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2.4. Confiança

2.4.2. Condições para a confiança

Conforme comentam Rousseau et al (1998), dentre os vários enfoques disciplinares em que a confiança é estudada, há um certo consenso quanto às condições que levam à sua existência, as quais, de acordo com esses autores, englobam: a percepção dos riscos, no sentido da possibilidade de perda, provocada pela incerteza quanto às intenções e ações da outra parte; e a interdependência, sendo que os interesses de uma parte não podem ser atingidos sem a outra. E, de acordo com Rousseau et al (1998), eventuais variações, tanto na percepção dos riscos, como na interdependência entre as partes, podem levar a variações na confiança de uma parte junto à outra.

Yamagishi, Cook e Watabe (1998) salientam que as interações entre os seres humanos levam ao que eles chamam de incerteza social, que se refere aos riscos de uma das partes vir a ser explorada pela outra no decorrer dessas interações. Para estes autores, essa incerteza encontra-se presente quando as interações entre as partes implicam em custos, ou quando uma parte não tem informações suficientes de que a outra irá agir conforme o prometido, o que leva a que se estabeleçam relações contratuais de compromisso entre ambas as partes, as quais tornam-se desnecessárias quando há confiança.

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Através de um estudo comparativo no qual simularam transações comerciais de compra e venda de produtos e serviços, Yamagishi, Cook e Watabe (1998) puderam identificar que, quanto maior a incerteza envolvida numa relação entre duas partes, menor é a confiança de uma parte na outra e, consequentemente, maior é a necessidade de se estabelecer compromissos contratuais entre as partes envolvidas numa transação comercial. Sendo assim, a confiança dos clientes tem “consequências econômicas” para as organizações, como comentam Harisalo, Huttunen e McInerney (2005, p.464) ao implicar na diminuição da percepção de riscos e de incerteza entre as partes.

Ao analisar transações comerciais eletrônicas, Cook e Luo (2003) fizeram uma série de considerações quanto aos aspectos que interferiam na confiança dos clientes, e apontam que a confiança está associada às informações que os clientes recebem das organizações nos momentos em que realizam as transações comerciais, bem como na crença que possuem quanto à longevidade dessas organizações no mercado.

Mayer, Davis e Schoorman (1995) enfatizam que confiar não implica necessariamente em assumir riscos, mas na disposição em assumi-los, e que a propensão em confiar varia conforme as características em termos de personalidade e cultura de cada indivíduo, além de contextos específicos e situações específicas, bem como das interpretações que os sujeitos fazem de tais situações. Com relação às influências de características culturais na propensão a confiar, Doney, Canon e Muelen (1998) defendem que as normas e os valores referentes a cada cultura levam a que indivíduos de diferentes culturas apresentem distintas propensões em confiar.

Doney, Canon e Muelen (1998) propõem um modelo para o processo de formação da confiança nos indivíduos, levando em conta aspectos destacados em estudos das áreas de Economia, Sociologia e Psicologia Social, que abordam o tema. De acordo com o modelo por eles proposto, o processo de construção da confiança de um indivíduo envolve uma análise que leva em consideração vários fatores:

- os riscos envolvidos no caso da outra parte não atender às expectativas; - a possibilidade de prever o comportamento da outra parte;

- a avaliação subjetiva das intenções da outra parte;

- a capacidade da outra parte em cumprir com as promessas realizadas;

- a possibilidade da transferência da confiança depositada em uma entidade, ou sujeito conhecidos, para a outra parte.

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Cada um desses fatores que compõem o processo de análise ocorre, de acordo com Doney, Canon e Muelen (1998), de formas diferentes em cada cultura. E têm, cada um deles, pesos diferentes no processo de construção da confiança, tomando-se como base indivíduos de culturas distintas, uma vez que tais fatores dependem das normas e dos valores vigentes em cada cultura.

Quanto às condições que podem levar a que uma das partes se caracterize como confiável perante a outra, Deutsch (1958) enfatiza que implicam na apresentação de um comportamento responsável, o qual, conforme esse autor, pode ser suscitado por:

- um sentimento positivo perante a outra parte, provocando a vontade de realizar seus objetivos;

- o medo da punição por não se comportar de forma responsável;

- os valores internalizados, que levam ao sentimento de culpa por não se comportar de forma responsável.

Deutsch (1958) salienta que, a força dos valores internalizados com relação à responsabilidade, a habilidade em solucionar ou resolver conflitos que envolvam responsabilidades, e a disposição em assumir os objetivos dos outros como sendo os próprios, constituem aquilo a que se pode chamar de integridade.

Butler (1991) desenvolveu um estudo com o objetivo de identificar as condições que podem propiciar com que uma parte se torne confiável perante a outra. De acordo com este autor, apresentar um comportamento confiável consiste em se comportar apresentando as seguintes características:

- disponibilidade - estar presente junto à outra parte, sempre que necessário; - competência - ter conhecimento e habilidades relativos à tarefa desempenhada; - coerência - apresentar comportamento previsível do ponto de vista do outro; - prudência - ter capacidade de proteger informações da outra parte;

- justiça - tomar decisões justas quanto ao que envolve a outra parte; - integridade - ter honestidade e dignidade;

- lealdade - proteger o outro e agir em seu benefício;

- sinceridade - compartilhar informações junto à outra parte;

- cumprimento de promessas - cumprir com as promessas feitas ao outro; - receptividade - aceitar novas idéias e sugestões apresentadas pela outra parte.

