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Capítulo III – UMA LEITURA DO RITUAL DA DEDICAÇÃO DO ALTAR

2. Ritual da Dedicação da Igreja e do Altar

2.4 Comentários às orações do Ritual

A tarefa de analisarmos o rito passo a passo é a possibilidade que temos para extrair dele tudo o que ao Altar diz respeito e assim caminharmos para a construção da sua identidade. Esta atitude pode levar-nos a pensar que o rito é um somatório de gestos, palavras, símbolos, contudo a liturgia é mais que a soma das partes. Ela é uma realidade viva, e que só na vivência se consegue perceber toda a densidade e a realidade na qual ela nos introduz realidade impossível de transpor em papel.

2.4.1 Bênção da água e aspersão

Este é o primeiro de um conjunto de ritos que nos introduzem na ação que se vai realizar. Trata-se de um rito ambivalente, por um lado aspersão sobre o povo em sinal de penitência e memória do batismo, e por outro, para purificação do Altar. Tal como a vida cristã precisa de renovação, purificação, também o Altar carece da mesma realidade. A pedra, a matéria,

carece de renovação180. Entrando na oração, esta apresenta a estrutura típica de uma

berakà181, começa com uma admonição na qual somos dispostos para o que se vai realizar, a

dedicação do Altar e torna-se claro que o verdadeiro rito de dedicação é a celebração do sacrifício do Senhor. A monição continua num convite à ação litúrgica provocando um movimento interior de piedade e devoção, escuta da palavra de Deus e de participação na mesa do Senhor, ao mesmo tempo desperta a consciência de que assim reunidos à volta do único Altar, aproximamo-nos de Cristo, pedra viva e n’Ele crescemos como templo santo. Na construção da identidade do Altar recolhemos deste momento a certeza de ser alguém que é único, que é vivo, que faz crescer aqueles que estão à sua volta e que carece de purificação.

Depois de um breve momento de silêncio, momento ativo de participação do que se segue, entramos na anamnese da oração a qual nos recorda que a água que vai ser aspergida sobre nós e sobre o Altar é realidade que nos renova, purifica, que nos faz acolher a vida da graça. É claro o modo como tudo isto se realiza e como imprime em nós esta graça, vejamos o texto da oração: “Em vosso desígnio de misericórdia quiseste que todos os que descessem, com seus pecados, às águas purificadoras do Batismo, para aí morrerem com Cristo, daí surgissem purificados como novos membros do seu Corpo e com Ele, herdeiros dos prémios eternos”182. Segue-se a epiclese, invocação do Espírito, para que o Senhor derramando a sua graça sobre a água, sua criatura, nos permita receber os seus dons. Uma vez mais as realidades materiais manifestam uma identidade do Altar. “Purificados em Cristo nos tornámos um Altar espiritual”183. O Altar é, portanto, assim a vida de todo o fiel que vive em santidade a vida da graça batismal. A água aspergida sobre o Altar evoca a dinâmica da iniciação cristã. A oração termina pedindo a graça para aqueles que ali se hão de reunir para que possam viver na eternidade aquilo que este Altar lhes dá de forma antecipada. Após a aspersão o presidente conclui o rito deixando duas notas significativas. A primeira, que o Altar é dedicado a Deus Pai, o Altar carrega a marca do próprio Deus, por isso deve sempre remeter a Ele. A sua identidade é marcada por este selo. A segunda, a insistência do desejo de que celebrando o sacrifício de louvor o realizemos um dia no Altar celeste. Podemos

180 Cf. IGREJA CATÓLICA – Dedicação da Igreja e do Altar, Cap. IV, nº 35.

181 Uma bênção de louvor. A estrutura de toda a oração responde ao esquema oracional judeu baseado no dinamismo anamenesis-epeclesis.

182 IGREJA CATÓLICA – Dedicação da Igreja e do Altar, Cap. IV, nº 35. 183 IGREJA CATÓLICA – Dedicação da Igreja e do Altar, Cap. IV, nº 35.

acrescentar à identidade do Altar o ser de Deus e o de ter a missão de levar o fiel à experiência da eternidade.

2.4.2 Oração Coleta

Verificamos nesta oração como na anterior um desejo cumprido do Concílio. Este apelava a uma maior interação entre assembleia e ministro presidente. Verificamos que os gestos, sinais, símbolos têm uma maior inter-relação entre crente e ação litúrgica.

