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CONSIDERAÇÕES FINAIS:

No documento MESTRADO EM LÍNGUA PORTUGUESA SÃO PAULO (páginas 144-148)

CAPÍTULO II FUNDAMENTOS TEÓRICOS DA LEXICULTURA : IDENTIDADE DOS

CONSIDERAÇÕES FINAIS:

Através do tempo, percebemos que a distinção entre os gêneros: masculino/feminino é cultural, social, que impõe um protótipo ideal: “a virilidade”. Sem, contudo, deixar de designar a homossexualidade, que através do tempo; ora é aceita, ora é rejeitada, mas é rotulada. Assim, houve a necessidade de discutir quem é o homossexual?

Para esta construção observamos que na sociedade temos a noção de gênero, que é alicerçada numa concepção biológica dual: homem X mulher, tendo por base os respectivos órgãos genitais: pênis/ vagina. Desde o nascimento, a criança é colocada nestas categorias.

A gramática acompanha esta noção que vem da Biologia, quando se trata do gênero dentro do substantivo. Percebemos que juntamente ao gênero, temos a presença dos desejos, do corpo e da atração sexual, que não se conformam com a identidade sexual. Para tanto, precisaríamos descobrir quem é o homossexual?

Para conhecermos quem é o homossexual, houve a necessidade da busca do conceito de “virilidade” e por oposição “a-não virilidade”. Estes conceitos demonstram uma oposição, visto que o primeiro é considerado pela sociedade como positivo, visto que a premissa é a procriação. O segundo, por sua vez, ora é aceito, ora rejeitado, mas sempre rotulado. Basta observarmos o glossário na p. ... da presente pesquisa. Há a valorização do ativo em detrimento do passivo. Neste sentido, houve a necessidade de recuperarmos os marcos históricos, tendo em vista este foco desde a Civilização grega, romana, passando pela egípcia e aos povos tribais.

No que concerne aos povos tribais, deparamo-nos com o termo “pachuco”, que se trata de um personagem que é submisso, não é confiável, dobra-se diante da pessoa dominadora.

Após esta pesquisa acerca da homossexualidade através da História, recorremos às teorias do protótipo e do estereótipo. Estas teorias estão alicerçadas no senso comum. Elas demonstraram que o homossexual e o heterossexual são protótipos, isto é, são formas de conduta, sendo que o primeiro, como já foi dito, é valorizado e o segundo rejeitado, rotulado. O primeiro tem voz e está inscrito socialmente; o segundo, por sua vez, é silenciado. Este silenciamento é rompido de duas formas: pelas instâncias

jurídicas, penais, médicas, etc – pelos estereótipos, que são construídos a partir das atitudes de uma mulher: submissa, passividade, não confiabilidade. Os estereótipos referem-se à avaliação ideológica do homossexual56.

Para comprovar esta ideia, houve a necessidade de se construir um glossário, que teve por base vocábulos utilizados para designar o homossexual. Estes vocábulos foram escolhidas conforme a frequência de uso pelos falantes da língua. Por intermédio delas, notamos que ora os significados animalizam o homossexual; ora coisificam. Frequentemente, encontramos estes vocábulos em textos escritos, orais, na internet, redes sociais, com uma forte dose de preconceito e intolerância.

O vocábulo homossexual é reduzido para uma única forma: bicha, gay, sapatão, viado. Estes vocábulos ora designam um homem essencialmente afeminado; ou a uma mulher masculinizada. Dentre este universo ainda temos outros vocábulos: travesti, drag queen, transformista, assexuado, transgênero, transexual, entre outros.

Depois de realizado o percurso sobre o léxico, passamos a analisar o discurso. Para tanto, utilizamos uma crônica de Arnaldo Jabor “O travesti está na terceira margem do rio”.

Por intermédio desta crônica procuramos apresentar como o autor apresenta-nos o universo homossexual desde os locais como esquina do Lavradio, Mem de Sá, entre outros, em específico da travesti57.

Estes locais estão localizados na Lapa, que durante muito tempo, foi, é e será um bairro boêmio, que pelos casarões antigos contam histórias. Histórias do apogeu do bairro com a malandragem, gafieira. Esse bairro foi demolido e reconstruído, mas ainda mantém uma mistura de estilos tal como acontece no Barroco. Os seus moradores mudaram: a malandragem, as travestis e, atualmente, o tráficante.

56 Durante muito tempo, a homossexualidade esteve presente no Código Internacional de Doenças.

57 Ressaltamos que a concordância será mantida no feminino, tendo em vista a posição adotada por Jesus (2012: p. 27), que segue transcrita:

Travesti: Pessoa que vivencia papéis de gênero feminino, mas não se reconhece como homem ou mulher, entendendo-se como integrante de um terceiro gênero ou um não-gênero. Referir-se a ela sempre no feminino, o artigo definido “a” é a forma respeitosa de tratamento.

Analisando as crônicas de Arnaldo Jabor, este apresenta para o leitor a personagem travesti, por intermédio de estereótipos sociais, que vem nominalizada por “travecas”, alternância das designações entre o genérico, o masculino ou o feminino, “figuras shakesperianas”, “centauros urbanos”, que denotam os estereótipos sociais a que está sendo nominalizados bem como à marginalização a que está sendo relegada: prostituição, uso de drogas, violência, às doenças, à AIDS. Nesse universo temos a utilização de um léxico específico como “veado”, “michê”, “mudança de sexo”, “ativo”, “passivo”, “executivos”. Observamos na crônica: “O travesti nu em Copacabana desafia todos os pudores”. (p. 172).

Temos dois discursos: o primeiro é do autor que nos apresenta a personagem e de outro o discurso homofóbico e preconceituoso a que estão subjugadas, que as violentam, desde a não permissão de uma identificação (nome social), sem trabalho, sem direito a hospital e um tratamento digno. Para tanto, o léxico construído tem referências à duplicidade: homem-mulher concentrado num corpo.

Observamos que os homossexuais, travestis, transexuais, transgêneros, lésbicas e, mais recentemente, os assexuados são violentados pelo léxico, com expressões como bicha ou gay, que reduz todos a um termo. Há referências aos termos bicha, afeminado para designar o homossexual masculino e sapatão, dyke, colar velcro para designar o homossexual feminino.

A travesti enfrenta os perigos da rua, da falta de uma política educacional e de saúde, que muitas vezes se deparam com a falta de higiene, com a morte, com os insultos. Suscita um aspecto criminal, visto que sempre está pronto para se defender. Segundo Kulick (2008: p. 47) “Travestis se veem obrigadas a reafirmar a cada instante seu direito de ocupar o espaço público”.

Ressaltamos alguns avanços como a permissão de uso de nome social para as travestis, acesso ao Hospital das Clínicas: para cirurgia, tratamento psicológico, psiquiátrico. O hospital conta com uma equipe multidisciplinar para efetivar o atendimento.

Por fim, concluímos que esta reflexão torna-se relevante, visto que tenciona que o enunciatário reflita e deixe de ser preconceituoso (se o for), mas também observar que a

sexualidade transcende a noção de gênero, que ao invés de termos uma concepção dual, podemos pensar numa tríade.

No documento MESTRADO EM LÍNGUA PORTUGUESA SÃO PAULO (páginas 144-148)