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Transpondo as condições identificadas por Butler (1991) para o contexto da confiança dos clientes nas organizações, pode-se supor que comportamentos e ações dos funcionários das empresas, no sentido de demonstrar essas características citadas pelo autor, possibilitem percepções, por parte dos clientes, que levem a que identifiquem uma organização como sendo confiável.

Dessa forma, tanto os valores percebidos pelos clientes como sendo os prevalecentes numa organização, quanto as práticas, ou seja, os comportamentos e os procedimentos adotados pelos funcionários de uma organização, poderiam resultar na confiança dos clientes junto a essa organização, uma vez que, como comentam Rousseau et al (1998), a confiança dos indivíduos em uma instituição pode derivar de suas normas, das regras estabelecidas, das formas e redes de trabalho, e da maneira como se resolvem os conflitos.

Morgan e Hunt (1994) salientam que a confiança existe quando uma das partes acredita na integridade da outra. Ao realizarem um estudo junto a clientes do setor bancário, os autores concluíram que a confiança dos clientes relaciona-se com o comprometimento, sendo este definido como o desejo de manter o relacionamento com a organização. De acordo com Morgan e Hunt (1994), o nível de confiança e comprometimento dos clientes junto a uma organização pode ser analisado através de alguns aspectos como:

- o grau de aceitação das regras e políticas da organização; - a propensão que apresentam em trocá-la por uma organização

concorrente;

- a forma como percebem as soluções no caso de situações conflituosas; - o julgamento que fazem de que possuem informações adequadas para

tomar suas decisões junto à organização;

- a forma como percebem que a organização busca os mesmos objetivos que seus clientes.

O modelo proposto por Morgan e Hunt (1994) foi tomado como base por Andamson, Chan e Handford (2003) em um estudo realizado junto a clientes corporativos de pequenos bancos. Entre outros resultados, Adamson, Chan e Handford (2003) identificaram que o nível de confiança dos clientes sofria influências da reputação da organização e de suas estratégias de comunicação junto a esses clientes, bem como da percepção da importância que a organização lhes atribuía, no sentido de mostrar preocupação em resolver eventuais problemas, em resolvê-los prontamente e em demonstrar o interesse na manutenção do relacionamento. Estes autores salientam a importância da interação entre funcionários e

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clientes, propiciando com que estes últimos tenham uma percepção positiva que se reflita em confiança.

Conforme Mayer, Davis e Schoorman (1995), a propensão de um indivíduo em confiar irá depender basicamente de três fatores relativos à outra parte: as habilidades e competências referentes ao assunto; a benevolência, no sentido de que irá proporcionar benefícios, apesar dos próprios interesses; e a integridade. Para esses autores, a integridade pode ser definida como sendo resultante da percepção de que a outra parte segue princípios considerados aceitáveis por ambas as partes, percepção essa que pode ser afetada pelas ações passadas; pelas informações recebidas referentes ao comportamento da outra parte; e pela crença no senso de justiça da outra parte, bem como na congruência entre as ações prometidas e as executadas. De acordo com Mayer, Davis e Schoorman (1995), a percepção desses três fatores (habilidades, benevolência e integridade) tende a aumentar conforme cresce a interação entre as partes envolvidas.

Rousseau et al (1998) salientam que a confiança aumenta conforme crescem as interações provocadas pelo relacionamento entre as partes, o quê pôde ser identificado por Gwiner, Gremler e Bitner (1998), em um estudo voltado a indicar e classificar os benefícios percebidos por clientes que mantinham relacionamentos de longa data com organizações prestadoras de serviços. Os autores identificaram três tipos de benefícios:

- benefícios de confiança - percepção da redução da ansiedade e do risco, expectativa positiva quanto à prestação do serviço e crença na integridade das organizações;

- benefícios sociais - familiaridade, reconhecimento e amizade por parte dos funcionários das organizações;

- benefícios de tratamento especial - descontos, brindes e participação em programas de fidelidade das empresas.

Dentre estes três tipos de benefícios, Gwiner, Gremler e Bitner (1998) identificaram os benefícios de confiança como sendo aqueles percebidos como mais importantes do ponto de vista dos clientes entrevistados.

Doney e Cannon (1997) realizaram um estudo com o objetivo de identificar os fatores relativos ao desenvolvimento de relações de confiança nas transações comerciais, analisando vendedores e compradores de diversas organizações. Entre outros fatores, esses autores identificaram a importância da interação entre os vendedores e os compradores das empresas,

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no que tange ao desenvolvimento de um relacionamento, mostrando-se importante, nesse aspecto, a identificação de similaridades de princípios entre os compradores e os vendedores.

Conforme Doney e Cannon (1997), o contato frequente entre compradores e vendedores das organizações tem um papel crucial no desenvolvimento da confiança. Este aspecto também foi identificado por Butler (1999), ao pesquisar as influências para a confiança da quantidade de informações compartilhadas e do clima entre partes envolvidas em processos de negociação.