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Os colonos suecos de Guaran

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CAPÍTULO 1 – ESPECIFICIDADES DA IGREJA BATISTA SUECA EM GUARANI RIO GRANDE DO SUL

1.7. Panorama dos Batistas na Suécia e no Brasil no final do século

1.7.1. Os colonos suecos de Guaran

Na concepção de Weber110, a “comunhão étnica” se distingue de uma “comunidade

étnica”, uma vez que esta é apenas a expressão de um “sentimento de comunidade”, mas aquela produz elementos que facilitam as relações comunitárias. Entendemos ser esta frase do missionário Erik Jansson111 um bom exemplo dessa característica: “Eu queria que tudo fosse o

mais sueco possível”.112 Jansson projetava um Natal que era comemorado na colônia pela

primeira vez, semelhante ao que ocorria na Suécia, definem os irmãos Lars-Bertil Ekström e Leif Arthur Ekström.113 Por intermédio dessa comunhão étnica, conseguiu resgatar o sentimento patriótico adormecido nos corações dos colonos em Guarani. Nils Persson114 escreve em carta publicada no jornal sueco Närkesbladet, da cidade de Örebro:

Amigos cristãos, queremos de coração agradecer-lhes por terem se lembrado de nós, suecos no Brasil. O missionário Erik Jansson chegou até nós. No dia 15 de setembro estivemos reunidos mais de quarenta suecos para ouvi-lo expor um estudo bíblico. Somos muito gratos pela luz da Palavra de Deus.

Há pouco mais de um mês da chegada de Jansson à colônia, a breve carta, citada, demonstra o desejo e anseio espiritual dos colonos e, ainda, a gratidão à ÖM pelo envio do missionário. Outro fato interessante no Natal de 1912 foi o hasteamento da bandeira sueca na colônia, conforme é assinalado por Lars-Bertil Ekström e Leif Arthur Ekström115, o que denota

o esforço de preservação étnica. Relatos da época expressam que o sentimento de comunidade e até de valor humano foi restabelecido com sua chegada. Esse foi um sinal claro do resgate étnico promovido por Jansson que, no Natal daquele ano, foi presenteado com uma sela para

109 INTERACT é o atual nome da Örebromissionen - ÖM. Trata-se de uma denominação interdenominacional,

pois, como nos últimos anos muitas igrejas têm sido fechadas, várias denominações resolveram unir-se sob uma mesma sigla para haver mais coesão e fortalecimento nos trabalhos das igrejas naquele país. Ao contrário do início do século XX, quando a Suécia era um centro de envio de missionários, atualmente, tem recebido missionários com o propósito de reevangelizar aquela nação.

110 WEBER, 2012, p. 270. 111 JANSSON, 1941, p. 50.

112 Jansson se referia ao primeiro Natal que passaria em terras brasileiras.

113 EKSTRÖM, Lars-Bertil; EKSTRÖM, Leif Arthur, 2012, p. 38.

114 Närkesbladet, 18 de outubro de 1912, sendo esse jornal o mais importante na cidade de Örebro, Suécia.

Tivemos acesso a esse material no ArkivCentrum Örebro län em 20 de maio de 2012, durante a pesquisa do mestrado, com autorização expedida pela INTERACT. A tradução da carta foi feita por Silas Pereira Valério. 115 EKSTRÖM, Lars-Bertil; EKSTRÖM, Leif Arthur, 2012, p. 38.

cavalgar, pois até então ele usava selas emprestadas. No Natal seguinte ganhou um cavalo. Fica- nos evidenciada a satisfação dos colonos em tê-lo como líder espiritual. Parece-nos que a instalação da IBS em Guarani, portanto, foi providencial, reavendo a noção de comunhão étnica e a preservação do ethos comunitário.

Ao enviar a carta “Um clamor macedônio”, Andersson tinha como objetivo despertar a espiritualidade adormecida entre os suecos. Erik Jansson trouxe a expectativa de resgatar o desejo pelo transcendente, adormecido durante cerca de vinte anos. Fazer isso não foi tarefa fácil, mas encontrou um ponto comum entre os colonos: o desejo de reatar seus laços espirituais que haviam sido abandonados desde que vieram da Suécia. Assim sendo, a preservação da cultura e da etnicidade foi de suma importância para que o missionário pudesse desempenhar seu papel e, com a abertura de uma escola, os filhos dos colonos suecos, alguns deles nascidos no Brasil, aprendiam, além de matérias básicas, o idioma sueco. Tal ação serviu ainda como forma de fazer um proselitismo entre os colonos suecos, o que teve um bom resultado, pois foi bem recebido por eles.

Weber116 afirma que:

A comunidade de culto, como expoente do ‘sentimento tribal, é em regra, portanto, ou um resto de uma comunidade antigamente mais firme e agora decomposta por cisão ou colonização, na maioria das vezes de natureza política, ou então, como no caso do Apolo délfico, o produto de uma ‘comunidade cultural’ surgida em virtude de outras condições, não puramente ‘étnicas’, a qual, por sua vez, faz nascer a crença na comunidade de sangue.

Essa preservação étnica para Weber pode ser mantida por questões que estão para além daquelas de preservação de consanguinidade, mas pode ser fortalecida através destas também. A etnicidade sueca entre os colonos de Guarani representava suas raízes e essas, por sua vez, tinham laços religiosos na Suécia. Ao preservarem seus traços culturais, tinham o desejo de fazer o mesmo quanto à sua religião.

Em regra, para Weber117, a formação de sentimentos de comunhão étnica e de ideias de

consanguinidade provém de diferentes condições de existência econômica ou política às quais um grupo de pessoas tem de se adaptar, deixando-se de fora as diferenças linguísticas e religiosas. Nesse sentido, a teoria weberiana adequa-se diretamente aos colonos suecos de Guarani, pois esses possuíam um forte sentimento patriótico.

As diferenças nos costumes, que desempenham um papel equivalente ao hábito hereditário na formação de sentimentos de comunhão étnica e da ideia de consanguinidade,

116 WEBER, 2012, p. 273. 117 Ibid., p. 272-273.

conforme Weber118 têm como origem, sem levar em conta as diferenças linguísticas e religiosas, as condições diferentes da economia e política a que um grupo deve adaptar-se. Fazendo abstração de fronteiras linguísticas rigorosas e de comunidades políticas ou religiosas bem delimitadas, tendo como base costumes distintos, há transições de costumes e fronteiras

étnicas fixadas e condicionadas por diferenças geográficas drásticas. As delimitações que

rigorosamente regem etnicamente os costumes relevantes que não são condicionados por fatores políticos, econômicos ou religiosos, iniciam-se, em regra, das migrações ou expansões, resultado de uma vizinhança que viveu, permanente ou temporariamente, em lugares geograficamente distantes e, por consequência, adaptou-se a condições heterogêneas. Tal contraste é despertado claramente na vida das pessoas de ambos os lados, surgindo a ideia de

sangue estranho, independentemente da realidade objetiva.

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