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CONSIDERAÇÕES SOBRE A CONFIGURAÇÃO ESPACIAL DE FORTALEZA

3 URBANISMO: EM BUSCA DE UMA DELIMITAÇÃO CONCEITUAL

5 OS PLANOS E A EXPANSÃO URBANA EM FORTALEZA: DA CIDADE PORTUÁRIA À CIDADE-METRÓPOLE

5.1 CONSIDERAÇÕES SOBRE A CONFIGURAÇÃO ESPACIAL DE FORTALEZA

Este capítulo tratará da compreensão das ações dos diferentes agentes na produção do espaço, entre eles o Estado, e suas representações (plantas, planos de remodelação urbana e planos diretores) no contexto da expansão urbana, as quais antecederam as experiências dos planos diretores. Tal abordagem constitui uma das visões sobre a cidade que, embora não permita captar os múltiplos e complexos aspectos do seu desenvolvimento, possibilita perceber alguns elementos estruturantes da configuração espacial.

Para tanto, torna-se fundamental destacar alguns aspectos geográficos situados historicamente, significativos para compreensão da formação urbana de Fortaleza e dos seus desdobramentos nos processos socioespaciais.

O sítio de implantação inicial do núcleo urbano de Fortaleza estendia-se à margem esquerda do riacho Pajeú, próximo à sua desembocadura no Oceano Atlântico. Fortaleza, cidade litorânea, conforme (Mapa 1), com ampla e aberta orla marítima tem seus limites, ao norte, com o oceano atlântico, ao sul com os municípios de Pacatuba, Maracanaú e Itaitinga, a leste, com o Oceano Atlântico, Aquiraz e Eusébio e a oeste com o município de Caucaia. A localização privilegiada constitui um dos fatores definidores da sua configuração espacial e da sua natureza metropolitana. Tais características geográficas propiciaram, no século XIX, a sua condição de pólo de nucleação das atividades mercantis, administrativas e, atualmente, foram acrescentadas a função turística e o papel de núcleo metropolitano com influência estadual e regional.

Fortaleza foi marcada pela tardia implantação das relações capitalistas, que atingiram o território e os agentes de forma desigual e combinada. A princípio, o desenvolvimento material da cidade aconteceu ligado às atividades de exportação-importação, e, posteriormente, na condição de

metrópole periférica25, assentado em quatro eixos de atividades: serviços modernos, turismo, construção civil e mercado imobiliário.

Os vetores de expansão urbana seguiram os eixos viário e ferroviário, ligando a capital à área produtiva algodoeira, estabelecendo fortes vínculos com o sertão, lócus da economia regional. Nas últimas décadas, a ampliação da malha

urbana em xadrez reforça os mesmos tentáculos, acrescidos de dois novos vetores de aporte às atividades de lazer e turismo: um a oeste, o binário formado pela avenida Leste-Oeste e a Rodovia Costa Oeste, e outro a leste, o binário integrado pela avenida Washington Soares e a Rodovia Costa Leste. O conteúdo técnico destas transformações tem forte expressão do capital corporativo e do Estado, o qual se apresenta em ritmo mais acelerado, num processo de destruição/reestruturação e erradicação/reestruturação.

A paisagem natural da cidade litorânea caracteriza-se pela ocupação ao longo de uma orla marítima, de aproximadamente 31 km, estendendo-se por uma planície flúviolitorânea, emoldurada por um cordão de dunas (Mapa 2). A cidade desfruta de um clima tropical quente e úmido26, com estações diferenciadas em dois regimes (chuva e estiagem) e altos índices de energia solar. Estes atributos, associados a outros, como status e valor potencial do solo, hoje, são valorizados para a construção da imagem de cidade-referência no slogan “Ceará Terra da Luz”, marketing das políticas públicas voltadas ao

turismo no denominado “Governo das Mudanças”27.

O complexo hídrico (Mapa 3), formado por três bacias, elemento importante na paisagem urbana, não é valorizado como elemento estruturante da organização espacial. Isto acarretou sérios problemas para a cidade. Algumas áreas às margens destes recursos hídricos foram apropriadas pela população de baixa renda (áreas de risco) e ocupadas pelos especuladores imobiliários, de forma indevida, sem atender às exigências mínimas das faixas de proteção e preservação, de domínio público.

