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CENTRO HISTÓRICO DE SALVADOR

5.0 CONSIDERAÇÕES FINAIS

As informações registradas pela Pesquisa de Equipamentos Culturais do CAS – PEC/CAS confirmam o entendimento prevalecente pelo Governo do Estado da Bahia/ERCAS e pela UNESCO de que a reabilitação da subárea do Centro Histórico de Salvador – CHS, reconhecida como Patrimônio da Humanidade, está intrinsecamente ligada à reabilitação do conjunto do Centro Antigo.

O fato de este território abrigar o maior e mais diversificado conjunto de equipamentos e de negócios culturais de Salvador, cujo acervo, dentre outros predicados, guarda registros preciosos da história da Bahia e do Brasil, o diferencia das demais subáreas de ocupação recente na capital (parte da orla oceânica, subúrbio ferroviário e entorno do Iguatemi-Paralela), mesmo daquelas que concentram os moradores de maior estrato de renda e os empreendimentos competitivos. Nessas áreas dinâmicas, os negócios culturais de cunho exclusivamente privado obtiveram êxito, a exemplo dos complexos de salas de cinema como o Multiplex Iguatemi, que por dois anos seguidos (2006/07) galgou o topo no ranking nacional de público que freqüenta salas de exibição nesse estilo, dentre outros, teatros, galerias, antiquários. Já nas subáreas onde reside a população, predominantemente, de baixo poder aquisitivo, dentre outras ausências, quase não há oferta de equipamentos culturais. A presença de centros de cultura e bibliotecas em algumas localidades está muito aquém da necessidade de milhares de habitantes que residem nessas áreas.

Apoiados pelo sistema de transporte público – Estação da Lapa, terminal da França e terminal da Barroquinha –, pela oferta de serviços diversos, principalmente os educacionais e pelo comércio varejista de rua e de shopping Center, o CAS atrai, diariamente, milhares de pessoas, com destaque para o público jovem. Nesse contexto, se observa uma relativa efervescência cultural em função das atividades e programas desenvolvidos por instituições públicas, privadas e organizações do terceiro setor (Teatro Castro Alves, Teatro Vila Velha, Teatro do SESC Pelourinho, Biblioteca Infantil Monteiro Lobato, Biblioteca Pública do Estado da Bahia, IPAC/Pelourinho Cultural, Museu de Arte Moderna, Universidade Federal da Bahia, várias ONG); do acervo disponível nas bibliotecas e arquivos; ou ainda, dos espaços de sociabilidade do Shopping Piedade e do Shopping Lapa.

Tal movimentação está aquém do potencial existente nos diversos espaços culturais disponíveis no CAS, que poderá interessar a esse e a outros públicos, a partir de ações de requalificação dos equipamentos, melhorias no sistema de informação, ampliação e acesso, projetos de segurança, dentre outros.

Nesse trabalho de avaliação dos equipamentos culturais do CAS se optou por agrupá-los em dois subgrupos: equipamentos tradicionais – museus, igrejas e conventos, bibliotecas, arquivos, centros culturais e fundações – e negócios

culturais – cinemas, teatros, antiquários e galerias. E mais, por entender que

esses espaços exercem papéis diferenciados no processo de reabilitação do antigo centro, do ponto de vista cultural, foram considerados equipamentos e negócios, aqui denominados de âncoras – museus, igrejas, cinemas e teatros – seja pelo valor histórico, espaços de sociabilidade, maior fluxo de visitação, seja pela possibilidade de vir a obter melhor desempenho econômico. Os demais segmentos – bibliotecas, centros culturais, fundações, arquivos, antiquários, sebos e galerias – de acomodação mais recente, ainda que de reconhecida importância para formação educacional e de público em cultura, aqui foram analisados tão-somente à luz dos dados coletados.

Um dos aspectos observados pela PEC/CAS que merece destaque diz respeito à concentração de público destinado a algumas instituições e a baixa freqüência de outras. O Teatro Castro Alves, por exemplo, que responde por 51,2% da capacidade instalada dos teatros pesquisados em Salvador (a Concha Acústica, voltada a apresentação de espetáculos populares, principalmente shows musicais detém 39% dos assentos), em 2007, foi o mais freqüentado, pois atraiu 83,6% das pessoas que foram a essas casas de espetáculo; os shows foram os mais requisitados (284 mil pessoas, correspondendo a 90,3% do público do TCA em todas as linguagens; a Concha Acústica recebeu 110 mil espectadores - 38,7%).

Ainda que o maior número de espetáculos apresentados nos espaços pesquisados de Salvador fosse de teatro (790 peças, correspondendo a 50,5% do total de espetáculos ofertados), o que indica um dinamismo na produção desse tipo de linguagem, o fluxo de público não ter correspondido a oferta de peças (95,7 mil pessoas assistiram ao conjunto de apresentações teatrais, o que representou 20,7% do público total de 462,3 mil espectadores).

