A aluna se mostrou decepcionada com a informação e disse que talvez não participaria por esse motivo. Os 10 alunos que permaneceram na sala, incluindo as duas alunas citadas, levaram o TCLE para ser assinado pelos responsáveis.

Os alunos foram informados que o grupo focal começaria às oito horas, mas que eles deveriam entrar na escola no horário normal de aula, e que só participariam do grupo aqueles que trouxessem o TCLE preenchido e assinado. Após esse primeiro contato com os discentes, a diretora (que já havia chegado) e a coordenação foram informadas sobre quais seriam os alunos que participariam do grupo focal no dia seguinte e, mais uma vez, foi questionado se de fato haveria aula normalmente até o final da semana e ambas responderam positivamente.

No dia seguinte, data marcada para a realização da pesquisa, ao chegar à escola, fui informada por uma inspetora que os alunos dos 8º e dos 9º anos haviam sido dispensados, pois faltaria energia elétrica na escola entre nove e quinze horas. Essa informação, no entanto, foi negada por outra inspetora que, após ser informada sobre o agendamento do grupo focal para aquela data e sobre a garantia da presença de alunos pela direção e a coordenação, afirmou que os alunos não haviam sido dispensados, mas que, ao serem informados sobre a possibilidade da falta de energia, resolveram ir embora por conta própria.

Quando questionadas sobre a possibilidade de não haver alunos no dia seguinte, ambas afirmaram que haveria aula, no entanto, uma delas se disponibilizou a ajudar a contatar os

alunos para confirmar a realização do grupo focal para o próximo dia, a fim de garantir a presença destes. A assistente de direção autorizou a realização de ligações telefônicas para todos os alunos que haviam se candidatado a participar da pesquisa, no entanto, orientou para que não fosse comentado sobre a dispensa das aulas, pois, segundo ela, isso não era verdade. Dentre os 10 alunos, foi possível contatar apenas dois, pois os demais ou não haviam deixado nenhum número para contato no prontuário, ou não atendiam a ligação. Os dois alunos contatados afirmaram terem desistido de participar da pesquisa.

Diante do risco de haver mais desistências entre os alunos que se dispuseram a participar, cogitou-se a possibilidade de estender o convite também aos alunos da única turma de 9º ano do período da tarde. Essa possibilidade estava fora de cogitação até o momento devido à dificuldade de reunir alunos de períodos distintos. Informei a inspetora sobre minhas intenções e a mesma comentou que haveria aula no período da tarde, caso não faltasse energia elétrica. Retornei ao local por volta das quatorze horas, e fui informada por um funcionário que não havia alunos do 9º ano na escola. A energia elétrica estava funcionando normalmente. Optei por retornar à escola no dia seguinte, no horário de entrada, e observei a presença de muitos alunos do 9º ano. No entanto, por volta das 7h00, quando o portão de entrada foi aberto, um inspetor começou a gritar incisivamente que os alunos de 8º e 9º anos estavam dispensados. Diante do tumulto, foi possível identificar e reunir apenas seis alunos que anteriormente se dispuseram a participar da pesquisa. No entanto, somente três estavam com o TCLE assinado pelo responsável. Os demais afirmaram que tinham esquecido da pesquisa ou que não queriam mais participar. Com a ajuda dos inspetores, que, ao me verem no local, tentavam contatar individualmente alguns alunos, foi possível reunir mais cinco alunos que haviam faltado no dia do convite para a participação da pesquisa.

Após uma nova explicação sobre os objetivos e métodos da pesquisa, além da apresentação do TCLE, três desses alunos aceitaram participar da pesquisa e se dispuseram a levar imediatamente o documento para o responsável assinar. Foi informado aos alunos que a pesquisa também poderia ser realizada no retorno das aulas, caso fosse necessário. No entanto, todos se mostraram disponíveis para participar naquele momento. Tempos depois, os três alunos retornaram com o TCLE assinado. O grupo ficou completo, contendo três meninas e três meninos.

Para a realização da pesquisa, foi solicitado à direção que disponibilizasse uma sala vazia. Foi oferecida uma sala destinada ao Laboratório de Ciências, mas que não era utilizada para esse fim. A sala foi organizada de maneira que os alunos pudessem sentar em semicírculo. Antes do início do grupo focal, os participantes preencheram o questionário

contendo perguntas relacionadas ao tema de pesquisa e ao perfil dos adolescentes e foi solicitado a todos que desligassem seus celulares, a fim de garantir maior atenção dos participantes nas discussões. A realização do grupo focal, no entanto, foi dificultada pelo barulho externo e pelo comportamento inapropriado de parte dos participantes da pesquisa. As janelas da sala davam para o pátio e para a quadra de esportes, e o barulho dificultou a realização do grupo focal na medida em que, por vezes, era difícil ouvir a voz dos alunos, sendo necessário solicitar que repetissem as suas falas.

Durante a realização do grupo focal percebeu-se a falta de compromisso das alunas, que insistiam em conversar entre elas, muitas vezes ficando alheias às questões que estavam sendo discutidas pelos outros alunos, e em permanecer com o celular ligado. Diante das solicitações para que as alunas desligassem os celulares, simulavam o desligamento do aparelho, porém, alguns minutos depois tornavam a mexer no celular, compartilhando entre elas suas postagens. Houve um momento em que uma delas chegou a atender uma ligação durante a realização do grupo focal.

Além disso, houve intercorrências no processo de filmagem. A filmadora apresentou problemas durante a primeira parte em que foram realizadas as discussões sobre a relação dos adolescentes com a autoridade na família. As intercorrências na filmagem não comprometeram, no entanto, a coleta de dados, visto que foi utilizado o gravador de voz concomitantemente com a filmagem. Os dados coletados foram transcritos e serão apresentados a seguir.