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Segundo Bernal (2004, p.198): “A emergência de Fortaleza como metrópole periférica, ao lado de Recife e Salvador, compreende a etapa do processo de integração do Nordeste do Brasil aos mercados globais, através da descentralização territorial do país” [... .]

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A falta de infra-estrutura e equipamentos urbanos, o valor do solo, a proximidade do porto, o alto índice de umidade relativa, oscilante entre 73% e 82%, e o alto índice de salinidade do ar contribuíram para a baixa ocupação do bairro Praia do Futuro.

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“Governo das Mudanças”, slogan criado na campanha política do PSDB ao pleito estadual nas eleições de 1986.

Fator fundamental de expansão urbana foi a institucionalização da Região Metropolitana de Fortaleza28-RMF, Lei Federal n° 14/1973, amparada na Constituição de 1967 e, cujos limites foram definidos pelos estudos do Plandirf: Fortaleza, município sede, Aquiraz, Maranguape, Pacatuba, Caucaia . Conforme os estudos de polarização e integração realizados pelo Plandirf em 1972, até aquele momento não

se comprovara ainda um fenômeno de metropolização em Fortaleza, pois inexistiam indícios de conurbação, complementaridade nas relações econômicas intermunicipais, movimentos pendulares e continuidade da mancha urbana entre os municípios. Do mesmo modo que em Belém e em Porto Alegre, a institucionalização da RMF ocorreu com fins preventivos, configurando-se como uma “metropolização antecipada”, com reflexos no fenômeno de metropolização destas cidades.

Apesar da RMF ocupar posição privilegiada quanto ao quadro demográfico, não acontece o mesmo em relação ao desenvolvimento econômico e socioespacial. Conforme o censo demográfico do IBGE no ano 2000, a RMF está em sétimo lugar no ranking das áreas metropolitanas brasileiras, com uma população de 2 984 689, e município de Fortaleza, no quinto. Na Região Nordeste, a RMF ocupa o terceiro lugar, seguida de Salvador (3 021 572 habitantes) e de Recife (3 337 565 habitantes) e, em relação aos núcleos metropolitanos nordestinos, Fortaleza está em segundo lugar, Salvador no primeiro (2 443 107 habitantes) e Recife no terceiro (1 442 905 habitantes).

O fato de se localizar no Estado do Ceará, situado na região do semi- árido do Nordeste, e outras circunstâncias, vinculadas às especificidades da reprodução das relações capitalistas nas sociedades periféricas, foram fundantes na formação da metrópole-periférica. A metáfora “a loura desposada do Sol”,29 artifício literário, alusivo a uma representação da cidade, cantada em

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A RMF foi ampliada conforme leis estaduais, quando dos desmembramentos dos municípios de Gaiúba, Maranguape, Maracanaú, Itaitinga e Pacatuba. A conformação atual, da Região Metropolitana de Fortaleza engloba treze municípios, de acordo com a Lei Complementar n° 12.989 de 29 de dezembro de 1999, que acrescentou os municípios de Chorozinho, Horizonte, Pacajus e São Gonçalo do Amarante.

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Esta metáfora foi extraída da poesia Fortaleza de Paula Ney, poeta cearense nascido em Aracati, em 2 de fevereiro de 1838, o qual participou da campanha abolicionista ao lado de José do Patrocínio. Radicado no Rio de Janeiro, exerceu a profissão de jornalista até seu

falecimento em 13 de outubro de 1897. Foi contemporâneo no Liceu do Ceará de Domingos Olímpio, Capistrano de Abreu e Rocha.

MAPA 03/26

prosa e verso por poetas e escritores, apresenta nas condições concretas outra realidade. A partir desta sucinta apresentação de Fortaleza, torna-se fundamental um percurso pelas representações espaciais (plantas, planos e legislações) no contexto da expansão, para explicação do papel do Estado, em especial do Governo municipal, e de suas práticas de urbanismo/planejamento urbano em Fortaleza.

5.2 AS PLANTAS DE EXPANSÃO URBANA E A HEGEMONIA DE