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2 Referencial Teórico

2.3 Teorias Relacionadas aos Construtos Investigados

2.3.1 Comportamento de consumo racional e hedônico

O comportamento do consumidor é um tema complexo e que vem sendo sistematizado desde a década de 1960. De sua origem com o foco na racionalidade das decisões com forte viés econômico, evolui-se para as decisões de caráter mais emocionais. Na década de 1980 com os trabalhos de Holbrook e Hirschman (1982) e Hirschman e Holbrook (1982), esta faceta do comportamento é enfatizada e se reconhece que as decisões de compra são acompanhadas de traços racionais e hedônicos. No campo do turismo, o interesse nos estudos sobre o consumo de bens e serviços turísticos tem aumentado à medida que a atividade turística cresce, sendo este um fenômeno cujo desenvolvimento está diretamente relacionado com as alterações frequentes das preferências dos consumidores. Essas relações geram mudanças e ocorrem mediante a evolução das sociedades e dos respectivos modelos turísticos preconizados (CROUCH; LOUVIERE, 2000; TRAUER, 2006).

À proporção que os turistas se tornaram mais experientes, sofisticados, requintados e simultaneamente mais ricos, é possível verificar que as mudanças nos modos de viver e as decisões de compra passaram a se basear em critérios mais cuidadosos e exigentes. Os novos turistas querem ser diferentes e estar em destaque nas multidões por meio da afirmação de sua individualidade. Ao contrário do velho turista que era considerando como inexperiente,

standard, massificado na procura de climas quentes por meio de um pacote rígido de férias

(AGUILÓ; ALEGRE; SARD, 2005), estes são cada vez mais independentes e flexíveis com preferências voláteis e desejos por um turismo alternativo (IOANNIDES; DEBBAGE, 1997).

O turista guia-se por novas prioridades e preocupações, procurando atividades diferenciadas durante as suas viagens. Querem viver experiências em cada ambiente que frequentam e consumir muito além de produtos, ou seja, emoções (HIRSCHMAN;

HOLBROOK, 1982; TRAUER, 2006); o que traduz uma alteração nas escolhas, avaliações e comportamentos dos indivíduos em turismo. Neste sentido, acredita-se que esses comportamentos podem estar relacionados apenas a aspectos hedônicos mesmo quando os consumidores estão visitando uma destinação que se preocupa com a preservação do local.

Cohen, Prayag e Moital (2013) consideraram que apesar de existirem vários estudos que relataram a influência externa (tecnologia, geração Y e preocupação com consumo ético) no comportamento do turista, a partir de uma revisão de estudos recentes na área, propuseram que estudos futuros devem analisar a tomada de decisão conjunta, os mercados emergentes para o turismo, os aspectos emocionais e racionais e o mau comportamento do consumidor nas destinações, sendo estas grandes temáticas que precisam ser exploradas na área do turismo (COHEN, PRAYAG; MOITAL, 2013).

Por conta de inúmeros enfoques propostos por várias áreas das ciências sociais, existem diversas definições para a racionalidade e o hedonismo. Áreas como sociologia, psicologia, antropologia e ciências políticas, por exemplo, apropriaram-se e apresentaram sentidos distintos o que direciona o entendimento com um significado central, porém com algumas variações, da mesma forma nas ciências administrativas. Apesar dessas variações, os conceitos tendem a ser uniforme, o que permite sua utilização neste estudo. Desse modo, a partir da Teoria da Ação Racional de Fishbein (1963), serão apresentadas as definições de consumo racional. Em contraponto à racionalidade, tem-se o hedonismo. As variações conceituais do hedonismo, bem como o enfoque associado ao consumo serão destacadas. Com isso, nessa seção inicial, serão apresentadas as principais discussões sobre cada tipo de consumo (racional e hedônico), sendo destacadas as abordagens que irão direcionar o levantamento teórico desta tese.

Ambos os aspectos racionais e hedônicos são de natureza bipolar. O hedonismo inclui sensações agradáveis e desagradáveis, ao mesmo tempo o aspecto utilitário inclui julgamento sobre racionalidade e irracionalidade (HOLBROOK; HIRSCHMAN, 1982; HIRSCHMAN; HOLBROOK, 1982; AHTOLA, 1985; RINTAMAKI et al., 2006). O valor hedônico está associado à satisfação ampliada dos sentidos pela vivência do prazer, entretenimento, fantasia e diversão. Já o valor utilitário está relacionado com as necessidades de realizar tarefas que devem ser cumpridas (HOLBROOK; HIRSCHMAN, 1982; HIRSCHMAN; HOLBROOK, 1982; BABIN; DARDEN; GRIFFIN, 1994).