O Museu de Arte Moderna – MAM é mais concorrido dentre os museus de Salvador, algumas exposições contemporâneas, como a do fotógrafo Pierre Verger e a do artista plástico Caribé, atraem um grande número de pessoas. O projeto Jazz no MAM que, semanalmente, atrai cerca de 2 mil pessoas, o cinema SaladeArte de MAM e o programa de Arte-Educação desenvolvido com crianças e jovens são alternativas que ampliam a freqüência e permanência de público nesse espaço cultural. Também com fluxo de público temos os museus da Universidade Federal da Bahia, como destaque para o Museu de Arte Sacra da Bahia e o Museu Afro, o Museu de Arte da Bahia e o Museu Carlos Costa Pinto. Ainda que o deficiente sistema de controle de público dos museus baianos não permita a mensuração precisa do retorno desses empreendimentos, observa-se que algumas exposições têm resposta mais positiva do que outras, certamente o fator divulgação influencia nesse resultado.

O patrimônio religioso com suas obras de arte barroca instaladas nos conventos e igrejas da cidade associados aos ritos litúrgicos – missas, festas, novenas – levam um elevado número de pessoas às igrejas católicas. As missas que ocorrerem na Igreja de São Francisco (especialmente a Terça da Benção), Igreja de São Bento (cânticos gregorianos), Igreja Nossa Senhora do Rosário dos Pretos (associação dos ritos católicos e africanos), Igreja de Santo Antonio Além do Carmo, Igreja de Nazaré e Igreja de São Pedro na Piedade, levam multidões de fiéis ao Centro Antigo de Salvador. Por associar liturgia, fé à arte, sem dúvida, a Igreja e o Convento de São Francisco é o principal ponto de visitação de turistas na cidade.

A atividade de ir ao cinema, tradicional desde o início da segunda metade do século XX, continua presente no CAS, prova disso é que 19,3% da capacidade instalada dos cinemas de Salvador estão distribuídas dentre as dez salas de cinema e uma de vídeo, localizadas nesse território tradicional. Sobretudo quando se considera que 74,3% dos assentos disponíveis em Salvador estão concentrados dentre as salas dos três complexos multiplex fora do CAS. As alternativas de salas de exibição no CAS são mais diversificadas do que nas demais subáreas de Salvador, pois aí ainda é possível encontrar cinemas de

rua (Astor e Cine XIV SaladeArte), cinemas associados aos espaços culturais (Espaço Unibanco, SaladeArte do MAM, Sala Walter da Silveira) e de shopping center (Lapa 1 e 2) – o que possibilita atrair um perfil de público mais diferenciado.

A PEC/CAS também apontou que parte significativa do público que freqüenta bibliotecas, arquivos, fundações, centros culturais é composta de pesquisadores e estudantes em busca de informações históricas, artísticas e culturais, algumas raras, disponíveis nos acervos públicos e particulares. No caso de bibliotecas, o destaque é para Biblioteca Pública do Estado da Bahia, conhecida como Biblioteca Central, que guarda livros raros (3.820 títulos) e a Biblioteca do Mosteiro de São Bento (20 mil títulos); nos arquivos, a ênfase é para o Arquivo Teodoro Sampaio/Instituto Geográfico e Histórico da Bahia, o Arquivo da Santa Casa da Misericórdia. A diversidade e a riqueza de conteúdos são diferenciais que merecem ser potencializados e amplamente divulgados.

Ao se considerar o público que freqüenta os Antiquários e Galerias, a pesquisa apontou que o principal público desses empreendimentos é o turista estrangeiro e os soteropolitanos de maior poder aquisitivo. A maioria dos antiquários e sebos estão localizados na subárea São Bento/Misericórdia, com maior destaque para rua Rui Barbosa, onde ainda é possível encontrar os primeiros antiquários da cidade, cujo acervo se concentra em mobiliário, e peças decorativas. As galerias, espaço que ampliou a sua oferta na cidade a partir dos anos de 1990, incitada pelo incentivo do governo Estado durante a reforma do Pelourinho, aparecem mais comumente nas subáreas Praça da Sé/Pelourinho/Taboão e Carmo/Santo Antônio Além do Carmo; seus proprietários quase sempre são artistas locais. Esses negócios são fundamentais para a divulgação da arte contemporânea e popular.

Quanto à natureza jurídica, a pesquisa identificou que parte dos equipamentos culturais pesquisados pertence ou é administrado pelo poder público nas três esferas, principalmente pelo governo estadual. Esse é o caso dos museus (50% públicos, sendo que 38,5% são ligados ao Estado, atualmente

subordinado ao IPAC, destaque para o MAM), teatros (60% públicos, desses 50% são estaduais, destaque para o TCA), bibliotecas (50%, dessas 33% estaduais, destaque para Biblioteca do Estado da Bahia), arquivos (46%, metade estadual, destaque para o Arquivo Público da Bahia, o mais antigo e bem estruturado), Centros Culturais e Fundações (41,6%, com destaque para a esfera federal, Centro Cultural da Caixa e dos Correios). As galerias (22% são públicas ligadas à esfera estadual, destaque para a Galeria Solar Ferrão), as duas salas de cinema públicas correspondem a 20% do total e, duas outras, funcionam em regime de parceria público-privada (sessão dos prédios estaduais). Os segmentos de antiquários e sebos são exclusivamente privados, ainda que sejam estruturas empresariais e organizacionais quase sempre familiar, prova disso está no quadro de pessoal, na forma de organizar o acervo e no atendimento ao público.

