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Como os eleitores conservadores mudaram sua tendência de voto

Capítulo 2: Efeitos de campanha em eleições presidenciais no Brasil 1988 1998

3. A era Lula: Alternância na sucessão e a reeleição com segundo turno

4.5 A mensagem clarificativa no primeiro turno

4.5.2 Como os eleitores conservadores mudaram sua tendência de voto

A fim de demonstrar que a estratégia insurgente adotada pelos adversários foi a principal razão para o insucesso de Dilma no primeiro turno, é preciso investigar as atitudes dos eleitores quando seu discurso de sua campanha mudou. Viu-se que a campanha da candidata do governo modificou o padrão de a sua mensagem depois do 35o. dia de HGPE.

Agora é preciso avaliar se essa mudança afetou ou não as intenções de voto como esperado. O gráfico 5 mostra a evolução das intenções de voto para os três principais candidatos, nas série combinada de todas as pesquisas publicadas no período239. Os dados indicam que,

enquanto Dilma perde força no final do primeiro turno, seus concorrentes, especialmente Marina Silva, recebem um expressivo aumento de suporte nas pesquisas.

Agrupando os dados de diferentes fontes, como GRÁFICO 4.3, ou plotando os dados do tracking (GRÁFICO 4.6), encontram-se as mesmas tendências. Na seção anterior sugeriu- se que há uma forte correlação entre a quantidade de tempo que Dilma dedicou à economia e seus índices nas pesquisas.

Diante deste cenário, uma pergunta permanece: Por que a mensagem da campanha Dilma mudou, se os dados mostram que a estratégia estava funcionando? Sugere-se aqui que Dilma teve que mudar a sua mensagem, a fim de enfrentar os ataques insurgentes de seus oponentes.

Considerando os valores dos segmentos religiosos do eleitorado sobre a importância da vida, e a necessidade de garantir que os seres humanos não intervenham em “provisões de Deus”, o ataque da oposição enfraqueceu Dilma em um tema sobre o qual ela não podia lidar adequadamente. Se este argumento for verdadeiro, deve-se esperar que entre os eleitores que deixaram Dilma no final da campanha estavam os conservadores, auto- identificados como cristãos. Para avaliar tal suposição, analisa-se as taxa de intenção de voto em Dilma no tracking segundo a religião dos entrevistados. Os resultados são impactantes

(veja GRÁFICO 7): primeiro, observa-se que o apoio dos cristãos a Dilma foi diminuindo significativamente ao longo do período do HGPE. No entanto, os gráficos também mostram que o momento de maior inflexão ocorreu no final do primeiro turno, quando a mensagem insurgente atingiu sua intensidade máxima. Entre os católicos, a queda na intenção de voto em Dilma é de cerca de 6 pontos percentuais, e para os protestantes, a queda é de cerca de 4 pontos percentuais. Observe-se que não há mudança na intenção de voto entre os espíritas e os sem religião.

Gráfico 7: Intenção de Voto em Dilma x Religião, primeiro turno

Fonte: Tracking Vox Populi/Rede Bandeirantes de TV

A evidência apresentada até agora é sugestiva do esperado, mas o modelo ainda está incompleto. Para avaliar adequadamente a segunda hipótese proposta neste capítulo, executa- se um modelo linear generalizado misto, que leva em conta a tendência longitudinal da intenção de voto. Embora os dados não apresentem correlação temporal entre indivíduos que responderam as pesquisas - já que se trata de uma amostra diferente a cada dia - eles apresentam correlação temporal entre grupos de indivíduos representados nas amostras. Isso significa que é possível controlar o quão semelhante é o padrão de votação dos eleitores religiosos por sexo, idade, dispersão geográfica, e escolaridade. Muitos outros resultados de pesquisa indicam que tais características são as mais preditivas das atitudes em relação ao voto.

Tabela 23 - Modelo Linear Misto Generalizado para Intenção de Voto em Dilma

Fonte: Elaboração própria

Os resultados sugerem que o eleitorado de Dilma era composto principalmente por três grupos: sexo masculino, pobres e religiosos. Eles também indicam que o seu apoio diminuiu ao longo do tempo, especificamente entre os eleitores religiosos. Mas, mais importante, os

resultados da regressão apontam no sentido esperado. De fato, o insucesso de Dilma em ganhar no primeiro turno da eleição presidencial pode ser atribuído a uma pequena migração de eleitores cristãos para os seus adversários. Para avaliar isso corretamente, apresenta-se no gráfico 8 o efeito marginal de ser ou católico ou protestante sobre a probabilidade de votar em Dilma no primeiro turno da eleição, em função do tempo. O sentido e alcance dos efeitos marginais apoiam o argumento que aqui proposto. Prevê-se que católicos e protestantes ‘abandonarão’ Dilma, no final da primeira rodada do ciclo eleitoral.