A oração centra-nos em três aspetos. O mistério pascal, afirmando-nos a cruz como Altar, e realidade que atrai todas as coisas. Um segundo aspeto faz-nos olhar o Altar como mesa santa onde o Pai providente alimenta os seus filhos que em redor da mesa se aproximam e o terceiro aspeto tem que ver com os frutos deste alimento e desta reunião que é tornar cada vez mais o povo num povo consagrado. Os elementos que acolhemos desta oração para a construção da identidade do Altar são: lugar onde Cristo é exaltado como na cruz. Identificando assim Altar e cruz numa realidade. Tal como a escritura que nos diz “quando por eu for levantado atrairei todos a mim”184 assim, o Altar é chamado a atrair todas as coisas. A imagem de ser mesa santa transporta-nos para a identidade de ser lugar que sacia, alimenta, é uma verdadeira mesa na qual encontramos o alimento que nos revigora e assim somos levados à experiência de sermos um povo consagrado185.

2.4.3 Oração litânica

A oração conclusiva da litânia dá uma identidade do lugar que o Altar deve ser. Recuperamos as expressões da oração. Lugar da celebração dos mistérios máximos da

salvação, lugar onde o povo oferece os seus dons, apresenta votos, preces e sentimentos de religião e de piedade186.

184 Jo 12, 32

185 Cf. IGREJA CATÓLICA – Dedicação da Igreja e do Altar, Cap. IV, nº 39. 186 Cf. IGREJA CATÓLICA – Dedicação da Igreja e do Altar, Cap. IV, nº 46.

2.4.4 Oração da dedicação

Neste trabalho de análise somos conduzidos pelo ritmo, oração e estrutura desta grande oração da dedicação. Só na ação litúrgica podemos beber todo o seu significado. Como anteriormente se disse o único e importante rito de dedicação é a celebração da eucaristia, contudo e pela grande tradição deverá fazer-se sempre este conjunto de ritos pois eles são um acontecimento catequético que a todos ajuda a entender e viver a aliança de Deus com os homens. Não analisaremos a oração da dedicação da igreja. Essa centra-se sobretudo nas imagens da própria Igreja a que o edifício deve corresponder. Assim, tendo nós vindo a definir a identidade do Altar como pessoa, queremos no entanto defender a tese de que Ele evoca uma pessoa. Às vezes a linguagem pode confundir mas nesta homilia de Gregório de Nisa fica claro que não adoramos um objeto mas evocamos o mistério daquele que adoramos – Cristo, morto e ressuscitado “Este altar ao redor do qual nos encontramos, pela sua

natureza é uma pedra comum, que em nada se diferencia das demais pedras com que construímos as nossas paredes ou adornamos os nossos pavimentos, mas depois de ter sido dedicada a Deus e ter recebido a consagração, é a mesa santa, o altar imaculado, que não pode ser tocado por qualquer um, se não somente pelos sacerdotes com um santo temor”187.

Ao analisarmos a oração encontramos uma estrutura tripartida numa lógica da história da salvação. Os conteúdos das três secções são os seguintes:

a) A primeira estrofe (I) funciona como uma abertura enunciando o grande tema: Cristo é o cumprimento das múltiplas figuras antigas do mistério do Altar. As estrofes seguintes (II-III-IV) narram as respetivas anamenésis daqueles altares cuja construção assinala uma etapa na história da salvação: são os altares construídos por Noé, Abraão e Moisés. Cada um a seu modo é figura do sacrifício salvífico da morte e ressurreição de Cristo. A (V) estrofe funciona como uma conclusão afirmando que todos estes sinais prefigurativos têm o seu cumprimento na única e perfeita oblação de Cristo na cruz.

b) A segunda secção refere-se à (VI) estrofe. Esta apresenta-se como o coração de toda a oração. Nela vemos a súplica ao Senhor é realmente uma epiclese para que desça sobre o Altar a divina santificação com uma dupla função; ser ara do

187 NISA, Gregório de – In diem luminum. PG 46, 581C. Cit. por AROCENA, Félix Maria - El altar cristiano.

sacrifício e mesa do banquete sagrado. Percebemos a tensão entre as duas realidades mas que a oração mantém, visto não ser possível eleger uma dimensão antes vivem necessariamente uma relação dinâmica.

c) A terceira secção engloba as últimas cinco estrofes. Cada uma apresenta uma das funções do Altar: sinal de Cristo (VII), mesa do banquete (VIII), lugar da comunhão com Deus (IX), fonte da unidade da Igreja (X) por fim encontramos no Altar o centro do louvor e ação de graças a Deus durante o tempo da espera da escatologia (XI).

