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Na atualidade, atribui-se à vida um valor inestimável, sendo esta albergada por muitos ordenamentos jurídicos mundo afora, mormente o brasileiro, no qual ela adquire status de inviolável e indisponível. Por essa mesma razão, deve o direito à vida ser ainda tutelada pelo Estado.

Além disso, a Constituição Federal garante aos indivíduos um tratamento digno, haja vista ser a dignidade da pessoa humana estabelecida como um fundamento da ordem jurídica brasileira. Assim, percebe-se que as pessoas têm o direito a uma vida digna, cujo pressuposto é a própria vida.

A partir da ideia de que a dignidade da pessoa humana influencia a noção geral do que se entende por “vida”, surge o seguinte questionamento: pode-se considerar que qualquer vida é digna? Qualquer “tipo de vida” realmente vale a pena ser vivido ou desfrutado? Com isso, a sacralização de toda e qualquer vida humana, prolongada a qualquer custo, passa por profundas transformações.

Nesse contexto, sugere-se que esse direito à vida, o qual é, a priori, inviolável e indisponível, para respeitar o que se entende por dignidade humana, pode ser relativizado em algumas situações específicas, razão pela qual seria possível a prática da eutanásia, sob determinadas condições.

Seguindo essa teoria, seus defensores entendem que o direito à vida, embora seja tratado como indisponível pela legislação brasileira e por muitos países, deve ser relativizado, em circunstâncias específicas. Dessa forma, de acordo com esse posicionamento, seria direito fundamental da pessoa a liberdade de dispor de seu próprio corpo, retirando essa titularidade do Estado, o qual a detém no atual sistema.

Por isso, o que se põe em xeque no presente trabalho é justamente até que ponto pode o Estado interferir na esfera privada e impedir que alguém - que se encontra acometido de enfermidade incurável, perpassando sofrimentos indizíveis, sem chance nenhuma de cura - disponha sobre sua própria vida, na medida em que estabelece a indisponibilidade do direito à vida e ainda criminaliza a conduta do médico que comete a eutanásia.

E é a partir dos mesmos princípios que se propõe aqui a possibilidade de autorizar a prática da eutanásia, vendo isso, porém, a partir de outro viés. A Constituição Federal estabelece a dignidade da pessoa humana, mas o que se quer

mostrar é que não é se prolongando a “vida” de alguém que se confere a ela dignidade, principalmente se for contra sua vontade, sob a mais fraca justificativa da indisponibilidade do direito à vida. Na verdade, acredita-se que, quando se desrespeita a vontade de alguém capaz de exprimir vontade, há, de certa forma, afronta à dignidade desse indivíduo.

Por tudo isso, embora no Brasil e em muitos outros países a eutanásia ainda seja considerada crime, é de extrema utilidade se discutir sobre a possibilidade de descriminalizá-la, quando esta for cometida em situações bem específicas como as aqui exemplificadas, uma vez que se almeja respeitar a liberdade de autodeterminação das pessoas, protegendo-se, por via de consequência, a dignidade desses indivíduos.

Vale ressaltar, por fim, que o que se objetiva não é uma conclusão unanimemente aceita, até porque isso está longe de ser alcançado. O que se quer, na verdade, é realmente incitar discussões profundas acerca dessa temática cada vez mais presente na nossa sociedade, a fim de se concluir ou não pela possibilidade de legitimar a prática da eutanásia, tendo como base os princípios constitucionais vigentes no Brasil, mormente o basilar, da dignidade da pessoa humana, e ainda o da liberdade de autodeterminação do indivíduo.

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