É válido destacar que alguns autores consideram o hedonismo como um comportamento que pode apresentar uma conotação negativa associada à gratificação

instantânea, ao egoísmo materialista, ao individualismo e ao excessivo comportamento egoísta (GABRIEL; LANG, 1995; SZMIGIN et al., 2007). Porém, há opiniões controversas. Soper (2007), por exemplo, ao analisar o comportamento dos consumidores ambientalmente preocupados e dos consumidores éticos, considerou que o consumo ético pode, por si só, ser uma busca hedônica. A autora observou que o hedonismo está baseado na motivação do indivíduo para lutar por uma ‘vida boa’. A ‘vida boa’ está relacionada ao descontentamento de um indivíduo com o consumismo e o materialismo, resultando em uma tendência para escolha de formas alternativas de consumo mais corretas. Assim, considerando esses aspectos, Soper (2007) afirmou que é necessário analisar duas formas de hedonismo: o egoísta e o ético. O hedonismo egoísta está baseado na ideia de que a felicidade ou o prazer é individual e não diz respeito ao bem-estar de outras pessoas. Já o hedonismo ético, está baseado na preocupação coletiva. A compra e o consumo são algo prazeroso, mas para assim ser, o consumidor sente a sensação de que está fazendo a coisa certa. Logo, a prática gera sentimentos de autoestima que por sua vez dão à pessoa sentimento de prazer (SZMIGIN; CARRIGAN, 2006; SOPER, 2007).

Ao abordar a moral e o autocontrole, Wertenbroch (2002) apontou que as preferências dos consumidores são muitas vezes impulsionadas pela experiência hedônica antecipada, de modo que essas estejam alinhadas aos parâmetros da moral e do autocontrole. Logo, os benefícios hedônicos ajudam na manipulação de um conjunto de possibilidades de escolhas enfrentadas pelo consumidor (WERTENBROCH, 2002). De tal modo, uma decisão ética pode ser mais atraente quando é feita na presença de menos escolhas éticas (SZMIGIN; CARRIGAN, 2006). Ou seja, o indivíduo ficará mais atraído por uma escolha ética quando estiver diante de poucas opções de escolha com essa finalidade.

Por outro lado têm-se outro aspecto que deve ser analisado com relação ao consumo sustentável: a culpa. Alguns autores consideram que, ao contrário do consumo racional, o consumo hedônico pode provocar um sentimento de culpa (STRAHILEVITZ; MYERS, 1998; KIVETZ; SIMONSON, 2002; BELK; GER; ASKEGAARD, 2003). Segundo Belk, Ger e Askegaard (2003), a culpa pode ser entendida como uma emoção negativa autoconsciente despertada quando a conduta da pessoa está em desacordo com os seus padrões de comportamento. A culpa pode ocorrer numa situação de compra, de uso ou na avaliação a partir da disposição dos produtos. É uma emoção moral que está ligada ao sentimento de bem- estar de outras pessoas ou da sociedade em geral, sendo sentida a partir do momento em que as pessoas se preocupam com normas ou danos morais feitos para os outros a partir de suas

escolhas (GHINGOLD, 1981; DAHL; HONEA; MANCHANDA, 2003). Neste sentido, observa-se a importância de considerar a culpa em situações de consumo eticamente responsáveis. Isso é relevante porque os consumidores tendem a eliminar a culpa quando conseguem fazer escolhas ‘mais corretas’ (DEDEOGLU; KAZANCOGLU, 2012).

Apesar de ter sido comentado sobre o conceito de culpa, este não será mensurado neste estudo. Apenas considerou-se como aspectos de análise do comportamento. Mas, a bipolaridade do consumo racional e hedônico será considerada nesta tese. O estado da arte com alguns estudos sobre a temática principal é apresentado no Apêndice D. Observou-se que as investigações mais recentes estão concentradas na avaliação dos efeitos dos estímulos hedônicos diante de um website de destino turístico, com o efeito da moderação do envolvimento, destacando que os apelos emocionais geram maior atitude e intenção (TOA; LIAOB; LIN, 2006; LWIN; PHAU; HUANG; LIM, 2014; RODRÍGUEZ-MOLINA, FRÍAS- JAMILENA E CASTAÑEDA-GARCÍA, 2015) e na análise da moderação entre o tipo de produtos e variáveis demográficas (DROLET; WILLIAMS; LAU-GESK, 2014). Em seguida, os estudos concentram-se mais na relação entre as respostas de intenção entre um estímulo utilitário e hedônico (OKADA, 2005), fechando com o desenvolvimento de escalas para mensurar as dimensões hedônicas e utilitárias do consumo (VOSS; SPANGENBERG; GROHMANN, 2003; BABIN; DARDEN; GRIFFIN, 1994; BATRA; AHTOLA, 1991).

Nos próximos itens desta seção, serão apresentadas algumas perspectivas teóricas sobre a razão e o estudo do comportamento do consumidor, bem como os principais aspectos teóricos do conceito de emoções, finalizando com a apresentação de estudos que trabalham as emoções no comportamento de consumo.