O texto apresentado é-nos dado pelo ritual da dedicação e as notas nele contido são recolhidas da obra de Félix Maria Arocena, El altar Cristiano188.

(I) Nós vos glorificamos, Senhor, nós vos bendizemos,

porque, nos inefáveis desígnios da vossa piedade,189 quisestes que passado o tempo das figuras,

o mistério do altar atingisse a perfeição em Cristo.

A I estrofe funciona como introdução e como afirmação de Cristo como aquele que dá pleno significado ao mistério do Altar. Ele é o Altar. A nota predominante nesta estrofe é o louvor e a ação de graças dirigida ao Pai por ter realizado em Cristo o seu desígnio de amor. O ablativo absoluto “superadas as diversas figuras” expressa com força como tudo o que de riqueza e imperfeição tiveram os diversos altares terrenos alcançam a sua plenitude em Cristo190. Por isso toda a teologia prefigurativa tem em Cristo a sua perfeição.

(II) Foi assim que Noé, segundo pai do género humano, Uma vez acalmadas as águas do dilúvio,

Vos ergueu um altar e ofereceu um sacrifício191, Que Vós, ó Pai, aceitastes como suave perfume192, Renovando assim

A vossa aliança de amor com os homens.

188 AROCENA, Félix Maria – El altar cristiano. Biblioteca Litúrgica. Barcelona: Centre de Pastoral Litúrgica. 29 (2006).

189 1 Tm 3, 16.

190 Cf. AROCENA, Félix Maria – El altar cristiano. Biblioteca Litúrgica, p.93-94. 191 Gn 8, 20-21.

Entramos na segunda parte da oração. Nela encontramos uma grande anamenese. Tomando três figuras transversais à história da salvação, neles vemos obra que Cristo realiza ao Pai. Neles vemos um plasmar da identidade do Altar de Cristo. Com Noé, na II estrofe, reforça a nova geração, desfeita esta morada, Cristo faz surgir com a sua ressurreição uma nova e eterna aliança. Com Noé, vemos esta promessa da aliança de amor com os homens que Deus Pai realiza.

(III) Abraão, pai da nossa fé,

Seguindo, de todo o coração, a vossa palavra, Ergueu um altar193,

Para sobre ele imolar Isaac,

Preferindo assim agradar-Vos a Vós A poupar o filho do seu amor194.

Abraão aparece-nos na III estrofe. Cristo é o Filho que Deus não poupou para nossa redenção e salvação. Com Abraão tocamos a oblação antecipada, a realidade que se torna presente em cada eucaristia, a oferta que Cristo havia de fazer de si consumando na cruz esse mistério. Abraão é experimentado no amor que tem a Deus! A construção do Altar por parte de Abraão, manifesta a obediência à voz do alto e disposto a oferecer o sacrifício do seu filho Isaac para não quebrar a sua fidelidade a Yahvé195. As palavras que o anjo lhe dirige “não me teres recusado o teu filho, o teu único filho”196 prefiguram a revelação Paulina do Pai em ordem à nossa salvação: “Deus não perdoou ao seu próprio Filho, mas entregou-O à morte por todos nós”197. Este amor que Cristo realiza é o que podemos receber da relação com o Altar. A experiência do sacrifício é transversal em todas as culturas, com Cristo ganha um novo sentido, o da redenção. O Altar transporta e conduz-nos à experiência de um novo tipo de sacrifício. Unidos à paixão do Senhor acolhemos o mistério da vida nova. O Altar presenteia-nos com uma realidade que atingindo-nos nos ultrapassa. Só em Cristo se torna acessível198.

193 Gn 22, 9.

194 Gn 22, 16; Rm 8, 32.

195 Cf. AROCENA, Félix Maria – El altar cristiano. Biblioteca Litúrgica, p.95. 196 Gn 22,16.

197 Rm 8, 32.

(IV) Também Moisés, o mediador da Lei antiga, Edificou um altar,

Que, aspergido com o sangue do cordeiro199, Prefigurava simbolicamente o altar da cruz.