No caso das instituições culturais públicas ou dependentes de políticas de fomento à cultura pelo menos duas decorrências podem ser enumeradas: a descontinuidade das políticas de gestão e a escassez de recursos orçamentários para manutenção e execução dos programas e ações. Esse aspecto requer ações que garantam maior participação orçamentária e de sustentabilidade a médio e longo prazo.

As igrejas são majoritariamente ligadas a Arquidiocese, comunidades religiosas e Irmandades. A maioria das instituições depende para sua manutenção predial e de ações sociais de recursos de instituições particulares, nacionais e internacionais, de doação de fiéis e do poder público federal, principalmente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional-IPHAN. A monumentalidade e complexidade artística dos templos católicos do CAS demandam investimentos elevados para a sua manutenção, a insuficiência de recursos e a escassez de público contribuíram para que 69,6% das igrejas e conventos se encontrem em situação de risco.

A PEC/CAS constatou que um grande número de equipamentos culturais opera com espaços multiusos, principalmente os museus, igrejas, teatros, salas de cinemas e centros culturais. No entanto, se observa que apesar do apelo

artístico e cultural nos usos desses espaços, muitos deles continuam carentes de investimento para responder as necessidades da estrutura física e de acessibilidade.

A PEC/CAS também identificou que majoritariamente, os equipamentos culturais não estão informatizados, principalmente aqueles ligados ao poder público, o que prejudica em muito a integração desses aos circuitos e redes nacionais e internacionais. De igual maneira, os prédios que mais comumente apresentaram condição de conservação dos prédios entre ruim e péssimo são subordinados, direta ou indiretamente, ao poder público.

Outro aspecto recorrentemente identificado pela PEC/CAS é a fragilidade na estratégia de divulgação e informação dos conteúdos, atividades e ações desenvolvidas. As agendas culturais ligadas às instituições públicas de cultura e turismo, como a da Fundação Cultural do Estado – Funceb, do Pelourinho Cultural, da Bahiatursa e os sites das instituições são os recursos mais utilizados pelos equipamentos, mesmo os privados. Apenas as salas de cinema, muitas dessa conectadas aos grupos nacionais e internacionais, afirmaram disponibilizar material de divulgação e distribuí-lo sistematicamente. Por outro lado, dentre as mídias de grande alcance como televisão, rádio e os jornais impressos, quase não há práticas de formação de público em cultura, só recentemente um jornal de circulação estadual, passou, aos domingos, a disponibilizar para um caderno voltado para este segmento, no entanto não se tem informações relativas a sua receptividade.

Também a dificuldade de acesso e a pouca disponibilidade de vagas de estacionamento limitam a presença da população de maior poder aquisitivo, soteropolitanos e turistas no CAS, vale salientar que dos equipamentos e negócios culturais entrevistados, apenas sete instituições – 4 museus, um teatro e dois cinemas possuem estacionamentos próprios.

Quanto ao número de postos de trabalho originários nos equipamentos e negócios selecionados, a PEC/CAS identificou que 1608 pessoas estavam trabalhando nessas atividades entre novembro/2008 e março/2009. Mais da

metade desses postos são ocupados por indivíduos com nível superior completo, originário de diversas áreas do conhecimento.

A elevada concentração de espaços culturais no CAS evidencia o potencial cultural a ser explorado no projeto de reabilitação desta subárea. No entanto, se observa que a dicotomia entre o rico acervo patrimonial dos equipamentos culturais e as condições para sua sustentação – descontinuidade das políticas públicas de cultura e de segurança, carência de gestão, acessibilidade, orçamento, manutenção patrimonial – apontam para a necessidade urgente de investimento em diversas áreas desses segmentos. Uma melhoria na qualidade da oferta e da divulgação dos bens culturais existentes poderá propiciar um maior fluxo de pessoas em busca dos conteúdos disponíveis, das expressões e das referências tradicionais e contemporâneas tão proeminente no Centro Antigo de Salvador, assim possibilitando uma maior apropriação e preservação desse patrimônio pela população residente, pela população que circula na região e pelos visitantes e, conseqüentemente, garantia de sua sustentabilidade.

II - REFERÊNCIAS

ACCIOLI, Ignácio. Memórias históricas e políticas da Bahia. Salvador: Imprensa Oficial do Estado da Bahia, 1931.

AZZI, Riolando. A Sé Primacial de Salvador: a igreja católica na Bahia 1551- 2001. Petrópolis: Vozes, 2001. Vol. I e II.,

BOTELHO, Isaura e FIORE, Maurício. O uso do tempo livre e as práticas

culturais na região metropolitana de São Paulo. www.ces.uc.pt . Acesso em 20.01.09.

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BOXER, Charles R. A idade de ouro do Brasil: dores de crescimento de uma sociedade colonial. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2000.

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