Gráfico 8: Efeito Marginal da religião sobre intenção de voto Dilma, no primeiro turno

Fonte: Elaboração própria

Como apontado anteriormente, Dilma não conseguiu vencer as eleições no primeiro turno por uma pequena margem de votos, cerca de 3,1%. Isto é consistente com o que o modelo prevê sobre o comportamento dos eleitores religiosos. Enquanto no início da eleição católicos e protestantes a apoiaram, no final, eles foram o principal grupo responsável pela segunda rodada. Eles deixaram Dilma, como argumenta-se, por causa das mensagens da campanha insurgente. Isso pode ter impactado a muitos eleitores, porém entre os não- religiosos o seu apoio não baixou. O mesmo aconteceu entre as confissões religiosas que não têm restrições quanto a esse issue. Uma evidência adicional encontra-se na base de dados do segundo turno. Cerca de 9% dos eleitores entrevistados três dias após a votação do primeiro declararam ter pensado em votar na candidata-sucessora e depois desistido, seja pelo desempenho percebido dos candidatos, seja por diferentes motivos, como perda do título de eleitor, esquecimento do número da candidata ou razões pessoais. Mas o mais interessante é que, recodificando as respostas individuais, encontram-se muitas que se enquadram nos conteúdos da campanha insurgente, em particular as motivações religiosas e a questão do aborto. Esses motivos representam quase 40% da mudança observada, e sua proporção equivale à margem necessária para uma eventual vitória no primeiro turno, como mostra a TAB. 24, abaixo:

Tabela 24 - Mudança de voto e campanha insurgente no primeiro turno Motivos para mudar o voto

Freq. Geral Percentual Percentual mudaram

Imagem candidaturas desafiantes 49 1,6 18

Campanha Insurgente 106 3,5 38,9

Imagem candidatura sucessora 88 2,9 32,3

Outros Motivos 29 1 10,7

Total 272 9,1 100

Não mudaram o voto 2729 90,9

Total 3000 100

Fonte: Dados da pesquisa extraídos do arquivo Vox Populi, banco de dados segundo turno.

Satisfeita com o desempenho econômico do país, a maioria eleitorado no primeiro turno apoiou Dilma Rousseff. Assim que seus principais adversários enfatizaram uma mensagem insurgente rentável, a candidata-sucessora foi compelida a modificar sua ênfase no conteúdo campanha. Em consequência, houve uma ligeira, decisiva mudança no seu apoio entre os eleitores mais conservadores, que passaram a preferir Serra ou Marina, o que levou à necessidade de segundo turno. Em suma, enquanto Dilma Rousseff teve condições de manter a estratégia clarificativa, obteve feedback positivo nas pesquisas de opinião. Inversamente, quando José Serra e Marina Silva perceberam que uma “estratégia insurgente” estava disponível e a utilizaram, a intenção de voto em Dilma caiu. Marina Silva foi particularmente importante para a ocorrência do segundo turno (Telles, 2012). Como ex-ministra do governo Lula, tinha fortes discordâncias com Dilma sobre os trade-offs entre crescimento econômico e preservação do ambiente. Com fortes laços com as igrejas evangélicas, constituiu-se em alternativa para os eleitores mais conservadores quando a polêmica sobre temas comportamentais se tornou relevante na agenda da eleição (Alonso, 2012). Serra, por sua vez, também enfraqueceu os argumentos de Dilma salientando em suas campanhas temas da agenda insurgente. Em conjunto, esses elementos parecem ter sido suficientes para danificar a credibilidade de Dilma perante segmentos decisivos de eleitores no final do primeiro turno e obstando a sua vitória naquele momento.

Os achados reforçam a proposição de que campanhas são capazes de alterar os resultados eleitorais, mesmo que o número de eleitores influenciados seja marginal. Embora Dilma ainda fosse a candidata mais votada da eleição, ela submeteu-se ao risco de derrota na segunda rodada, por não poder garantir a continuação da sua mensagem clarificativa inicial.