Por último temos a figura de Moisés. A estrofe coloca diante de nós um rito de grande significado. O sangue do cordeiro aspergido. A imagem é clara, prefigura o sangue que Cristo derrama na Cruz. Na antiguidade o sangue é a realidade que vincula as partes num contrato. Assim o faz Moisés com a lei que recebe, assim o realiza Cristo revelando-se como a nova lei, aquele que dá pleno sentido e cumprimento. Cristo derrama o seu sangue retificando a nova e eterna aliança de Deus com os Homens200. De todo o conjunto de atos contidos no relato do Êxodo, a oração centra-se em dois: a construção do Altar e a celebração do sacrifício com a aspersão do sangue. Neste sacrifício aparece prefigurada a cruz sobre a qual foi aspergido o sangue do Senhor e consumou a oblação sacrificial. A oração diz-nos: “ergueu um altar e rodeo com sangue do cordeiro, como sinal profético que anunciava a ara da cruz”201.

(V) Todas estas figuras,

Cristo as realizou no seu mistério pascal202: Sacerdote e vítima, ao subir à árvore da cruz, Ele se entregou a Vós, ó Pai, como oblação pura, Que destruía os pecados de todo o mudo

E selava convosco uma aliança nova e eterna.

Esta V estrofe faz uma síntese e conclusão do sentido de todas estas figuras. Cristo, tudo realizou na obra pascal assumindo em Si o oferente e a oferta (o Sacerdote e a vítima) na oblação do seu sangue resgata a humanidade e sela uma nova e eterna aliança. Seria muito expressivo trazer um arco que partindo do verbo “dar cumprimento” da primeira estrofe, acabasse no verbo “passar a realidade plena” da quinta estrofe. Efetivamente, depois da longa anamnese precedente onde foram evocadas as prefigurações antigas, com esta estrofe chega-se à etapa do cumprimento expresso num texto em que se resumem os ecos da SC203.

199 Ex 24, 4.

200 Cf. IGREJA CATÓLICA – Dedicação da Igreja e do Altar, Cap. IV, nº 48. 201 Cf. AROCENA, Félix Maria – El altar cristiano. Biblioteca Litúrgica, p.96.

202 Cf. IGREJA CATÓLICA – Concílio Ecuménico Vaticano II – Constituição Sacrosanctum Concilium, nº 5. 203 “Esta obra da redenção dos homens e da glorificação perfeita de Deus, prefigurada pelas suas grandes obras no povo da Antiga Aliança, realizou-a Cristo Senhor, principalmente pelo Mistério Pascal da sua bem- aventurada Paixão, Ressurreição dos mortos e gloriosa Ascensão”. IGREJA CATÓLICA – Concílio

O alcance teológico desta estrofe não é modesto: Jesus é por identidade sacerdote e vítima do seu próprio sacrifício. No sacerdócio veterotestamentário o sacerdote e a vítima eram realidades separadas. O culto e o sacerdócio antigos eram implorativos da salvação; eram prefiguração contudo não eram realização. A graça da nova aliança é que deixam de ser duas realidades. No sacrifício de Cristo, sacerdote oferente e vítima oferecida identificam-se. Cristo oferece-se a Si mesmo e deste modo o sacrifício resulta eficazmente. A identidade entre a condição sacerdotal e vítima do Senhor no Altar da cruz, que é efeito da transcendência da sua pessoa divina e, por outro lado, a manifesta, é o modo preciso como Cristo leva ao cumprimento as prefigurações do Antigo Testamento superando a sua limitação204.

(VI) Derramai, agora, Senhor, humildemente Vos pedimos, Sobre este altar, erguido na casa da Igreja,

A vossa celeste santificação, Para que ele seja, para sempre, Dedicado ao sacrifício de Cristo E se torne a mesa do Senhor,

Onde o vosso povo se alimente do divino banquete.

Encontramo-nos no centro desta oração. A VI estrofe é também o momento da epiclese, da invocação do Espírito. A Igreja, por meio daquele que preside, pede, suplica a Deus para que santifique o Altar. Há um reforçar do Altar como mediação. Erguido na casa da Igreja, o Altar não está num qualquer lugar, mas na morada onde a Igreja se concentra, reúne para que à volta do Altar apareça como povo congregado que vai ao encontro do seu Deus. Pela súplica reforça-se uma vez mais que nele se torne presente o Mistério Pascal, sacrifício e banquete, e que este aconteça para sempre205. A súplica fundamental que aqui está contida encontrasse no sintagma “A vossa celeste santificação”. Pedir a santificação do Altar é o mesmo que pedir ao Pai para que derrame o seu Espírito, autor de toda a santidade. O santo Pneuma comunica ao Altar a santidade de Deus, convertendo-o em fonte de santificação para a Igreja206.

Para compreender o significado do Altar como ara convém retomar os sacrifícios que tinham lugar sobre os altares da antiga aliança. Neles se oferecia fundamentalmente dois tipos de

204 Cf. AROCENA, Félix Maria – El altar cristiano. Biblioteca Litúrgica, p. 98. 205 Cf. IGREJA CATÓLICA – Dedicação da Igreja e do Altar, Cap. IV, nº 48. 206 Cf. AROCENA, Félix Maria – El altar cristiano. Biblioteca Litúrgica, p. 99.

sacrifícios: o chamado “sacrifício de comunhão” e o chamado “sacrifício de holocausto”. O sacrifício de Cristo assume ambos os tipos de sacrifício. Por um lado, é um sacrifício de comunhão porque a Igreja ao alimentar-se do corpo e sangue do Senhor entra em comunhão com a Trindade e renova a aliança nova e eterna com Deus. Por outro lado, o sacrifício de Cristo é também um holocausto. A consumação do cordeiro imaculado, simbolizada na expressão “naquele momento brotou sangue e água”207, expia superabundantemente todos os pecados do mundo. No que se refere ao Altar como mesa, não o podemos ver como uma mera mesa porque sendo Altar é o lugar do acontecimento sacrificial do memorial eucarístico. O Altar tem a forma de mesa para nos recordar que o Altar não é uma simples ara mas a mesa do Senhor. Alguns autores dizem que não podemos referirmo-nos ao Altar como Altar ou mesa mas que se trata de dois nomes que juntos explicitam a realidade do mesmo objeto. A mesa é Altar por causa da sua finalidade eucarística208. Outros autores tendem a pensar que a tensão ara-mesa resolve-se como duas dimensões que sempre coexistiram e que segundo a época e o contexto cultural foram tendo um peso diferente caindo umas vezes numa tendência do Altar como ara e outras vezes o Altar entendido como mesa do Senhor209. A compreensão desta estrofe remete a uma contemplação do Altar como lugar divinizante para a assembleia em razão da sua consagração pela descida santificante do Espírito.

(VII) Seja este altar (esta pedra), para nós, sinal de Cristo, De cujo lado aberto correu sangue e água210,

Nos quais encontram fundamento Os sacramentos da Igreja.211

Entramos na terceira e última parte desta grande oração. Na VII estrofe somos convidados a ver o Altar como o peito rasgado de Cristo. Desse lado nascem os sacramentos, neste vemos o próprio sinal de Cristo que se dá em alimento. A estrofe apresenta esta correlação: de modo semelhante como a pessoa de Cristo, proto-sacramento de Deus na sua humanidade, fluem os sacramentos significados no sangue e água que brotaram do seu lado aberto, assim também o Altar, sinal de Cristo pela plenitude da bênção divina, fluem os sacramentos que

207 Jo 19, 34.

208 Cf. AROCENA, Félix Maria – El altar cristiano. Biblioteca Litúrgica, p. 99-100.

209 Cf. GERHARDS, Albert – Teologia dell’altare. In F. Bebuyst [et al.] – L’altare: Misterio di presenza,

opera dell’arte. Magnano:Qiqajon, 2005, p. 219-220.

210 Cf. 1Pe 2, 4-8; 1Cor 10, 1.4. 211 Cf. Jo 19, 34.

atualmente vivificam a Igreja. Com efeito, todos os sacramentos – não somente a Eucaristia – e também por analogia, os sacramentais, junto com o ano litúrgico e a Liturgia das Horas guardam estreita relação com o Altar212.

(VIII) Seja a mesa da festa

Aonde acorrem, cheios de alegria, Os convivas de Cristo,

Para que, colocando em Vós O peso e os cuidados da vida, Tomem novo vigor de alma Para percorrerem novos caminhos. O Altar, lugar de íntima comunhão.

O Altar, mesa da festa, somos desafiados a colocarmo-nos em torno do Altar com o que somos e o que temos, acolhendo o vigor de alma, que só se experimenta no pão repartido e na alegria que é partilhada pelos convivas, que comungando da vida uns dos outros são levados a percorrer novos caminhos. No adjetivo festiva, aplicado ao Altar encontramos uma evocação ao tom de festa com que a antiguidade vivia os ritos da dedicação da Igreja e do Altar. Ressoa também o texto de Elias que percorre o seu caminho de quarenta dias e quarenta noites até ao monte de Deus, sustentando pela força do alimento apresentado pelo anjo213. Neste sentido a estrofe descreve a vida cristã como uma oração que percorre sempre